Eu tentei conversar com minha mãe, mas ela só chorava, e eu comecei a chorar também. Não me lembro de quem desligou. Algumas coisas depois daquela ligação ficaram em branco na minha mente. Só lembro que, no dia seguinte, estava chorando dentro de uma capela, me despedindo do meu pai. É muito difícil aceitar uma perda tão grande. Eu e minha mãe nos abraçamos; naquele momento, esquecemos nossos problemas e nos apoiamos.
Gustavo não entrou na capela. Ele foi, mas ficou do lado de fora do cemitério. Disse que não queria causar problemas, e como minha mãe estava lá, isso era bem possível. Depois que o corpo foi enterrado, fui saindo do cemitério e, de longe, vi Gustavo conversando com uma mulher. Do nada, minha mãe se aproximou e parecia falar algo para Gustavo, mas a mulher a abraçou e afastou minha mãe dali. Elas seguiram para um carro, entraram e saíram.
Quando cheguei, perguntei a Gustavo o que tinha acontecido. Ele disse que não era nada, para deixar pra lá, mas eu insisti. Então, ele contou que estava ali me esperando e que Stella apareceu, oferecendo 10 mil reais para ele ir para a Europa com ela e me deixar para trás. Meu sangue ferveu; eu queria ir à casa da minha mãe e brigar com aquela vagabunda. Ela era muito cara de pau!
Mas Gustavo me acalmou. Disse que eu já estava passando por muita coisa e que isso era perigoso, pois eu estava grávida. Acabei concordando com ele e fui para casa. Naquela noite, mal dormi. Eu ainda não acreditava que nunca mais veria meu pai. E, ainda por cima, Stella tentou de novo me roubar Gustavo. Meu ódio por ela era imenso; nunca pensei que poderia odiar tanto uma pessoa.
Os dias foram passando e a saudade do meu pai doía muito. Achei que minha mãe me ligaria depois que me viu grávida e que ficamos juntas no velório, mas ela não ligou. Provavelmente, Stella tinha feito a cabeça dela contra mim de novo.
Depois de uns 15 dias da morte do meu pai, Gustavo veio me perguntar se algum advogado tinha me ligado para falar da herança. Eu disse que não e que não estava preocupada com isso. Então, ele disse que era para eu pensar melhor, porque agora meu pai não poderia nos ajudar mais e que, como minha mãe não gostava dele, corríamos até o risco de sermos expulsos daquele apartamento.
Eu não tinha pensado nisso, e depois do que houve, não duvidei de que minha mãe faria isso para prejudicar Gustavo. Mas, depois, pensei bem e cheguei à conclusão de que minha mãe nunca me colocaria na rua grávida. Ela era nervosa como eu, mas não era uma pessoa má a ponto de fazer isso.
Fui falar com Gustavo e ele ficou meio nervoso por eu não ir atrás da minha herança. Eu me assustei, mas ele disse que só estava pensando no futuro do nosso filho e que era um direito meu também receber minha parte. Eu disse que iria pensar no assunto.
Na quarta-feira, recebi uma ligação de um número que eu não tinha. Era o advogado do meu pai, dizendo que precisava que eu fosse até seu escritório para assinar uns papéis e receber minha herança. Marquei com ele para o outro dia, às 14 horas.
Gustavo foi me levar. Quando chegamos, a secretária nos encaminhou até a sala do advogado. Eu o conhecia; já tinha visto ele na minha casa várias vezes. Ele pediu para eu sentar e explicou que meu pai deixou uma quantia de dinheiro para mim e que precisava do número da minha conta para fazer a transferência e da minha assinatura confirmando que recebi o dinheiro.
