Não saí da cama para ajudar na ordenha naquela manhã. Fiquei deitada, chorando por um tempo. Levantei-me e fui para a cama de Clara; fiquei ali, deitada, sentindo seu cheiro e pensando em como seriam os próximos dias sem ela. Meu coração doía muito.
Mas a vida continuava, e eu tive que levantar antes que minha mãe voltasse e me visse naquela depressão. Fui à cozinha e tomei um café. Graças a Deus, não vi ninguém; não queria conversar. Saí de casa e fui direto pegar a égua branca. Logo estava saindo em direção ao rio, onde fiquei quase o dia todo.
Quando voltei para casa, tomei um banho e fui jantar. Minha mãe estava jantando, mas logo que me sentei, ela se levantou e disse que estava cansada e iria dormir. Não comi quase nada e fui me deitar. Por mais que quisesse dormir, não conseguia; estar ali, naquele quarto sem Clara, era torturante.
Não sei a hora em que dormi, mas foi bem tarde. Quando o despertador tocou no dia seguinte, acordei com os olhos ardendo de sono. Levantei-me; ficar ali era pior. Eu precisava me distrair. Enfiei a cara no trabalho nos dias seguintes, evitava ficar sozinha para não lembrar de Clara, mas era quase impossível. À noite, quando ia dormir, era pior ainda, porque tudo dentro daquele quarto me lembrava ela.
Chegou o final de semana e minha tristeza diminuiu um pouco. Clara disse que iria ligar. Fiquei o tempo todo dentro de casa ou ao redor para não correr o risco de minha mãe não me achar quando ela ligasse. O sábado se foi, o domingo já estava acabando e, para meu desespero, o telefone só tocou uma vez e não era ela, porque minha mãe não me chamou.
Antes de dormir, fui ao quarto da minha mãe e perguntei se Clara tinha ligado. Ela disse que não. Perguntei se sabia o porquê e se, por acaso, tinha ligado para Clara para saber notícias. Ela disse que tentou, mas não conseguiu a ligação e mandou eu ir para o quarto porque queria dormir.
Saí dali arrasada. Clara disse que ligaria, mas não ligou. Pensei que talvez ela tenha tentado, mas por algum motivo a ligação não deu certo, como aconteceu quando minha mãe tentou ligar.
Talvez ela ligue no meio da semana, mas não ligou. Minha mãe disse que tinha tentado ligar outras vezes, mas não deu certo. Então, ligou para o trabalho da prima dela, que era a dona da casa onde Clara estava, e a prima disse que eles não tinham mais telefone em casa, que o marido tinha desativado a linha, mas que Clara tinha chegado bem e estava tudo bem com ela.
Fiquei aliviada por ter notícias de Clara, mas triste por saber que agora seria muito difícil a gente conversar. Provavelmente, nas próximas semanas ou no início da outra, chegaria a carta dela.
Mais uma vez, os dias passavam devagar. Era torturante para mim aquela espera; não dormia nem comia direito. Mas a semana passou, depois o final de semana, e na quarta-feira minha mãe saiu para a cidade depois do almoço, mas não falou nada comigo. Perguntei a Ana se sabia o que minha mãe tinha ido fazer, e Ana disse que só sabia que ela ia ao escritório do advogado dela.
Fiquei muito feliz porque provavelmente ela foi buscar as cartas de Clara. Como os correios não entregavam cartas na fazenda, minha mãe dava o endereço do advogado dela para que suas correspondências fossem entregues. Ele, além de advogado, era um amigo antigo da família e de total confiança.
Fiquei o resto do dia olhando para a entrada da fazenda. O sol já estava quase se pondo quando vi de longe o carro da minha mãe apontar na estrada de terra. Saí da porta e sentei no sofá da sala. Ela entrou com algumas sacolas em uma mão e uns papéis na outra. Minha ansiedade era enorme, mas não falei nada. Ela foi até a cozinha e, depois de alguns minutos, foi para o escritório. Fiquei ali esperando ela me chamar para entregar a carta de Clara, mas se passaram minutos, horas e nada dela me chamar. Por fim, ela saiu e foi para o seu quarto.
Não aguentei e fui atrás dela. Perguntei se Clara tinha mandado alguma carta. Ela disse que sim, que tinha acabado de ler e me mostrou um papel nas mãos. Disse que, se eu quisesse, poderia ler. Eu disse que não precisava. Então, minha mãe disse que Clara tinha mandado um abraço para todo mundo.
Perguntei se ela só tinha mandado aquela carta e minha mãe disse que sim. Agradeci, dei boa noite e fui para meu quarto. Antes de chegar na cama, minhas lágrimas já cobriam meu rosto. Ela não ligou, não escreveu a carta para mim. Eu não estava entendendo nada. Clara prometeu que ligaria, que escreveria. Por que ela não estava cumprindo sua promessa?
Chorei naquela noite. Juntou-se a saudade, a tristeza por ela não ter me mandado nada. Eu não sabia o que fazer. Depois de tanto chorar e ficar pensando em um monte de motivos para ela não ter me mandado uma carta, acabei adormecendo.
Acordei no dia seguinte, mas simplesmente não tive coragem de sair da cama. Era umas 9 horas quando minha mãe me chamou. Eu disse para ela entrar. Ela perguntou se eu não ia levantar. Eu disse que estava com uma cólica muito forte e que ia ficar na cama até melhorar.
Ela então disse que ia escrever uma carta para Clara e se eu queria mandar algum recado. Eu disse que era para mandar um abraço, como ela mandou para mim. Minha mãe se levantou e se foi. Eu poderia escrever uma carta e pedir para minha mãe enviar, mas se ela não me escreveu, algum motivo tinha. Então, resolvi ficar no meu canto até ver o que acontecia. Talvez ela me mande algo nas próximas semanas.
