Sinopse: Inimigo ou aliado? O que esperar da pessoa que flagrou nosso amado casal?
Com o flagrante, Eric e Nívea viverão momentos a sós no último dia de Carnaval?
***
- Não precisa explicar. O que eu vi foi o suficiente.
O silêncio absoluto que pairava no corredor onde eu estava até então, a sós com o Eric, naquele instante se transformou em um vácuo onde apenas quatro pessoas existiam.
- Eu só quero...
- Vi o suficiente - e levantou a sua mão, me impedindo de continuar a falar - apenas para organizar e juntar as determinadas peças deste quebra-cabeça que apareceram em forma de um enigma para mim.
Mantendo as mãos na boca, Melissa movimentava a cabeça e olhos rapidamente nas duas direções, prestando atenção em cada palavra.
- Como assim??? - não tinha uma parte desde os meus pés até a cabeça que não tremiam de medo - Você... Você sabia?
- Como eu disse no primeiro dia que chegamos aqui, eu sou muito bom de memória. Bom o bastante para lembrar da conversa que tivemos quase no fim do ano passado, lembra?
- Lembro - apertei os lábios, aflita - Te contei sobre como ele era.
- Exato. Esta foi a primeira peça. A segunda peça surgiu para mim no dia da sua festa surpresa. Por causa do que faço, eu preciso ser um bom observador, estar atento à tudo. E observei você, professor, por mais de uma vez olhando a aniversariante de um jeito diferente e por que não dizer... especial? - um sorriso cínico se formou em seu rosto.
Eric desviou o olhar em uma direção qualquer, respirando fundo e acelerado. Seu jeito discreto de ser e agir foi descoberto e estar exposto daquele jeito se tornara uma humilhação.
- É claro que poderia ser uma paranoia da minha cabeça. São coisas que acontecem - e de novo sorriu de canto - Mas então, o que eu vi no seu aniversário se repetiu exatamente hoje durante o almoço. A troca de olhares entre vocês dois. Discretas, mas que eu considerei como uma terceira peça.
- Por favor, me deixa explicar!
- E agora a última peça e mais importante se materializou bem aqui na minha frente. - com o rosto sério, ele cruzou os braços na altura do seu peitoral.
Nós dois estávamos nas mãos dele. Do homem que cumpria a ordem de me levar em segurança de carro, do colégio para casa, todos os dias. Que sempre foi um verdadeiro cavalheiro quando me encontrava. E agora era a testemunha do segredo que eu guardava por quase dois anos.
- Há quanto tempo isso acontece? - Evandro quis saber.
- Não te interessa! - Eric, enfim, rebateu.
- Eric, não... - puxei devagar o seu rosto para fazer com que olhasse para mim - Não vai adiantar nada. Ele viu. - e voltei a encarar o Evandro - Eu e o Eric estamos juntos desde o meu primeiro ano no Saint Vincent. Namoramos em segredo todo esse tempo, temos a Melissa e o Felipe como cúmplices. E também a Luciana.
- E como fazem para se encontrar? - ele continuou com sua postura rígida.
- Cara, cala a boca!
- Ei! - Evandro ergueu ambas as mãos - Vocês já estão na lama mesmo. Não custa nada responder às minhas perguntas. Além disso, eu lido com segurança pessoal e fazer questionamentos é algo normal para mim. Prossiga, senhorita.
- É sempre aos sábados. Eu digo para os meus pais que vou para a casa do Felipe em Ipanema quando na verdade, eu passo a noite com o Eric, onde ele mora. E nesse tempo todo eles nunca desconfiaram de nada.
- É óbvio que não desconfiaram, uma vez que ele frequenta e parece ser muito bem recebido na sua casa.
- Sim - confirmei - Essa aproximação foi acontecendo normalmente desde o aniversário da minha mãe quando tínhamos poucos meses de namoro.
- Entendo... - ele ergueu ainda mais o olhar sério e de ameaça que possuía.
- É isso - senti minha garganta apertar e não consegui mais segurar as lágrimas que desabaram pelo meu rosto - Agora você pode fazer o que quiser.
- Ní, não chora... - Mesmo que ainda estivesse chocada, Melissa se aproximou e me consolou com um abraço, permitindo que eu recostasse minha cabeça no seu ombro - Por favor Evandro, ninguém pode saber disso - ela pediu.
- Eu sei que não pode. Mas por quanto tempo pretendem esconder este relacionamento?
- Não acha que já sabe o suficiente? - foi a vez do Eric questionar - Vai querer o quê de mim para ficar calado? Dinheiro?
- Por que acha que é sempre por dinheiro, professor?
- Porque todos tem um preço em nome de um interesse próprio. Desde que o mundo é mundo nada na vida nunca foi de graça.
- De fato. No entanto, o que eu ganho por dar segurança e assistência às duas famílias para as quais eu trabalho é um valor alto o suficiente para deitar a minha cabeça no travesseiro todas as noites e dormir sossegado.
- Se não é dinheiro, então o que você quer?
- Estamos apenas nós quatro aqui... A sala de jogos fica no final desta ala da casa.
- E daí?
- Daí que ninguém vai ouvir e saber que eu aprecio a beleza de uma bela mulher quando eu vejo uma. - seus olhos percorreram todo o meu corpo e eu congelei de pavor – É inegável que você tem um excelente gosto, professor - seu olhar continuou em mim.
- Seu desgraçado! - Eric avançou na direção do Evandro e o esmagou pelo pescoço, usando a força do antebraço, o encurralando na parede - Você pode fazer o que quiser, me denunciar e me colocar na cadeia, eu não me importo!
- Eric, solta ele! - o agarrei pela cintura tentando separá-los e Melissa fez o mesmo por trás - Solta! - implorei.
- Mas você não encosta um dedo na Nívea, entendeu bem? Em nenhum fio de cabelo dela! Eu te mando pessoalmente para o inferno antes de qualquer coisa!
Eric e Evandro possuíam quase a mesma altura. Enquanto os olhos de um eram tomados pelo vermelho do ódio, o olhar do outro era frio feito um iceberg. Seu rosto não demonstrava nenhuma expressão.
- Será que pode me soltar? - a voz saiu falha e mesmo assim ele pediu calmamente, levantando a cabeça buscando o ar - Não quero te machucar...
- Olha só, eu e a Ni somos pequenas demais para separar dois brutamontes feito vocês. - Melissa reclamou - Eric, para com isso e solta o cara!
Eric o largou e nós duas conseguimos afastá-lo, porém, o ódio era nítido em cada músculo do seu rosto e suas narinas dilatavam sem parar. Calmo, Evandro ajeitou a postura, tossindo de leve e massageou seu pescoço cujas marcas avermelhadas quase roxas eram visíveis.
- Você tem uma força e tanto... - riu de lado, ainda com uma das mãos na garganta.
- Faça logo o que tiver que fazer! Fala com os seus patrões e me denuncia para a polícia!
- Não vou fazer isso - ele o encarou novamente e sem que ninguém esperasse, estendeu a sua mão para o Eric - Vamos fechar um acordo.
- Como é que é?
- O segredo de vocês estará bem guardado comigo, afinal é o que eu também sei fazer muito bem. - desviou o olhar e piscou para mim, sorrindo - Se lembra disso, não lembra senhorita?
- Sim... - o encarei, tentando decifrá-lo e vi a expressão do seu rosto se suavizar.
- Pois então - sua mão continuava estendida. Eric estava calado e ainda enfurecido - Temos ou não um acordo?
- Deixa de ser imbecil porque eu não vou cair nessa!
- Eu falo sério, professor! Eu guardo este segredo e você me passa o contato da sua amiga - ele falou sem enrolação.
- É o quê?
- Hã?
- Oi? Peraí que deu tela azul na minha cabeça!
Olhei séria para Melissa depois da piada fora de hora.
- Você... Quer o contato da Luciana? - Eric questionou - Foi isso mesmo que eu entendi?
- Eu disse e repito. Seu bom gosto para mulheres também inclui amizades e eu sou um bom observador em absolutamente tudo. A beleza dela me chamou a atenção no dia da festa da senhorita Martin. Ela está aqui em Búzios, não está?
- Está.
- E eu vou ficar igual um pateta com a mão estendida? - insistiu no gesto - Acordo fechado ou não?
Eric olhou para a mão e eu respirei aliviada quando finalmente ele o cumprimentou de volta, aliviando a raiva do seu rosto, ainda que o seu olhar para o Evandro estivesse desconfiado.
- Adoraria encontrá-la mas como eu estou aqui a trabalho, fica complicado.
- A situação em torno da Luciana é complicada - Eric revelou - Ela se divorciou de uma forma nada amigável e por causa disso se fechou para relacionamentos. Existem cicatrizes abertas até hoje.
Evandro ficou sério e analisando as palavras do Eric. Aquilo era uma novidade não apenas para ele mas para mim também.
- Eu lamento. Ainda assim eu queria uma chance. Ela é bonita, altiva e muito bem-humorada. São qualidades que eu aprecio em uma mulher.
- Ela é tudo isso mesmo. Mas o bom-humor dela em boa parte do tempo é uma forma de blindagem. A outra forma é se jogar no trabalho na Universidade para impedir que a depressão a domine.
- Então ela precisa de alguém que a faça feliz.
- Vá em frente e com calma. O coração dela se tornou uma fortaleza que ninguém consegue invadir.
- Serei paciente.
O que começou com um flagrante e uma possível chantagem, terminou com mais um cúmplice para o nosso lado e o início de conquista amorosa. Evandro poderia ser um canalha e querer me fazer mal. No entanto, mais uma vez, ele provou ser uma boa pessoa.
- Peço a vocês dois que sejam discretos. Continuem agindo como estão e ninguém vai desconfiar.
- Eu vou ser sim. - sorri.
- Claro.
- Vamos para a sala de jogos, Ni? - Melissa me deu a mão - Eu pedi ao Evandro para me trazer porque não conhecia esse lado da casa muito bem e ia no seu quarto te chamar. Mas aconteceu tudo isso.
- Vamos. Vocês dois vão ficar bem?
- Da minha parte está tudo em paz! - Evandro afirmou.
- É... da minha também. - Eric concordou - Pelo menos eu espero que esteja.
- Então vamos, tem um banheiro social no caminho até lá e você lava o rosto.
Saímos de mãos dadas e olhei para trás deixando o Eric e Evandro ainda conversando no corredor. Entramos no banheiro e trancamos a porta, desabando no chão em seguida.
- Meu Deus do céu, o que foi isso? - pus a mão na testa que parecia ferver - Agora o Evandro sabe do meu namoro com o Eric.
- Seu namoro com o Eric??? Tu ainda tá pensando nisso?
- Ué e eu vou pensar em mais o quê?
- Como o quê? Minha cara ficou totalmente o meme da Nazaré confusa quando ele começou a falar da Luciana!
- Isso também me espantou. O Evandro a fim da Luciana... Eu nunca desconfiei de nada. Mas eu ainda tenho receio de que ele vá falar alguma coisa.
- Pois eu achei que ele foi muito sincero e não vai fazer chantagem nenhuma. Se o Evandro tentar conquistar a melhor amiga do seu amor e não conseguir já é uma outra história.
- Talvez um voto de confiança. - dei de ombros - Se ele disse que vai guardar segredo...
- Agora pensando bem... Não é que eles dois são shippáveis? Formam um casal lindo! - dando um mini surto, Melissa bateu palmas, toda sorridente.
- Meli, eu tô falando de mim e você se achando cupido?
- É isso! - estalou os dedos - Vamos realizar uma operação cupido e juntar eles dois!
- Você não ouviu tudo o que o Eric disse sobre ela?
- E daí? Talvez um empurrãozinho não seja nada demais. Hein Ní, vamos bolar um plano!
- Nós não vamos nos meter nisso! - me levantei do chão e fui até a pia, abrindo a torneira para lavar o rosto - Eu ainda estou absorvendo tudo o que aconteceu e você se achando personagem de filme de comédia romântica.
- Ai mas não custa nada a gente tentar! - ela se levantou e ficou do meu lado encostada na pedra de mármore, gesticulando com as mãos - Só precisamos de uma chance para falar com a Luciana sobre ele.
- Eu desisto. Você não ouviu nada - peguei a pequena toalha pendurada ao lado do espelho e enxuguei o rosto. - Se existe pessoa mais teimosa que você, ela ainda está pra nascer. Deixei meu celular no quarto. - Achei melhor mudar de assunto - Vamos lá buscar e depois voltamos.
- E eu vou pensar em um plano para eles dois!
Suspirei profundamente. Eram acontecimentos demais para apenas um dia.
***
Deitada em um dos pufes da sala de jogos, sendo que o meu estava na varanda, eu sentia a brisa junto do aroma da maresia e observava o fim de tarde cujo Sol se despedia. Olhei para o lado de dentro e no meio da sala estava a mesa de ping-pong onde Gabriele, Frederik e Melissa jogavam e podia ouvir o ruído da bolinha branca quicando pela mesa. Aquele que perdesse a partida, dava lugar para o outro jogar em forma de revezamento. Em um outro lado de frente para a parede, onde havia uma TV de tela plana em tamanho médio, Patrick e Evandro estavam deitados em seus pufes concentrados em um jogo de terceira dimensão, algo que eu não entendia praticamente nada.
