CAPÍTULO VI
*** ERIC VIANA ***
Levo a taça de vinho a boca, precisando de algo para acabar com a secura que tomou conta dela enquanto vejo o maldito homem desfilar seus passos lentos até a cozinha. Lindo, como sempre, lindo. Diferente de mim que me esforcei para estar em meu pior, Gustavo parece ter se esforçado para estar em seu melhor.
A calça jeans e escura abraça as pernas grossas e musculosas, a camiseta fina, de malha branca, envolve seu peitoral definido, deixando boa parte de seus braços fortes expostos e delineando perfeitamente as costas largas e a barriga que, puta merda! É uma perdição para os olhos.
Seus cabelos estão penteados para trás, e até as veias de seu pescoço estão indecentes hoje. Tudo nele me atrai e desconcentra, mas eu estava exausta da figura pateticamente passiva que me tornava todas as vezes que me via diante dele.
As palavras ditas parecem ter arrancado um imenso peso de mim, mas nada fizeram para diminuir ou aliviar o desejo que sinto por ele. Não sei se é o fato de estar em seu apartamento, aquele onde sei que ele faz miséria de caras como eu, se é a mesa tão cuidadosamente posta para dois, ou se é, simplesmente, a forma como ele olha para mim.
Mas toda a minha pele está quente desde o segundo em que coloquei meus pés aqui dentro e, mesmo antes do meu rompante de sinceridade, respirar já era uma tarefa difícil. Ele vira o rosto, olhando-me por cima do ombro e sorri.
Mordo o lábio, outra vez, precisando de algo para me concentrar. Ele volta a concentrar sua atenção na bancada diante de si, e a sensação que tenho, quando seus olhos me deixam, é ambígua. Sinto-me libertado, e, ao mesmo tempo, abandonado.
Expiro profundamente e tão baixinho quanto é possível. Um jantar, Eric! Você já deixou claro que não está disposto a ceder.
Vocês comem, ele assina a porcaria do papel, e pronto! Resolvido! Tudo volta a ficar em paz, e você ainda vai ter tempo de conseguir um encontro para o dia dos namorados. Torço os lábios para o pensamento, porque, se há algo certo, é que eu não quero arrumar um encontro para o famigerado dia. Fecho os olhos, apertando-os.
Ao abri-los, deixo que passeiem novamente pelo ambiente ao meu redor, descobrindo-o. O apartamento se parece muito com o meu, mas é maior. Os móveis são planejados e sofisticados, fazendo com que eu me pergunte se já estavam aqui quando Gustavo o comprou. Não faria sentido que ele tivesse mobiliado o apartamento apenas para demoli-lo depois, não é?
Minha atenção é atraída pela imensa televisão pendurada em uma das paredes e isso não me espanta, é claro que ele teria algo assim. De novo, a sensação de conhecê-lo me assalta, e expulso-a. Porque ela é enganosa e serve como justificativa para atitudes que eu não estou disposta a tomar. Continuo minha observação silenciosa, e, olhando para o espaço dele, posso descobrir algumas coisas.
Gustavo gosta de basquete. A camisa autografada emoldurada em uma das paredes deixa isso evidente, e se sozinha ela não fosse o suficiente, as bolas expostas como itens decorativos, seriam. A decoração da casa é minimalista e masculina. O sofá escuro, espaçoso e aparentemente muito confortável, é convidativo, o tapete felpudo me deixa louco de curiosidade para colocar meus pés nele, e o imenso quadro com uma Harley Davidson deixa claro outro dos gostos de Gustavo, uma motocicleta. Um típico gay com padrão de hétero.
— Gosta do que vê? -Pergunta, parado ao meu lado, observando meu escrutínio da sua casa. Inclino a cabeça, encarando-o, de baixo.
— Gosto. Só me surpreende que você tenha perdido tempo decorando um lugar que pretende demolir... -Ele sorri com o canto da boca e senta-se ao meu lado. Inspiro com força o cheiro incrível do que quer que seja o que está diante de mim. Olho para a travessa e minha boca se enche de água.
— Você cozinhou isso? - o sorriso cafajeste volta a tomar conta do rosto de Gustavo.
— Tudo o que você colocar na boca hoje foi tocado pelas minhas mãos, inclusive a sobremesa... -A pergunta era simples, mas, aparentemente, transformar qualquer coisa em algo com conotação sexual é um dom com o qual o homenzarrão a minha frente foi abençoado. Rio sozinho da piada, e ele sorri de volta, achando que suas palavras cheias de duplo sentido são a razão do meu sorriso.
Decido não esclarecer, se um sorriso é tudo o que vai ter de mim, deixe que tenha. Gustavo começa a servir meu prato e eu percebo que é uma massa coberta por molho branco. Passo a língua sobre os lábios, isso parece muito bom.
Ele deixa o prato a minha frente com um sorriso no rosto, como se soubesse exatamente o que estou pensando e começa a servir a si mesmo. Espero, como manda a educação, e, quando finalmente termina, o homem pega a garrafa de vinho, servindo mais nas duas taças.
Ele faz um sinal bobo com a mão, dizendo-me para fazer as honras e eu não me faço de rogado. Levo o garfo ao prato, e, depois de pegar uma quantidade educadamente aceitável, o levo a boca. Puta merda! Que delícia.
Olho para o homem imenso, quente, lindo, à minha frente, morta de vontade de choramingar. Porque não bastava tudo isso, e ele ainda sabe cozinhar? Isso é judiação com os homens que estão tentando não ter um caso com o vizinho.
Meus pensamentos devem estar estampados em meu rosto, porque Gustavo gargalha antes de começar a comer. Balanço a cabeça em negação, lentamente. Frustrado por ser obrigado a lidar com isso. Uma garfada, duas garfadas,silêncio confortável se instala enquanto me ocupo com a comida irritantemente divina, mas ele não dura muito.
— Meu nome completo é Gustavo Fortuna Maltez, eu tenho trinta e três anos, a idade de Cristo quando morreu, sou formado em Engenharia, adoro motos, luto box, sou viciado em café, e não tenho disposição para animais de estimação. Sou o irmão caçula, e tenho duas sobrinhas lindas, são gêmeas. -Despeja as informações sobre mim como se eu as tivesse pedido e, ao terminar de falar, faz uma pequena pausa apenas para sorrir cafajestemente para mim: ͞ Sua vez, agora fala de você... -pede, e eu ergo as sobrancelhas. Seu rosto assume uma expressão inocente que faz meus olhos se revirarem.
— Nós estamos fazendo uma troca, agora? -ironizo.
— Sempre estivemos! Você janta comigo, eu assino seus papéis... Eu falo de mim, você fala de você... -responde como se estivesse explicando que dois mais dois são quatro.
— O que você quer saber?
— Tudo! -surpreende-me. Prendo meus olhos aos seus, tentando entender a razão de tudo isso, porque a desculpa que ele deu não me convence. Gustavo é assumidamente um cachorro, todo esse esforço simplesmente não combina com a palavra ordinário estampada em sua testa.
— Por quê, Gustavo? -A pergunta é simples.
