Havia uma faixa, que foi desenrolada. Era um banner cheio de fotos e tinha recados de cada pessoa:
- VEM LOGO, ESTÁ ESPERANDO O QUÊ? - berrou o Tom.
O Caio veio aos prantos, mancando com a perna de pau. Eu também não me contive e chorei um pouco. Chorei o bastante. Chorei expressivamente.
Ok, chorei muito!
Ele abraçou o Tom, ficou um tempão agarrado a ele e a Claudinha se agarrou aos dois. Depois o Caio começou a abraçar a todos. Quando ele veio me abraçar, me bateu antes no braço.
- Seu desgraçado, nem me avisou! - me abraçando.
- Nem eu sabia!
- Mentira!
- Juro, juro, juro.
- Ai, queria tanto te beijar aqui!
Saímos do abraço, ele passou a mão no meu rosto, enxugando as minhas lágrimas. O Tom foi ao microfone de novo e deu início aos parabéns:
- Garçom, poderia trazer o bolo, por favor!
A partir daí o resto já não era surpresa para o Caio, afinal, era o bolo que ele havia encomendado.
Cantamos os parabéns e, no momento em que ele partiria a primeira fatia, chamou os seus pais:
- Bom, a primeira fatia...não tem como...vai para os meus pais. Essas pessoas de tamanha paciência e inteligência, porque...só assim mesmo para me suportarem. - algumas risadas - então, pai, mãe, esse pedaço vai para vocês, que me apoiam tanto nessa vida.
A mãe do Caio já estava com a maquiagem toda borrada e o pai do Caio tentava não chorar, mas sem muito sucesso. Depois sentamos todos à mesa e o Caio começou a comer do bolo.
- Me senti traído agora: por que vocês não me falaram do vídeo? - perguntei.
- Para você sair correndo contar ao Caio? - insinuou a Claudinha.
- Eu não faria isso!
- Será?
- Juro que não. Claro que não.
- Enfim, preferimos não correr o risco.
- Ai gente, foi lindo, obrigadão mesmo! - disse o Caio.
- Lindo o bastante para você desistir de Gastronomia? - perguntou alguém da turma.
- Haha. - irônico - não!
- Ah, então vamos embora gente, vamos, vamos!
- Hahahahahhahaha...
A banda do Seu Guilherme começou a se arrumar no palco. Quando prontos, o velho saxofonista falou:
- Estamos aqui hoje comemorando o aniversário desse garoto simpático, que gosta de boa música e que me convidou para tocar na sua festa. Parabéns, Caio!
Depois do pequeno discurso, o Tom começou a fazer piadas:
- “...garoto simpático...”? - perguntou ele - O Caio está dando pro Seu Guilherme, o Caio está dando pro Seu Guilherme! - cantarolou.
- Hahahaha, cala a boca, pervertido! - disse o Caio.
- “...gosta de boa música...”? Ele sabe que você canta Britney no chuveiro?
- Tom, vai se lascar!
A primeira musica tocada foi “Singing In The Rain”. A banda de jazz tocou durante todo o almoço. Para aqueles que torciam o nariz para esse gênero de música, surpreendeu-se, pois foi até muito divertido.
Depois da primeira canção, o repertório se mostrou bem agitado. O Caio não resistiu, tirou a perna de pau e foi dançar. Alguns casais formaram pares e também ocuparam a pista. O Caio balançava o dedo indicador enquanto chacoalhava os quadris.
Depois da banda, o Caio abraçou o Seu Guilherme e cumprimentou toda a banda, convidando-os para comer bolo.
- Marlon, fica de olho nesse velho muxiba, pois ele está pegando o Caio! - alertava o Tom.
O DJ voltou a tocar no mesmo volume de antes, mas não demorou muito e as pessoas começaram a reclamar, inclusive os clientes. Então o DJ perguntou:
- Pessoal, se todo mundo concordar, eu posso aumentar o volume. Todo mundo é a favor?
- SIM! - gritaram todos; creio que tenha sido unânime.
Pronto, a festa agora poderia ser chamada de sucesso, mesmo só estando na metade.
Era domingo. Em geral, esse é um dia que associamos a programas enfadonhos. Todo domingo é almoço em família, visita de primos antipáticos e piadinhas sem graça dos tios. Tudo isso pode ser feito em casa, mas também podemos transportar essa chatice para uma churrascaria.
Aquele domingo era uma celebração à criatividade, à felicidade e à boa companhia e Seu Ademar percebeu isso assim que viu. Enquanto o Caio recebia os convidados e envolvia os outros clientes no clima, o dono do lugar se aproximou:
- Olá. - disse o homem com um sorriso.
- Oi. - disse o Caio.
- Tudo bem por aí?
- Tudo.
- Que bom!
