CAPÍTULO 11
*** MARCOS VALENTE ***
Ele mentiu. Eu sei. Mas não faço ideia de sobre o que.
— O que aconteceu, meu filho? — minha mãe pergunta assim que Anthony está distante o suficiente para não nos ouvir mais.
— Bem... — suspiro, preparando-me para dar a notícia de uma vez só —, Anthony é filho de Mário Machado Rodrigues...
Os olhos de minha mãe se arregalam e a expressão do meu pai endurece imediatamente, porque esse não é um nome qualquer. O pai de Anthony é um juiz federal conceituadíssimo e, embora até esta noite eu não tivesse qualquer informação sobre sua família, seu trabalho na esfera jurídica federal é uma grande referência para qualquer jurista do país.
— E por que ele não o levou até o altar?
— Por que nós só estamos sabendo disso agora?
Ambos os meus pais falam ao mesmo tempo, dando vozes às suas maiores preocupações com a notícia que acabo de lhes dar, e logo se vê a diferença em suas personalidades.
— Anthony cortou relações com eles há anos, depois de uma situação muito delicada. Não era... esperado..., que ele ou a esposa comparecessem... — esclareço superficialmente, porque essa não é a minha história para contar. Minha mãe franze o cenho.
— E como foi que ele entrou aqui?
— Uma falha na montagem da lista de convidados, sem dúvidas... — uma falha minha, que coloquei todos os nomes que importavam de alguma maneira nas altas rodas do Brasil, sem ter ideia de que dois deles pertenciam aos meus sogros, mas essa parte eu guardo para mim.
— Que situação... — minha mãe murmura e meu pai continua em silêncio. Até não estar mais.
— Por que nós não vamos tomar uma bebida no bar? — concordo com um aceno e minha mãe, ainda que saiba exatamente o que ele está fazendo, não se opõe. Nos afastamos da mesa e rapidamente estamos de pé, apoiados no balcão enquanto o barman prepara os copos.
— O que você não está nos contando, Marcos?
— Não é minha história para contar, pai... — dois copos sobre guardanapos são colocados no balcão, diante de nós, e eu pego um, tomando o primeiro gole quase imediatamente.
— Tem a ver com a menina, não tem? — suspiro. Não é como se fosse muito difícil deduzir a raiz do problema, basta saber fazer contas.
— Eles o expulsaram de casa...
— Puta que pariu! — rio.
— Filhos da puta, você quer dizer, né? — Nego com a cabeça, passeando os olhos pelo salão lotado de pessoas e esperando não encontrar o rosto maldito, eu não responderia pelos meus atos.
— Quantos anos?
— Dezessete, ele tinha a porra de dezessete anos e eles o colocaram para fora só com a roupa do corpo.
— Você vê um homem como ele e nunca imaginaria o que acontece por trás das portas da sua casa... Nunca... — meu pai comenta, soando tão desgostoso quanto eu.
— É a história da sociedade, não é? Mascarada na rua, monstruosa dentro da própria casa...
— Eu fico feliz que não seja a história da nossa casa... — Abaixo a cabeça, olhando para o fundo do meu copo. E, quando volto a erguê-la, toco a testa do meu pai com a minha, agradecendo silenciosamente por isso, pela história da nossa casa ter sido completamente diferente da de Antonella.
Diferente dos seus pais, os meus tiveram muitos, muitos motivos mesmo para me abandonar, para me julgar, para se ressentirem da pessoa que me tornei. Ainda assim, nunca fizeram. Seu apoio e amor incondicional nunca me faltaram, e eu sei que nunca poderia fazer o mesmo por alguém. Surpreendendo-me, a imagem de Isabella toma minha mente de assalto. Aquela garotinha merece mais um pai exatamente como esse e eu espero que, um dia, ela encontre, sorrio ao me lembrar das palavras de Anthony, “Eu sou a mãe e o pai dela...” É verdade, Isabella já encontrou.
— Posso me juntar a vocês? — João Pedro pergunta e eu me afasto do meu pai com carinho, logo em seguida, ele é abraçado por meu amigo.
— João, meu filho! Bom te ver! Como vão as coisas? Como a vida de casado anda te tratando? — Joaquim Valente questiona com um imenso sorriso no rosto.
— Melhor impossível! — Meu amigo responde e eu observo a interação dos dois por trás do meu copo.
— E quando é que esse padrinho vai ganhar netos?
— Por mim? Iria amanhã em um orfanato. Mas Eduardo não tem a menor intenção de ter filhos nem tão cedo, só me resta esperar a vontade dela...
— É assim que se fala! Aprenda, Marcos! — Meu pai brinca e eu reviro os olhos.
— Isso, Marcos! Aprenda comigo! — João Pedro debocha e eu bufo.
— Onde ele está, aliás? Ainda não o vi...
— Com meus pais, o deixei conversando com minha mãe...
— E como vão as coisas na Gouvêa?
— Está tudo bem por lá! — O CEO do grupo editorial Govêa assume a conversa e começa a falar sobre a fusão que estão prestes a fazer. Bastam alguns segundos para que eu decida que, definitivamente, a última coisa sobre a qual quero conversar agora, é trabalho.
— Com licença, eu vou procurar meu esposo... — digo, já abraçando meu pai em uma despedida.
— Viu só, padrinho? Ele até que aprende rápido! — João Pedro comenta, eu me viro em sua direção, coçando o nariz com o dedo do meio, ele gargalha.
— Tchau, filho da puta! — murmuro em seu ouvido, deixo um apertão em seu ombro, e me afasto, procurando Anthony com os olhos.
Vasculho o salão de ponta a ponta por uma, duas, três vezes. Mas não o encontro e concluo que ele só pode ter ido ao banheiro.
Caminho na direção das toaletes, no entanto, quase vinte minutos se passam sem que eu tenha sinal do meu marido. Franzo o cenho, porque independentemente do quão complicada seja a logística, não demoraria tanto, demoraria? Não, eu acho que não...
Saio do salão de festas. Provavelmente, Anthony decidiu dar uma última olhada em Isabella e eu vou encontrá-lo no apartamento. Mas, enquanto caminho na direção dos elevadores, ouço vozes conhecidas vindo do mesmo corredor em que eu estava escondido hoje, antes da cerimônia. Parece que eu o encontrei, afinal.
Caminho na direção das vozes, no entanto, paro quando ouço a pergunta feita pela voz que só pode ser de Graziella.
— Como ele reagiu? — Eu não deveria ouvir essa conversa. Eu sei que não deveria, mas com a possibilidade descobrir algo que Anthony não quer me contar, aquela sensação de certeza de que ele está me escondendo alguma coisa volta a me atingir com força.
Estreito os olhos, me aproximando devagar, esforçando-me para não fazer qualquer barulho. Foda-se, se ele não tiver nada a me esconder, eu serei só um marido a procura do esposo, e, se tiver, que moral ele teria para me cobrar qualquer coisa? Nenhuma, não depois de me garantir que não me escondia nada e de me acusar de paranoia.