— Eu não sei... -responde, simplesmente, desarmando-me. Dobro os lábios para dentro da boca, ainda o observando. Expiro, e sem que me dê por mim, mordo o lábio em um reflexo nervoso. São seus olhos, que, subitamente se desviam para a minha boca, tornando-se mais escuros a cada segundo, que me dizem o que estou fazendo.
— Tenho vinte e seis anos... -cedo. Afinal, que mal poderia fazer dar algumas informações a meu respeito? ͞ Nasci e cresci em Madureira, na zona norte do Rio, e até os dez anos de idade, queria ser astronauta, mas mudei de ideia quando descobri que não poderia comer e sentir o gosto das coisas. E, bom, eu gosto muito de comer... -Seus olhos desviam para o meu prato, revirado e perto de ficar vazio. Seus olhos sorriem tanto quanto seus lábios.
— E você revira os olhos frequentemente... -Comenta e franzo minhas sobrancelhas.
— O quê?
— Você nem sempre percebe, né? Mas faz isso o tempo todo, uma autêntica criança mal criada...
Percebo o que estou fazendo, mas não me impeço de revirar os olhos.
— E quando desistiu de ser astronauta, decidiu que seria o quê?
— Poliglota! -ele gargalha.
— Ninguém te disse que isso não é uma profissão? -estalo a língua, porque sim, me disseram.
— Disseram, e por isso eu me formei em Biologia. Por que, Deus? Não sei! Já que meu diploma só serve como enfeite de gaveta desde que o recebi! Nem na parede ele fica. Ela é reservada pros meus certificados de línguas, e pra sua informação e de todo mundo que me disse que ser poliglota não era profissão, hoje, são elas que me sustentam! -balança a cabeça, ainda divertido, ainda sorrindo.
— E quantas línguas você fala?
— Seis!
— Seis? -questiona com as sobrancelhas quase alcançando as raízes dos cabelos e é a minha vez de rir.
— Sim, seis! Português, inglês, espanhol, francês, alemão e grego.
— Grego?
— Grego!
— Por quê? -Soa um pouco desconfiado.
— Porque é bonito, ué! -estreita os olhos para mim.
— Então fala alguma coisa em Grego! -Gargalho, é exatamente o mesmo pedido que ouço de qualquer pessoa que receba a informação de que sou capaz de falar grego.
— eísai epikíndynos. -digo devagar.
— O que você disse? -seus olhos brilham na expectativa pela resposta e cravo os dentes em meu lábio inferior.
— Se você descobrir, ganha um desejo! -Pisco.
— Quê? Peraí! Isso não é justo! -protesta: ͞ Você não avisou antes, eu não estava preparado! -Soa, ao mesmo tempo, indignado e pedinte: ͞ Eric! Qual é? Repete?
Gargalho.
— Mas é claro que não! Essa é a graça da coisa. O jogo é meu, eu faço as regras! -Sua cabeça balança lentamente e sob seu olhar, levo à boca as últimas garfadas do que ainda tinha em meu prato. Olho, desejoso, para a travessa diante de mim, porque, nossa! É uma massa simples, mas deliciosa com o molho de queijo e as iscas de carne, que eu tenho quase certeza serem filét mignon.
— Come, Eric... -Diz e eu dou de ombros, servindo-me de mais. No entanto, meu braço paralisa no ar, com o pegador a caminho do prato quando ouço sua próxima frase:
— Mas guarde espaço para a sobremesa! -estalo a língua.
— Não vai acontecer, Gustavo. -Termino de me servir e olho para ele.
— E por que não? -Seu corpo se aproxima do meu, envolvendo-me outra vez na maldita bolha que insiste em nos cercar toda vez que ficamos um pouco mais perto. Respiro fundo, seus olhos verdes me escrutinam, desafiam.
— Porque é uma péssima ideia! Um jantar não muda os fatos, você ainda não presta, e eu ainda sei disso.
— Então você só transa com homens que prestam? -Gargalho.
— Deus, não! Na maioria das vezes, eu nem tento descobrir, não preciso saber, não vou conviver com eles tempo o suficiente pra isso fazer diferença.
— Então por que eu recebo tratamento especial?
— Geralmente, as pessoas gostam de receber tratamento especial!
— Não quando isso me impede de estar dentro de você! -Abro a boca, chocado por ele continuar dizendo coisas assim como se estivesse falando sobre o clima.
— Você é sempre tão direto?
— Sou!
— E funciona sempre?
— Eu não costumo precisar pedir, muito menos insistir... Deslizo os olhos pela sua pele, pelos seus lábios, pelos braços fortes, pelo peitoral largo, pela barriga definida, e minha santa das yags em apuros, por uma ereção. Engulo em seco, não conseguindo parar de olhar.
— Pode ser toda sua, Eric... -Sussurra, finalmente atraindo minha atenção de volta para o seu olhar. Minha língua umedece meus lábios, e sinto o pau latejar. Como foi que viemos parar aqui? Estávamos falando sobre grego e, de repente, isso.
— Não... -respondo, minha voz muito mais baixa do que eu gostaria.
— Do que você tem tanto medo? -De você. Minha mente responde imediatamente, mas não são essas as palavras que saem da minha boca.
— De nada, Gustavo... A questão não é essa... -Atentamente, me analisa antes de seus lábios sentenciarem.
— Mentiroso! -Inclino a cabeça, encarando-o, revirando meus olhos.
— Eu sei o que você está fazendo!
— E o que seria?
— Fazendo com que eu me sinta desafiado a fazer o que você quer! -Dá de ombros e dobra o lábio inferior em uma atitude de desdém.
— Mas nem por isso deixa ser verdade. Eu quero você, você me quer, mas é medroso. -Bufo.
— Eu sou medroso?
— Sim, você é! -Me desafia.
— E do que exatamente eu tenho medo, Gustavo? -Com o garfo sobre o prato, sou obrigada a questioná-lo.
— Eu não faço ideia, mas você tem! Seria do seu companheiro descobrir? Lindo, eu não sou ciumento!
— Nossa! -Quase cuspo a palavra. Sentindo-me ultrajado, provocado e, ao mesmo tempo, seduzido pela safadeza do cretino: ͞ Não, Gustavo, eu não teria porque temer que alguém descobrisse qualquer coisa! -Solto sem me dar conta do que estou dizendo até que seu sorriso cafajeste e sua sobrancelha arqueada encontrem meus olhos. Oh, merda!
— Não? Então vocês terminaram? -Há um brilho satisfeito em seus olhos que não estava lá antes, e eu me pergunto o porquê, já que ele acabou de dizer que não é ciumento.
— Não, Gustavo. Mas não é nada sério. É só sexo... -Minto, porque poderia ser verdade. Sexo casual é algo que costumava fazer parte da minha rotina antes de o vizinho fodedor/ deus nórdico corredor/ CEO ladrão de apartamentos duramente conquistados aparecer na minha vida. Olho para ele e não consigo evitar a pergunta causadora de tudo isso.