E então observei o jovem guarda-costas. Será que ele realmente era uma pessoa de confiança? Deu sua palavra de que guardaria segredo mas para mim estava sendo difícil ficar tranquila com mais uma pessoa sabendo do meu namoro.
- Nívea, quer jogar com a gente? - Frederik se aproximou segurando a pequena raquete cor de telha.
- Não, obrigada. O pufe aqui está muito confortável.
- Tá tudo bem com você? Está tão quieta...
- Então eu estou bem. - e rimos juntos.
- Se quiser jogar, é só chegar.
- Tá bom.
Continuei deitada sentindo a brisa da tarde quando de repente senti o meu celular vibrar no meu colo. Desbloqueei a tela e vi que era uma mensagem do Eric.
"Ainda está na sala de jogos?"
"Estou sim."
"E ele está aí com vcs?"
"Sim. Está jogando com o Patrick."
"Depois que vc e a Melissa saíram do corredor, eu e ele ficamos conversando. Me garantiu que não contaria nada. Mas ainda estou um pouco desconfiado"
"Não tem outro jeito, temos que confiar nele..."
"Que seja. A Natália e o Willian voltaram do Centro da cidade, estamos aqui jogando conversa fora na sala."
"E o que achou deles? Dos pais dos meus amigos só faltava vc conhecer eles dois."
"Exatamente, aqui eu os vejo como os pais dos meus dois alunos e parecem ser boas pessoas."
"A avó Raquel que adorou saber que vc viria para cá. O Patrick te enviou o vídeo?"
"Sim, ela é adorável."
"E a neta querida que está sendo sua anfitriã."
"Se sentou do meu lado na hora do almoço tentando chamar minha atenção quando na verdade era a pessoa sentada na minha frente que me interessava."
"E infelizmente alguém percebeu. Sabe que vamos ter que ficar longe um do outro, não sabe?"
"Está mesmo me pedindo isso?"
"Eric!"
"Não quero ficar só naquele beijo... a praia particular da casa é um convite tentador para uma noite juntos, rs..."
"Eu não acredito que vc tá querendo isso depois do que aconteceu! Vc tá doido?"
"Pensa com carinho."
"Não tem o que pensar, minha resposta é não! Tchau!"
E fechei a conversa, deixando o meu aparelho de volta no meu colo ainda sem acreditar no que o Eric tinha sugerido.
- Hum, estão aí - Dona Raquel apareceu na porta da sala - O William e a Natália já chegaram tem um tempinho e querem conversar com vocês sobre o passeio de hoje à noite.
- Eu falei com o meu pai na hora do almoço, vó - Gabriele olhava atenta a partida de ping-pong entre Frederik e Melissa - Vamos sair para jantar hoje de novo.
- Então vão até lá e confirmem com ele. Aproveitem também que a Neide fez um bolo de cenoura para o lanche da tarde e saiu agora do forno.
- Opa, primeirona! - imediatamente, Melissa largou a raquete na mesa e saiu ligeira corredor afora.
- Vamos terminar aqui e já descemos vó! - Patrick respondeu ainda com os olhos na tela.
- Não demorem!
***
Sentada no confortável sofá da enorme sala, eu estava totalmente alheia à conversa que acontecia ao meu redor. Olhava com calma todas as fotos da galeria do meu celular na tentativa de me distrair e não pensar no que tinha acontecido poucas horas antes.
- Nívea?
- Oi. - desviei o olhar da tela na direção de quem me chamava.
- Tudo bem pra você? - Natália me perguntou.
- Sobre o quê?
- Eu disse que ela não estava legal! - Frederik brincou e todos riram, me deixando morta de vergonha.
- Desculpe, eu estava distraída.
- Tudo bem - a mãe dos irmãos sorriu - Escolhemos um restaurante francês para irmos jantar, o que acha?
- Ótimo - sorri.
- Fiz a reserva para nove da noite - William explicou - Dá tempo de todos se arrumarem.
- Show! Estou subindo, vou escolher uma roupa pra mim - Gabriele saiu em direção às escadas da casa, subindo rapidamente na ponta dos pés.
- Eu e a Ní, vamos fazer o mesmo! - Melissa estava sentada do meu lado e me puxou pela mão, subindo na mesma direção da nossa amiga.
Era difícil não pensar em outra coisa. Mesmo com a Melissa falando, eu me sentia longe daquele nosso quarto de hóspedes.
- Nívea, você tá me ouvindo?
- O quê?
- O quê que você tem, hein? - ela se sentou do meu lado na cama - Tá com a cabeça em Marte.
- Desculpa, Meli. Pode falar.
- Ainda pensando no que aconteceu?
- Sim - afirmei com a cabeça - Com um pouco de medo do Evandro contar alguma coisa, mesmo que eu tenha confiado nele.
- Se ele tivesse falado pra Natália e o William, acha que estaria tudo calmo como está?
- É, você tem razão...
- Eu sei que tenho, agora me ajuda aqui porque o restaurante francês que nós vamos é super chique e eu não tenho roupa pra ir.
- A Natália disse que era chique? - realmente eu não havia prestado atenção em nada da conversa na sala.
- Disse!
- Eu tenho este vestido aqui - Observei o nosso guarda-roupa aberto e meus olhos se voltaram para um vestido em cor pêssego de alças finas, com tecido leve e forro por baixo para disfarçar a transparência - Combina com o restaurante - E o pus, pendurado no cabide, de frente no meu corpo.
- E agora? Eu não tenho roupa chique pra ir! - a aflição tomou conta do seu rosto vermelho de sol.
- Vamos ver se a Gabi tem alguma coisa pra te emprestar! - coloquei o vestido com cuidado na cama - Ela é magra igual a você, só um pouco mais alta.
Saímos do quarto em direção ao da nossa amiga e a encontramos sentada no meio da sua cama enorme com a maquiagem espalhada pelo edredom. Uma música pop estava tocando do seu Iphone.
- Gabi!
- Entra aí, gatas!
- Preciso da sua ajuda - Melissa chegou na beira da cama se apoiando em um dos joelhos - Você tem alguma roupa chique pra me emprestar? A Ní tem um vestido fofo e eu queria algo parecido.
- Bom, vestido fofo igual os que a Nívea usa eu vou ficar te devendo. As fotos que eu fiz para a edição da revista Runway Teen Brasil, da festa que vocês estão na minha lista vip e será em abril, além do cachê, eu só ganhei roupa com o tema do punk rock londrino dos anos 70. Trouxe uns três vestidos com esse estilo, já que eu sou meio indecisa com roupa.
- E você vai toda roqueira? - perguntei.
- Claro! E duvido me barrarem. Ser filha de famosos tem suas vantagens.
- Ai meu Deus e agora? - ela se sentou - Não tenho nada decente pra vestir!
- Eu tenho uma solução...
- Qual? - perguntamos nós duas juntas.
- São 18h30 - ela olhou na tela do seu celular que estava na cama - Podemos ir ao centro e comprar alguma coisa. Tem sapatos?
- Não tenho! Aaaaaa - ela berrou, enfiando as mãos por dentro dos fios de cabelos ruivos como se quisesse arrancá-los.
- Temos que comprar tudo! - e saiu da cama com o seu celular em mãos - Vamos falar com o papai.
***
- Mas vocês querem ir agora?
William, Eric e Evandro estavam na varanda a céu aberto do terceiro andar. Sofás que não eram totalmente estofados, feitos com trançados em palha pintadas a óleo decoravam o local junto de plantas e alguns móveis de madeira. A noite se fazia presente e na pequena mesa onde eles estavam sentados haviam alguns petiscos e bebidas sem álcool.
- Sim pai, é uma emergência fashion! - Gabriele explicou.
- Se vocês não demorarem, tudo bem...
- Eu vou com elas, William - Evandro se prontificou, deixando a mesa - Vou tirar o carro da garagem - Ele desceu com rapidez as escadas pintadas de preto em forma de caracol e Gabriele o seguiu.
- Eu preciso dar uns telefonemas, saber como estão as coisas na emissora. Fiquem à vontade, meninas. - continuou sentado onde estava, com seu celular em mãos.
- Obrigada. Vamos descer também - cruzei o meu braço com o da Melissa e saímos, repetindo o mesmo caminho do Evandro e da nossa amiga.
- Bom, vou aproveitar e ir até o meu quarto. - Ouvi a voz do Eric enquanto descíamos.
Já estávamos no corredor dos quartos quando senti meu braço ser levemente puxado, me forçando a olhar para trás.
- Tem certeza de que é uma boa ideia ele ir também?
- A Gabi estará com a gente, Eric. Não tem perigo.
- Só fico preocupado...
- Perigosa é essa conversa de vocês aqui! - Melissa retrucou.
- O Patrick e o Frederik estão lá na praia privativa e a Dona Raquel não vai sair hoje à noite.
- Por que não?
- William contou que ela se recolheu para o quarto com crise de enxaqueca.
- Que pena.
- Triste mesmo. - Melissa me puxou pelo braço - Agora temos que ir!
Foi o puxão da minha amiga de um lado e um mais forte do outro, me fazendo sentir seu abraço apertado e a sua boca afundar no meu pescoço, me enchendo de cócegas.
- Eric, para! - Comecei a rir e senti minha pele se arrepiar.
- Pensou direitinho na minha proposta? - continuou me mantendo agarrada ao seu corpo e olhando nos meus olhos.
- Eu te respondi na mesma hora, esqueceu? Agora pode me soltar?
Eric fez o que eu pedi, porém, os seus olhos passearam pelo meu corpo que felizmente estava vestido por uma das saídas de praia que eu levei na viagem.
- Você sabe que eu não desisto fácil.
- É mais fácil sonhar - e dei um meio sorriso debochada - Vem, Meli! - Foi a minha vez de pegá-la pela mão e sair, indo alcançar o Evandro e a Gabi.
- De que proposta ele está falando? - perguntou em voz baixa enquanto andávamos.
- Depois eu te conto!
***
A Rua das Pedras estava agitada naquele início de noite. Parecia que as pessoas tiveram a mesma ideia de saírem das praias locais e decidiram passear pelo ponto mais conhecido da cidade. Barzinhos lotados, grupos de jovens da nossa idade por todos os lados... No entanto, nosso foco era outro. Éramos três amigas e um guarda-costas chegando em uma parte específica onde ficavam as lojas mais elegantes. Melissa não perdeu tempo, entrou na primeira que encontrou e foi direto na seção de vestidos. Evandro, por sua vez, optou por ficar do lado de fora esperando na calçada.
- Você quer comprar o quê, Meli? - questionei enquanto a observava passando um a um, os modelos nas araras em um lado da loja.
- Não sei, algo parecido com o seu vestido.
Fiz o mesmo que ela em outra arara que estava bem no meio da loja. Havia muitos modelos de roupas com cores fortes e estampadas. O que não combinavam em nada com ela.
- Aqui, achei estes dois modelos que estavam na seção de roupas para noite - Gabriele se aproximou com dois vestidos de mesmo corte quadrado no decote e alças finas, em cores verde escuro e preto com listras fininhas de cor branca.
- Ah, meu Deus! - ela vibrou - É isso, estão perfeitos! Vou experimentar! - pegou os dois modelos e foi direto pra cabine.
- Vai lá que eu levo os sapatos.
- Enquanto isso eu vou continuar aqui esperando vocês.
Fui até a seção de saias do outro lado da loja e enquanto observava e passava a mão em cada modelo pendurado, meus olhos se voltaram para a vitrine e então paralisei com a cena do lado de fora: Evandro estava conversando com ela. Sorridente, usava um vestido azul com botões na frente. Seu rosto estava bronzeado de Sol, os cabelos pareciam estar mais loiros do que o normal e conversava animadamente. ''Será que eu devo ir falar com eles?'' pensei. Com certeza ele não falaria nada das suas intenções em relação à ela.
- Luciana. - me aproximei dos dois na beira da calçada em frente à loja.
- Oi, Nívea! - ela sorriu e me abraçou ao me ver - Finalmente estamos nos encontrando!
- Sim. Perguntei ao professor sobre você e ele me disse que está com raiva dele.
- Não estou com raiva, estou é puta da vida e estava falando com o Evandro exatamente sobre isso. Não por ele ter vindo mas por não ter me falado que viria.
- Ele disse que essa sua raiva não vai durar muito... - dei um meio sorriso.
- Só sei que hoje ela não vai passar. Talvez amanhã. E falando em amanhã, vai ter um bloco aqui no Centro para fechar os quatro dias de Carnaval. Querem vir?
- Alguém disse bloco?
Nos viramos e ao olhar para trás, Melissa e Gabriele estavam paradas na saída da loja com as sacolas em mãos.
- Não estamos atrapalhando nada, estamos?
- Meli! - chamei a sua atenção.
- Atrapalhando? Que nada. Estou falando sobre o bloco de amanhã e seria legal se vocês viessem.
- Jura? - os olhos da Gabriele brilharam - Traz a gente amanhã, Evandro, por favor!
- Se os seus pais autorizarem, eu trago vocês sem problemas.
- Venham sim, vai ser divertido! - a amiga do nosso professor afirmou.
- Eu vou ver com o William e a Natália - ele sorriu - Mas agora precisamos ir. Vocês compraram tudo, meninas?
- Compramos sim - a ruiva ergueu as três sacolas que carregava.