— Melhor do que eu imaginei... Talvez eu devesse ter contado a verdade desde o começo... — Anthony responde e eu balanço a cabeça, concordando. Sim, deveria. As coisas teriam sido muito mais fáceis em tantos sentidos...
— O quê, Thon? Tá com pena dos Marcos babaca, agora? — Marcos babaca? Mas que porra é essa? Franzo o cenho não apenas pelo apelido, mas pela naturalidade com que ele soa, como se fosse usado constantemente. — E, eu tenho que admitir, suas habilidades de interpretação são realmente muito melhores do que eu esperava, tem certeza de que nós não fizemos aula de teatro na escola, Thon? — Interpretação? Sinto um aperto no estômago, me dando conta de que estou prestes a descobrir algo muito mais importante do que uma mentirinha, fecho os olhos e levo os dedos indicador e médio à lateral da cabeça, apertando ali, tentando me preparar para o que quer que eu esteja prestes a ouvir, mas basta que as palavras sejam ditas, para que eu tenha certeza de que não havia nada que eu pudesse ter feito para me preparar para elas. — Porque se você conseguiu se manter o doce e inocente Anthony aos olhos dele, depois de toda aquela cena e de tudo o que explicar isso envolveu, porra! Ou você é muito bom, ou ele é muito trouxa. Talvez, um pouco dos dois... — leva algum tempo para que a gravidade da situação me alcance e quando acontece, aperto as mãos em punhos e ranjo os dentes. Uma raiva como eu jamais senti gira e borbulha no meu peito, estômago, na minha cabeça. A impressão que tenho, é de que posso explodir a qualquer momento.
Anthony não apenas escondeu algo de mim, ele, deliberadamente, me enganou, atuou, fingiu ser algo que não é. E, de repente, todas as peças soltas do quebra-cabeças começam a se encaixar. Meu corpo fica parado, exatamente no mesmo lugar, não porque quero continuar ouvindo a conversa reveladora, mas porque pareço ter perdido a capacidade de me mover.
— Você sabe que eu não fiz isso de propósito, certo? Porquê do jeito que você fala, faz parecer que eu o estou enganando por pura diversão!
— Bem, você pode até não estar se divertindo, mas eu, sem dúvida nenhuma, estou! Eu já te disse! Sua vida se tornou minha novela preferida! Você precisava ver a cara de babaca do Marcos babaca quando as portas se abriram e você apareceu, graças a Deus alguém filmou! Eu estava mesmo precisando de figurinhas novas para o WhatsApp!...
— Grazi!
— O quê? Eu dou um mês, talvez dois, até ele estar completamente rendido, apaixonado, lambendo o chão que você pisa! E, pelo amor de Deus, Thon! Não se atreva a abrir essa bunda! Você é tipo um vingador de todos os gays que já foram vítimas da cafajestice do seu marido! Eu queria ver a cara que ele faria se descobrisse que o doce e inocente Anthony não tem nada de doce ou inocente e que usa essa desculpa só para não dar para ele, quando já teria dado para metade de São Paulo se tivesse a oportunidade...
— Eu juro que, às vezes…
— MARCOS! — Uma voz alta me chama, libertando minha mente do ciclo infinito de pensamentos no qual ela mergulhou a cada palavra ouvida da conversa entre Graziella e Antonella.
Mas não é apenas por mim que o chamado faz isso, porque antes mesmo que eu possa me virar, o rosto assustado de Anthony aparece no corredor, assim como sua amiga. Seus olhos estão arregalados, sua pele está pálida e sua boca abre e fecha sem dizer qualquer coisa, agora, els decidiu ficar sem palavras. Eu deveria agradecer por isso só ter acontecido depois de ter deixado bem claro o quão trouxa eu fui?
Rio, sem humor algum, ao me virar para a voz que me chamou e me deparar com ninguém menos que Eduardo. A vida é mesmo uma brincante por escolher esfregar o marido do meu amigo, que eu acusei injustamente de o estar fazendo de idiota quando conheci, justamente agora, quando me mostra que sou eu o maior idiota de todos os tempos.
— Marcos... — a voz de Anthony soa desesperada, mas eu não lhe digno um olhar. Caminho até Eduardo, ignorando completamente o chamado de meu esposo.
— Tudo bem? — pergunto ao homem que me encara confuso, provavelmente com o tratamento dado àquele que ainda tem a roupa de noivo no corpo.
— Sim! Eu só achei estranho o jeito que você estava parado no corredor. Eu te chamei outras vezes, mas você não ouviu...
— Oh... Eu estou bem, eu só vim buscar meu marido. — Agora, viro-me para ele, e porra! Os gritos de agonia de seus olhos fazem eu me sentir um pouquinho menos miserável, quase nada, mas, ainda assim, alguma coisa. — Nós já estamos de saída... — Eduardo balança a cabeça lentamente, desconfiado, mas não é nada relacionado a isso o que diz.
— Tudo bem, façam uma boa viagem... — deseja, se aproxima de mim e me abraça, eu retribuo, me sentindo mais culpado do que nunca por todas as acusações injustas que lhe fiz. Ele beija Anthony e se despede, virando as costas e caminhando de volta para o salão.
— Thin... — É Grazi quem fala e eu apoio as mãos na cintura, rindo da minha própria situação ridícula. Puta que pariu, quão estúpido eu puder ser, porra?!
— Eu estou no carro... — Ainda tenho a cortesia de avisar antes de caminhar para fora, mas a voz de Grazi me para.
— Marcos, não ouse…
— Não ouse você! — aviso, apertando os dentes logo em seguida, tentando controlar minha raiva, mas ela parece determinada a ser incontrolável, aperto as mãos em punhos e viro as costas, andando na direção oposta àquela que as duas estão, porém ainda ouço o alerta sussurrado.
— Thon, eu acho melhor você não ir... — a filha da puta tem a audácia de realmente soar preocupada e eu gargalho, sem poder acreditar em uma coisa dessas.
— Claro, porque, obviamente, sou eu o perigo dessa equação. Ah, não fode, porra! — digo, ainda olhando para frente, mas sem conseguir me conter, viro-me para Anthony e aponto o dedo em sua direção. — E caso você tenha esquecido, você assinou a porra de um contrato, porque pelo menos nisso, eu não fui idiota o suficiente para acreditar só na sua palavra! — Me viro, caminhando para fora sem olhar para trás.
Me jogo no banco da limusine e levo as mãos ao rosto. Porra, puta que pariu! Poucos instantes depois, a outra porta é aberta e ouço o farfalhar de tecido quando meu esposo bebê — gargalho alto da minha própria estupidez e me corrijo em minha própria mente, — meu esposo, que teria fodido metade de São Paulo, se lhe fosse dada a oportunidade, senta-se ao meu lado. — Marcos, eu… — Não!