Seu olhar me escrutina e eu mordo meu lábio. Será que algum dia eu vou parar de me sentir afetado por esse homem? Ele sorri cafajeste e apoia um braço dobrado sobre o encosto da sua cadeira.
— Enfim... Agora que nós já resolvemos isso, eu vou ser obrigado a voltar a ouvir você pela parede? Porque se não fosse pelos seus e-mails, essa semana teria sido perfeita! -comento, enquanto levo a taça de vinho a boca e ele gargalha.
— Eric, eu não sei o que te deu essa impressão, mas não resolvemos absolutamente nada. E eu planejo que você me ouça no seu ouvido, lindo. Definitivamente, não do outro lado da parede. - Gemo, desgostoso.
— Porra, Gustavo! Eu to tentado aqui! Você precisa parar de me dizer essas coisas! -Vira o corpo na minha direção, outra vez, encaixando as pernas entre as minhas, tocando minha pele com a sua, que, mesmo coberta por jeans, me provoca e arrepia.
— Eu tenho uma proposta pra você...
— Você já me fez uma proposta e eu já disse que não... - dispenso-o com a mão, fazendo um imenso esforço para não deixar que a maldita bolha me sele dentro dela. Ele balança a cabeça e estala a língua, negando.
— Eu acho que você tem medo de se apaixonar por mim... — Solta, e eu pisco freneticamente. Suas palavras me atingem como tapas, porque, porra! É muita pretensão da parte dele sugerir algo do tipo, e é uma audácia sem tamanho que o infeliz esteja certo.
Essa química indiscutível, essa sensação de reconhecimento e, ao mesmo tempo, a forma como seu jeito arrogante, petulante, me instiga e irrita, acendem todos os alertas de autopreservação existentes no meu corpo. Meus lábios se entreabrem, passo a língua sobre eles com o coração batendo acelerado no peito como se tivesse acabado de correr uma maratona.
— Eu nunca me apaixonaria por alguém como você, Gustavo! Sou inteligente demais pra isso! Já você... -Olho-o de cima a baixo, antes de continuar: Definitivamente, é o tipo de cara que se apaixonaria por mim e, depois, encheria meu saco, me perseguindo, como um cachorrinho, e eu tenho zero vocação pra cuidador de animal de estimação! -Devolvo, e ele sorri imenso.
— Ótimo! Então vai ser fácil aceitar minha proposta! -reviro os olhos.
— Jura, Gustavo?
— Juro. Na verdade, você só tem a ganhar... -colo uma expressão de cansaço no rosto e faço um gesto com a mão, dizendo para que ele continue.
— É uma aposta! -Isso ganha minha atenção e eu franzo o cenho.
— Uma aposta? -Balança a cabeça, confirmando.
— E o prêmio seria?
— Essa é a parte boa! Se eu ganhar, não preciso de prêmio, porque até lá, eu já vou ter recebido exatamente o que quero, você na minha cama! -Estalo a língua, dispensando-o e desvio meus olhos de seu rosto: ͞ Mas se você ganhar, eu cancelo o empreendimento. -Viro o rosto em sua direção em uma velocidade digna do flash.
— O que você disse? -Ele sorri. — Agora eu tenho sua atenção!
— Gustavo, essa é uma brincadeira muito estúpida de se fazer! -Acuso, chateado pela sua falta de respeito a forma como me sinto, mas o que é que eu estava esperando? Não é justamente esse perfil que me faz ter certeza de que o melhor é colocar um mundo de distância entre nossas camas? Me remexo na cadeira, pensando seriamente em me levantar e ir embora.
— Eu não estou brincando... -Olho em seus olhos, procurando qualquer sinal de mentira como se fosse possível encontrá-lo. Eu não conheço Gustavo e, embora já tenha tido sim a impressão de ver sinceridade em seu olhar, até onde eu sei, ele poderia ser perfeitamente capaz de camuflar ou dissimular os próprios sentimentos.
— Você pode fazer isso? Quer dizer, você faria isso? Por uma transa?
— Por uma transa qualquer? Não... Por dois meses transando com você? Com certeza! Mas não se engane, Eric... Eu não entro em batalhas perdidas. Se estou te oferecendo isso, é porque não acho que você vá ganhar...
Encaro o homem sentado à minha frente. Seus olhos transbordam desejo, determinação e desafio. Inclino a cabeça para o lado, ainda com dificuldade de acreditar que ele possa, realmente, estar me fazendo uma proposta como essa.
— Sua empresa não tem um conselho, alguém que possa te impedir de fazer coisas como essa, quer dizer? Se você faz esse tipo de coisa, como vocês ainda não faliram? -Ele gargalha.
— Eu te disse, Eric... Não jogo pra perder. Mas, pra sua informação... -Apoia os cotovelos sobre os joelhos e deixa o rosto absurdamente próximo do meu. Inspiro o ar que ele expira e me perco no contorno dos seus lábios, distraindo-me daquilo em que eu realmente deveria estar pensando: ͞ Sim, eu tenho um conselho... E então? -Me desperta.
— Não! -respondo rápido, e ele sorri.
— Eu sabia! -Desdenha, voltando o corpo para trás e retomando a posição anterior, com o braço sobre o encosto da cadeira: ͞ Medroso!
— Eu não sou medroso! Mas isso é absurdo! Gustavo, você está se ouvindo?
— Sim, eu estou! E, até onde sei, tô te fazendo um imenso favor, tô te dando a chance de manter seu precioso apartamento, e tudo o que você precisa fazer é não se apaixonar por mim, algo que você disse que jamais aconteceria... E, é claro, fazer eu me apaixonar por você, algo que você disse que obviamente aconteceria... Ao meu ver, você tá com toda a vantagem, e, de quebra, ainda vai ter tudo isso... -Faz um aceno com a mão para o próprio corpo: ͞ Pra você, por dois meses inteiros, pra fazer o que quiser! -Pisca um único olho e sorri safadamente.
— Isso não pode ser legal! -argumento.
— Acredite, é!
— Você já fez algo assim antes, né, seu cretino? -Atiro contra ele, de repente, indignado. Seu rosto assume uma expressão provocadora com olhos pequenos.
— Com ciúmes, Eric? Já? -Estala a língua e eu derrubo minha cabeça para trás, apoiando-a no encosto da minha cadeira, fingindo estar sofrendo um derrame. Ele gargalha.
— Tudo bem, engraçadinho... Mas sim! Qualquer acordo que siga as normas é legalmente válido. Podemos fazer um acordo informal num guardanapo até, desde que eu esteja sóbrio, dominando minhas faculdades mentais, e assine, é válido. E não, Eric... Eu nunca fiz isso... Parece que você desperta meus instintos mais loucos no final das contas... -comenta, despretensiosamente, depois, leva mais uma garfada a boca enquanto permaneço em silêncio.
— Eu ligaria pro meu advogado pra que ele confirmasse, mas não acho que você acreditaria na palavra dele, então, pode consultar qualquer outro... -Olha para o relógio pendurado na parede: ͞ Mas se você for fazer isso, sugiro que seja rápido, essa oferta só é válida até o final da sobremesa.