- Então vamos, pois estamos em cima da hora - e ele se voltou para a Luciana - Temos um compromisso mais tarde.
- Liga para o professor, Luciana! - pedi.
- Não sei, vou pensar a respeito - e piscou para mim.
Depois dela se despedir de nós três, Luciana e Evandro se despediram com um aperto de mão e realmente precisei concordar com a Melissa: os dois formavam um bonito casal embora ela nem sonhasse que o guarda-costas dos meus três amigos de turma, em breve, avançaria um passo naquela cordial relação.
***
Prontas para sair e sentindo o vento fresco da noite na varanda do nosso quarto, enquadrei a câmera do celular da Melissa cuja capa era toda preta com uma estampa de caveira com flores vermelhas ao redor e tirei várias fotos dela. Mesmo a vaidade não sendo o seu ponto forte, ela não precisava de muito esforço para ficar bonita. E com o vestido preto que usava e calçando uma sandália de salto baixo, decorada com pequenas pedras, os cabelos ruivos e os olhos verdes ganhavam mais destaque. Infelizmente exigir um sorriso aberto dela para a câmera já seria demais.
- Pronto - lhe entreguei o aparelho de volta - Vê se ficaram boas.
- Vou ver - ela deslizava a tela com os dedos - Adorei, ficaram ótimas. Mas e você?
- Eu? Você tirou fotos minhas antes das suas, doidinha. Esqueceu?
- Não é isso! Tô falando sobre o que você me contou. Vai se encontrar com ele na praia?
- Claro que não!
- Por que não?
- Melissa, você enlouqueceu? Depois do que aconteceu hoje, acha normal eu e o Eric nos arriscarmos desse jeito?
- Qual o problema se for de madrugada? Eu achei linda a proposta! Além disso, eu e o Fê já fizemos na praia lá em Ipanema e foi lindo, sabia? Colocando sempre em prática nossa fantasia em trepar ao ar livre.
- É sério? - não consegui disfarçar o espanto - E ninguém flagrou vocês?
- Essa é a questão. - ela piscou - A adrenalina do flagra aumenta o tesão. E das vezes que nós fomos, eu e ele procurávamos um lugar mais tranquilo na orla, sem tanta gente porque de vez em quando aparece uns grupinhos pra fazer luau, tocar violão e fumar maconha.
- Vocês são doidos... - balancei a cabeça em negação.
- Nós apenas gostamos de variar, é diferente. A água batendo enquanto eu fico por cima dele, nossa... É delicioso.
- Eu não sei, Meli. Já estou acostumada a ficar com o Eric na segurança de quatro paredes, sabe?
- E eu não sei como você não enjoa disso. A praia aqui é particular, chance zero de vocês serem flagrados dependendo da hora.
- Você viu como ele foi pra cima do Evandro? - esbocei um sorriso me lembrando - Ele não pensou em mais nada, só em me defender.
- Exatamente! Você poderia muito bem retribuir.
- Eu não sei... Vou pensar.
- Aceita sim! Você vai amar.
- Vem - entramos de volta para o quarto e peguei a minha pequena bolsa e o meu celular que já marcava na tela oito e meia da noite - Já devem estar todos prontos para sairmos.
Antes mesmo de chegarmos na escada e descermos para a sala, ouvimos vozes alteradas. Não era uma briga, e sim uma discussão calorosa.
- Mas pai, se estamos aqui curtindo o Carnaval qual o problema em irmos ao bloco amanhã na cidade?
- Gabriele, você sabe muito bem que eu e a sua mãe nos preocupamos com a super exposição de você e do seu irmão. E se acontecer alguma coisa por lá?
Chegamos nós duas na sala e acompanhamos quietas a conversa acalorada.
- Por mim tanto faz, ir ou não. - Patrick deu de ombros, com as mãos cruzadas atrás da cabeça, recostado no sofá da enorme sala.
- Você também não ajuda em nada! - a irmã disparou.
- Então, pelo que a Luciana falou comigo agora - Eric explicava mostrando o seu celular - o bloco vai começar às quatro da tarde.
- Viu só, pai! Dá tempo de curtir o dia, almoçar e depois ir pro Centro.
- Vamos combinar uma coisa? Amanhã resolvemos isso, certo? - Natália, como sempre, acalmando as situações - Já estamos em cima da hora e não podemos abusar da meia hora a mais de tolerância que temos sobre a reserva no restaurante. Eu e o seu pai vamos no quarto da sua avó apenas para nos despedir dela.
- O Evandro já verificou o alarme da casa - William explicou - Ela e a Maria ficarão bem até nós voltarmos - E saíram em direção aos quartos do primeiro andar.
- Droga! - Gabriele fechou a cara.
- Vocês estão muito bonitas... - Frederik elogiou.
- Pode elogiar sim, porque vocês me vendo com vestido de novo será só Deus sabe quando - Melissa brincou.
- Eu tenho duas amigas muito gatas mesmo - ainda sentado, os olhos do Patrick percorreram o meu vestido e o da Melissa - E realmente o mundo está em desequilíbrio. Gabriele usando vestido com estampa anarquista e jaqueta de couro e a Melissa igual à Nivea.
Mesmo parado perto de um móvel de madeira em um lado mais isolado da sala, Eric permaneceu calado com os seus lindos olhos na minha direção. Meu vestido não era apertado no corpo mas deixavam minhas curvas em evidência e o comprimento ia até um pouco acima do joelho. Já o decote redondo cobria os meus seios sem fazer com que eles pulassem para fora.
Eu estava devidamente comportada como o passeio pedia.
***
Era incrível descobrir a beleza de um novo restaurante. Depois da leveza das cores azul e branco do restaurante italiano, estávamos diante do clima aconchegante da França em forma de gastronomia. O local era grande com uma iluminação à meia luz em tons amarelados, muito parecido com as paredes da fachada.
Um recepcionista muito educado nos recebeu e nos levou até onde estava a nossa mesa reservada. As mesas e cadeiras eram de madeira pintadas em tom grafite quase preto. No entanto, o que mais me chamou a atenção foi uma adega de vinhos que estava no lado direito e mais reservado. Não resisti e parei para tirar fotos e enviá-las para o meu tio na França pois ele iria adorar.
- Com licença, senhorita? - a voz do recepcionista me chamou a atenção.
- Oi. Desculpe - sorri sem jeito - Tem algum problema em tirar fotos? - Se tivesse eu estaria encrencada.
- Não, de jeito nenhum.
Tirei mais algumas e depois segui para a nossa mesa. Parei e quando vi, restava apenas uma cadeira vazia. Respirei fundo ao ver que ela estava entre a Melissa e o Eric.
- Guardamos o seu lugar, amiga! - seu sorriso irônico não negava que aquilo foi de propósito. Eric, por sua vez, sorriu de lado mas não podia demonstrar que também havia combinado com ela a cadeira vazia.
- Que gentil - Dei a volta e me sentei, deixando minha bolsa pendurada na cadeira e o meu celular na mesa.
Evandro e William sentaram cada um em uma ponta da mesa, Patrick, Frederik e Natália de um lado, Eric, eu, Melissa e Gabriele do outro. Sendo que o Frederik ficou de frente para mim. Algo que me causou um certo alívio pois assim eu não teria que lidar com os olhares da pessoa, uma vez que se sentou do meu lado.
Estava um clima razoavelmente quente dentro do restaurante e então William pediu que servisse água para todos antes de começarmos a fazer os nossos pedidos. Peguei um dos cardápios espalhados pela mesa e vi algumas combinações para a entrada e o prato principal.
- Amiga, vai pedir o quê? - Melissa chegou mais perto de mim e olhamos juntas o mesmo cardápio.
- Tem umas boas opções de salada aqui para a entrada.
- Salada vai me deixar com fome.
- Por isso que na maioria das vezes, eu acho, que elas são servidas antes do prato principal. Mas só acho.
- Ah, é verdade - ela sorriu sem graça e eu suspirei.
- Tem este Duo de salada verde, tomates confitados, sorvete de iogurte e presunto cru. Deve ser bom. Depois, o prato principal eu vou de filé mignon ao gorgonzola com risotto de cogumelos da serra.
- Ótimo! Vou pedir o mesmo que você para não errarmos.
- Aceita nos acompanhar no vinho, professor? - William perguntou.
- Não, obrigado. Eu fico apenas no suco.
- Ih, o nosso professor é careta - Patrick riu.
- Se ser careta é não consumir bebida alcoólica então eu sou sim. Bom, acho que vou escolher essa combinação de frutos do mar que me parece ótima - e fechou o cardápio.
Dois garçons se aproximaram com garrafas pequenas de água mineral e começaram a anotar todos os nossos pedidos. Achei melhor deixar para escolher a sobremesa no final. Enquanto aguardava, peguei novamente o cardápio, indo direto na página dos vinhos e vi que muitos deles eu conhecia por causa do meu tio Jeróme.
- Meu tio vai amar as fotos que eu enviei pra ele da adega dos vinhos - comentei enquanto olhava o cardápio - Ele conhece todos.
- Entende de vinhos, Nívea? - Patrick perguntou.
- Ah, entendo o suficiente.
Enquanto esperávamos os nossos pratos serem servidos, observei o restaurante e ele não estava muito cheio o que nos permitiu conversar sem falar alto. Peguei o meu celular e li algumas mensagens no grupo da turma do colégio em que havia muitas fotos. Cada um se divertindo à sua maneira naquele feriado de Carnaval.
- Será que o bloco amanhã vai ficar lotado?
- Ah, Nívea, você também não vai andar para trás e não querer ir!
- Não Gabi, não é isso. É porque no bloco que eu fui com a minha mãe e a Melissa no ano passado, foi muito tranquilo, sabe? Ele se concentrou onde o professor Schneider dá aula - apontei para o Eric - E desfilou pelas ruas do bairro.
- Então o professor deve ter ido também? - foi a vez do Frederik perguntar.
- Nos dias de Carnaval eu fico em casa e aproveito para descansar bastante - ele explicou - Mas tenho certeza de que a senhorita Martin se divertiu e muito nesse bloco, certo?
- Sim, bastante - meu rosto ficou quente e pude sentir o chute de leve da Melissa na minha canela.
- Como eu gostaria que a Gabriele fosse tão tranquila igual à Nívea na hora de sair para os lugares.
- É, Natália, os meus pais também vivem falando isso - Frederik comentou e me encarou com ternura - Minha mãe diz que você é a filha que gostaria de ter tido.
- Ah, não acredito...
- Filha não é bem a palavra - Patrick ironizou e riu abafado, me deixando ainda mais envergonhada.
- Patrick! - o pai chamou a atenção.
- Foi mal - ele ergueu as mãos se desculpando - Desculpa aí, Nívea.
- Vamos combinar de sairmos pra jantar com os nossos pais igual daquela vez - ele sugeriu.
- Claro, vamos sim! Aquela batata frita que eles serviram era deliciosa, lembra?
- Aham e a sobremesa que você escolheu foi sorvete de flocos com torta holandesa.
- Isso mesmo! - e ri - E foi engraçado porque eu e você não...
Dei um pequeno salto na cadeira de susto ao sentir dedos deslizando pela minha coxa direita e meu coração saltou na mesma proporção me forçando a paralisar a conversa. Mesmo com o tecido do vestido, Eric teve a ousadia em acariciar por dentro dela quase chegando na minha virilha.
- O que foi? - Frederik estranhou minha reação - Você ficou pálida.
- Na - Nada... acho que é soluço - e passei a mão pelo meu colo e pescoço na tentativa de disfarçar.
- Toma aqui, bebe um pouco de água - rapidamente, ele serviu uma taça até a metade e me entregou - Vai te aliviar.
- Obrigada - comecei a beber devagar e com a minha mão direita, apertei a dele com força tirando de cima da minha coxa - Mas vamos marcar sim - confirmei depois que terminei, colocando a taça de volta à mesa - O restaurante que fomos é perfeito.
Os garçons retornaram com alguns dos pedidos e entre eles estavam o meu e o da Melissa. Era o que eu precisava para aquela situação inesperada - e excitante a ponto de molhar minha calcinha - terminasse de vez. Cruzei as pernas, ajeitando o meu vestido e comecei a comer a salada que havia pedido.
O jantar correu tranquilamente durante as horas que ficamos no restaurante e não precisei ficar em alerta com uma possível mão atrevida por debaixo da mesa.
***
Deitada na cama, usando um pijama quentinho de manga longa e calça e depois de trocar algumas mensagens com a minha mãe, contando como foi o dia, estava postando as fotos no feed do Instagram formando um photodump. Ouvi a porta do banheiro se abrir e o aroma perfumado dominou o ambiente.
- Até que o restaurante francês foi legal - Melissa saiu do banheiro enrolada em uma toalha branca, com o rosto cheio de hidratante e os cabelos amarrados em uma grande presilha de cor marrom - Pelo menos a comida era boa.
- A Natália e o William são pessoas normais mas gostam de fazer essas extravagâncias de vez em quando - falei enquanto eu passava o dedo em cada foto postada, conferindo se alguma não ficou cortada.
- Com o cachê que eles ganham apresentando o jornal da noite eu também faria igual.
"Está pensando direitinho na minha proposta, não está?"
A notificação com a mensagem surgiu no alto da tela.