— Eu…
— Eu não quero ouvir a porra da sua voz, então faz um favor para nós dois e guarde as suas mentiras para você! — Com as mãos no rosto, ouço-o bufar indignado e abaixo as mãos, procurando seu olhar dissimulado e me perguntando se alguma das vezes em que o ouvi gritar antes, eles diziam verdades, ou se também contavam mentiras.
Pelo menos, agora, quando eles me chamam de babaca, eu não tenho a menor dúvida de que eles estão sendo sinceros.
— É, você sabe absolutamente tudo sobre mim... — respondo em voz alta e ele vira o rosto.
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O caminho até o heliporto é feito em silêncio apenas externamente, porque em minha cabeça, há uma verdadeira banda marcial se apresentando. Quando as hélices do helicóptero começam a girar, erguendo uma verdadeira ventania, tenho a impressão de que as folhas perdidas no meio dela ainda estão melhores do que eu, porque em meio ao inferno da percepção de que Anthony passou todo o último mês me enganando, há o fato de que eu preciso fazer um esforço sobre-humano para não olhar para ele, quando ele está tão perto.
Há o fato de que seu cheiro se infiltrou em meu nariz e duela, de igual para igual, com suas mentiras, por espaço em meus pensamentos. Há o fato de que a minha vontade de o tocar parece ainda maior sabendo agora, que, todas as vezes em que me afastou, ele estava encenando. Eu deveria querê-lo tão longe de mim quanto a circunferência terrestre permite que se esteja longe de alguém, no entanto, não consigo parar de pensar que, se algo bom veio de tudo isso, é que minha obsessão por esse homem finalmente tem um obstáculo a menos em seu caminho.
E, quando o helicóptero pousa e eld salta para fora, uma verdadeira batalha acontece dentro de mim. Uma que envolve responder uma única pergunta, o quanto eu estou disposto a fazer para tirar Anthony do meu sistema de uma vez por todas? Faço meu caminho para fora da besta de ferro e hélices e caminho alguns passos atrás de Anthony até a única casa na ilha. O balançar dos seus quadris rouba e mantém cativa a atenção dos meus olhos e eu me amaldiçoo por isso.
Eu quero tantas coisas agora, eu quero gritar com ele, mas, definitivamente, eu também quero fodê-lo até que tudo o que seus lábios mentirosos sejam capazes de dizer, seja meu nome. No momento em que a porta da suíte se fecha e os funcionários da ilha são deixados para trás, Anthony caminha para longe de mim, mas não diz absolutamente nada.
Ando de um lado para o outro, apesar das quase duas horas em que passei pensando nisso de São Paulo até aqui, ainda desvendado cada momento em que Anthony pareceu mais do que eu via nele. Cada olhar. Cada fala imperativa. Cada ação determinada. A lembrança da noite do evento beneficente assalta minha memória como um ladrão de bancos inexperiente.
Ele vem sem cuidado ou discrição, tocando cada nervo e inundando-os com sua presença. Sua resposta quando eu comentei que ele estava diferente, sua postura diante de pessoas importantes, sua altivez e conforto com os assuntos falados, ele sempre foi a porra de um rei brincando comigo, e eu não enxerguei.
Sem permissão, lembranças de seu toque me atingem com ainda mais violência do que as de seu comportamento. Lembranças de como seus olhos escandalosos me ordenavam, de como sem dizer uma palavra, ele me fez seu escravo e eu obedeci prontamente a cada um de seus comandos e, por último e muito mais amarga do que qualquer outra lembrança, vem a memória de como els fugiu, deixando-me para trás, miserável, acreditando ter me aproveitado do meu noivo inocente.
Ah, homem maldito! Momentaneamente, a raiva se sobrepõe ao desejo de consumi-la em minha luta interior, crescendo em ondas gigantes. E como se respondesse a um chamado, o desejo reprimido e negado ao longo de todo o último mês, ganha forças, transformando-se em algo muito maior do que tsunamis. Não consigo escalar sua medida em um fenômeno arrasador da natureza sequer.
Os dias de olhares roubados, as lembranças dos toques trocados e toda a sua sufocante presença, tudo me desestabiliza, me enlouquecendo e desesperando, até que eu rompa o silêncio em uma explosão que não consigo definir se é mais raiva, tesão ou desespero.
— Quão divertido foi isso, em Anthony? Me fazer de palhaço? — grito, louco para prensá-lo contra a parede. Abrindo e fechando as mãos, ando para frente e para trás, ansioso por um controle que eu não tenho.
— Marcos...
— Marcos o quê? Não ouse! Não ouse, porque nada que sai da sua boca é verdade! — acuso, respirando pesadamente e balançando a cabeça para um lado e para o outro, — Você é a porra de um ator e eu, um filho da puta, um idiota! Dissimulado do caralho! Isabella é realmente sua filha, Anthony? Ou ela faz parte de todo esse seu show? —atiro as últimas palavras mesmo sabendo que a pergunta não faz o menor sentido, não depois dos acontecimentos que nos trouxeram exatamente para onde estamos esta noite.
Mas não me importo. Tudo o que eu quero é que ele se sinta tão desestabilizado quanto eu, quero que ele se sinta usado, enganado, e na ausência dessa possibilidade, uso a única arma que tenho.
Entregando-me uma reação que não chega nem perto daquilo que preciso, Anthony arfa, tendo a desfaçatez de se sentir ofendido. Seu corpo cresce, seu olhar se ergue e ele caminha em minha direção com uma postura austera que finalmente combina com seus olhos, fazendo eu me perguntar como pude ser tão idiota. Eu rio, porque aí está você, aí está a porra do homem que não consegue me dar paz nem quando eu descubro que ele me enganou o tempo inteiro desde que a conheci.
— Não ouse você! — brada com o dedo em riste. — Não ouse trazer a minha filha para essa conversa, porque ela não tem nada a ver com a sua prepotência!
— Ah, então o problema não são as suas mentiras? É a minha prepotência? — pergunto, rindo de sua cara de pau. — O seu cinismo é inacreditável!
— E a sua arrogância também!
— Descarado! — acuso, dando um passo em sua direção.
— Cretino! — rebate, caminhando um passo até mim! Nego com a cabeça, a ousadia desse cara!
— Mentiroso! — mais um passo e agora tudo o que nos separa é mais um.
— Presunçoso! — grita, eliminando por completo a distância que nos separava. Respiramos ofegantes. Nossos olhos travam uma batalha infinita no espaço de um segundo e, então, minhas mãos, braços e boca estão nele.
O beijo. O caralho do beijo que não me deu paz desde a primeira vez que eu provei essa boca, semanas atrás. Não é como eu me lembrava, é melhor, muito melhor. Anthony não é entregue, ele é exigente, sua língua dança em minha boca, apresentando o próprio show, demonstrando as próprias vontades e não deixando espaço para que eu faça nada além de atendê-las.
