Não esperei que ele terminasse e o abracei, grata e feliz por tudo não ter passado de um pesadelo. “Estou aqui. Fica calma!”, ele me falava ao pé do ouvido. Ainda assim chorei em pânico por um tempo, mas seu abraço forte me acalmou. Ele me colocou para dormir e eu não o soltei mais. Acabou que ele dormiu antes de mim em nossa cama e só depois de ver que ele não sairia, dormi. Feridas abertas haviam aos montes, mas com a ajuda dele, talvez conseguíssemos curá-las.
PARTE 4 – O INÍCIO
No dia seguinte, acordei sentindo um cutucão na minha bunda. Olhei por sobre meu ombros e Kaká dormia profundamente, porém seu pau já havia acordado e parecia disposto a praticar uma boa maratona de exercícios. Numa situação normal, eu o teria acordado com um caprichado boquete para terminarmos juntos numa transa caprichada. Entretanto, naquela situação éramos praticamente dois estranhos tentando se conhecer melhor ou talvez seria melhor dizer, tentando se reconhecer novamente.
Sentir o volume de seu pau sem poder fazer algo estava me deixando agoniada e decidi me levantar para fazer um café ou tomar um banho frio, o que fosse mais fácil naquele momento. Assim que me movimentei, ele também acordou e me viu ali de pé ao lado da cama:
- Ué! Você não costuma acordar tão cedo assim.
- Pois é. É que eu não estava me ajeitando na cama. - Respondi e olhei sem querer para seu pau.
Ele também olhou e entendeu de imediato o motivo de meu constrangimento:
- Ah! Poxa, desculpa.
- Tá tudo bem. Antes de pé que deitado.
Ele começou a rir e se levantou da cama, indo direto para o banheiro da suíte. Fechou a porta e a abriu rapidinho, saindo:
- Desculpa, esqueci que a suíte é sua. Vou no outro.
- Para, né, Kaká. Sem viadagem comigo!
Ele riu e voltou para o banheiro, se trancando novamente. Conhecendo meu marido como eu conhecia, ele passaria os próximos dez minutos cagando e o resultado olfativo seria dos piores possíveis. Abri a janela da suíte, para melhorar a circulação do ar e fui para a cozinha preparar um café da manhã. Dito e feito: dez minutos depois o Kaká surgiu, sorrindo timidamente:
- Se eu fosse você, não iria na suíte agora.
- Ai, credo, Kaká! Que nojo…
Ele riu e se sentou à mesa, esperando que o café ficasse pronto. Enquanto isso, eu andava de um lado para o outro, amornando o leite, pegando a margarina, um pão caseiro que eu havia me aventurado a fazer no dia em que fomos ao Clube de Swing, minhas bolachinhas de nata recheadas de goiabada que amo de paixão! Quando o café ficou pronto, levei-o até à mesa e nos servimos. O clima estava tão ameno entre nós que até parecia que não havíamos jogado na cara um do outro as traições que havíamos cometido na noite anterior:
- Humm… Esse pão tá divino.
- Obrigada. Ainda acho que ficou faltando sal.
- Sal!? Ele não é pão doce?
- Não! Era pra ser salgado. - Falei, rindo de mim mesma: - Agora tenho certeza que ficou faltando sal e bastante!
- Não, mas ficou bom. - Ele insistiu e riu também: - Mas ficou doce.
Ficamos rindo feito bobos, constrangidos com nossa própria presença. Eu precisava me situar em nossa relação, então perguntei:
- Você vai mesmo sair de casa?
- Quer que eu saia?
- Não! É claro que não.
- Então, eu fico, mas no quarto de hóspedes.
- Se você prefere… - Disse, tomando um gole de meu café e continuei: - Por mim, você dormiria na nossa cama. É uma roupa de cama a menos para eu me preocupar…
- Eu lavo, se for o caso. Não se preocupe.
Depois de tomarmos nosso café em silêncio, minha curiosidade feminina me empurrou para cima dele e fiz a pergunta que não queria calar dentro de meu coração:
- Você vai continuar se encontrando com a Sandrinha?