- Mas é muito cara de pau mesmo! - me sentei na cama, dobrando as pernas e li a mensagem de novo para não achar que ela veio por engano.
- O que foi? - a ruiva se sentou na ponta da minha cama.
Apertei o microfone do áudio e posicionei o celular perto da boca para falar.
▶️ Depois do que você fez hoje, pode esquecer! - e enviei.
- Quem fez o quê, Ni?
- Tenta adivinhar quem passou a mão na minha coxa hoje por debaixo da mesa lá no restaurante? Só tenta!
- Não acredito - ela ficou boquiaberta - Ele teve coragem?
- Teve!
- Eu estava do seu lado e não vi nada! Perdi esse babado! - e se levantou em direção ao seu lado do guarda-roupa.
A resposta veio em forma de áudio.
▶️ Vai me dizer que não gostou?
▶️ Já pensou se alguém tivesse percebido?
Vc sabe que eu gosto de correr riscos, ma petite. Devia experimentar, rs...
▶️ Não vou experimentar nada! Você esqueceu do que aconteceu hoje? E se não tivesse sido o Evandro? Me fala!
▶️Foram dias longe de você, meu amor...
A forma carinhosa do Eric sempre me desmontava mas eu precisava ser firme.
▶️ E serão mais dias daqui pra frente e eu vou pensar se vamos ficar o próximo sábado juntos lá no Rio. Vai usar a sua mão ao invés de ficar entre as minhas pernas pra se aliviar, entendeu bem? Tenha uma boa noite!
Enviei e joguei de leve o aparelho na cama.
- Poxa Ní, pegou pesado! - Melissa já estava de camisola trocada - Não precisava disso.
- Se eu falei tudo isso foi por nós dois. E se mais alguém nos flagrar juntos aqui? Já pensou?
- A madrugada na praia não vai ter perigo, tô te falando...
- Então ele que vá e fique sozinho.
- Ai ai, vocês dois...Vamos dormir? - ela se levantou e foi até o interruptor da parede, apagando a luz.
- Ótima ideia - peguei meu celular e antes de me deitar, qual foi a surpresa ao ver uma última mensagem dele.
"Não desisti quando rompemos no ano passado e não vou desistir de uma noite com você aqui."
Li a frase, paralisada.
***
Se o último dia de Carnaval seria de diversão em um bloco, então o que eu precisava fazer era descansar o quanto pudesse. Nada de praia ou piscina.
Sendo assim, depois de tomar o café da manhã, decidi adiantar um pouco as coisas e comecei a arrumar a minha mala, dando prioridade em ajeitar as compras que eu fiz pela cidade. O restante eu iria organizar no decorrer do dia.
Embora fosse importante, me ocupar com outras coisas foi uma saída para evitar cruzar com o Eric pela casa mesmo ela sendo do tamanho de uma mansão. E foi o que aconteceu em toda parte da manhã, dando de cara com ele somente na hora do almoço.
- E então, pai? Nós podemos ir para o bloco ou não? - Gabriele não iria desistir fácil enquanto enfiava o garfo na salada de legumes do seu prato.
- E eu tenho outra saída a não ser permitir?
- Uhulll - ela vibrou na mesa.
- Vocês vão mas com uma condição.
- Qual, mãe?
- Depois do bloco, todo mundo de volta para casa e nada de sairmos à noite.
- Por mim, tá tranquilo - Patrick deu de ombros - Eu já curti bastante.
- Gabi, você sabe fazer penteado? - eu quis saber.
- Sei fazer alguns. Posso fazer em você e na Melissa.
- E vou querer emprestado um batom vermelho seu. O mais vermelho que você tiver.
- Tá legal.
Continuei almoçando tranquilamente e sentia que ele me encarava nada satisfeito em saber que eu usaria um batom bastante chamativo. Mas não me importei. Era o momento em dar o troco pelo que me fez na noite anterior, além de frustrar o plano que ele tinha para a última noite.
- Consegue dar conta de cinco adolescentes, Evandro? - William questionou.
- Se todos ficarem juntos para ninguém se perder, sim.
- Eu vou com eles - Eric disse - Com dois adultos fica mais fácil.
- Bom. Eu deixo vocês lá e assim que acabar, eu volto para buscá-los.
- E a avó Raquel? - Frederik quis saber - Ela não veio almoçar com a gente hoje...
- Ela ainda está com crise de enxaqueca e preferiu almoçar no quarto dela - Natália explicou a ausência.
- Que pena.
- Pois então - Já tinha terminado de comer o último pedaço de carne, deixando os talheres no prato e me levantei da mesa - Eu vou no quarto dela pra dar um oi antes de subir e escolher uma roupa pro bloco.
- Eu vou com você, Nívea - Frederik se levantou em seguida.
- Tá bom - e sorri - Com licença, gente.
Saímos em direção aos quartos do primeiro andar e eu estava rindo por dentro. A vontade de olhar para trás era maior principalmente porque, enquanto andávamos, o Frederik passou o braço por cima do meu ombro. Eu gostava mesmo de brincar com a morte como a Melissa disse outra vez.
O quarto da Dona Raquel estava exatamente como eu achei que estivesse. Luzes apagadas, o ar condicionado em uma temperatura agradável e apenas a luz da TV ligada na parede, em um canal qualquer, iluminava o comodo. No entanto, estava no mudo.
A bandeja com o prato e copo, ambos vazios, posicionadas do seu lado na enorme cama e uma manta de cor marrom cobria até a metade do seu corpo. Ela usava um pequeno óculos e seu pijama de cetim perolado.
- Uma pena você não ter almoçado com a gente, vó - Frederik lamentou sentado do seu lado na cama, pegando na sua mão deixando um beijo.
- O ambiente aberto só iria piorar a minha crise, meu querido - Ela deu um meio sorriso - Por isso foi melhor eu ficar aqui.
- Você sempre teve enxaqueca, vó?
- Desde que o avô das crianças faleceu. - ela me explicou - Eu fiquei doente apresentando um quadro de depressão por causa do luto e mesmo com o tratamento, a enxaqueca se tornou uma sequela.
- Entendo. Mas você vai ficar boa, logo.
- Ah sim, ela dura poucos dias.
- Bom, eu e a Nivea só viemos aqui para lhe fazer uma visita. Não vamos mais perturbar até porque temos um bloco de Carnaval para ir mais tarde.
- Isso mesmo, crianças! Vocês são jovens e tem que se divertir mesmo! - Frederik a beijou carinhosamente na testa, saindo da cama e eu me aproximei, repetindo o gesto no seu rosto.
- Melhoras vó!
- Obrigada, minha querida!
Frederik e eu deixamos o quarto e quando saímos do corredor, chegando na sala para subirmos pro segundo andar, demos de cara com a pessoa que eu evitei em boa parte da manhã.
- Oi, professor!
- Oi crianças. E a Dona Raquel, como está?
- Está melhor - Frederik lhe respondeu, felizmente, tomando a frente da conversa - Escuridão e silêncio são as melhores companhias para ela no momento.
- Bom, eu nunca tive enxaqueca mas imagino como deve ser chato.
- Verdade - ele pousou suas mãos nos meus ombros - Falamos rapidinho com ela e agora está descansando.
Os olhos do Eric imediatamente miraram as mãos do meu amigo nos meus ombros e precisei segurar a vontade de rir pois por mais que tentasse disfarçar, ele engoliu em seco não gostando do que via.
- A sobremesa está sendo servida. A Neide acabou de tirar um pudim de leite do forno.
- Bom, eu vou para o meu quarto escolher uma roupa para ir ao bloco - dei uma desculpa para sair dali de onde estávamos e principalmente da situação tensa que se formou - Se você quiser, pode ir Frederik - e segui em frente, subindo as escadas - Daqui a pouco eu vou.
- Tá legal.
Subi ligeira os degraus e fui direto para o quarto, fechando a porta atrás de mim, me encostando nela e respirando fundo. Meu coração batia acelerado pelo encontro inesperado, porém, eu precisava manter distância do Eric.
O bloco de Carnaval o qual iríamos no fim da tarde seria um teste de fogo e tanto. Perto dele fisicamente e longe de qualquer intenção de toque ou gesto da minha parte ou da parte dele.
Alívio e angústia em um mesmo ambiente.
***
Foram muitos cliques e poses para as câmeras de uns três celulares.
Usando um vestido bege claro, com estampas de flores bem pequenas e tênis all star branco, o mesmo do Carnaval do ano anterior, eu tirei várias fotos de corpo inteiro e apenas do rosto para destacar o meu batom vermelho e as duas tranças embutidas que a Gabriele fez nos meus cabelos e nos cabelos da Melissa. Ainda que estivéssemos no meio da tarde, o Sol era bem forte e ventava bastante na enorme sala de estar da casa.
- Agora eu quero todos vocês olhando para cá - William pediu enquanto posicionava sua câmera fotográfica profissional e nós cinco nos juntamos, fazendo poses diferentes para a foto - Isso mesmo - concentrado, ele focava e disparava vários cliques - Muito bom!
- Sempre gostou de fotografia, William? - me aproximei dele, perguntando por curiosidade.
- Sim, foi um hobby que adotei ainda na faculdade de jornalismo. Fotografia era uma das disciplinas do curso e acabei mantendo o hábito.
- Pode me enviar as fotos depois?
- Claro! Vou revelar para que você e a Melissa tenham como lembrança.
- Obrigada.
- E então? Todo mundo pronto? - Evandro surgiu na sala usando roupas leves para um bloco de rua - É bom sairmos cedo e assim não precisamos ficar até muito tarde.
Desde o momento em que eu desci para a sala, me distraí com as fotos e não tinha notado a ausência do Eric. Mas isso durou pouco pois ele surgiu logo em seguida, vindo do corredor. Não consegui disfarçar um meio sorriso em vê-lo como ele ficava lindo usando o seu boné preto e óculos escuros. Desviei meu olhar em outra direção mas as batidas do coração eram difíceis de serem controladas.
- Falei com a Luciana e ela vai tentar nos encontrar lá! - ele avisou.
- Vamos logo porque eu quero curtir o bloco desde o começo! - Gabriele pediu empolgada. Ela e eu usávamos o mesmo batom vermelho de tom bem forte com a diferença de que apenas a anfitriã tinha as bochechas com uma leve camada de glitter e o redor dos olhos bem maquiados.
Eu optei em apenas usar o batom e lápis de olho e Melissa não colocou nada no rosto pois sua pele ainda estava sofrendo com os efeitos do Sol.
- Divirtam-se, crianças! - Natália se levantou do sofá, deixando um pequeno livro de lado, e se aproximou dando um beijo em cada um de nós - E se comportem!
Saímos todos em dois carros. Eric foi ao lado do Evandro de carona, eu, Frederik e Melissa no banco de trás. Gabriele e Patrick foram no outro carro com o pai.
Durante o trajeto, me veio a lembrança do Carnaval passado. Eric não seria louco de sumir comigo no meio de tanta gente e com os meus amigos por perto. Seria?
Os músicos da banda estavam todos reunidos e as pessoas em volta deles já se divertiam. Muitas delas, homens e mulheres, jovens da nossa idade usavam biquínis, bermudas e seguiam direto para a concentração e isso fez com que o centro de Búzios ficasse lotado. Percebi então que eles saíram direto da praia. O Sol daquela tarde aos poucos ia perdendo força dando lugar a uma brisa refrescante. Mesmo assim, o clima era bem diferente do que presenciei ao lado da minha mãe e da Melissa.
Não era um bloco familiar, com crianças e jovens da nossa idade. Era algo bem maior, com pessoas aglomeradas, cheiro de suor, cigarro e bebida alcoólica.
- Está cheio... - comentei assustada, apertando a mão da Melissa.
- Ní, fica calma! - ela manteve sua mão junto da minha - Eu vou ficar do seu lado.
Olhei para o lado e a Gabriele já estava totalmente à vontade se divertindo e posando para fotos ao lado de algumas meninas. Aos poucos, mais pessoas chegavam, a aglomeração foi se tornando maior e eu me sentindo em pânico.
- Eu não gosto de ficar no meio do tumulto... - falei, começando a me sentir sufocada.
- Vamos sair daqui! - Ouvi a voz do Eric atrás de mim e senti a Melissa me puxar pela mão na direção da calçada.
Paramos em frente à uma sorveteria que estava bem climatizada pelo ar condicionado. Entramos nela e me sentei em uma das mesas, sentindo dificuldade em respirar. Por sorte, ela não estava lotada pois a atenção das pessoas era toda no bloco.
- Meu Deus, você tá gelada... - Melissa colocou as duas mãos no meu pescoço - Se ficasse lá mais tempo, com certeza ia desmaiar!
A mesa que escolhemos era colada na parede o que me permitiu encostar a cabeça e voltar a me sentir melhor. Eric permaneceu em pé com o seu celular em mãos e alternando o seu olhar entre o aparelho e eu, enquanto que a minha melhor amiga se sentou ao meu lado, segurando a minha mão.
- Fica quietinha aqui que eu vou comprar uma água pra você! - Melissa saiu do meu lado e foi até o balcão de vidro onde se podia ver muitos sabores diferentes de sorvete.
- Nívea! - Ouvi a voz do Frederik e ele, ao lado do Evandro e dos irmãos, se aproximou de mim e se sentou onde a Melissa estava - Tá tudo bem? O que houve?