Minha boca se abre em choque. Deus, isso é sério. Olho enquanto ele se levanta, retirando da mesa a travessa em que a massa foi servida e caminha com ela nas mãos na direção da cozinha. Acompanho seus passos, lambo meus lábios, enfio os dedos pelas raízes dos meus cabelos.
Engulo em seco, ao mesmo tempo, chocado, impressionado e horrorizado. Quer dizer, o que eu deveria fazer? Ele está me oferecendo a chance de manter meu apartamento, e tudo o que eu tenho que fazer é não me apaixonar por ele e fazer com que ele se apaixone por mim! Pelo amor de Deus, Eric! Eu não acredito que você realmente está cogitando isso! A parte sensata de mim me recrimina e eu abro a boca, pronto para responder em voz alta a confusão que minha mente se tornou.
Mas fecho-a, porque se sozinho isso já seria loucura, acompanhado, nem se fala! Expiro com força, expulsando todo o ar que há em meus pulmões, inspiro, enchendo-os outra vez. Gustavo abre a geladeira, retirando lá de dentro um prato redondo coberto por uma cúpula de inox. Segundos depois ele já está ao meu lado, deixando-a sobre a mesa e incendiando meus olhos com os seus.
— Isso é sério? -Não consigo evitar perguntar.
— Cada palavra...
— E como você pode agir tão calmamente? Gustavo... -Ele senta novamente ao meu lado e pega minhas mãos que, dentro das suas, parecem pequenas. Seu toque em minhas palmas envia pequenos choques pelo meu corpo e a forma como ele me encara me diz que ele também sentiu.
— É exatamente isso o que eu quero, Eric... Mais disso... E eu não sou homem de frear meus impulsos, nunca fui, e não vai ser agora que vou começar.
— Isso é loucura...
— Isso é uma proposta justa... Só depende de você...
— Eu preciso de mais tempo...
— Não... -É rápido em rebater: ͞ É uma oferta única, você mesmo disse, eu estou colocando muita coisa em jogo aqui, o mínimo de preservação que mereço é não te dar tempo pra pensar direito e perceber que é uma péssima ideia... Eu preciso da sua impulsividade a meu favor. -Sorri de canto.
— Então por que raios você tá me dizendo isso?
— Por que isso não muda o fato de que você tem só mais uns minutos pra decidir se quer a chance de manter seu apartamento, ou não... Você não tem nada a perder...
Meu lábio protestaria se pudesse pelo castigo que lhe dou com meus dentes enquanto os dedos de Gustavo fazem círculos lentos nas palmas suadas de minhas mãos. Suas palavras não me convencem. Algo em meu interior grita que sim, eu tenho muito a perder. Mas é a perspectiva de ter mais a ganhar que define as próximas palavras que saem pela minha boca.
— Eu preciso fazer uma ligação! -Ele balança a cabeça devagar, concordando. E sem me dar a chance de pensar muito a respeito, me levanto, já sacando o celular do bolso da calça e procurando o contato de Lívia. Caminho até a sacada do apartamento enquanto a chamada é realizada e ela atende no terceiro toque.
— Eu juro que se você me disser mais uma vez que eu preciso fazer alguma coisa sobre os malditos e-mails, eu te bloqueio!
Expiro, resignado. Ai que saudades de quando esse era o maior problema que Gustavo me causava.
— Não, Lívia! Eu preciso saber se é legalmente válido fazer um acordo de milhões de reais informalmente.
— O quê? -soa alarmada e confusa.
— É isso! Eu quero saber se alguém pode me fazer uma proposta de milhões de reais de maneira informal, sem advogados e tabelião e, ainda assim, isso ser legalmente válido.
— Eric, como assim? Do que você tá falando?
— Lívia! Eu não posso explicar agora! Eu só preciso saber se é ou não legalmente válido, droga!
— Não é simples assim! A lei é aberta à interpretações! Quer dizer, em teoria, sim! É legalmente válido se o acordo cumprir alguns requisitos, como, por exemplo, ser registrado em papel, assinado, e que ambas as partes estejam cientes do que estão fazendo, sóbrias e totalmente em domínio de suas faculdades mentais, mas...
— Só isso? -A interrompo.
— Em tese sim, mas...
— Tudo bem, Lívia! Obrigado!
— Eric, o que está acontecendo?
— Eu te ligo amanhã, agora eu preciso ir!
— Eric...
— Eu preciso ir, irmã! -Ela suspira, derrotada.
— Tudo bem, Eric! Boa noite. -Desligo o telefone sem nem mesmo responder. Olho para a rua abaixo de mim, dessa vez, de uma perspectiva diferente daquela que me encara todos os dias quando olho para o mesmo destino.
A rua, acesa pela iluminação pública, tem seus bares e restaurantes em pleno funcionamento, passantes andando normalmente, e carros, motos, ônibus e vans zunindo pelo asfalto. Lá embaixo, a vida continua acontecendo como se eu não tivesse uma proposta absolutamente descabida em mãos.
Respiro fundo e fecho os olhos, agarrando o guarda corpo até que os nós dos meus dedos fiquem brancos. Não posso fazer isso, simplesmente não posso. É loucura demais, quer dizer, quem, em sã consciência, apostaria algo assim? A vida não é um maldito filme da sessão da tarde!
A sensação de perda se estabelece em meu peito como óleo quente, encontrando e espalhando-se por todos os lugares, porque, por mais absurda que fosse a proposta, a simples esperança de que não estaria tudo perdido, mudou tudo, mesmo que apenas por alguns minutos.
E também não posso fingir para mim mesmo que por um segundo não desejei uma desculpa para fazer exatamente aquilo que quero, pular em cima daquele homem malditamente gostoso. Precisava ser justamente ele a pedra no meu sapato? Quer dizer, a cretinice dá para relevar, mas o fato de estar se colocando entre meu sonho e eu não. Isso não. É estupidez? Talvez... Mas se eu não puder culpá-lo, a quem culparei? Puxo e expulso o ar com força várias vezes, reunindo a coragem necessária para acabar com isso.
Não funciona, não me sinto pronto para colocar um ponto final nessa história que nem mesmo começou, mas vou assim mesmo. Viro-me e caminho a passos lentos de volta para a sala, onde Gustavo me espera no mesmo lugar em que o deixei, sentado à mesa, que agora tem pratos de sobremesa diante das cadeiras em que ambos estivemos sentados.
Olho para ele e, depois de alguns segundos de um duelo silencioso, desvio o olhar. Tomo mais uma inspiração profunda e, finalmente, dou minha resposta.
— Não. -Decepção atravessa seu rosto e ele acena com a cabeça para cima e para baixo, lentamente.
— Achei que você era mais corajoso que isso, mas parece que eu me enganei...
— Não, Gustavo! Chega desse seu joguinho psicológico, minha resposta é não. Obrigado pelo jantar, mas eu vou dispensar a sobremesa. Enfio a mão no bolso, tirando de lá a declaração que trouxe e uma caneta. Estendo-a para ele com um pedido silencioso e ele não protesta, apenas pega as duas coisas e deixa sua assinatura sobre o papel sem nem mesmo ler.