Agarro seu corpo com força, me deliciando em suas curvas, e outra vez, com sua boca na minha, seu corpo no meu, com sua presença e cheiro inundando cada pedaço de mim, não sobra espaço para nada em minha mente que não seja meu desejo por Thony. E, esta noite, ele não vai fugir de mim nem pelo caralho do inferno!
— Pede! — ordena, ainda com a boca na minha. — Se você quer me foder, Marcos, PEDE! — Seus olhos faíscam de desejo e provocação, suas unhas se arrastam pela minha nuca, arranhando, deixando uma ardência gostosa, e sua respiração ofegante sopra sobre meus lábios e queixo.
— Nem fodendo! — rosno, entredentes, antes de morder seu lábio inferior com força e puxá-lo para mim. O safado se esfrega em meu corpo e geme, gostando da brutalidade. Puta que pariu!
— Então, eu lamento muito por você... — murmura no tom manhoso que me enganou por semanas e pisca os olhos, encenando outra vez o menino tímido, idiota para caralho, é o que eu fui! — Por nós dois, na verdade... — comenta como se não desse a mínima para o desejo descontrolado que nos envolve.
Afasta os lábios dos meus e ensaia afastar o corpo também.
— Anthony, não me testa! — digo, entredentes, apertando os braços mais firmemente ao redor do seu corpo e seus olhos encontram os meus, desafiando-me.
— Ou o quê? — provoca e passa a língua lentamente sobre os lábios. — Se você quiser me foder, Marcos, vai ter que me pedir... — aproxima a boca do meu ouvido e enfia os dentes com força no lóbulo da minha orelha, puta que pariu! Engulo o gemido que sobe pela minha garganta, me recusando a lhe dar esse prazer, — Porque, caso você tenha se esquecido, foi a sua arrogância do caralho que colocou no nosso contrato de casamento que interações sexuais só aconteceriam após a expressão verbal do consentimento das duas partes. A sua prepotência estúpida que achou que eu imploraria para você me foder... — Estala a língua, traz os olhos de volta para os meus e move a cabeça para os lados. — Isso não vai acontecer, Marcos. Se alguém vai implorar aqui, é você... Pede! — o sorriso em sua boca é dos mais bonitos que já a vi dar. O maldito me enlouquece sem nunca deixar de sorrir.
— Se eu enfiar a mão na sua cueca agora, Anthony, eu não vou te encontrar melado? — rosno em sua boca, puto por estar me sentindo ser consumido, enquanto ele continua dono de cada uma de suas palavras e provocações.
— Vai... — Arrasta cada letra da palavra e toca a ponta da língua em meus lábios. — Se enfiasse a mão na minha cueca, você me encontraria todo melado, babando pelo seu pau, louco para sentir você me foder duro, rápido... — pausa, deixando-me imaginar cada uma das imagens que acabou de pintar em minha mente com palavras arrastadas. — Louco para gritar seu nome quando você me fizesse gozar de novo e de novo... — outra pausa e ele estala a língua mais uma vez, desinteressado. — Mas você não vai enfiar a mão na minha cueca, marido... — escolhe as palavras com um cuidado fodido para me enlouquecer e diz a última lentamente, saboreando-a e odiando cada segundo, ouço seus olhos me dizerem. — Só se você pedir, Marcos! Pede! Pede para me foder! — ordena e como a porra de uma marionete que tem os fios manipulados por seus lábios, eu obedeço.
— Me deixa te foder Anthony? — seu sorriso se torna imenso, indecente, à medida que eu danço sua música. — Me deixa chupar seu corpo inteiro, estapear sua bunda e depois lamber? Me deixa judiar dos teu peito e gozar no teu cu? Deixa, porra? — digo, entredentes, me sentindo mais perto do limite a cada palavra dita, ele permanece em silêncio por vários segundos, torturando-me, e finalmente, responde.
— Deixo!
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*** ANTHONY RODRIGUES ***
Marcos não espera nem mais um segundo, sua boca devora a minha no instante em que a última sílaba da permissão ganha som e eu adoro, porra! Finalmente.
Espalmo as mãos em sua nuca, puxando-o para mim, beijando-o com lábios, dentes e língua, sentindo e aproveitando o seu gosto que tem me atormentando há semanas, pelo que eu já tive dele, por aquilo que eu quis ter e, ainda assim, vinha negando a mim mesmo. O gosto que vinha me atormentando pela porra da impossibilidade. E, agora, em um piscar de olhos, ela não passa de fumaça.
Suas mãos procuram o meu terno com desespero. As minhas têm a mesma urgência em arrancar seu paletó, deixando a tarefa de um despir o outro muito mais complicada do que deveria ser.
Arremesso longe o tecido escuro e grosso, meus dedos começam a desfazer os botões da camisa sem nem mesmo se preocuparem com a gravata borboleta em seu pescoço, porém antes que tenham terminado o trabalho que faziam com a perícia de um especialista, meu corpo é virado de costas e prensado contra a parede sem qualquer delicadeza.
Marcos encaixa o rosto na curva entre meu ombro e pescoço e morde a pele esticada. O filho da puta morde com força e eu gemo, rebolando a bunda, esfregando-me em sua ereção, louco para fazer muito mais do que isso.
— Tá disputando o prêmio de despir mais devagar, Marcos? — provoco. Sua mão desce em minha bunda com uma força que me deixa sentir o impacto mesmo por baixo das camadas de tecido da calça. Grito, surpreendido e deliciado pelo toque rude.
Depois do que parece uma eternidade, tira minha roupa toda, o tecido se acumula em uma poça que me cobre até o meio das panturrilhas e finalmente Marcos me toca pele contra pele.
Outra vez, meu corpo é virado e eu vejo seu rosto. Totalmente perdido, louco de desejo, seus olhos devoram meu tronco nu e os dedos, imediatamente, alcançam e esmagam um dos meus mamilos. Minhas costas se amparam na parede atrás de mim enquanto meu corpo é arrebatado pelas sensações do toque.
Meus olhos piscam e minha boca se abre. O gemido passa por ela, arrastado e eu estico as mãos, agarrando seu cinto e desfazendo-o. Depois, volto a trabalhar nos botões até que sua camisa esteja completamente aberta, por último, desfaço o nó da gravata e a jogo no chão.
Corro os olhos por cada milímetro seu, passeio as pontas dos dedos pelo peito firme, aproximo a boca, lambo a pele quente. Os dedos de Marcos se infiltram pelas raízes dos cabelos de minha nuca, puxando e empurrando minha cabeça em movimentos alternados enquanto minha língua se espalha e saboreia seu gosto.
Sua respiração ofega quando chupo um de seus mamilos e ele me afasta. Invertendo nossas posições, leva a boca até o meu mamilo, suga e continua a esmagar o outro entre os dedos. Minha pele inteira formiga e vibra, ansiosa por mais e mais das sensações que açoitam meu corpo, por mais de seu calor, mais da dureza de suas mãos, da umidade de sua língua.