Ele me olhou por um tempo em silêncio, parecendo buscar uma conclusão para uma pergunta que parecia ser tão simples e eu mesma me adiantei:
- Esquece. Eu não tenho direito de perguntar…
- Tem sim! - Ele me interrompeu e continuou: - Estive pensando sobre isso e estou disposto a dar um tempo até decidirmos o que vamos fazer, mas só se você também parar com suas saídas.
- Eu não tenho um amante, Kaká. Foram umas “escapadas” eventuais e nunca repeti com ninguém, então, pra mim é moleza, mas e você?
- Pois é. A Sandrinha não vai entender tão bem assim, mas paciência, né? Vou me resolver primeiro com você, que é algo que eu já devia ter feito antes de me envolver com ela.
O clima que até então estava ameno entre a gente, ficou pesado, óbvio. Ficamos em silêncio e como ele já não estava mais comendo, me levantei para retirar as louças da mesa, colocando-as na pia, nem vi quando ele se levantou e saiu, mas, enfim, nada mais havia a ser dito naquele momento.
Ele foi se arrumar para sair para o trabalho e fui me despedir dele na porta, como sempre fazia. Eu não sabia se o beijava na boca como sempre fiz, mas tentei, e ele virou o rosto. Não insisti e ele saiu. Fiquei cuidando de meus afazeres domésticos, que não são poucos e, depois de um tempo, recebi uma ligação do Cesinha. Mesmo receosa, sem saber o que esperar, decidi atendê-lo:
- Vê, cê andou falando algo pro Carlinhos? - Disse sem sequer me cumprimentar.
- Oi pra você também, Cesinha. - Respondi cinicamente e continuei: - Tivemos uma séria conversa sim, se é o que você quer saber.
- Ai, meu Deus… Você não falou de mim não, né?
Achei de um cinismo sem tamanho dele querer me jogar a responsabilidade por ele ter dado em cima de mim, aproveitando-se inclusive de um momento em que eu estava vulnerável e ele literalmente se fodendo para meu marido ao me foder sem dó ou piedade três vezes naquela tarde no clube de campo. Fiquei curiosa:
- Por que a pergunta?
- Encontrei com ele quando ele estava chegando no trabalho e ele me olhou como se eu fosse o maior filho da puta da face da Terra.
“E é mesmo, oras!”, pensei. Decidi ser sincera:
- Contei sim. Ontem tivemos uma conversa decisiva de marido e mulher e me abri com ele.
- Pelo amor de Deus, Verônica, cê vai me foder com ele.
- Espera aí! Se bem me lembro, foi você que deu em cima de mim e que depois me fodeu. Agora vem com esse papinho de que eu vou te foder!? Quer saber? Vai se foder você, cara!
- Não! Espera aí, eu…
Não esperei que completasse e desliguei. Ele tentou me ligar mais três vezes, mas ignorei todas as chamadas. Sei lá se ele se cansou, mas fato é que parou de me ligar. Achei melhor assim. Voltei às minhas atividades e praticamente me esqueci de todos os problemas que me rodeavam, somente o Kaká me vinha à cabeça vez ou outra, mas isso era normal, pois eu imaginava que ele também devia pensar em mim.
Decidi que iria caprichar num jantarzinho para nós e fui num mercadinho perto de casa comprar alguns mantimentos. Encontrei Andressa, a nova namorada do Roberto lá e já imaginei que o filho da puta também poderia estar por perto e estava, chegando logo depois onde estávamos. Cumprimentei-o formalmente e quando nos despedimos, ele ainda me deu um ligeiro beliscão na bunda. Quase o mandei à merda e só não fiz isso em consideração a ela e porque iria tornar pública minha traição. Além do mais, eu havia dado a liberdade antes e ele, folgado e abusado, não perdia a chance quando me encontrava.
Voltei para casa e passei a me ocupar com o jantar que havia bolado para a gente. Fiz uma caprichada lasanha à bolonhesa, a preferida dele. Pus um vinho tinto suave que eu adoro para gelar. Mesmo já tendo uma carne, decidi fazer um pernilzinho assado com molho de tomate agridoce, vinagre e mel, e ervas aromáticas que fica divino nas mãos dele, nas minhas seria a primeira vez. Enquanto ele assava, fui tomar um banho, no qual me esmerei. Depois passei um creme delicioso e cheiroso pelo corpo e coloquei um vestido não muito curto, mas bastante sensual. Fiz também uma maquiagem suave, mas marcante nos olhos e lábios e fiquei aguardando-o.