- Me senti mal com o tumulto, foi só isso...
- Tem certeza? Quer ir a um posto de saúde? Nós te levamos!
- Não precisa, Frederik, obrigada. Eu só preciso ficar longe da multidão.
- Quer voltar para casa, senhorita? - Foi a vez do Evandro questionar - Eu te levo e depois volto para cá.
- Aqui, amiga - Melissa voltou e me entregou uma garrafa pequena de água mineral e um copo descartável - Bebe um pouco.
- Não, por favor! Não deixem de fazer nada por minha causa - Dei alguns goles, sentindo a água gelada descer pela minha garganta - Eu fico aqui e vocês podem voltar para curtirem o bloco. Não se prendam por mim. Vou me sentir horrível se fizerem isso.
- Eu te faço companhia, Nívea - Frederik pegou na minha mão - Fico aqui com você!
- Eu já estou me sentindo melhor. O bloco que eu fui ano passado era bem diferente deste, por isso eu me assustei e comecei a me sentir mal.
- Se a Nívea quer ficar aqui, então não tem problema em voltarmos - Gabriele sugeriu - Além disso, o bloco é parado. Não vai desfilar pelas ruas da cidade.
- Vocês podem ir - Frederik não conseguia disfarçar o seu olhar de preocupação - Prometo não sair daqui.
- Eu faço companhia à Senhorita Martin - Eric, enfim, se sentou na cadeira que estava de frente para mim - Se ela se sentir mal, eu aviso à vocês.
- Bom, eu queria curtir o bloco mas fico aqui com a minha amiga também - Melissa se sentou na outra cadeira, me abraçou de lado e beijou os meus cabelos - Principalmente se vamos ficar em uma sorveteria - e sorriu.
- Meli, eu vou ficar bem.
Mesmo sentada e com todos em volta de mim, pude ver e reconhecer de imediato a mulher alta, de cabelos curtos e loiros entrando na sorveteria. Usava um short jeans claro e blusa branca de alças repleta de lantejoulas coloridas junto de um tênis também branco.
- Não tem ninguém passando mal por aqui, tem? - Luciana já chegou falando de forma irônica, fazendo todos rirem - É o último dia de Carnaval e nada de ficarmos dentro de um hospital. E aí, gente, tudo certo? - ela cumprimentou a todos de forma geral.
- Sabia que estávamos aqui? - Evandro questionou.
- O digníssimo professor de vocês me passou uma mensagem, contando o que aconteceu. Bom saber que ele se lembra dos amigos - Ela continuou a ironizar, fazendo o Eric esboçar um leve sorriso.
- Mas então, podemos voltar pro bloco ou não? - Gabriele insistiu.
- Eu e o Schneider vamos ficar aqui e fazer companhia à Nívea.
- Se dois adultos vão ficar com a minha amiga então eu fico tranquila - Melissa se levantou e deu a volta na mesa - Vamos Frederik? A Nívea vai ficar bem.
- Eu fico com você... - Frederik pegou na minha mão.
- Eu e a Luciana vamos tomar conta da Senhorita Martin - Eric respondeu - Se acontecer alguma coisa, nós avisamos.
- Isso mesmo - Melissa puxou o Frederik pelo braço e ele, mesmo receoso, se levantou e se deixou levar pela ruiva.
- Nós não vamos ficar muito longe daqui - Evandro avisou - Você tem meu número, professor. Pode me ligar.
- Eu ligo sim.
Respirei fundo e observei todos saírem da sorveteria para curtirem o bloco que tocava as conhecidas marchinhas de Carnaval cujas caixas de som reproduzia em uma altura considerável. Um casal de namorados entrou, indo direto para o balcão de vidro e, abraçados, olhavam os sorvetes e conversavam sobre quais sabores iriam experimentar.
- Está melhor? - a voz do Eric me fez desviar o olhar do casal em direção a ele.
- Agora estou sim - Enchi o copo descartável com água e bebi - Eu não sabia que o bloco iria lotar tanto.
- Todos os anos, na terça-feira de Carnaval, o bloco daqui fica lotado. Bem diferente do que você curtiu no Campus. - Luciana piscou para mim. Não sabia a que ela se referia exatamente mas sendo a melhor amiga do Eric, não era difícil imaginar - Agora já sabemos que você passa mal com lugares tumultuados.
- Eu nunca gostei - abaixei a cabeça, dando de ombros e tirei o meu celular da minha pequena bolsa, colocando-o na mesa.
- Se ficar aqui, não tem mais perigo - Eric se aproximou de mim com a sua cadeira, ajeitando a fina alça do meu vestido e suspendendo o decote para cobrir os meus seios.
- Ei, tira a mão! - dei um tapa de leve que o fez recuar.
- Mais um pouco e eles pulam para fora! - ele fechou a cara - Podia ter vindo com um vestido mais decotado, não é mesmo? - falou com sarcasmo.
- É, eu podia. Seria um motivo e tanto para o Frederik ficar aqui, me fazendo companhia - dei um sorriso fechado e debochado e Luciana caiu na gargalhada, chamando a atenção das poucas pessoas no local sentadas em suas mesas.
- Pelo visto você está ótima, Nívea! - ela continuou a rir.
Eric permanecia sério me observando enquanto eu terminava de beber toda a água da pequena garrafa. Desbloqueei a tela do meu celular, distraída, vendo algumas postagens no Instagram e eles dois começaram uma conversa que não dei atenção. Visualizei algumas publicações e nada muito diferente: postagens sobre Carnaval de alguns perfis que eu seguia, muitos stories da Melissa... E então uma mensagem de um contato conhecido no whatsapp surgiu, me fazendo clicar de imediato.
- Salut Nívea, ma cousine ! Mais quel endroit magnifique ! Où est-ce ?
(Oi, prima ! Lindo o lugar ! Onde é ?)
Era a mensagem do meu primo Henry abaixo do meu primeiro status do dia que era mais uma foto da varanda do meu quarto na casa de praia. Não pude disfarçar o sorriso e ao invés de digitar, enviei um áudio:
▶️ C'est la fête du carnaval ici au Brésil et je suis à Búzios, une ville située à quelques heures de Rio. J'ai voyagé avec des amis.
(É feriado de Carnaval aqui no Brasil e estou em Búzios, uma cidade que fica a poucas horas de distância do Rio. Viajei com alguns amigos.)
- É a coisa mais fofa do mundo você falando francês! - os olhos da Luciana brilhavam.
- Quem quer saber onde você está? - Eric questionou.
- Para com isso e deixa a garota! - Ela deu um tapinha no seu braço forte e eu ignorei totalmente aquele surto ridículo de ciúmes, abrindo a tela da câmera e posicionando o aparelho para uma selfie.
Enquadrei todo o meu rosto para destacar a maquiagem e as duas tranças no meu cabelo, tirando a foto em seguida e enviando para ele com a legenda: "Je suis dans un glacier et il y a un bloc de carnaval dans la rue."
("Estou em uma sorveteria e tem um bloco de Carnaval aqui na rua." )
Por sorte eu não estava mais com a aparência pálida no meu rosto.
Tu es très belle comme toujours. Ce n'est qu'aujourd'hui que je me suis arrêté pour voir tes photos sur Instagram et les plages me rappellent beaucoup les images de la Sardaigne que j'ai recherché.
▶️ Envoie-moi les photos quand tu es là. Je compte les jours pour visiter l'île.
Oui, je vais les envoyer! Amuse-toi là, Nívea ma cousine ! Il est déjà nuit ici et je vais bientôt dormir. Je t'embrace.
- Toi aussi et mes oncles aussi !
(Está muito bonita como sempre. Somente hoje eu parei pra ver as suas fotos no Instagram e as praias lembram demais as imagens da Sardenha que eu pesquisei.
▶️ Me envia as fotos de lá. Estou contando os dias para conhecer a ilha.
Envio sim! Divirta-se aí, prima! Aqui já está de noite e vou dormir daqui a pouco. Um abraço.
Pra você também e para os meus tios !)
E encerramos a breve conversa, deixando o meu celular novamente na mesa.
- Entendi você falar em ilha...
- Sim, seu chato! - respondi de cara amarrada - Era o meu primo que me enviou uma mensagem comentando sobre Búzios e ele comparou as fotos das praias daqui com a Sardenha. Satisfeito?
- Me desculpa - ele pegou na minha mão e a beijou como sempre fez - Eu nem pensei que podia ser alguém da sua família. Vem cá, senta aqui - e me puxou para perto dele, para que eu sentasse na sua coxa direita.
- Não, Eric! Alguém pode nos ver!
- Vocês dois fiquem aí e eu vou lá fora ver onde o pessoal está - Luciana se levantou e saiu, nos deixando a sós - Se comportem! - pediu apontando com o dedo na nossa direção e sorrindo.
Era impossível ainda sentir raiva do Eric pelo que aconteceu na noite anterior pois, quando me dei conta, eu já estava sentada como ele pediu e sentindo a sua língua brincando com a ponta da minha orelha, sugando e lambendo, me causando calafrios no mesmo instante.
- Eric... - mordi o meu lábio e me contorcia de leve com a sua boca mordendo o lóbulo e os seus braços em volta da minha cintura... - Desse jeito você vai deixar a minha pele marcada.
- Só se eu chegar no seu pescoço para sentir esse perfume delicioso - falou em voz baixa no meu ouvido - Vamos sumir de novo? Hum? - deixou pequenos beijo por trás da minha orelha e pude sentir a sua barba macia.
- Você sabe que não dá... - àquela altura, fechei minhas coxas uma na outra tentando conter a minha calcinha molhada pelo que os lábios provocantes dele eram capazes de fazer.
- Então vou te esperar hoje como eu te falei - sua mão se enfiou por entre as minhas pernas e eu a apertei com força impedindo que ele avançasse.
- Eu não vou! - segurei nos seus ombros e olhando naquele mar azul que eram o seus olhos - Quer que nos vejam juntos de novo, seu doido?
- Te garanto que não vai ter perigo. Aquela casa é enorme e além disso estará escuro.
- Nos encontramos no sábado. É o último fim de semana antes das aulas começarem pra valer.
- Promete?
- Prometo.
- Ótimo. Nos vemos no sábado... - seus olhos percorriam cada detalhe do meu rosto, o que me fez sorrir - E hoje de noite também.
- Eric! - dei dois tapas de leve nos seus ombros e o seu sorriso mais canalha surgiu e sua boca enchendo o meu pescoço de beijos ligeiros.
- É melhor voltarmos pro bloco - ainda sentada no seu colo, o abracei pelo seu pescoço me permitindo sentir todo aquele carinho - Podem desconfiar.
- Você vai na frente e eu vou depois... - a mão que estava entre as minhas pernas, acariciou o meu rosto e nossos olhos mais uma vez se encontraram - Je t'aime, ma petite...
- Je t'aime aussi.
Trocamos um último selinho de leve, porque meu batom super vermelho poderia denunciar o óbvio, e saí do seu colo, indo na frente em direção à calçada onde o bloco acontecia a todo vapor. Meu baixo ventre queimava e eu não podia andar trocando as pernas. Encontrei a Luciana com o seu celular direcionado para a multidão de gente em volta dos músicos e fiquei do seu lado observando o mesmo que ela.
- Se sente melhor agora?
- Sim, eu só preciso ficar longe do tumulto.
- Muito bom. Seus amigos estão bem ali no meio de todo mundo.
Ela apontou na direção e pude ver os inconfundíveis cabelos ruivos da Melissa ao lado da Gabriele e dos meninos. Evandro estava próximo deles e não parecia se incomodar nem um pouco com o empurra empurra das pessoas. Eric se juntou a nós duas minutos depois com uma sacola branca e dentro dela várias garrafas pequenas de água mineral e copos descartáveis.
- Para o caso de mais alguém se sentir mal.
O bloco seguiu se apresentando durante todo o fim de tarde até o início da noite. Mesmo lotado, não vimos brigas, confusões ou algo parecido. Para mim, foi muito melhor ver tudo de "longe".
***
Estávamos nós cinco sentados na beira da calçada em plena Rua das Pedras enquanto a Luciana, o Eric e o Evandro estavam em pé conversando tranquilamente. A multidão havia se dispersado com o fim do bloco e tudo o que nos restava a fazer era esperar pelo William que iria nos buscar com o seu carro.
- Mas então? Vão ficar em Búzios até quando? - Luciana perguntou.
- Ainda não sabemos - Evandro explicou à ela - Como vamos voltar para o Rio de carro, o William ainda está analisando se voltamos amanhã no fim de tarde ou na quinta-feira pela manhã bem cedo.
- Para fugir do trânsito na estrada.
- Exato - o guarda-costas confirmou.
- Será que o papai vai demorar muito? - Gabriele bufou quase se deitando na calcada, apoiando os cotovelos no concreto - Minhas pernas doem em cada músculo.
- Eu telefonei para o seu pai assim que o bloco encerrou e ele avisou que estava saindo de casa.
- Tá cheio de carro circulando por aí e ele deve estar preso em alguma rua - Patrick acrescentou. Estava sentado entre a irmã e a Melissa que cruzou o seu braço com o meu encostando sua cabeça no meu ombro. Tagarela como sempre foi, estranhei ela tão quieta.
- Tá tudo bem, Meli?