- O estacionamento sempre fica cheio de carros desse jeito? - provocou o Caio.
- Às vezes.
- É que essa churrascaria é caminho para a minha antiga faculdade e eu nunca vi tantos carros por aqui.
- É... Você poderia fazer aniversário mais vezes, não acha?
- Hahaha, o senhor é tão, mas tão engraçado, sabia? - ironizou o Caio, que lhe deu as costas e foi embora, me puxando junto com ele.
Enquanto andávamos entre as pessoas que dançavam, eu disse:
- Nossa, você ficou tão bravo com ele!
- Hoje de manhã ele torrou o meu saco. Disse que eu não podia fazer um monte de coisas e que a festa não daria certo, que eu traria prejuízo... enfim, foi uma tortura. Eu quase acreditei nele e desconfiei da minha capacidade.
- Oh, meu bebê, duvidar de si mesmo? Você nunca fez isso.
- Mas quando alguém fica no seu pé tentando te derrubar, você começa a pirar.
- Eu imagino. Vamos só curtir, ok?
Já ultrapassava dezessete horas e a casa ainda estava cheia. Onde no mundo uma churrascaria chega a esse ponto? Aliás, de churrascaria só restavam as carnes, pois o pessoal estava dançando muito. Os clientes mais velhos foram saindo mais cedo, mas com um sorriso no rosto de surpresa, pois não esperavam por isso. Os mais jovens ficaram admirados: não era um domingo qualquer.
Um grupo de meninas de uma faixa de quinze procurou saber se poderiam continuar na festa, mesmo que seus pais fossem embora.
Isso se tornou frequente. O Caio se tornou o pai dos pré-adolescentes. Ele juntava a molecada e ia de encontro aos pais, para convencê-los a permitirem que os filhos ficassem.
O que isso significava? Mais consumação. Os pais iam, mas o dinheiro ficava. Foi aí que percebi. Sim, o Caio sabe fazer propaganda, mas tudo isso envolvia um restaurante, comida, ambiente, música.
O Caio deveria ser mesmo um proprietário de uma casa de comidas. E digo “casa de comidas”, pois ele é versátil para ser chef de um restaurante francês ou o balconista de um boteco. Sim, o Caio poderia unir os dois talentos que ele tinha. Dois dos milhões que ele tinha, na verdade.
Depois da certeza absoluta do sucesso alcançado, o Caio sentou-se. Sentei ao seu lado.
- Parabéns, você é um grande chef de verdade!
- Consegue entender o que eu quero da minha vida agora?
- Sim.
- Fico tão feliz. Esse é o melhor presente que você poderia me dar. Isso é o que quero fazer até morrer e quero você ao meu lado. É importante para mim que você entenda. Que bom que você entende!
- Você nasceu para isso. Por isso você ficou chateado com o Ademar. Ele te colocou limites, mas o seu estilo de fazer um restaurante não tem limites.
- Quero que as pessoas entrem no meu restaurante achando que vão comer e saiam morrendo de fome de voltar para se divertir.
- Que lindo isso!
- Não é? Olha os meus olhos brilhando.
- Tive uma ideia: vamos fazer o Seu Ademar falir e comprar esse lugar a preço de banana.
- Hahaha, que maldade!
- Hahahaha. Ei, já pensou em que nome dar ao seu futuro restaurante?
- Claro! - disse ele entusiasmado - vai se chamar “O Saxofone”.
- Hã? Por quê? - estranhei.
- É um nome que me agrada, é um nome que quando ouço o acho sonoro. Para mim tem cara de diversão, tem tudo a ver com comida. Não necessariamente tocarão sax todos os dias, mas é um nome gostoso. É um conceito!
Enquanto conversávamos, Tom sentou-se conosco.
- Oi gente linda e poderosa!
- Oi, gato. Está arrasando na pista hoje, hein? - disse o Caio.
- Cara, nunca me imaginei dançando numa churrascaria. Sério!
- Ai, eu daria tudo por um contra filé agora... - disse o Caio.
- Vamos chamar o garçom. - eu disse.
Depois do pedido feito:
- Caio, você vai mesmo nos deixar né? - choramingou o Tom.
- Não, chega disso. Para, Tom! - eu disse - O Caio quer ser um chef e é isso o que ele vai ser.
- Ai, que grosso. Não faz isso comigo, Marlonzinho-zinho-zinho.
Quando o Tom disse isso, arregalei os olhos e o Caio deixou o garfo cair no prato propositalmente, provocando um tilintar do metal com a louça.
- Oops! - disse o Tom.
- Tom! - briguei.
- Ai, desculpa, foi sem querer.
- Tá, mas não repete mais isso. - eu continuei.
O Caio não disse nada, só olhava para o Tom com a boca aberta.
- Ah, o quê que é também? Vocês têm que parar com essa bobagem, né?