As horas foram passando, passando, passando, e nada dele chegar. Já passava das dezenove horas e, salvo às sextas quando ele às vezes saía para beber com os amigos, não costumava atrasar. Liguei em seu celular duas, três vezes e nada dele atender. Eu sentada na mesa que havia enfeitado com tanto carinho, só aguardando-o para colocar os pratos que havia preparado e nada do meu marido. Comecei a imaginar que ele tivesse desistido da gente e foi impossível conter uma lágrima, mas me convenci de que deveria ser forte e aguardar mais um pouco, senão borraria a maquiagem.
Sete e meia ele chegou e entrou em casa. Fui correndo até ele que estava com um semblante incomum, meio carregado, meio aliviado, estranho mesmo:
- Tá tudo bem? - Perguntei antes de notar uma marca de batom no colarinho de sua camisa e, apontando com um dedo, não consegui ficar quieta: - Poxa, Kaká, batom!? Você voltou a ficar com aquela biscate?
Ele puxou o colarinho e viu a marca, ficando constrangido, mas começou a falar na sequência sem me dar chance de continuar:
- Para! Eu fui terminar com a Sandrinha. - Falou, fazendo-me arregalar os olhos e até arrancou um contido sorriso: - Depois que eu falei, ela tentou me beijar e até conseguiu. Isso aqui deve ter acontecido nesse meio tempo, nem vi quando.
- E ela?
- Lógico que não aceitou bem. Depois que falei, tentou me convencer a não terminar, beijou, disse que me amava, que não podia viver sem mim… Aquela ladainha toda. - Disse e depois começou a rir: - Depois abriu o bocão com vontade, chorando alto, e falou que eu havia acabado com a vida dela.
- Vixi!...
- É, não foi nada legal.
- Eu… Bem, cada um com seu problema, né? Eu fiz um jantar para nós. Me deu vontade de caprichar um pouquinho, então, fiz aquela lasanha que você gosta, um pedaço de pernil assado e tem um vinho na geladeira.
- Não sei o que você está comemorando?
Realmente não havia nenhum motivo aparente, mas eu não queria me dar por vencida e acabei achando uma boa resposta:
- A verdade, a honestidade que deveria ter existido entre a gente desde o início!
Ele me encarou, sorriu e disse:
- O cheirinho está bom mesmo. Vou tomar uma ducha rápida e já venho. - Falou e, já no meio do corredor, avisou: - Vou usar o banheiro da suíte mesmo, tá bom? Você disse que eu podia…
- E pode mesmo! - Insisti: - Só não demora que eu já tô com fome.
- Também tô. É rapidinho…
Voltei à cozinha e após reaquecer a lasanha e o assado, coloquei os dois sobre nossa mesa. Deixei o vinho num suporte próprio e fiquei aguardando seu retorno. Uns cinco, dez minutos no máximo depois, Kaká chegou, cheiroso e bem vestido com uma camisa polo e uma bermuda social de sarja. Apenas sua já tão conhecida e surrada sandália de couro destoava um pouco, mas enfim…
Ele se sentou em seu lugar de costume e pelo seu olhar seguido de um sorriso, pareceu ter aprovado meu cardápio. Eu o servi de um belo pedaço de lasanha e outro para mim, enquanto ele picava o pernil, servindo-me em seguida. Depois abriu o vinho e nos serviu também. Após provar o primeiro pedaço, elogiou:
- Hummm… Maravilhoso! Hoje, você acertou em cheio no tempero. Está melhor que o meu.
Sorri, agradecendo e também provei e, modéstia à parte, eu havia acertado mesmo. Não sei se havia ficado melhor que o assado que ele faz, mas realmente estava muito bom. Começamos a conversar sobre seu dia no trabalho, sem muita novidade. Então, contei-lhe sobre meu encontro no mercadinho e ele não gostou nada, pior foi quando falei da ligação do Cesinha, mas ele não me criticou em nenhuma das duas situações, pois eu não havia feito nada de errado. Passamos a conversar sobre diversos assuntos, quando a campainha tocou e ele foi atender.