Agradeço com um aceno e me encaminho para a porta. Quando alcanço a maçaneta, dou uma olhada para trás e Gustavo continua lá, sentado no mesmo lugar, sem nem mesmo me olhar ou se levantar para se despedir. Isso só me dá certeza de que fiz a escolha certa.
Giro a fechadura e saio pelo corredor, estendo a mão para abrir minha própria porta e dou uma última olhada para o apartamento vizinho, esperando encontrar não sei o que, mas não encontro, tudo o que há para ser visto é o vazio de sempre.
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*** GUSTAVO FORTUNA ***
Olho para a Cheesecake sobre a mesa, ainda coberta pela cúpula de inox, e fecho os olhos, frustrado. Porra, eu achei que daria certo! Eu realmente achei. O plano se formou em minha mente assim que ele disse que não tinha medo de nada. Mentiroso. Eu sabia que tinha, só não fazia ideia do que. Joguei verde, colhi maduro.
No momento em que ele me desafiou, que disse que eu cairia de amores por ele como um cachorrinho, eu sabia exatamente o que fazer. Era a oportunidade perfeita de conseguir o que eu queria dando a ele a sensação de estar no controle, não tinha como dar errado. Mas deu.
Medroso da porra! Bufo, inconformado que ele simplesmente tenha virado as costas e saído, como se nada do que aconteceu no caralho da noite inteira tivesse importância. Como se eu fosse um qualquer que ele conheceu há dez segundos, e não alguém que estava lhe oferecendo a oportunidade de ter exatamente o que ele quer.
Foda-se! Eu não me importo com o que ele quer, até porque, ele não teria, mas, porra! Eu me importo com o que eu quero, e, nesse momento, é ele! Ele que se recusa, terminantemente, a ceder! Maldito gosto por coisas arriscadas e improváveis, sempre me fodendo! Esfrego as mãos no rosto, tentando espantar a sensação de derrota, mas de nada adianta.
Levanto-me da cadeira em um salto, espalho uma das palmas pelo cabelo, deslizando-a nele e alcançando a nuca, apoiando-a e fazendo uma pequena pressão. Fecho os olhos, tentando acalmar meus pensamentos. Inspiro e expiro, mas, inferno! Não! Foda-se! Foda-se, foda-se, foda-se! Aquele cara me deve, pelo menos, que eu saiba o gosto que tem sua boca!
Em passos largos, cruzo a sala, saindo do meu apartamento.
Paro diante da porta do apartamento 304 e, repetindo o que Eric fez naquela manhã há duas semanas, não bato, esmurro-a em um imenso estardalhaço, ensaiando colocá-la no chão.
Ouço seus passos apressados e ele abre a porta dizendo meu nome, mas não lhe dou chance para qualquer coisa. Assim que o tenho diante de mim, envolvo seu corpo em meus braços e desço minha boca sobre a sua com fome, raiva e a certeza de que isso é o mínimo que mereço.
Invado-o com minha língua e exploro cada canto. A princípio, ele não reage, deixa que eu sinta seu gosto, lamba seus lábios, aproveite seu calor sem qualquer tipo de participação ou impedimento, mas bastam alguns segundos do toque para que ele se entregue completamente. Sua língua encontra a minha e se envolve nela, lambe, chupa, massageia. Entra e sai da minha boca, devorando-me com a mesma intensidade que o devoro.
Meses de desejo contido, semanas de provocações e farpas trocadas irrompem em um beijo longo, gostoso, quente feito o inferno, que acende meu corpo inteiro, e acaba com qualquer pensamento idiota que eu pudesse ter sobre desistir de Eric em minha cama. Sua boca é um banquete, e eu, um faminto.
Enfio meus dedos pelas raízes de seus cabelos soltos e pressiono sua cabeça contra a minha, aprofundando nossa troca. Aperto seu corpo dentro do meu abraço, apertando-o contra mim e tirando seus pés do chão, sentindo algo semelhante a desespero para que não haja qualquer coisa entre nós: tempo, espaço, roupas... Eu quero esse homem com uma necessidade inexplicável.
Meu pau endurece dolorosamente com o pouco que tenho dele durante o beijo.Nos beijamos até que a falta de ar se torne insuportável e sejamos obrigados a parar.
— Você tá me deixando louco, porra! Amanhã de manhã, Eric! Você tem até amanhã de manhã! Se você não me procurar, a noite você já não vai mais me encontrar aqui... -intimo com a boca ainda colada à sua antes de abrir os olhos e admirá-la por alguns segundos. Ele ainda tem os olhos fechados, a pele arrepiada, os lábios, inchados e vermelhos, puxando e soltando o ar, e o corpo já não está mais escondido embaixo de roupas largas e desleixadas.
— Eu saio de casa às 9:00h. -Digo, antes de, contra cada fibra do meu corpo, soltá-lo e me afastar. Viro as costas e entro no meu próprio apartamento sem nem mesmo dar chance para que ele rebata.
É uma noite de merda.
Nem tento, porque sei que não serei capaz de dormir. Minha expectativa é de que a qualquer momento Eric bata em minha porta, dizendo que mudou de ideia. Mas ele não bate. Quando as seis da manhã chegam, estou desesperado para dispersar a energia acumulada em mim, mas dispenso a saída para o treino de box e, vestido com roupas apropriadas, ensaio meus movimentos em casa mesmo.
Por quase duas horas, enquanto dou socos e pontapés guiados pela televisão, não penso em Eric, porque não há espaço para ele e minha mente se torna um vazio bem-vindo, depois da noite desgraçada que tive. Mas o treino acaba e eu me vejo sendo arremessado de volta ao caos dos meus próprios pensamentos e da espera por algo que eu nem mesmo sei se vai acontecer.
Saio do banho com uma toalha enrolada na cintura, outra em volta do pescoço, jogada sobre os ombros, e com a cabeça cheia de perguntas sobre como fazer Eric mudar de ideia, ou, que outras investidas eu poderia fazer para que ele finalmente ceda. Expiro com força e jogo o corpo sobre a cama. O relógio, pendurado na parede do quarto, me diz que já são oito e dez.
— Homem teimoso pra caralho! -resmungo, sem conseguir me conter. Eu não entendo essa porra. Se eu quero algo, pego. Foda-se o que vão pensar, e muitas vezes, fodam-se também as consequências. Prefiro pedir perdão a pedir permissão, a vida é uma só. Então, minha cabeça não processa, como, sentindo o tesão que O próprio infeliz admitiu sentir, ele continua negando a si mesmo o que quer.
Em um salto me coloco de pé e me enfio no pequeno closet em busca do que vestir. A falta de paciência para escolhas só confirma meu estado de espírito pobre e eu acabo com um jeans escuro e uma camisa branca. Quase posso ouvir as piadinhas de Rodrigo sobre eu não me vestir como um homem sério e blá blá blá...