- Está. Só quero ir embora também. Meus ouvidos estão zumbindo por causa das caixas de som e estou implorando mentalmente por um banho.
- E você, Nívea? Não sente mais nada?
- Não, Frederik, estou bem. - e sorri pra ele.
- Que bom. Você ficou tão pálida naquela hora... Fiquei assustado.
- O bloco de hoje foi muito diferente do ano passado, eu não esperava ver tanta gente...
Vi o Evandro tirar o seu celular do bolso e sair de perto para atender a ligação. Poucos minutos depois, ele retornou.
- Pessoal, é o seguinte. Tenho duas notícias, uma boa e outra ruim. - ele anunciou enquanto eu, Melissa, Frederik e Patrick nos levantávamos da calçada.
- A boa, por favor - Gabriele pediu.
- A boa é que o pai de vocês já chegou e está nos esperando.
- Obrigada, Deus! - ela se levantou apressada, limpando a poeira da parte de trás da sua roupa - Vamos logo! Papai está aonde?
- Então, essa é a notícia ruim. Ele está a umas três quadras daqui. Então teremos que ir andando até lá.
- Não acredito nisso! Que droga! Eu mal sinto as minhas pernas e ainda vou ter que andar!
- Foi onde ele conseguiu estacionar, sua sem noção! Queria que ele parasse aqui na nossa frente com a cidade entupida de gente?
- Seu irmão está certo. Menos a parte do sem noção - Evandro brincou e todos riram.
- Então é isso, gente! Me despeço de vocês daqui pois o meu Carnaval só acaba no domingo - Luciana abraçou e deu um beijo no rosto de cada um de nós, terminando em mim.
- Nívea, minha querida, se precisar de alguma coisa, você grita que eu venho te socorrer tá bom? - falou com as mãos no meu rosto - Qualquer coisa! - e piscou pra mim.
- Obrigada Luciana, adorei te ver aqui.
- Eu também. Agora preciso voltar porque a galera lá na casa deve estar achando que eu fui sequestrada pois eu sumi a tarde toda.
- Quem veio com você? - Eric, com os braços para trás, perguntou por curiosidade.
- Os de sempre. Da Coordenação viemos eu, a Rosana do curso de Pedagogia, o Rodrigo de Educação Física e a Adriana da Nutrição. E mais quatro professores da equipe do Rodrigo.
- Então a casa está lotada... e ainda queria que eu me juntasse a vocês?
- Sim, seu bicho do mato, quanto mais gente, menor fica o valor por pessoa pra fechar o aluguel da casa pela temporada de Carnaval. Até a nossa amiga querida, a Ana Luíza, eu chamei.
No instante em que eu ouvi o nome, eu lembrei e quis saber se era a mesma Ana Luíza que a Melissa investigou pelo Instagram. Aquela que eu vi com o Eric na praça de alimentação do shopping.
- E quem é essa amiga de vocês? - perguntei para ter certeza, de forma tranquila, para não parecer enciumada.
Na verdade, eu não estava pois meu coração permaneceu tranquilo. Apenas a Melissa apertou o meu braço cruzado com o dela.
- Ah, então... - Luciana me encarou e riu seco, sem graça, olhando para o Eric que continuou sério como sempre - A Ana é da minha equipe, professora de Literatura Brasileira.
- E é gata? - foi a vez do Patrick perguntar.
- Sim, ela é bem bonita - ela riu - Tem os cabelos iguais aos meus com a diferença de que são pretos.
- E ela não veio por quê? - Eric perguntou.
- Porque ela viajou para o Rio Grande do Sul visitar uma amiga de infância que mora há alguns anos com o marido e as duas filhas. Vai passar o Carnaval tomando chimarrão.
- Hum, legal.
- Vamos então, gente? O papo está ótimo mas o William está esperando - Evandro pediu e se despediu da Luciana com um simples gesto de mão. Algo bem contido para alguém que pretende chamá-la para sair. Talvez fosse essa a intenção.
Se aproximar dela com calma. Sem a euforia da parte de um homem interessado por uma mulher.
***
No horário da tela do meu celular havia passado da meia noite...
E eu estava sentada na minha cama, pronta para dormir, com o aparelho nas mãos. Porém, apesar da hora, sono era a única coisa que eu não sentia.
Melissa estava quieta, sentada do meu lado me observando. Alisava os meus cabelos ainda um pouco úmidos do banho, esperando por alguma resposta minha. Olhei para ela que continuava me encarando e deu um meio sorriso. A pele do seu rosto cheio de sardas minúsculas estava iogurte de morango de tão rosa, devido aos dias de Sol.
Era noite mas era também o início do último dia de viagem. Quando voltamos do bloco, eu e os meus amigos ficamos sentados à mesa, onde fizemos nossas refeições na área aberta da cozinha lanchando, jogando dominó e uno, jogos que o Patrick levara para a viagem. Como aproveitamos bem o dia todo, Natália tinha mesmo razão: não havia motivo para sairmos à noite para o Centro. Consegui me distrair ficando com eles, conversando e rindo.
E após estas poucas horas ao lado deles, eu me encontrava ali em meio ao silêncio pensando se eu deveria ir ao encontro dele ou não.
- Vai se encontrar com o Eric ou não? - Melissa pôs uma mecha do cabelo atrás da minha orelha.
- Eu não dei nenhuma resposta. - respirei fundo, sentindo minhas mãos úmidas pelo nervosismo.
- Então não vai - deu de ombros.
- Mas e se ele ficar a madrugada toda lá na areia me esperando?
- Ele vai se cansar e desistir de te esperar, voltando para o quarto dele.
- É - afirmei com a cabeça - É isso, então eu não vou e ele vai cansar, indo dormir.
- Exatamente - ela sorriu.
- E se fosse com você? - perguntei por impulso.
- Comigo?
- É! Você iria se encontrar com o Lipe?
- Óbvio que eu iria! Eu não sou medrosa igual a você, Ní.
- Não é medo! - ela arqueou a sobrancelha - Só acho arriscado como eu te falei ontem.
- Se acha arriscado, então não vai.
- Mas o Eric vai ficar sozinho... - mordi o lábio, me sentindo aflita.
- Então espera e daqui mais ou menos uma hora, vê se estão todos dormindo e vai até a escadaria. Se a praia estiver vazia, você volta. O que significa que ele não foi.
- Mas e se eu for e ele estiver lá?
- Ai Nívea, chega! - Melissa esfregou as mãos por dentro dos seus pesados cabelos ruivos - Indecisão não vai adiantar nada! Não sou eu quem vai te dar uma resposta.
- Eu sei... - suspirei - Quer saber? Eu não vou e pronto! - Me levantei da cama, coloquei meu celular no criado-mudo ao lado da cama e puxei o edredom para me deitar e dormir - Se o Eric for, ele vai cansar de esperar e voltar para o quarto.
- Isso mesmo. - Melissa se levantou e foi para a sua cama - Agora posso ir dormir. Mas, se por acaso você mudar de ideia, só não me acorda no meio da madrugada, tá bom?
- Eu não vou mudar de ideia!
- Não me acorda!
- Eu não vou! - apaguei a luz do quarto e enfim, me deitei.
Correr o risco de ser flagrada? Não mesmo! Que o Eric esperasse pelo próximo sábado como eu disse para ele na sorveteria.
***
Eu rolava de um lado para o outro na cama. Enfiava a cara no travesseiro, rezando, implorando para o sono ganhar força e nada. Era 1h20 da madrugada quando, deitada, estiquei o braço até o meu celular no móvel para conferir a hora.
Me sentei na cama, olhei na direção da varanda aberta como sempre ficava e me levantei, caminhando em direção do lado de fora. O vento estava frio mas eu não sentia o meu corpo tremer por causa dele e sim pela agonia da dúvida por não saber se o Eric realmente estaria na pequena praia da casa ou não. O céu estava incrivelmente estrelado nem nenhuma nuvem. Seria um bom sinal?
Voltei para dentro do quarto e cheguei perto da cama da Melissa. Como ela aproveitou o bloco muito mais do que eu, curtindo e pulando no meio da multidão, o seu cansaço era nítido pois, mesmo no escuro, eu pude sentir o quanto dormia profundamente. Fiz o que me pediu e não a acordei.
Voltei para a minha cama e me deitei. Olhava para o teto. Nada de sono. Peguei meu celular, abri meu Instagram, vi e curti algumas publicações... Nenhuma mensagem no whatsapp, nem dele. ''Se o Eric não me mandou mais mensagens então é porque ele não foi. É isso! Ele não foi!''
Pus de volta o celular no móvel, ajeitei o travesseiro dando socos, deitei a cabeça nele e fechei os olhos, tentando relaxar para o sono finalmente aparecer. Mas a dúvida era um furacão dentro de mim.
Eu não podia mais ficar remoendo aquilo. Me levantei da cama e descalça saí do quarto bem devagar, fazendo o mínimo de ruído com a maçaneta. Melissa dizia ter o sono pesado e juntando com a diversão do bloco seria impossível ela acordar com o barulho da porta.
Andando na ponta dos pés, o corredor dos quartos era uma escuridão total. Tanto a Gabriele quanto os meninos já dormiam pois eu não percebi nenhuma movimentação ou luz acesa vinda dos quartos. Cheguei na escadaria que levava para a sala e desci lentamente degrau por degrau. A enorme casa estava absolutamente escura e silenciosa mas felizmente eu decorei desde o primeiro dia, o caminho que levava até a praia.
Meu coração batia enlouquecidamente a cada passo que eu dava e minhas mãos se esfregavam uma na outra sem parar. Mesmo sentindo o vento e vestindo uma camisola cor-de-rosa com a estampa de um anjo na frente, de mangas curtas cujo comprimento ia até o meio das coxas, o suor escorria pela linha da coluna tamanho era o nervosismo e o tremor incontrolável nas pernas.
Quando a longa escadaria que levava até a praia estava diante de mim, eu travei completamente. Devido à escuridão da noite, de onde eu estava não ajudou muito em ver a pequena faixa de areia.
Segurei com força o corrimão de metal e apertei os lábios na mesma intensidade. Recuei alguns passos pensando o quanto aquilo era uma loucura. O que eu não esperava era que os meus passos para trás fossem interrompidos por mãos que apertaram firme a minha cintura. As mesmas mãos que um ano atrás me envolveram no meio de um bloco.
- Eu sabia que você viria... - aquela voz rouca e excitante pousou no meu ouvido junto de um pequeno beijo, me impedindo de falar, respirar. Me impedindo de reagir. Apenas segurei nos seus pulsos, na tentativa de me afastar daqueles braços fortes envolvendo o meu corpo - e espero que tenha vindo sem nada por baixo - sua mão deslizou pelo tecido da minha camisola, levantando o suficiente para chegar até o meio das pernas.
- Eric... - o ar me faltou no exato instante em que seus dois dedos se afundaram na minha buceta e o sussurro enlouquecedor junto do seu hálito quente me fez perder o controle sobre o meu próprio corpo - Aqui não, por favor... - Mesmo de pé, não me restou mais nada a fazer além de me recostar no seu peitoral musculoso e gemer feito louca, me sentindo pulsar e esmagar aqueles dedos.
A mão do Eric envolvia a minha cintura e sua boca percorria a curva do meu pescoço, sugando, lambendo e beijando. Eu estava molhada a ponto de sentir escorrer pela virilha e poderia gozar a qualquer momento.
- Que feio, ma petite... - senti o seu sorriso no meu rosto - Essa buceta molhadinha querendo gozar tão rápido?
Eu rebolava naqueles dedos e quando percebi, veio uma segunda onda de choque que mais uma vez me paralisou: senti a ponta do membro do Eric se esfregando em mim que estava duro feito pedra.
- Eric, você está...
- Nós já perdemos tempo demais aqui - e de uma só vez, ele tirou minha camisola me deixando completamente nua igual a ele e me virou de frente.
Suas mãos agarraram a minha nuca e um beijo feroz engoliu a minha boca não me dando chance de fazer mais nada além de permitir o fogo entre as minhas pernas crescer e dominar nós dois. Deslizei as mãos pelos seus braços e o abracei pelo pescoço, ficando na ponta dos pé. Eric me ergueu e envolveu minhas pernas na sua cintura.
- Eu vou com você para o seu quarto... Vamos... - pedi, para evitar correr qualquer risco de outro flagra.
Eric não me respondeu e desceu a escadaria comigo no seu colo o que para ele parecia ser a coisa mais simples do mundo. Ele não tinha medo de levar um tombo, de ser flagrado comigo, de nada. Absolutamente nada.
Chegamos na pequena faixa de areia e quando pensei que seria colocada em pé, senti que íamos na direção de um dos lados das pedras onde era o cenário para fotos. E partir daquele momento, o cenário do nosso amor.
Eric intensificou o beijo, me agarrando com força e indo na direção do paredão de pedras que formava uma encosta, me deixando encurralada.
- Preciso te foder, ma petite... - sua voz era desesperada e sua respiração estava ofegante - Ficar aqui sem tocar em você é uma tortura...
As palavras dele fizeram cada parte da minha pele se arrepiar e suas mãos ergueram mais o meu corpo pelas minhas coxas, exigindo o encaixe perfeito com o seu.
- Eric... Ah! - senti a primeira estocada e minha cabeça se inclinou para trás enquanto eu me agarrava nele o quanto podia, envolvendo as mãos no seu pescoço. Mordi meu lábio com força ao sentir seu membro todo dentro de mim.