Meu pau duro, e meu cuzinho, contraem dolorosamente com a expectativa do toque quando seus dentes se afundam levemente em meu bico sensível, enviando ondas de prazer diretamente para o meu pau. A cabeça de Marcos se ergue, seu olhar encontra o meu e ele para de me tocar.
Suas mãos descem para a própria calça. Uma delas enfia-se no bolso, tira de lá a carteira e dela um preservativo, antes de abandoná-la no chão, junto com o paletó. Ele prende a embalagem entre os dentes e arranca a camisa aberta do corpo. Os braços fortes, musculosos, flexionam, deixando veias saltadas e músculos evidentes.
Minha boca saliva, ansiosa para prová-lo inteiro, e eu lambo meus lábios. Marcos sorri e balança a cabeça para um lado e para o outro, parecendo saber exatamente o que eu quero e me negando isso.
Segundos antes de ele libertar o pau delicioso do tecido, meus olhos são atraídos para o volume arrogante em sua cueca preta. Apenas para que eu veja, Marcos o massageia em movimentos lentos de vai e vem antes de deslizar o preservativo pela cabeça larga, pelas veias salientes, pela grossura impressionante da pica e a quantidade absurda de saliva em minha boca aumenta. Mordo o lábio inferior, gemendo, louco para senti-lo e pressiono minhas coxas, uma contra a outra. Insano de necessidade.
— Eu vou te comer agora, esposo, e é melhor você se segurar! — Em quatro movimentos rápidos, rasga minha cueca, agarra minhas coxas e me tira do chão. Cruzo as pernas ao redor da sua cintura, afundo dedos e unhas em seus ombros, sinto o pau cutucando meu ânus, encaixando-se. Quando ele está no lugar certo, Marcos investe com força ao mesmo tempo em que puxa meu corpo para baixo.
A invasão é violenta, rápida, deliciosa de uma maneira inexplicável. O gemido que foge pelos meus lábios se recusa a acabar, mesmo quando já estou completamente preenchido. Ele cola a testa na minha, expira pela boca e invade meu nariz com seu hálito quente.
Seu peso me subjuga, aperta meu corpo completamente nu contra o seu. Em resposta, cravo meus pés em sua bunda e forço-me para cima, ansioso para tê-lo se movimentando dentro de mim.
Marcos pressiona minhas costas contra a parede, prendendo-me no lugar e me fode. Gostoso, rápido, forte e duro, exatamente como eu disse que estava louco para se fodido por ele. Cada arremetida me expulsa da gravidade, me enlouquece, me faz rebolar e gritar.
Esfrego meus mamilos em seu peito, puxo seus cabelos, o empurro ainda mais contra mim com minhas pernas. É tudo. É muito. É a porra de uma delícia e eu grito e espasmo quando o orgasmo mais rápido que já tive na vida me atinge e me rasga de ponta a ponta. Minha respiração falha e, junto com ela, minha voz, mas meu corpo não se importa. Ele continua movendo-se, desesperado por mais e mais do que quer que esteja recebendo.
Marcos grunhe e sibila roucamente, seus dedos se afundam na carne da minha bunda com força tamanha, que será impossível não me deixar marcado, o suor já desliza sobre sua pele dourada e eu me rendo, completamente abandonado em seus braços, cavalgando-o, deslizando para cima e para baixo.
Sua língua invade minha boca, ansiosa, lambendo e chupando.
— Puta que pariu, Anthony! Puta que pariu! — brada, antes de voltar a beber meus gemidos e, sendo duplamente penetrada, eu gozo em espasmos muito mais intensos do que da primeira vez. Logo depois, Marcos me segue, esporrando dentro de mim até que não haja nem mais uma gota que eu não tenha lhe roubado.
— Essa vai ser a primeira e a última vez! — declara, ofegante.
— A primeira e a última vez... — concordo, tão ofegante quanto.
— Ótimo, onde você quer começar? No chuveiro ou na banheira?
— Achei que você nunca ia perguntar...
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Abro os olhos e encontro um teto branco e limpo acima de mim. Uma brisa quente e úmida toca minha pele nua, sinto o corpo dolorido, mas ainda sonolento, me movo sobre os lençóis, espreguiçando-me. Esbarro em algo macio e quente, franzo a testa e giro a cabeça, quase engasgo ao me deparar com Marcos completamente nu, dormindo ao meu lado.
Eu fiz isso. Realmente fiz. Quero me chutar e me parabenizar ao mesmo tempo, porque sei que esse foi um erro. Um imenso, adornado por flores e neons piscantes, erro. Mordo o lábio e me apoio sobre os cotovelos. Meus olhos se lançam sobre a imagem do homem dormindo serenamente, o maldito é bonito, arrogante, prepotentemente bonito. E gostoso... Tão gostoso...
E soube me dar exatamente aquilo que eu queria, precisava. De repente, me dou conta de que me tornei o maior clichê da literatura, quero rir. O sexo que não posso ter se mostra o melhor da minha vida e a razão disso são motivos sobre os quais eu não quero pensar.
Passo as mãos pelo rosto. Não quero pensar que a raiva fez tudo uma delícia. Não quero pensar que a tensão acumulada há semanas foi a responsável pela explosão que aconteceu em cada canto desse quarto na noite passada, mas que contraditoriamente, foi a confiança que venho construindo com Marcos que fez com que tudo fosse exatamente como foi.
Sem barreiras. Sem mentiras. Libertador.
Quase sem mentiras. Ouço minha própria mente me corrigir e empurro essa ânsia moralista para o lado. Agora, Marcos sabe tudo o que lhe compete saber a meu respeito. O que ele não sabe, não é direito dele saber e eu sou obrigado a admitir que até que ele me tocasse e eu pudesse reagir exatamente como queria, eu não fazia ideia de que fingir ser alguém que eu não sou estava me fazendo tão mal.
Um arrepio atravessa minha espinha ao me lembrar das sensações da noite passada e sinto meu cuzinho contrair. Deitado de barriga para cima, Marcos tem o pau semiereto, orgulhoso, grosso e com a cabeça larga completamente a vista. É um daqueles paus que inspiram consolos de borracha, bonitos.
Salivo com a lembrança de ter minha boca cheia por ele, mordo o lábio, cheio de vontade. As pontas dos meus dedos formigam, não resisto, viro-me na cama, encosto minha frente à sua lateral e deslizo a mão suavemente pelo peito duro, pela barriga definida, até alcançar a púbis. Meu marido nem mesmo se move.
Continuo minha exploração. Acaricio a virilha, as coxas, raspo as costas da mão no pau e a afasto. Não podendo mais me segurar, me arrasto pela cama até estar à altura dos quadris de Marcos. Ajoelho, deixando seu corpo entre as minhas pernas, e toco a pele com a ponta do nariz. Ele se remexe levemente, eu sorrio, travesso, adorando a ideia que parece ainda melhor do que era em minha cabeça.