Mas não mandou. Só tive notícias de que ela mandou outra carta no fim do mês porque minha mãe disse que ela tinha escrito e mandado um abraço.
Os meses foram se passando. Eu me sentia sozinha porque não podia desabafar com ninguém. Uma tristeza foi tomando conta de mim. Eu mal sorria. Os poucos momentos de felicidade eram no meio dos peões ou cavalgando para algum lugar com Sebastião ou Jorge.
Patrícia notou minha tristeza e veio perguntar o que eu tinha, mas desconversei e disse que não tinha nada, que estava bem. Tenho certeza de que ela não acreditou, mas não insistiu. Todo domingo eu ia ao rio chorar e curtir minha dor. A saudade cada vez apertava mais.
Faltava uma semana para terminar o mês de junho daquele ano. Clara logo estaria na fazenda de férias e eu poderia matar minha saudade e ter as explicações que tanto buscava.
Na sexta-feira, acordei e segui minha rotina normal, mas quando voltei da ordenha, vi que o carro da minha mãe não estava na garagem. Fui à cozinha e perguntei a Ana se minha mãe tinha saído. Ana disse que ela saiu bem cedo para ir à rodoviária pegar o ônibus para a capital.
Como assim minha mãe viajou?!?
Perguntei a Ana se ela tinha ido buscar Clara, mas Ana disse que não, que ela levou umas malas e disse que ficaria o mês lá porque Clara não poderia vir passar as férias na fazenda. Aí minha mãe foi para lá ficar com ela.
Eu só não caí sentada com aquela notícia porque tinha acabado de me sentar para tomar um copo de café. Meu mundo caiu naquele momento. Perguntei a Ana por que minha mãe saiu assim de uma hora para outra e não me levou. Ana disse que não sabia, mas que minha mãe disse a ela que Clara ligou à noite avisando e que minha mãe resolveu ir de repente.
Eu nem terminei de tomar o café. Saí da cozinha para não chorar na frente de Ana. Não lembro muito o que aconteceu dali para frente, mas voltei a mim e estava sentada no chão debaixo de uma mangueira, chorando, e Patrícia abraçada comigo. Pensei em sair dali, mas precisava daquele abraço. Apertei Patrícia contra meu peito, coloquei meu rosto sobre seus ombros e não disse nada; apenas chorei muito.
Depois de um bom tempo ali, chorando abraçada com minha amiga, me afastei, enxuguei meu rosto e disse:
Ceci— Obrigada pelo ombro.
Patrícia— Amigos são para essas coisas. Você está melhor? Te vi saindo da casa igual uma doida e vim atrás de você.
Ceci— Na verdade, não estou não, mas vou ficar. Não se preocupe.
Patrícia— Quer conversar sobre o que está acontecendo com você?
Ceci— Queria, mas não posso. Me desculpe, mas é um problema que não posso dividir com ninguém.
Patrícia— Eu sei qual é o seu problema, mas não vou insistir. Se algum dia você achar que sou confiável a ponto de me contar a verdade, estarei por aqui.
Ceci— Duvido que você saiba, mas não é que não te ache confiável, é que realmente não posso falar.
Patrícia— Eu sei sim, Ceci. Eu vi os olhares de vocês duas. Vocês podem ter enganado os outros, mas a mim não.
Não sabia o que dizer depois que ela disse aquilo. Entrei em choque, acho. Ela percebeu e disse:
Patrícia— O segredo de vocês duas está seguro comigo. Pode ficar tranquila. E não precisa falar nada. Só queria deixar claro isso. Estarei por aí quando quiser conversar.
Ela disse isso, se levantou e saiu andando, e eu fiquei ali sentada no chão, sem saber o que fazer.
Pensei bem e resolvi não confirmar nada para Patrícia. Se ela tocasse no assunto de novo, eu me faria de boba e negaria até o fim. Depois que me acalmei, voltei para casa. Não adiantava mais chorar; Clara não ia vir e, mais uma vez, ela quebrou uma promessa que fez.
Não chorei mais aqueles dias. Apesar da tristeza que sentia, acho que não tinha mais lágrimas para chorar, e também não ia resolver nada.
A semana foi passando. Na quinta-feira, fui surpreendida ao ver minha mãe chegando de carro. Me deu uma pequena esperança de poder ver Clara com ela, mas logo que o carro chegou mais perto, minhas esperanças se foram. Minha mãe estava sozinha.
Ela desceu do carro e foi para dentro de casa. Eu fui atrás dela. Quando entrei, a achei no quarto guardando as malas. Entrei e perguntei o que tinha acontecido para ela voltar antes do previsto e se Clara estava bem.
Mãe— Não que seja da sua conta, mas ela está ótima.
Ceci— Nossa, mãe! O que foi isso? Eu só perguntei, me desculpe.
Mãe— Você é muito boba, Maria Cecília! Você acha que não vejo você aí triste pelos cantos por causa da Clara?!?
Ceci— É que sinto falta da minha irmã.
Mãe— Pois ela não está nem aí com você! Bom, vou te dizer porque voltei antes: sua irmã brigou comigo e me mandou embora, Ceci. Sabe por quê?
Ceci— Não faço ideia, mãe.
Mãe— Ela falou que iria estudar, mas em vez disso arrumou um namorado. Eu não queria saber dela namorar antes de terminar os estudos, mas ela não me ouviu. Ainda brigou comigo. Sua irmã não está nem aí pra mim nem para você. Esqueça que ela existe e vai viver sua vida.
Só virei as costas e saí. Eu não podia acreditar. Clara estava namorando. Por isso não ligou, não escreveu. Ela não queria saber de mim. Ela me traiu, me fez de boba. Como eu pude ser tão idiota assim?!?
Continua…