Gustavo perguntou se era só o dinheiro, porque meu pai tinha a empresa e alguns apartamentos, fora a mansão onde morava e o carro. Eu disse que a mansão era da minha mãe e não dos dois. O advogado confirmou e disse que meu pai vendeu tudo antes de falecer. Gustavo perguntou como assim ele tinha vendido tudo. O advogado disse que era tudo mesmo; a empresa, carros e todos os apartamentos, inclusive o que eu estava morando. Gustavo perguntou se o dinheiro que ele deixou era o que me tocou na parte do que ele vendeu. O advogado disse que não, que meu pai vendeu tudo para pagar as dívidas da empresa, e o que restou ele deixou para mim.
Gustavo perguntou de quanto ele estava falando. O advogado disse que era 10 mil reais. Gustavo fechou a cara na hora. Eu, que até o momento estava calada, perguntei se eu tinha que deixar o apartamento. Ele disse que não, que a nova proprietária deixou eu continuar morando lá do mesmo jeito. Fiquei curiosa e perguntei quem era a nova proprietária. Ele respondeu que era a senhorita Stella xxxxx xxxxx xxxcc.
Eu não podia acreditar! Como assim meu pai vendeu tudo para aquela mulher?! Justo para ela? E como assim meu pai teve que vender tudo para pagar dívidas?! Meu pai sempre tocou muito bem a empresa; não é à toa que ele se tornou um dos maiores da sua área.
Perguntei ao advogado se ele sabia quais dívidas eram essas que meu pai tinha. Ele disse que meu pai levou um prejuízo muito grande em uma obra que pegou para fazer. Ele teve que fazer um empréstimo no banco para cobrir o prejuízo, mas os juros eram muito altos e acabou que virou uma bola de neve. Se ele não vendesse, teria perdido tudo de qualquer maneira; não havia mais o que fazer.
Passei o número da minha conta, assinei os papéis e o dinheiro foi transferido na hora pelo advogado. Saí dali com a cabeça a mil. Não fazia ideia de que meu pai estava endividado, e eu, em vez de ajudar, causei mais prejuízo indo morar em um apartamento que ele podia ter alugado, fora as despesas que ele pagava para mim.
Gustavo parecia muito irritado com aquilo. Quando chegamos em casa, pedi ajuda com umas coisas na cozinha e ele foi bem estúpido comigo; nem parecia o homem que conheci. Mas deixei pra lá; ele devia estar mal com isso tudo também.
À noite, Telma chegou e os dois ficaram conversando um tempão no quarto dela. Depois, ela veio no meu quarto e me acalmou um pouco, dizendo que Gustavo estava chateado porque provavelmente Stella tinha passado a perna no meu pai para conseguir a empresa dele. Eu tinha me esquecido desse detalhe: aquela mulher agora era dona de tudo que meu pai construiu a vida inteira.
Aquilo me deixou bastante irritada. Telma, como sempre, tentou me acalmar. Depois, saiu e trouxe um copo com água e um comprimido para eu beber. Disse que era um calmante fraco e que já tinha olhado e ele não era perigoso para gestantes, porque era natural. Eu bebi e me deitei. Ela ficou ali comigo e acabei adormecendo.
Não sei por quanto tempo dormi, mas quando acordei já era de manhã. Quando fui olhar a hora no meu celular, ele não estava onde deixei. Olhei do lado e não vi Gustavo. Olhei para frente e meu guarda-roupa estava com as portas abertas e todo bagunçado. Eu não estava entendendo nada. Levantei meio grogue; o calmante, pelo jeito, não era tão fraco como Telma falou. Fui até o guarda-roupa e as coisas do Gustavo não estavam lá. Também senti falta do meu porta-joias e de algumas roupas minhas, as mais caras.
Saí do quarto e vi a porta do quarto de Telma aberta, a cama toda bagunçada, o guarda-roupa vazio. Comecei a pensar besteira, mas não podia ser isso. Fui para a sala e vi que meu notebook não estava onde ele ficava. Aí vi um bilhete em cima da mesa de centro e o anel de noivado de Gustavo. Peguei e me sentei para ler.
Eu reconheci a letra; era de Telma. Ela pedia desculpas por ter levado minhas coisas, mas os dois não poderiam sair de mãos abanando dali, porque perderam muito tempo comigo. Disse que até gostava de mim, apesar de tudo, e se despediu, pedindo para eu não chamar a polícia, porque se não, o pai do filho que eu estava esperando iria para a cadeia.