Em um movimento rápido, minha língua desliza ao longo de todo o pau ereto, da base até a cabeça, eu a abocanho e chupo levemente. Meu marido geme baixinho. Isso está muito longe de me deixar satisfeito.
Desço a boca, engolindo o pau devagar, sugando, circulando-o com a língua. Quando sua cabeça alcança o fundo da minha garganta, eu engulo e Marcos geme alto. Sugo com força, deixo as bochechas fundas, deslizo o pau delicioso para fora da minha boca, ergo os olhos, encontrando os de Marcos fixos em mim.
— Puta que pariu! — uma mão se embrenha pelos meus cabelos e eu repito os movimentos uma e outra vez, até que Marcos esteja fodendo minha boca, desesperado pelo orgasmo. — Isso, porra, Anthony! Mama gostoso, caralho!
Aumento a intensidade, sugando, lambendo e engolindo. O aperto de Marcos nos meus cabelos se torna ainda mais forte e com uma última estocada, ele esporra no fundo da minha garganta. Engulo cada gota. Seu olhar não perde nenhum dos meus movimentos. Quando me sento sobre seus quadris, não consigo evitar o pensamento de como o maldito é lindo.
O rosto, ainda sonolento, tem as bochechas avermelhadas, o peito sobe e desce em um ritmo descompassado, os cabelos estão bagunçados e os raios de sol que se infiltram pela janela dão a eles um tom mais dourado do que jamais foram.
Marcos se senta na cama, deixando-me em seu colo.
A boca vem para minha, morde meu lábio. O nariz acaricia meu rosto, pescoço e ombro. O braço envolve minha cintura.
— Minha vez... — declara e, antes que eu perceba o que aconteceu, estou deitado na cama, com as pernas abertas e a cabeça de Marcos entre elas.
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— Nós realmente precisamos levantar e comer alguma coisa que não seja um ao outro... — resmungo, horas depois, quando meu estômago ronca de fome. Marcos ri. Olho para o seu rosto lindo e sorridente. Talvez esse seja um bom momento... Estreito meus olhos, investigando.
— Eu não quero conversar... — arruína meus planos com o aviso antes que eu tenha a chance de dizer qualquer coisa.
— Sério, Marcos?
— Sério. — Seu tom é relaxado, quase desinteressado. — E se você insistir, eu me tranco em um dos outros três quartos pelos próximos dois dias, o que seria uma pena, porque eu realmente gostaria de foder você em cada canto dessa ilha antes de nós irmos embora. — Dedos deslizam pelo meu braço com leveza em uma provocação escancarada.
— Então é isso? Nós fodemos feito bichos, não conversamos, nem resolvemos nossos problemas? Você entende que agora nós somos casados, certo?
Marcos tira minha perna de cima da sua e ensaia se levantar. O relaxamento e desinteresse de segundos atrás, abandonados. Mas eu sou mais rápida, giro o corpo e me deito em cima dele.
— Você é a porra de uma criança birrenta! — acuso.
— E eu acho que já estou com saudades de quando você fingia ser o que não é... — Sorrio. — Eu não vou ter essa conversa agora, Anthony. Então você pode escolher como quer passar os próximos dias: com orgasmos e sem tocar nesses assuntos fodidos, ou sozinho e sem tocar nesses assuntos fodidos? — Bufo, mas ao invés de lhe responder, beijo sua boca e mordo seu lábio inferior com força. — Doce como limão... — resmunga, chupando o próprio lábio para aliviar a dor quando eu o solto.
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— Oi, meu amor! — sentado no chão da sala da casa, aceno para Isabella pela chamada de vídeo e ela sorri, animada por me ver através da tela.
Bem, talvez, casa seja bondade minha. Cercada por vegetação e mar, a construção é imensa, imponente e sua arquitetura mistura elementos contemporâneos e clássicos. Marcos não se deu ao trabalho de me dar um tour. Então andei por aí até me dar por satisfeita.
São três andares, dez suítes, oito banheiros, seis salas, uma área externa com piscina, sauna, hidromassagem, área gourmet e acesso facilitado à praia, além, é claro, do heliporto e de um pequeno píer. Em outra situação, eu aproveitaria esse lugar muito melhor. Uma em que Isabella estivesse aqui comigo, para começo de conversa.
— Papai! Você trocou de lugar com a dinda! —Gargalho. Sua lógica infantil faz todo o sentido, já que hoje, Grazi está ao seu lado e eu estou atrás da tela de um celular, literalmente, uma inversão de papéis.
Depois de toda a situação na festa de casamento, minha amiga não quis deixar Isabella. A única razão para isso, a princípio, era não poder explicar a Marcos minha confiança em alguém que teoricamente eu havia acabado de conhecer.
Se isso já não era mais um obstáculo, ela me avisou por mensagem que na manhã seguinte levaria Bella para o seu apartamento. Hoje pela manhã, liguei para Carmem, autorizando tudo.
Confio plenamente em Carmem, mas sei que Bella vai se sentir muito mais confortável passando dias com a madrinha e foi isso que expliquei à senhora que tinha se disponibilizado com tanto carinho. Ela, mais uma vez, foi extremamente compreensiva e solicita, me pedindo que avisasse a Grazi que, para qualquer que fosse a necessidade, ela estaria à disposição.
— Estou, meu bem, mas só por um pouquinho, já, já o papai volta pra te encher de beijos! Me conta! O que você fez hoje?
— Eu comi sorvete no jantar! — Entrega a madrinha sem nem mesmo pestanejar e eu abro a boca, ultrajada.
— Graziella!
— O quê? Eu sou a dinda! É meu trabalho estragar sua filha! — se defende com a maior cara de pau do mundo e eu nego, sem poder acreditar. Olha, sinceramente...
— Você me frustra, Grazi! Você me frustra! Se ela tiver dor de barriga de madrugada, a noite de sono perdida vai ser toda sua! Toda sua! — resmungo, sem me sentir nem um pouco aliviado com isso, porque, para começo de conversa, não quero que minha filha tenha dor de barriga.
— Não seja dramático! Foi só um sorvetinho!
— Papai, cadê o Marcos? — Bella atropela a fala da madrinha e Grazi revira os olhos.
— Está tomando banho, meu amor...
— Eu quero ver ele! — avisa e eu rio. Não se pode dizer que Marcos e Isabella tenham se tornado amigos no último mês, mas mesmo com a distância imposta por ele, Bella já o considera parte de sua rotina.
Sua adaptação à nova realidade me deixa feliz, mas não posso negar que também deixa meu peito apertado. Afinal, ainda que só daqui a dois anos, tudo isso vai mudar, de novo.
— Se ele ainda estiver tomando banho na sua hora de dormir, amanhã você fala com ele, tudo bem?