- Eu devia te castigar, sabia? - me estocou novamente, grudando sua boca no meu rosto, prendendo meu corpo ao dele - Estes dias todos se exibindo de biquíni, hein? Pensou em mais alguém além de mim? - se enfiou com mais força - responde!
- Só pensei em você, meu amor - mesmo não conseguindo olhar nos seus olhos por causa da escuridão, segurei no seu rosto e o beijei - Eu não podia ficar usando jeans e camiseta aqui.
Sem parar de me estocar, Eric resmungou e sua boca sugava a pele do meu rosto, deixando um rastro molhado que percorreu até os meus seios. Meu bico foi sugado, deixando meu corpo em chamas. Sua língua quente rodeava o meu bico de forma lenta e eu implorava em pensamentos que ele não parasse. Todo o calor ganhou força quando aquela boca fez o mesmo no outro. Senti as leves mordidas e minhas pernas e pés, cruzando a sua cintura, começaram a enrijecer e toda essa tensão deliciosa chegou entre as minhas pernas me impedindo de controlar o que estava por vir.
- Eric, eu vou... - me agarrei nas suas costas arranhando sua pele e afundei meu rosto no seu pescoço.
- Isso, esmaga o meu pau e goza bem gostoso nele... - sua mão segurou o meu pescoço, erguendo o meu rosto, com o polegar no meus lábios - Isso, ma petite...
Mordi o seu ombro, me deixando levar pelo orgasmo que dominou cada parte do meu corpo e rebolei sem parar querendo prolongar por mais tempo aquela sensação que eu jamais saberia descrever e que só o Eric era capaz de me proporcionar. Suas estocadas ficaram mais intensas e quando o seu corpo enrijeceu, se derramou dentro de mim.
Continuei agarrada e apertei mais minhas pernas em volta, não querendo que ele se afastasse. Mesmo com a brisa fria da madrugada, o calor dos nossos corpos era a única coisa que podíamos sentir um no outro.
Aos poucos, Eric se abaixou e continuou comigo no seu colo se permitindo relaxar e beijar carinhosamente o meu pescoço. Continuei abraçada a ele, sentindo o líquido quente escorrer e perceber o quanto estava marcada por ele entre as minhas pernas.
- Doido... - acariciei o seu rosto e a barba úmida e, ofegante, lhe dei um selinho, esfregando a ponta do meu nariz na dele - Podíamos ter feito no quarto...
- E perder a chance de trepar com você tendo todas essas estrelas como testemunhas?
- Mas e se alguém...
- Shiiuu... - seu dedo indicador calou os meus lábios - Ninguém viu e nem vai ver...
Suas mãos acariciaram o meu rosto e sua boca invadiu a minha onde trocamos um beijo apaixonado. Eric era o único homem que tocara os meus lábios e o seu beijo era tão bom que fazia o meu corpo derreter e implorar por mais. Senti minha buceta esquentar novamente e comecei a rebolar, querendo mais do orgasmo sentido minutos antes. Suas mãos deixaram o meu rosto e afundaram no meu bumbum, trazendo o meu corpo para mais perto dele.
- Do jeito que você gosta, não é danadinha? - ele provocou, encaixando a ponta do seu membro na minha entrada e as nossas línguas em uma dança frenética.
Eu estava tão excitada que ele penetrou fácil e senti o seu tamanho por completo, fechando mais a minhas pernas na sua cintura.
Nosso beijo se rompeu em uma leve mordida no meu lábio e entreguei o meu corpo aos seus chupões e lambidas nos meus seios até chegar na minha barriga. Agarrei nos seus cabelos por trás da nuca e continuei rebolando, querendo mais, muito mais.
- Nada de morder o meu ombro! - ordenou, agarrando os meus quadris, estocando com força.
Foi impossível controlar os meus gemidos diante do segundo orgasmo que dominou todo o meu corpo, me fazendo desabar e ser amparada por uma das mãos do Eric no meio da minha coluna. Senti minha virilha formigar e bem devagar, sua mão me fez deitar naquelas pedras úmidas e geladas mas eu não me importei. Só queria de volta o ar nos meus pulmões. Meu colo subia e descia implorando por ele.
***
Ao invés de um teto, o céu estrelado. No lugar de lençóis, a água gelada cobria os nossos corpos naquela pequena praia sem ondas e rasa. Eu estava ali como sempre gostava de ficar com o Eric: deitada por cima dele com o meu rosto colado no seu e a ponta dos seus dedos deslizando devagar pelo meu corpo. Ele não se incomodava com as pedras pois estava relaxado e a todo momento deixava beijos carinhosos no topo da minha cabeça e na testa. E eu correspondia fazendo o mesmo no seu peitoral e deslizava meu dedo indicador naquela parede de músculos, ouvindo as batidas tranquilas do seu coração.
- Vamos ficar aqui a noite toda? - perguntei.
- Por mim eu fico até o amanhecer... e você?
- Ah... - suspirei - Foi bom fazer ao ar livre...
- Só bom? Bom pra mim significa que foi péssimo - rimos juntos.
- Não, seu bobo! Foi maravilhoso - e me envolveu em um abraço apertado - Me senti em cena de filme...
Eric inverteu as posições e me deixou deitada por baixo do seu corpo permitindo a água encharcar os meus cabelos e minha pele se arrepiar com seus beijos que começaram pelo meu colo e seguindo uma trilha até o meu ventre. Seus beijos lentos eram uma tortura para mim. Que se transformou em prazer quando senti sua língua circulando o meu ponto mais sensível.
- Continua, Eric... Por favor... - implorei após arquear o meu corpo e arranhar em cada lado com as unhas a pedra de onde estávamos.
Eric não tinha nenhuma pressa em me penetrar com a língua e me invadir, usando os dedos. Sugava lentamente como se estivesse provando o mais doce néctar, me forçando a rebolar no seu rosto com as mãos nos seus cabelos macios o impedindo de parar aquele oral delicioso.
A ponta da sua língua quente me lambia e estocava e suas mãos seguraram as minhas coxas, abrindo o máximo possível. Eu estava perto de chegar ao céu quando Eric interrompeu aquele momento e ele apontou seu membro me penetrando com urgência. Suas mãos grudaram nos meus seios me deixando incapaz de reagir e apenas permitir o terceiro orgasmo daquela noite. Sabendo o domínio que possuía sob o meu corpo, ele continuou a socar gostoso na minha buceta que ainda formigava e gozou até a última gota, sem sair de dentro de mim, desabando no meu corpo, esmagando os meus seios com o seu peitoral e provando a minha pele. Cobriu minhas mãos com as suas, prendendo-as acima da minha cabeça e encheu o meu rosto com beijos.
- Je t'aime... - sussurrou no meu ouvido, acelerando as batidas do meu coração, ainda enfiado em mim que o abraçou com as pernas na sua cintura.
-Je t'aime beaucoup aussi ! - nossas bocas se uniram desejando que fôssemos um só.
Fazer amor na beira da praia...
Depois de vários momentos juntos dentro do seu carro, de ser pega desprevenida em uma saída de emergência, ser encurralada em um banheiro no meio de uma festa e ter a neve dos alpes franceses como testemunha da nossa reconciliação, o cenário noturno repleto de estrelas não poderia ser mais do que perfeito.
O que mais eu poderia desejar ou apenas acontecer?
Juntos, na beira da escada da sala, Eric e eu trocamos um último beijo antes de cada um seguirmos para os nossos quartos. Ainda não conseguia acreditar que a casa inteira estava em completo silêncio e que saímos ilesos sem qualquer risco de sermos pegos.
- Você nunca mais faz isso, ouviu bem? - pedi falando baixo quase sussurrando - E se fôssemos pegos?
- Agora que já aconteceu você vai reclamar?
- Foi arriscado, Eric!
- E delicioso... - me abraçou apertado, erguendo meu corpo do chão e afundando sua boca no meu pescoço.
- Foi, mas mesmo assim fiquei com medo – correspondi ao seu abraço – Vou tentar dormir...
- Só se for comigo.
- Para! - dei um tapinha no seu braço e um último beijo.
Eric seguiu para o seu quarto e eu fiz o mesmo, subindo devagar as escadas até, enfim, chegar ao meu quarto sã e salva. Respirei aliviada, recostada na porta e mesmo sem acender a luz, a minha melhor amiga parecia desmaiada na cama o tanto que dormia profundamente.
Deitada na cama, fiquei excitada apenas por lembrar daqueles momentos maravilhosos ao lado dele e virei para o lado, fechando as coxas uma na outra, controlando o tesão que insistia em dominar aquela parte do meu corpo.
***
Melissa e eu estávamos em frente ao espelho do banheiro, devidamente prontas para voltarmos para casa. Durante o café da manhã, William avisou que voltaríamos para o Rio antes do almoço. Era manhã de quarta-feira de cinzas e então ele deduziu que o trânsito na estrada ainda estaria tranquilo.
No entanto, eu não conseguia disfarçar o medo de alguém ver a marca roxa no meu pescoço deixada horas antes no meio da madrugada.
- Fica calma que isso aqui vai cobrir o chupão! - Melissa garantiu enquanto passava uma base para o rosto com o seu dedo indicador por cima da marca - Além do mais, o bronzeado da sua pele vai ajudar e o seu cabelo ficou todo na frente na hora do café. Ninguém viu nada.
- Eu vou esganar o Eric! - bati o pé, cruzando os braços - Eu fui uma imbecil por não trazer pelo menos uma jaqueta.
- Fez bem em não trazer. Os quatro dias aqui foram de Sol. Pronto - ela terminou e fechou a pequena bisnaga, abrindo a torneira e limpando o dedo com água, fechando em seguida - Agora é só esperar secar. - E tirou os meus cabelos da frente, dando uma leve assoprada, colocando os fios de volta - Relaxa, Ní! Tu tá paranoica sem necessidade. E vamos descer porque eu acho que só faltam nós duas. Até nossas malas já desceram.
Saímos do banheiro e peguei a minha mochila em cima da cama. Chegamos na sala e os nossos amigos estavam prontos. Gabriele esperava sentada em cima da sua mala, Patrick, Eric e Frederik no sofá. Todos distraídos com seus celulares nas mãos.
- E então, crianças? Gostaram? - William chegou na sala vindo na direção do corredor do primeiro andar ao lado da Natália - Espero que tenham aproveitado bastante.
- Eu adorei tudo - elogiei - Acho que não vou precisar tomar Sol por um bom tempo.
- É, nem eu - Melissa bufou e todos riram - Ainda sinto minha pele queimando.
- Pois eu não tenho pena!
- Tá bom amiga, eu aprendi a lição.
- Vamos tentar voltar no decorrer do ano em algum fim de semana - Natália sugeriu - mesmo com a pressão deste último ano no colégio vai ser bom para vocês descansarem um pouco.
- Podemos comemorar o nosso aniversário aqui - Patrick acrescentou - Já que não vai rolar festa...
- Teremos tempo e pensar melhor sobre isso.
- E então, podemos ir? A avó de vocês está esperando no carro.
- Espera aí, eu tive uma ideia - Gabriele interrompeu toda a movimentação de saída - A Melissa e a Nívea moram no mesmo bairro do nosso colégio e é o caminho que o professor Schneider faz para chegar em casa. Por que vocês não vão com ele de carona?
Custei a acreditar que a Gabriele estava sugerindo aquilo.
- Por mim não tem problema - Melissa sorriu da forma mais irônica possível - E acho que pra Ní também não tem - Não é, amiga?
- De jeito nenhum, Gabriele - William, sem saber, me salvou daquela situação constrangedora - Não tem nada a ver com você, professor - Ele se virou para o Eric que já esperava perto da saída - Mas o Frederik e as meninas estão sob a minha responsabilidade e da Natália com a supervisão do Evandro. E faço questão que ele as deixe em casa em segurança.
- Claro, não apenas entendo como também concordo - Eric afirmou.
- Tá bom, foi só uma sugestão - Gabriele deu de ombros e saiu de cima da mala, arrastando pelo suporte até a saída. Alívio me definia.
***
A viagem de volta para casa, embora não tenha sido de helicóptero e que ganharíamos mais tempo, foi tranquila. Evandro, Frederik, Melissa e eu pegamos alguns momentos de trânsito lento na estrada mas nada cansativo.
Chegamos em frente ao meu prédio e William parou com o carro com a Natália, a avó Raquel e os irmãos. Nos despedimos e após ele ver com os próprios olhos que estávamos em casa, seguiu seu caminho com a família. Talvez para não levantar suspeitas, Eric foi direto para casa.
- Então é isso, meninas. Finalmente em casa - Evandro disse, enquanto retirava nossas malas e sacolas de compras do porta-malas do carro com a ajuda do Frederik - Seus pais sabem que estão de volta?
- Ah, isso não falamos pra vocês. Eu e a Ni estamos chegando de surpresa. Eles nem imaginam.
- Vão tomar um susto.
- Eu estou morrendo de saudade da minha cama - suspendi minha mala para a ponta da calçada e pus minhas sacolas no ombro.
- Vocês querem ajuda?
- Não Frederik, obrigada! - Eu e a Meli damos conta.
- Se quiserem, podemos fazer alguma coisa neste fim de semana. Antes das aulas recomeçarem.