Continuei na cozinha, mas logo ouvi uma vozinha feminina irada e chorosa ao mesmo tempo, reconhecendo imediatamente a Sandrinha. Sei que é feio escutar a conversa dos outros, mas fui até o canto da parede e colei a orelha, tentando ouvir o que conversavam. Ela chorava demais, tentando convencê-lo a não abandoná-la e isso na sala da minha casa. Fiquei inconformada, irada e fui tirar satisfações com aquela safada, mas quando coloquei um pé no corredor, ouvi uma palavra que me quebrou no meio e recuei. Se a surpresa foi grande para ele que se calou, imagine para mim que não esperava aquela situação e muito menos dentro da sala da minha casa:
- O que foi que você disse, Sandrinha? - Ele perguntou um tempinho depois.
- Grávida! Estou grávida e só pode ser seu, porque eu não transo com o filho da puta do Jaime desde o Carnaval.
- Puta que o pariu! - Ele disse e se calou outra vez, aliás, se calaram.
Aquela novidade foi a facada que faltava no meu peito. Trair era horrível e havíamos errado, mas meu marido havia relaxado tanto em seu relacionamento extraconjugal que, aparentemente, não estava sequer se precavendo e aquilo me doeu demais. Meus olhos marejaram na hora, eu queria morrer; no mínimo, eu queria sair dali e foi isso que fiz, indo até a sala onde o casal de amantes me encararam com olhos arregalados:
- Vê, você ouviu? - Ele me perguntou, mas minha cara já havia respondido: - Eu… Eu… Eu não sei o que te dizer.
Dei-lhes as minhas costas e fui até minha suíte, arremessando a porta com o máximo de força que eu tinha em meus braços. Acho que o eco da batida ecoou a quarteirões de distância. Mas eu não estava satisfeita, apenas isso não era suficiente e se ficasse ali eu mataria aquela biscate. Peguei minha bolsa, carteira, documentos pessoais, celular e voltei para a sala, onde os dois agora estavam sentados e com a pior cara possível, nem velório era tão desanimado como aqueles dois:
- Verônica, onde você vai? - Ele me perguntou.
- Vou para a casa da minha mãe. Vocês têm muito o que conversar. Amanhã, peço para meu pai vir buscar minhas coisas.
- Para! O que é isso? Não, espera um pouco. - Ele disse enquanto já se aproximava e depois me segurava pelo braço: - Pelo amor de Deus, espera, fica calma. Pelo menos, me deixa te levar.
- Me solta. - Falei calmamente, mas com os olhos injetados de ódio, banhados na ira e quase transbordando veneno, mas consegui respirar fundo e não explodi: - De todas as traições, essa foi para acabar comigo. Parabéns!
- Eu não fiz por querer, não quis isso.
- Ah, não foi por querer!? Já ouviu falar em camisinha, anticoncepcional, pílula do dia seguinte? - Ironizei, me contendo para não desabar: - Porra, Kaká… Eu sei que falhei com você, mas transar e engravidar a amante!?
- Eu juro que não foi minha intenção...
- É!? E de quem foi então? Dela? - Gritei: - Ela pegou seu pau, colocou no meio da boceta e fez você gozar?
Depois que havia falado aquilo me toquei que era bem possível que tivesse mesmo feito isso inúmeras vezes, mas a raiva ainda me cegava e eu queria fazê-lo se sentir horrível, da mesma forma como eu estava me sentido:
- Eu sei que não consegui te dar um filho, mas já estava fazendo o tratamento direitinho, era questão de tempo... - Falei em meio às lágrimas e depois de secar algumas delas, falei: - Deixa pra lá. Só não era pra ter sido...
Soltei meu braço de sua mão e saí pela porta da sala, de lá para a rua e da rua para não sei onde. Só sei que andava sem rumo e sem parada. Depois de andar um tempão sem querer ou chegar a lugar algum, um carro passou do meu lado e parou um pouco mais à minha frente. Logo a porta se abriu e minha mãe desceu correndo, vindo me abraçar. Eu estava perdida e não a reconheci, mas depois de duas boas chacoalhadas e um leve tapa no rosto, a encarei e aí desmontei, literalmente: fiquei de joelhos no chão, chorando, sem forças para nada mais. Se antes havia alguma chance para mim e para meu marido, agora não havia mais.
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