Café. Preciso de café. Passos arrastados me levam até à cozinha e programo a cafeteira. O tic-tac do relógio, que deveria ser mudo, insiste em me importunar, sussurrando, em meu ouvido, que ele não vem. O café fica pronto, eu tomo uma xícara, duas, quatro, e, quando estou prestes a me servir da quinta, digo a mim mesmo para virar homem, ele não virá.
Deixo a caneca suja dentro da pia, reúno minha bolsa de trabalho e paletó, aguardo mais alguns minutos, parado diante da porta, ainda que o relógio esfregue na minha cara que não deu certo. Acompanho o ponteiro dos segundos dar a volta completa, até que a hora marque nove e um. Balanço a cabeça, lentamente, para cima e para baixo e abro a porta.
A silhueta curvilínea, de costas para mim, em fuga, deixa-me estático apenas por um segundo, e eu sorrio.
— Vai a algum lugar, Eric? -questiono e ele vira-se para mim. Os círculos levemente escurecidos ao redor dos olhos e o mesmo pijama que vi ontem à noite, denunciam que sua noite foi tão ruim quanto a minha e me dizem que, ou ele realmente não tem qualquer pudor em andar seminu pelo corredor do prédio, ou que vir aqui dessa vez foi uma decisão tão impulsiva quanto da outra. Conto com a segunda.
Sua língua passeia sobre os lábios antes de seus dentes morderem o inferior enquanto olhos verde e amarelos me encaram ansiosamente.
— Eu... Eu...
— Estava fugindo... -completo com um tom de ironia que não diz nada sobre a aflição martelando meu estômago. Vamos lá, Eric! Você não é a porra de um mocinho inocente! Tenha bolas, caralho!
Mais um passeio de língua sobre os lábios, mais um afundar de dentes neles, ele fecha os olhos, expira com força, e, quando os abre, estão cheios de uma determinação que deixam um gosto amargo de derrota em minha boca.
— Eu aceito! -Pisco, pego de surpresa.
— Você o quê? -Ele, obviamente, revira os olhos.
— Eu aceito, e agradeceria se você levasse mais de dois segundos pra fazer eu me arrepender disso! -Um sorriso imenso e honesto se espalha em meu rosto e dou um passo na sua direção. Ele ensaia dar andar para trás, e puxo seu braço, colando sua frente à minha antes que ela tenha a chance de fugir.
— Aonde você pensa que vai?
— Pra minha casa? -Gargalho.
— Acho que não, Eric. Nossa aposta começou, e cada um usa as armas que tem, eu vou começar com a minha mais potente.
— Qual? Sua personalidade encantadora? -Debocha, apesar do estremecimento que atravessa seu corpo e da dilatação imediata de suas pupilas com a sugestão óbvia do meu tom.
Sorrio um sorriso preguiçoso e aproximo meus lábios do seu ouvido. Passo o nariz lentamente pelo contorno da sua orelha, eriçando sua pele e cheirando seus cabelos, ele reprime um gemido, mas eu ouço, então, sussurro.
— O meu pau. -Antes que ele possa processar, seu corpo está imprensado contra a parede ao lado da porta e ele para de respirar. Sem desviar meus olhos dos seus, enfio os dentes em seu lábio inferior, judiando dele, exatamente como ele faz. Seu corpo inteiro estremece quando as pontas dos meus dedos se infiltram lentamente sob a barra do pijama.
— Nós estamos na porra do corredor, Gustavo! -sussurra, ainda que sua intenção tivesse sido soar incisivo. Cheiro a pele do seu pescoço e arrasto minha língua da curva do seu maxilar até parar sobre seus lábios.
— Então você não devia ter esperado o caralho do último segundo! -Assalto sua boca. Enfio a língua nela sem cuidado ou pudor, sem dar a mínima para o fato de que realmente estamos no corredor e de que qualquer vizinho desavisado pode sair de casa às nove da manhã e se deparar com uma verdadeira cena. Eu realmente não poderia me importar menos.
Durante a noite, me perguntei se eu não estava fantasiando sobre o quão malditamente bom tinha sido beijar sua boca, e, agora, tenho certeza de que não, eu não estava. Eric tem gosto de conquista, e eu ainda não experimentei nada melhor.
Seus lábios se encaixam aos meus de um jeito perfeito, delicioso, como nada que nos leve para o céu deve ser. Suas mãos deslizam pelos meus braços, amassando o tecido da minha camisa e alcançando meu pescoço. Suas unhas deslizam pela minha nuca, arranhando minha pele e deixando uma sensação de ardência deliciosa no caminho que seus dedos fazem até agarrar meus cabelos e provoca espasmos no meu pau.
Forço uma de minhas mãos em sua nuca e uma de minhas pernas entre as suas, puxo as raízes do seu cabelo e movo minha ereção dolorida em sua barriga. Ele geme baixinho, e esfrega-se de volta, esquecido dos protestos e do quanto o ato despudorado a preocupou instantes atrás.
Quando meus pulmões imploram por ar, estico a língua sobre seus lábios, descendo-a por seu queixo, pescoço, garganta, colo, até chegar ao vale entre seu peito com um Eric já completamente entregue em minhas mãos. Ele se oferece, empinando-se na direção da minha boca, exibindo os mamilos pontudos de seus peitos para os meus olhos, enquanto monta uma de minhas coxas e esfrega-se nela, no meio do corredor do prédio, e nada nunca foi tão sexy.
Seus olhos se abrem lentamente e eu acompanho suas pálpebras subindo devagar. Nossos olhares se encontram, se demoram, presos um ao outro. Meu peito sobe e desce em um ritmo descompassado, o rosto de Eric está avermelhado e seus olhos verdes, imensos.
O celular vibra no meu bolso, ameaçando puxar-me de volta para a realidade, mas eu me recuso a ir, ainda não, não sem a porra do prêmio que eu estou desejando há meses. Eric olha para o meu bolso, provavelmente, sentindo na própria pele a vibração do aparelho, depois, concentra-se novamente em meu rosto, antes de sussurrar algo muito parecido com um “nem fodendo”, e atacar minha boca.
Ele me beija faminto, voraz, tão cheio de tesão quanto eu. Agarro suas coxas, tirando-o do chão e ele prende as pernas ao redor da minha cintura. É tudo o que eu preciso. Beijando-o com os olhos abertos e cruzo a curta distância que nos afasta do meu quarto. O que eu tenho em mente agora, definitivamente, precisa ser feito em privado.
Eu não o jogo na cama. Prenso-o contra a parede, Eric geme em minha boca, impulsiona o corpo para cima e para baixo, esfrega o meio de suas pernas abertas em mim, agarra meus cabelos, arranha minha pele. Ele faz tudo isso com olhos abertos, encarando-me com intensidade, tesão. Seu toque parece estar em todos os lugares ao mesmo tempo até que alcança os botões de minha camisa. Ele os desfaz com perícia.
Não é um toque tímido ou sutil. É forte, intenso, possessivo e, porra, eu adoro. Eric tem tanta fome de mim quanto eu dele, e nada seria mais excitante do que essa constatação. Minha língua sai de sua boca, lambendo sua pele, deixando um rastro molhado por onde passa. Sua cabeça se inclina para trás, dando-me espaço, pedindo por mais da minha boca.