Eu não podia acreditar! Gustavo tinha fugido e levado tudo de valor que eu tinha. Aí me lembrei da minha carteira e do meu cartão de crédito. Levantei e fui procurar minha bolsa. O dinheiro que eu tinha na bolsa e meu cartão de crédito tinham sido levados também. Eu já chorava nessa hora. Fui na cozinha beber um copo de água e, no meio do caminho, senti uma dor muito forte na barriga.
Eu mal conseguia me mexer, mas consegui, com muita dificuldade, chegar na sala. Pelo menos o telefone fixo ainda estava ali. Liguei para o único número que eu sabia de cor. Quando atendeu, eu só consegui dizer:
Karla— Mãe, me ajuda, pelo amor de Deus!
Depois disso, desmaiei.
Acordei em uma cama de hospital. Olhei para o lado e minha mãe estava ali sentada. Quando me viu, já pediu para eu ficar calma, que estava tudo bem.
Karla— E meu filho, mãe?
Mãe— Ela está bem, não se preocupe.
Karla— Graças a Deus, mãe! Você disse "ela"?
Mãe— Sim, você não sabia?
Karla— Não, mãe, eu ainda não sabia.
Mãe— Desculpe, eu pensei que soubesse que era uma menina.
Karla— Não tem problema, mãe; eu queria mesmo uma menina.
Mãe— Pois é, é uma menina e não aconteceu nada de errado com ela. A ambulância chegou a tempo de salvar vocês duas.
Karla— Mãe, o Gustavo me roubou, levou tudo.
Mãe— Filha, eu sei, mas esquece isso agora, tá? O importante é que você e sua filha estão bem.
Karla— Há quanto tempo estou aqui, mãe?
Mãe— Faz três dias. Você perdeu um pouco de sangue; os médicos te colocaram em coma induzido, fizeram todos os exames e, graças a Deus, o bebê estava bem. Aí foi só esperar você se recuperar. Você recebeu um pouco do meu sangue também.
Karla— Muito obrigada, mãe! Você salvou nossas vidas. Eu te amo, mãe. Me desculpe por tudo que falei, por não te ouvir quando tentou abrir meus olhos.
Mãe— Vamos esquecer isso, filha; já passou. E eu também amo muito você!
Começava ali uma nova etapa da minha vida. Voltei a morar com minha mãe, mas colocamos uma regra: nunca falar sobre Stella. Minha mãe, pelo jeito, amava ela e eu a odiava. O que Gustavo fez não apagou o que ela fez; para mim, são farinha do mesmo saco.
Minha filha nasceu com muita saúde, uma menina linda. A batizei com o nome de Sophia. Meu coração estava partido; eu ainda amava Gustavo e sentia falta dele, mesmo depois de tudo que ele fez. Eu não o queria de volta, mas infelizmente o sentimento ainda estava ali no meu coração.
Assim que Sophia nasceu, recebi duas compras enormes: uma de um mercado e outra de uma loja de roupas e acessórios para crianças. Era muita coisa mesmo! Achei que era minha mãe que tinha comprado, mas ela disse que não era ela, até porque ela não tinha dinheiro. Então, pensei que só podia ser Gustavo; pelo menos na filha ele pensou.
O ano passou e eu ia voltar a estudar. Minha mãe contratou uma babá, já que ela iria voltar a trabalhar para ajudar a manter as despesas da casa. Eu não tinha mais um centavo. Sabia que pagar meus estudos, contratar uma babá e manter a casa iria ficar muito caro, mas minha mãe falou que tinha suas economias e que, com mais o que iria ganhar, dava pra bancar tudo.
Assim, voltei para a faculdade depois de um ano perdido. Mal eu sabia que ali conheceria uma pessoa muito especial que mudaria minha vida!
Continua…
Criação: Forrest_gump
Revisão: Whisper