- Só se for no domingo, não é Ni?
- Sim, é uma boa.
- Então vamos nos falando - ele deu um beijo no topo da minha cabeça e da Melissa.
- Obrigada, Evandro. Por tudo - agradeci e o meu meio sorriso junto da nossa rápida troca de olhares não era apenas por ele nos deixar seguras em casa.
- Só cumpro o meu trabalho que é ficar de olho em vocês - e piscou pra mim.
- Tchauzinho, meninos.
Melissa terminou de se despedir e entramos no prédio. Chegando no nosso andar, trocamos um abraço e cada uma seguiu para um lado do corredor.
- Chegueeeei! - falei no exato instante em que entrei com a mala arrastando pela sala. Ela estava vazia então imaginei que meus pais estivessem no quarto deles.
Segui pelo corredor até o meu quarto e desabei a bagagem, as sacolas pelo chão e me sentei na cama, soltando minha mochila dos ombros. Foi quando finalmente senti todo o cansaço de uma viagem de carro que durou quase três horas.
Estranhei não ouvir nenhuma voz do corredor e então fui até o quarto dos meus pais. Nem sinal deles e muito menos no escritório do meu pai ao lado.
- Eles não tinham como saber que eu iria chegar...
Voltei para o meu quarto e percebi o meu celular tocando dentro da mochila. Quando olhei a tela, era a chamada da minha mãe.
- Oi, mãe!
- Anjo da minha vida! Eu e o seu pai estamos aqui na Cecília e no Henrique. Vem pra cá!
- Tá bom.
Com o aparelho nas mãos, saí ligeira e fui para a casa dos nossos amigos e vizinhos. A porta já estava aberta e vi minha mãe em pé me esperando.
- Mas que surpresa linda, meu amor! - trocamos um abraço apertado que poderia durar para sempre - Pensei que vocês só chegariam de noite.
- Ní, chegamos na hora boa! - Ouvi a Melissa falar e quando olhei, ela já estava na mesa de jantar se servindo de lasanha à bolonhesa que estava em uma travessa gigantesca junto de uma salada verde em outro recipiente.
- Realmente, eu também não esperava essa surpresa - Dona Cecília se aproximou e me deu um beijo no rosto - Que horas vocês saíram de lá?
- Foi um pouco antes das dez horas. Tomamos o café da manhã e voltamos de carro - respondi e fui até o meu pai que conversava com o Felipe e o pai no sofá da sala.
- Olá - sorri para os três.
- Tudo bom, Nívea? - me aproximei do Felipe e ele me beijou no rosto.
- Olá, minha querida.
- Salut, mon chéri ! - meu pai deixou a taça de vinho na pequena mesa de centro e me abraçou apertado - Gostou da viagem?
- Muito, papa. Búzios é uma cidade linda.
- Esse rosto bronzeado que o diga.
- Olha pra mim, Nívea - minha mãe se aproximou e segurou o meu rosto analisando cada detalhe - Estou achando você vermelha demais!
- Eu usei protetor solar todos os dias, mãe. Eu juro. A Melissa é que merece uma bronca - apontei na direção dela que já estava sentada à mesa, devorando uma fatia de lasanha. Ou talvez duas. Seu rosto estava muito rosado de Sol.
- Nada que um bom banho gelado não resolva! - e deu uma garfada generosa na massa – Mesmo eu preferindo banho quente.
- Fique à vontade para se servir, Nívea. Eu me arrisquei na cozinha hoje e convidamos os seus pais para almoçar.
- Obrigada, Dona Cecília. Pai, por favor, deixa eu beber só uma taça de vinho junto da lasanha - o abracei apertado e ele suspirou fundo.
- Não estamos em dezembro, estamos?
- Uma taça! E cumpro a mesma regra que eu e os meus primos cumprimos na casa da vovó.
- Só uma taça, Jacques - minha mãe me apoiou - Fica ótimo com a lasanha e a Nívea não vai sair hoje.
- Não saio de casa! Prometo!
Meu pai pegou uma taça na pequena mesa e fez questão de ele mesmo servir com a quantidade certa para mim e me entregando em seguida.
- Oba!
- É um tinto bem leve, combinou bem com o almoço - Senhor Henrique explicou.
- Mas eu faço questão de registrar este momento histórico - Felipe pegou o seu celular do bolso da sua bermuda azul marinho e apontou na minha direção - Olha pra cá, Nívea.
Dei um sorriso erguendo a taça que possuía vinho tinto um pouco abaixo da metade e ele tirou mais de uma foto.
- Envia todas pra mim, Lipe! - pedi e fui para a mesa me servir com a taça em mãos.
- Agora mesmo!
Me sentei de frente para a Melissa, colocando meu celular e a taça na mesa e usando uma espátula de cozinha, me servi com uma fatia.
O queijo derretia junto da carne moída com o presunto e o aroma fez um rebuliço no meu estômago. Felipe se sentou na ponta e ficou de braços cruzados, com um sorriso irônico.
- O que foi?
- Posso enviar para você sabe quem? – perguntou em voz baixa.
- Pode. Não tenho motivo para esconder nada.
Felipe enviou a foto. Peguei os talheres que estavam na mesa e quando cortei a lasanha para dar a primeira garfada, meu celular começou a vibrar e na tela era o emoji de coração. Por sorte ele estava no silencioso e os meus pais conversavam com os donos da casa, alheios a nós três.
- Eric surtando é a minha religião - Melissa sorriu e bebeu um gole de Coca-Cola - Vai atender, amiga?
- Não. Deixa tocar. Não estou fazendo nada de errado, não estou na rua e o meu pai deixou. É apenas uma taça de vinho.
Comecei a comer tranquilamente, deixando o aparelho vibrar. Eric sabia deste meu hábito quando eu passava minhas férias de fim de ano em Lyon e eu não iria mais ficar tensa com a reação dele.
E mais uma página da minha insegurança era deixada para trás.
***
As portas da varanda estavam abertas e era uma noite onde não havia um sopro de vento. Abafado mas não estava desagradável. A luz do poste na rua iluminava o piso de madeira e o móvel novo ocupava aquele espaço até a cama de casal a qual eu já dormia nas noites de tantos sábados que eu perdi a conta.
Um divã verde escuro de pouco mais de um metro com braço esquerdo e muito confortável, era onde o Eric estava deitado e relaxado comigo por cima do seu corpo. Nus. Exatamente como estávamos dias antes. Acolhida com o meu rosto perto do dele, sentindo o seu abraço e o cheiro de suor e perfume masculino.
- Gostei de ficar aqui... - dei um beijo na sua bochecha - Você tem bom gosto para móveis.
- Luciana está se desfazendo de algumas coisas do apartamento dela e postou a foto deste divã.
- E você comprou?
- Mesmo sem condições, comprei. Ela vendeu pra mim pela metade do preço e de brinde me deu o abajour que está ali do lado da nossa cama.
- Achei ele lindo também. E essa fase dela de desapego tem alguma razão?
- Tem. Ela planeja se mudar de lá ainda este ano.
- Sério?
- Aham. Quer morar em um apartamento maior mas pretende ficar no mesmo bairro.
- Entendi...
- E você?
- O que tem eu?
- Ansiosa? As aulas agora começam pra valer...
- Se você diminuir o tamanho das provas fica tudo muito mais fácil - brinquei e rimos juntos.
- Você é o meu maior orgulho nestes anos todos de profissão.
- E se eu tirar uma nota ruim?
- Continuará sendo o meu orgulho.
- Tem certeza? - olhei no seu rosto e Eric fez o mesmo.
- Tenho – ele deslizou o dedo médio bem devagar pela curva do meu nariz, observando cada detalhe do meu rosto e fez o mesmo pelos meus lábios.
- Prometo que vou pensar na minha graduação.
- Lembra do que nós conversamos? Pensar com calma sobre isso. Sem que você não se sinta pressionada.
- Tá bom.
- E nada de vinhos. A sua sorte é que eu te amo tanto que não senti raiva por muito tempo depois de ter visto a foto.
- Eu só queria que você entendesse que os vinhos são uma tradição da família Martin.
- Eu entendo. E quero que você entenda que eu não suporto bebida alcoólica.
- Te juro que só bebi aquela taça. E quando eu bebo, não saio de casa.
- Isso é para me deixar tranquilo? – ele ajeitou o seu corpo e me afastei um pouco, retornando à posição que estávamos, recostando minha cabeça no seu ombro e seus braços se envolveram nos meus, unindo nossas mãos abertas como se fôssemos rezar.
- Sua mão tem o dobro do tamanho da minha – e comecei a rir, observando a diferença.
- É... – ele suspirou, massageando um dos meus dedos da mão esquerda de cada vez – Sua mão é bem pequena... – E continuou a massageá-los devagar.
- Podemos ficar deitados a noite toda aqui?
- É demais pra minha coluna, ma petite - Eric riu de canto e eu me virei de frente pra ele conseguindo ver o seu rosto perfeito graças à luz do poste - Então só mais um pouco.
Acariciei os fios do seu cabelo e trocamos um beijo calmo que fez formigar o meu ventre e esquentar gostoso entre as pernas, sentindo a língua do Eric brincando com a minha. Com ele ao meu lado, mais do que nunca eu me sentia confiante para seguir em frente e começar pra valer o meu último ano letivo do Ensino Médio.
Continua...
Nota da autora:
Não sei dizer quantos minutos fiquei lendo a palavra acima pois o significado dela na minha história é a finalização de mais um capítulo para se iniciar o próximo.
Por diversos momentos pensei que nunca chegaria até ela. O "continua..." deste capítulo tem algo muito mais profundo do que simplesmente continuar a história em si.
Quem me acompanha no Instagram sabe que 2023 se tornou, sem a menor sombra de dúvida, o pior ano da minha vida. De Março até hoje, eu estou vivendo um dia de cada vez pois a dor da perda, a dor do luto nunca é fácil para ninguém. A pessoa que me trouxe ao mundo com certeza está cuidando de mim onde quer que esteja. Não tem um só dia que eu não pense nela nestes quase cinco meses de muita saudade. Não é fácil e nunca será seguir em frente. Porém, é necessário.
E como fazer isso? Como seguir em frente? Uma das formas foi retomar bem aos poucos, esta história que eu amo tanto. Desde o último capítulo postado em janeiro, eu já estava com bastante coisa escrita mas a partir de fevereiro minha vida virou de cabeça para baixo culminando no inevitável no mês seguinte. E para piorar, o meu perfil na plataforma laranja de romances bastante conhecida na Internet foi banido em abril sem nenhuma explicação. O que me desmotivou ainda mais a voltar a escrever naquele momento. Ironia ou não, eu tinha bastante fresco na minha memória toda a sequência das cenas deste capítulo conseguindo reescrevê-lo e incrementá-lo com mais detalhes.
Não foi fácil, foram vários dias mergulhada na tristeza, desmotivada, semanas e semanas sem escrever uma única linha mas eu sabia que iria voltar pois era algo que eu precisava fazer por mim em forma de terapia e principalmente por vocês que me acompanham desde o início e amam esta história. Não sei se felicidade é a palavra adequada para definir a conclusão do capítulo. Sendo assim, prefiro dizer que estou aliviada.
Capitulo V?
Não irei mais trabalhar com prazos para postagem dele e nem dos próximos, pois estou em uma montanha-russa emocional muito grande. Vocês foram tão compreensivos comigo neste hiato de seis meses entre o terceiro e o quarto capítulo e eu espero que continuem assim. Muito obrigada mesmo. Tem dias que o gás me domina e escrevo desenfreadamente assim como eu posso passar mais de um mês onde sequer eu abro o word para desenvolver um parágrafo que seja. É exatamente assim a minha rotina atual de escrita.
No entanto, não se preocupem. Jamais irei abandonar esta minha terapia em forma de palavras. Será um dia de cada vez, um parágrafo de cada vez. E quando surgir mais um "Continua..." ele terá o significado de que estou indo muito bem comigo mesma, certo? Posso contar com vocês nessa caminhada sem pressa?
Pois muito bem...
Apesar de tudo isso que me aconteceu, vocês que comentam aqui e estão sempre em contato comigo no
/aescritora_ conseguiram a proeza de me arrancarem momentos de risadas. Encerrei o capítulo três deixando vocês em "surtos circuitos" e então surgiram os palpites sobre o final dele, digno de congelamento da novela Avenida Brasil.
Sendo assim, eu pergunto: o que levaram a maioria de vocês acharem que foi o Frederik o responsável pelo flagrante? Sério mesmo, qual foi o critério que os levaram até ele?
Nessa minha retomada aos poucos que se iniciou, acho que em abril, eu lia as teorias vinda por mensagens e me pegava rindo. Somente três leitores acertaram quando lancei pela primeira vez a pergunta.
Evandro e Luciana. Será que dá match? 😉
Vocês leram ali, na cena final do bloco, que a Luciana menciona a minha ausência no grupo de amigos da casa alugada em Búzios. Sim, a pessoa que vos escreve tem uma amiga de infância que mora no RS há alguns anos, casada e com duas filhas.
Espero que o capítulo tenha ficado ao gosto de vocês. Apesar de tudo que se passa comigo, cada momento dele foi escrito com muito esforço, dedicação e carinho.
Contato: a_escritora@outlook.com
Instagram: /aescritora_