Dou com gosto tiro seu pijama e sua imagem quase nu, coberto, somente, por uma cueca preta e lisa, me atinge com violência. Engulo em seco e sinto os pequenos tremores no meu nariz a cada respiração que dou na busca por controle para não rasgar o homem diante mim imediatamente.
Aperto sua cintura, enfiando os dedos em sua pele com força e ele se retorce sob eles, seus olhos estreitos e boca entreaberta, a expressão embriagada em seu rosto, o som de apreciação que solta, são as reações perfeitas ao toque rude e fazem um arrepio percorrer minha espinha. Mergulho em um dos seus mamilos, sugando-o e enchendo-me com seu sabor e cheiro.
Uma das mãos de Eric desce pelo meu peito, abdômen, encontra minha ereção e, ainda por cima do tecido, ele a aperta, puta que pariu! Grunho, preciso abandonar a mamada, porque a sensação me obriga a ranger os dentes. Ao levantar os olhos, encontro um olhar esverdeado cheio de luxúria me encarando de volta. A expressão é igualmente entregue e exigente.
Mordo seu mamilo, seu corpo inteiro estremece e eu enfio a mão dentro de sua cueca, encontrando-o duro e melado.
— Porra, Eric! -murmuro com a boca ainda em sua pele, seu aperto em meu pau se torna mais firme, meu dedo desliza para dentro dele e a sensação do cu sugando-o viaja diretamente para minha virilha. Ele geme quando enfio o dedo até o final, retiro, e volto a penetrá-lo, dessa vez, com dois dedos.
— Gustavo... -choraminga meu nome e eu descubro que essa é a minha nova canção preferida. Abro os dedos e os fecho dentro dele, esticando, alargando o cuzinho apertado e sendo cada vez mais consumido pelo desejo de me enterrar profundamente nele.
Subo minha boca, agora, lambendo seu peito, ombro, pescoço, de baixo para cima, até alcançar sua orelha e mordiscá-la inteira, repetidamente.
— Ah, Eric! Eu vou comer esse cuzinho até que meu nome seja tudo o que você vai ser capaz de dizer!
Com a cabeça jogada para trás, Eric geme e rebola sem jamais deixar de me tocar.
— Eu quero você pelado! -Sua voz tem um tom delicioso de ordem e eu sorrio com a boca colada à sua orelha. Suas mãos arrancam o que restava da camisa de dentro da calça e ele empurra o tecido pelos meus ombros, obrigando-me a me afastar, e deixando meu tronco nu.
Seu peito sobe e desce, seu olhar assumiu um tom selvagem de verde, e ele me diz que se eu não der o que ele quer, Eric certamente tomará. Encaixo as mãos sob seus braços, ele solta as pernas de minha cintura e firma os pés no chão, deixando-me livre para fazer exatamente o que pediu. Minhas bolas doem, tamanha é a vontade de fodê-lo, e é só por isso que não provoco um pouco mais o mandão diante de mim.
Seus olhos acompanham meus movimentos enquanto desfaço o cinto, e eu mantenho os meus nos dele. Ele observa tudo, faminto. Como se minha imagem fosse um verdadeiro oásis, passa a língua sobre os lábios devagar, sinto o efeito da provocação no latejar do meu pau que se torna constante e o safado sorri, me dizendo que sabe exatamente o que está fazendo.
— Você é um provocador, não é? -Minha voz sai grossa, rouca, completamente consumida pelo desejo. Não resisto, e, enquanto desabotoo a calça, abocanho um mamilo rosado, chupo-o. Eric geme, remexe-se, não perco seu apertar de coxas e abocanho o outro mamilo, fazendo o mesmo trabalho, lambendo, chupando, mordendo. Estico sua pele, puxando-o com os lábios e língua enquanto vou me afastando.
Ao me afastar, não me sinto preparado para a imagem que encontro. Eric afastou a cueca para o lado e tem os dedos afundados dentro dele. Me olha com a boca levemente aberta e os olhos perdidos em tesão enquanto move os dedos devagar no cuzinho, porra!
Engulo em seco, bebendo a visão do homem nu, gostoso feito o inferno, se masturbando e dedando para mim. Seus gemidos aumentam em volume e frequência, enchendo o quarto, tomando minha mente e assaltando de mim mesmo o controle do meu corpo. Os sons que por tanto tempo fantasiei que fossem para mim, finalmente são, e superam em anos luz a minha imaginação. A dor em minhas bolas é uma verdadeira agonia a essa altura, quando ele afunda os dedos no cuzinho cuzinho, apertada, e grita, eu me perco.
Esqueço absolutamente tudo o que não seja ele, não ouço nada que não sejam seus gemidos. Passo as mãos pelos cabelos, pelo pescoço, lambo os lábios, desesperado para tocá-lo e, ao mesmo tempo, sem querer perder um segundo sequer do espetáculo se desenrolando diante dos meus olhos. Sem me despir, tiro meu pau para fora da cueca, duro, com a cabeça larga babando, e com as veias saltadas. O olhar de Eric se torna ainda mais bêbado enquanto ele acompanha os movimentos lentos de vai e vem que faço devagar.
Ele abre levanta mais as pernas e eu não sei no que quero prestar atenção. Se nl cuzinho sendo tão deliciosamente acariciado, ou no seu rosto, entregue ao prazer. Meu coração retumba no peito e o sangue correndo em minhas veias parece ter ganhado a velocidade de uma motocicleta, minha respiração não consegue decidir se acelera ou para. Os gemidos de Eric tornam-se mais intensos, seus gritos, mais frequentes, eu acelero meu próprio ritmo.
Seu cheiro está impregnado do meu nariz. A cada inspiração profunda que tomo, ele me atinge novamente como se fosse a primeira vez. Aperto meu pau, o prazer é intenso, nenhuma porra de punheta nunca foi tão boa! Não deixo que meus olhos se fechem.
— Gustavo... -Geme alto e sinto o gozo chegando, subindo pelas minhas bolas.
Tumf.. Tumf... Tumf...
De repente, ambos somos arrancados da nossa bolha por murros violentos na porta do apartamento. Os olhos de Eric se arregalam e eu paro, literalmente, com o pau na mão, para escutar a voz de Rodrigo praticamente gritando meu nome do lado de fora. Fecho os olhos, sem poder acreditar nessa porra. Puta que pariu!
Quando volto meu olhar para Eric, ele já não tem mais a mão dentro da cueca, seus ombros estão retos e seus olhos despertos, apesar da respiração continuar descompassada. Eu vou matar Rodrigo, eu vou! Porra, eu juro que vou! Ele pega o short,jogadao no chão, e parece querer vesti-lo, mas eu o impeço, segurando suas mãos.
— Não tem a menor chance de eu deixar você sair daqui sem te comer, Eric. Não se atreva a se vestir, porra!
— Gusta..
— Não. se. a.tre.va. a. se. ves.tir! -praticamente grunho a sílabas e ele revira os olhos. O gesto, com sua pele avermelhada e coberta por uma fina camada de suor, torna-se muito mais sugestivo e eu lambo sua boca, pronto para mergulhar minha língua nele, mas uma nova sessão de murros na porta obriga-me a parar.