— Tudo bem! E você, Papai? O que fez hoje? — A pergunta me pega desprevenido e eu sou lento em esconder a resposta que imediatamente estampa meu rosto. Não que Isabella se importe ou tenha percebido, já Grazi...
— Filho de uma…
— Graziella! — grito, antes que ela xingue um palavrão na orelha da minha filha e seus olhos se estreitam, acusadores para mim.
— Você é inacreditável! — Desvio os olhos.
— Eu não vou ter essa conversa com você por chamada de vídeo! — me lembro que foram praticamente as mesmas palavras de Marcos e estalo a língua.
— O que você e a dinda vão fazer amanhã, filha? —pergunto à Isabella, ignorando completamente a cara emburrada de Grazi.
— Nós vamos ao parque!
— É mesmo? — Abro a boca, fingindo estar dramaticamente surpreso e a porta atrás de mim se abre.
— Marcos! — Isabella grita.
— Puta que pariu! — Grazi resmunga.
— Graziella! — a repreendo e viro o pescoço, encontrando Marcos apenas com uma toalha enrolada na cintura. Fecho os olhos, agora a reação da minha amiga faz muito mais sentido.
— Marcos, o que você fez hoje? — Isabella pergunta antes mesmo que ele se aproxime da câmera. Pego de surpresa como eu fui, Marcos parece ter a mesma reação imediata. Ele se cala e Graziella solta um som desgostoso pela garganta.
— Sua mãe e eu jogamos alguns jogos... — É a resposta estúpida que ele dá. Balanço a cabeça e franzo as sobrancelhas em um “sério?!” silencioso, que ele ignora enquanto se aproxima da câmera, deixando apenas parte do seu peito nu e seu rosto a mostra.
— Jogos? Como os das princesas? No celular? — Isabella pergunta, os lábios de Marcos formam um bico, pensativo. Cutuco suas costelas com meu cotovelo, ele abre a boca assim que a pontada dolorida lhe atinge e balança a cabeça, concordando rapidamente.
— E o que vocês vão fazer amanhã, Marcos? — Isabella repete as mesmas perguntas que eu fiz a ela.
— Nós vamos jogar mais jogos...
— Você tem que estar de brincadeira! — Grazi resmunga. Esfrego as mãos no rosto. Puta merda! E, como o anjo que é, Isabella resolve todos os meus problemas em sua próxima frase.
— Papai, agora eu vou desligar, vai começar o filme da princesa e do dragão! Tchau! — Sem esperar por resposta, desce do colo de Grazi, vira as costas e some no corredor, deixando três adultos completamente deslocados, sozinhos em uma chamada de vídeo.
Grazi abre a boca, pronta para falar o que não deve, não tenho dúvidas. Por isso, seguindo o exemplo de Isabella, lhe dou tchau e desligo a chamada antes que ela tenha a chance de entender o que está acontecendo.
Viro-me para Marcos, encontrando suas sobrancelhas franzidas.
— O quê?
— Eu não gosto dela...
— Acredite, a recíproca é verdadeira!
— Nós podemos conversar sobre outras coisas, ou a única linguagem permitida nessa ilha é a do corpo? — questiono, ironicamente, quando saio do banheiro enrolado na toalha e encontro Marcos vestindo nada além de uma sunga, não é como se ele tivesse motivos para se vestir, não realmente.
— E sobre o que você quer conversar? — Sentado na cama, com as costas apoiadas à cabeceira e as pernas esticadas na frente do corpo, ergue uma sobrancelha para mim.
— Não sei, qualquer coisa, desde que não fira o seu precioso código de silêncio... — entro no closet, onde eu poderia morar, não só pelo tamanho, como também pela vista.
O quarto principal da casa fica acima da encosta e todo ele, incluindo o closet, tem a parede lateral em vidro. Com as persianas abertas tudo o que se vê é a infinidade de mar a nossa frente. É mais do que bonito, é perfeito. É calmante. É inacreditável. Me perco na visão outra vez.
Na verdade, não. Eu não poderia morar aqui, provavelmente, esqueceria da vida.
— Meu Deus, você é tão mandão, cara! — resmunga, despertando-me da minha admiração silenciosa. Me viro em sua direção só para ter certeza de que ele verá minha sobrancelha erguida.
— Nós estamos conversando sobre isso agora? — Marcos bufa, ao que eu aceno, afirmativamente.
— Pois é, achei mesmo que não! Por que você não me conta o que exatamente nos trouxe até aqui? Quer dizer, você nunca me contou realmente... Tudo o que eu sei é que envolve seu pai te flagrando em momentos indevidos, um conselho de advogados indignados e, aqui estamos. Foi quase como fazer as meninas superpoderosas, adicione um pouco disso, um pouco daquilo e, boom! Tenha um casamento desastroso!
Marcos ri, mas ao se dar conta do que está fazendo, fecha a cara. Reviro os olhos.
— Você não vai poder passar os próximos dois anos sério só pra dizer que nunca riu pra mim, Marcos! Não seja infantil! — Tiro a toalha do corpo e seu olhar desliza lascivamente pela minha pele, arrepiando-me inteiro. Limpo a garganta, recuperando a capacidade de falar que seus olhos me roubaram por um instante. — Conversa primeiro, comida de verdade depois e, então, só então, eu deixo você me comer, de novo... — visto o pijama que peguei em uma das gavetas sem me preocupar em colocar uma cueca.
— Mandão...
— Unhum! Vamos lá! Pode começar! — Seus olhos me analisam por quase um minuto inteiro.
— Se eu falar do meu pai, você vai ter que falar do seu... — negocia e eu inclino a cabeça para o lado, ponderando.
— Tudo bem, mas não é como se eu tivesse muito a dizer além do que já te falei! Depois não vai dizer que foi enganado...
— Nós estamos falando disso agora? — resmunga e eu ergo as mãos em sinal de rendição.
— Só avisando...
— Meu pai me pegou comendo meu secretário, em cima da minha mesa, na minha sala, durante o horário de trabalho. Três vezes, duas delas, na mesma semana... — Não precisaria ser nenhum gênio para saber que sua escolha de palavras foi feita, precisamente, para me chocar.
— Você vai precisar fazer melhor do que isso, campeão! — Me sento ao seu lado na cama, secando os cabelos com uma toalha.
— O quê?
— Se quiser me deixar chocado, Marcos! Vai ter que fazer melhor do que usar a palavra “comendo” no lugar de transando! Eu trabalhei pra você por oito meses sem que você fizesse ideia da minha existência, mesmo que eu fosse uma flor do campo sensível, o que eu não sou, vi o suficiente de você e das suas merdas pra me tornar incapaz de ser surpreendido... — Agora sua testa se franze e ele recosta o corpo na cabeceira da cama.
— Minhas merdas?