— Eu já volto! -Aviso, abotoando a calça e subindo o zíper, mas não me dando ao trabalho de fechar o cinto.
Saio do quarto e caminho até a porta em passos apressados. Com a mão na maçaneta, respiro fundo, só depois a giro com a expressão mais amedrontadora que consigo colocar no rosto. Expressão essa que é imediatamente substituída por um cenho franzido quando me deparo não apenas com Rodrigo, mas com Alícia e Alice penduradas uma em cada um de seus braços, ambas com mochilas nas costas.
— Você não atende mais a porra do telefone, caralho?! -Quase rosna para mim antes que eu tenha a chance de perguntar o que está acontecendo aqui.
— Irmãããããããããã! O papai falou palavrão! -Alice acusa com os olhos arregalados.
Rodrigo bufa, só então se dando conta das palavras que escolheu e passa as duas mãos pelo rosto. Olha para baixo e agacha-se, ficando na altura da filha.
— Desculpa, filha! O papai está nervoso... -Deixa um beijo na testa de Alice e, então, promete: ͞ Se você não contar pra mamãe, o papai promete que te compra um novo unicórnio. -Mesmo sem ter ideia do que está acontecendo, e tendo quase certeza de que minha foda, foi, definitivamente, empatada, não consigo segurar o riso ao ver meu irmão comprando a filha, porque tem medo da esposa, uma mulher de um metro e meio. Gargalho, e os olhos de Rodrigo me alcançam quase imediatamente.
É ele quem agora veste uma expressão de pouquíssimos amigos.
— Eu preciso que você fique com elas! Aconteceu uma emergência... -Diz, olhando de rabo de olho para as meninas, deixando claro que não quer que elas saibam o que houve: ͞ Camilla e eu precisaremos correr pra Petrópolis.
Franzo as sobrancelhas, mas ele, discretamente, balança a cabeça em negação. Eu concordo devagar.
— Bom! Quem quer biscoitos de chocolate? -Pergunto com um sorriso, que não poderia ser mais falso nem se eu tentasse, para as minhas sobrinhas. Agora, preocupado com o que pode ter acontecido.
— Tio... -Alice, a mais tímida das minhas sobrinhas, me chama e eu, assim como seu pai, me agacho, para ficar da sua altura.
— Sim, princesa...
— Por que seu rosto ficou torto de repente? -Pergunta, fazendo menção ao meu sorriso falso e eu gargalho, entregando para ela um mais do que verdadeiro. Beijo sua testa e puxo-a para um abraço.
— Tio, por que você tá sem roupa? -Alícia, mais ousada, pergunta. E meu sorriso ganha ainda mais vida. Já Rodrigo, parece só então se dar conta do meu estado e, seu rosto se contorce primeiro em surpresa, depois em compreensão e, por último, em desgosto.
— Você tá sozinho, Gustavo? -Questiona e eu nego, balançando a cabeça: ͞ Você não trabalha mais?
Ergo uma sobrancelha para ele, meu irmão bufa.
— Sim, eu trabalho e, se você quer saber, o que eu estava fazendo pode até ser considerado como trabalho...
— Sério, Gustavo? Desde quando fo...-Começa a falar, mas se interrompe a tempo, felizmente para ele, porque tenho certeza de que se as gêmeas contassem para a mãe que o papai falou foder, ele teria um problema muito maior do que se elas contarem que ele falou caralho. Rio com o pensamento e Eric escolhe esse momento para aparecer na sala. Viro o pescoço ao ouvir seus passos, encontrando-o vestido pela minha camisa.
Essa imagem vai ficar presa a minha mente por muito tempo. Pisco para ele que está vermelho por se deparar com Rodrigo e as meninas na porta.
— Meninas, porque vocês não se apresentam pra tio Eric? Mostrem pra ele onde o tio esconde os biscoitos de chocolate. -peço e Alice inclina a cabeça levemente enquanto observa o homem parado ao lado do balcão da cozinha.
— Quais, tio? Os bons ou os outros? -questiona, sem desviar os olhos de Eric. Levo meu olhar para ele também e sorrio ainda mais largamente.
— Não sei, meninos... O que vocês acham? Os bons ou os outros? -pergunto baixinho, em tom de confidência.
— Acho que os bons, tio! Ele tem nome de princesa! -Alice sussurra também.
— E você, Alícia? O que acha? -Ela estreita os olhos, como se assim pudesse enxergar muito melhor, e eu me controlo para não gargalhar.
— Por que ele está usando a sua roupa, tio? -questiona, também sussurrado, ao invés de responder e eu engasgo.
— Hum...-enrolo, tentando ganhar tempo, enquanto penso em uma desculpa aceitável para uma menina de oito anos e ela espera, atenta.
— Porque o tio derrubou café nele! Aí tive que emprestar uma roupa pra ele trocar.
Alicia balança a cabeça, concordando.
— Tudo bem! Acho que devemos dar o biscoito bom pra ele, afinal, ele tá usando sua roupa! -sentencia, e eu concordo, balançando a cabeça.
— Então que tal vocês mostrarem a ele enquanto eu falo com o papai? -Elas concordam e passam pela porta. Rodrigo e eu, finalmente, nos levantamos e, olhando para dentro, encontro o olhar de Eric, interrogativo e levemente desesperado. Rio, e encosto a porta, deixando apenas uma fresta entreaberta e que Eric lide com as meninas sem nem mesmo tê-las apresentado.
— Sério, Gustavo? Porra! O vizinho? -Rodrigo diz antes mesmo que meus olhos tenham encontrado seu rosto: ͞ E você ainda tem a cara de pau de dizer que era trabalho?
— Qual é a emergência? -Ignoro seus questionamentos. Ele respira fundo, inclina a cabeça e, por fim, balança, negando, desistindo de mim.
— A mãe da Camilla sofreu um acidente doméstico. Precisamos ir até lá.
— Entendo... -Apoio a mão no queixo: ͞ Voltam hoje?
— Espero que sim... -responde, já parecendo cansado, às nove da manhã. Levo as mãos ao seu rosto, amparando-o.
— Ei, vai dar tudo certo! -Ele suspira, depois, concorda com um aceno e eu o abraço. Rodrigo retribui, e eu sei que o que quer que tenha acontecido, o está preocupando demais.
— Eu te ligo pra avisar como estão as coisas. -Desvencilha-se do abraço e eu concordo, com os braços cruzados na frente do peito. Ele se vira para sair, mas para dois passos depois, e me olha.
— Não faz merda, cara... -pede, resignado, e eu sorrio.
— Pode ser um pouco tarde demais pra isso... -Seus olhos se estreitam.
— Cuida dos seus sogros, irmão. Quando estiver tudo bem, conversamos...
— Gustavo... -Seu tom é de aviso.
— Quando você voltar, Rodrigo... -respondo no mesmo tom.
— Puta que pariu! -resmunga e sai caminhando na direção do elevador.