— Hum... Me deixa pensar? Oh! Espera! Não precisa! — Ergo uma mão no ar e conforme enumero o que vi, abaixo um dedo. — Ménages, orgias, você se escondendo de um cara que passou a noite com você... E a lista poderia continuar infinitamente...
— E ainda assim, você disse sim... — murmura, mais para si mesmo do que para mim. Fico em silêncio, deixo que ele reflita, quem sabe isso não o ajuda a entender que eu sou quem mais tem a perder com tudo isso.
Ele balança a cabeça, exatamente da mesma maneira que eu faço quando quero expulsar um pensamento dela. Não que isso realmente ajude em alguma coisa, não ajuda, mas eu gosto de fingir que sim.
E essa é só mais uma coisa que eu aprendi no último mês. Marcos e eu somos muito mais parecidos do que eu gostaria de admitir, na verdade, do que eu admitirei em voz alta.
— Marcos babaca! — pronuncia as palavras lentamente.
— Você pode me culpar?
— Eu ainda não gosto dela! — declara, falando sobre Grazi.
— Ela só está sendo uma boa amiga...
— Ou uma sádica, dependendo do ponto de vista... — suspira dramaticamente. — Tudo bem, sua vez! — aponta e eu me viro para ele. Seus olhos se estreitam, investigando-me, como se eu tivesse para onde fugir. Parecendo não querer correr esse risco inexistente, suas mãos agarram minha cintura e puxam-me até que eu esteja sentado em seu colo, com suas pernas entre as minhas coxas.
— Achei que a ideia era conversarmos... — sussurro, colando nossas testas.
— E é… — Sua voz fica imediatamente enrouquecida quando me esfrego em seu colo. — Porra, Anthony!
— O quê? Eu estava comportado, foi você quem começou! — Ele aperta meus quadris com força, firmando-me no lugar e impedindo-me de rebolar. Eu gemo, gostando da brutalidade, e ele move a cabeça para um lado e para o outro.
— Fala! — Expiro com força. Realmente acho que falar mais do que já falei sobre meus pais é a maior perda de tempo, no entanto, claramente, Marcos discorda.
— Meus pais nunca foram amorosos ou preocupados, eu era só mais uma peça da aparência de família perfeita deles, Marcos. Quando contei que era gay eles ficaram putos mas depois acabaram aceitando. Quando me recusei a a abandonar minha filha, tudo o que eles viram foi a possibilidade de uma mancha..., mais nada. Eles estavam prontos para me limpar, exceto que eu não estava sujo, não por ser um pai de um filho bastardo.
— Como isso aconteceu, Anthony? Quer dizer, eu achei que pudesse ter sido falta de informação, de métodos contraceptivos, mas, com certeza, não foi o caso. — Minhas sobrancelhas se erguem sem que eu tenha controle delas.
— Se nós falarmos sobre como eu engravidei minha amiga que eu nem sabia que estava grávida, nós vamos ter que falar sobre o porquê de você precisar de um casamento para recuperar algo que nem deveria ter perdido, para começo de conversa. — proponho e, reagindo exatamente da maneira que eu esperava, Marcos desvia os olhos.
— Agora nós estamos negociando?
— Foi você quem começou, marido. — Seus olhos voltam para mim.
— Você odeia essa palavra, não odeia? Odeia ter se casado?
— Eu não odeio essa palavra, Marcos... — suspiro. Definitivamente, não era isso que eu tinha em mente ao perguntar se podíamos conversar. — Houve um tempo em que eu queria isso, em que eu esperava que, em algum momento da minha vida, certamente não aos vinte e um anos, eu encontraria alguém que entenderia, aceitaria e amaria quem eu sou o suficiente para me fazer acreditar que poderíamos dar certo a longo prazo. Eu era novo e tolo nesse tempo, mas era um jeito bom de pensar... — Ele me escuta com atenção. Uma de suas mãos deixa o aperto em meus quadris e sobe para o meu pescoço, seus dedos sobem e descem devagar em uma carícia gostosa, inclino-me para o outro lado, lhe dando mais espaço.
— Eu nunca tive essa ilusão. Mas parece mesmo um jeito bom de pensar..., um jeito diferente de ser livre... — Me surpreende.
— Você se lembra... — constato, quando ele menciona a conversa que tivemos no dia em que Isabella se acidentou.
— Aquele é um dia difícil de esquecer...
— Impossível parece mais apropriado... — Ri e, dessa vez, não se para. Ergo minha mão, toco sua bochecha e lábios.
— Você fica insuportavelmente lindo quando sorri, Marcos...
— Só quando eu sorrio?
— Insuportavelmente? Sim! Todo o resto do tempo eu consigo definir como absolutamente...
— Absolutamente? — balanço a cabeça, concordando.
— Por que você mentiu pra mim, Anthony?
— Nós estamos conversando sobre isso agora?
— Me testa... — pede e eu rio.
— Lindo não é a única coisa que você sabe ser insuportavelmente, aliás...
— Não me diga que foi por medo, isso não combina com você. — Não me deixa fugir do assunto. Seu cenho está franzido e suas palavras não soam acusatórias, soam conciliadoras. — Eu não vi antes, mas agora há letras neons piscantes por todo lado!
— Tudo bem, talvez não tenha sido medo, mas você teria se casado comigo, Marcos? Teria mantido a proposta se eu tivesse falado que eu não tenho qualquer vocação pra submissão?
— Nós nunca saberemos...
— Eu não podia correr o risco, entende? — Mordo o lábio, me perguntando se devo ou não, permitir que a revelação que esteve prestes a saltar de minha boca ganhe o mundo. Admitir, para alguém, além de mim mesmo, que eu sou um péssimo pai é um tipo de intimidade diferente, um do qual não dá para voltar atrás.
Decido que não e o silêncio que se estabelece entre nós é opressivo.
— O que você não está me contando, Anthony? — pergunta, ao se dar conta de que eu não direi mais nada.
— Exatamente aquilo que eu não estou te contando...
— De novo... — Seu rosto se fecha e suas mãos param de me tocar, caindo ao lado do corpo.
— O quê? Agora eu devo te contar todos os meus segredos? Talvez, e esse é um enorme talvez, seja assim que funciona um casamento de verdade, mas o nosso? Definitivamente não! — pego suas mãos e as devolvo exatamente aos pontos do meu corpo onde estavam, a cintura e o pescoço. Ele aceita, mas seu toque se torna mais rude, áspero. Mordo o lábio, engolindo um gemido.
— Eu teria fugido de você. Provavelmente, te demitido também... — confessa e eu me surpreendo.
— Por quê? — a pergunta sai em um repente.
— Você nunca vai saber... — Morde meu lábio, puxando-o para si enquanto aperta minha cintura com mais força. Gemo e me remexo em seu colo, a bunda nua se esfregando no tecido fino da cueca box.
— Nós não deveríamos conversar?
— Nós vamos, mas não agora... — E essa é uma decisão que eu não tenho nenhuma dificuldade em aceitar.