- Não é bobagem! - disse o Caio.
- É claro que é. Não está vendo que esse cara aí te ama? Agora fica com criancice...
- Chega, Tom! - eu briguei.
- “Chega” nada. Vai dizer que você não sente falta do Caio te chamando assim?
- Não, ele não sente. Não é, amor? - perguntou-me o Caio olhando para o Tom.
Eu fiquei calado. Não sabia o que responder. Não sabia se mentia. Sim, eu sentia muita falta dele me chamando de “Marlonzinho-zinho-zinho”. Muita mesmo. Tanto que eu nem achei que fosse possível. Não soube como prosseguir. Eu comecei a gaguejar. O Caio se virou para mim e insistiu:
- Não é, amor?
- Eu...não sei.
- Como não sabe?
- Eu sei...eu sinto.
- Sente?
- Viu? Ele sente sim. Agora parem de se fazer de desentendidos e resolvam isso o quanto antes. E que se foda que isso é assunto só entre vocês. Eu vou me meter sim! - brigou o Tom.
- Bem, se isso é uma bobagem, então por que sentir falta de um apelido tão bobo? - perguntou o Caio.
- Boba é essa sua atitude de ainda ficar dando créditos ao Arthur. Nossa, aquele lá já morreu. Pare você de se fazer de “namoradinho chateado”. Isso nem combina com você!
O Caio ficou um tempo olhando para o Tom, depois ele me olhou, baixou a cabeça e voltou a comer. Ele respirou como se fosse dizer algo. A expectativa era de que ele dissesse algo em um tom humilde, não importa o que ele dissesse, mas seria um tom brando.
- Mas eu não consigo mais dizer, ponto! - disse agressivamente.
- E o Marlon continuará sentindo falta, ponto! - disse o Tom dando-lhe o troco.
Fiquei com medo dessa briga dos dois. Temi que Caio e eu voltássemos a nos estranhar, mas, no fundo, o que eu queria mesmo era que o Tom ganhasse a batalha.
- Mas tudo bem, a gente não precisa ficar nesse climão! - disse tentando apaziguar.
Mas Caio e Tom ficaram calados e se estranhando o resto da noite. O Tom se levantou da mesa calado. O Caio continuou comendo.
- Caio?
- Sim?
- Tudo bem?
- Tudo. Só não gostei do que aconteceu.
- Deixa para lá.
- Deixarei, mas o Tom não deixará.
- Como assim?
- Ele ainda vai insistir nisso.
- Não dá bola.
- Não posso.
- Por quê?
- Ele é meu amigo. Não posso ignorá-lo.
- Não se preocupa com isso, eu não ligo mesmo.
- Liga, liga sim.
- Não... ah, esquece.
Depois que ele terminou:
- Desculpa mesmo, mas eu não consigo!
Antes dessa pequena discussão, não achei que sentisse tanta falta assim de ser chamado por um nome tão bobo. Mas eu sentia e me surpreendi com isso.
Essas últimas palavras dele deveriam ter me soado como algo qualquer, um pedido de desculpas comum, como alguém que pisa no seu pé sem querer e se redime em seguida. Mas não era uma pisada no meu pé, era uma pisada no meu desejo, nos meus sentimentos.
O Tom não foi o culpado, foi uma luz que clareou muitas coisas. Talvez não fosse só um nome, talvez fosse mais que issoA festa, que aparentemente não tinha hora para acabar, acabou por volta das vinte e uma horas. Acabou “cedo”, pois era domingo. Segunda feira é dia de trabalho, escola e faculdade. As pessoas se despediam do Caio com um enorme sorriso no rosto.
O Aniversário era dele, mas a surpresa era dos convidados e demais clientes. Ninguém nunca imaginara comemorar algo de forma tão animada numa churrascaria. Mas, para mim, a festa tinha acabado antes mesmo disso. O Caio terminou de comer e foi dançar com os outros. Passou o resto da festa na pista improvisada, até o momento de partir.
Ele se despediu do Tom, quando este decidiu ir. Não estava próximo na hora, mas vi que eles não estavam zangados um com o outro. Eles já tiveram brigas muito mais feias que esta e sempre faziam as pazes numa boa. Na verdade essa nem pode ser considerada uma briga, era mais uma bronca do Tom no Caio.
As outras brigas eram sempre bem sérias, mas as pazes entre eles era sempre a coisa mais bonita de se ver. Ambos muito criativos em tudo na vida, não poupavam esforços para reatarem.
O Caio já lhe fez várias camisetas e o Tom já lhe fez serenatas na lanchonete da faculdade. Eles entendiam que a briga entre eles era uma atitude de renovação, entendiam que aquele momento era uma euforia que tomava os dois no intuito de fazer o outro enxergar a sua visão a qualquer custo.
Isso era amor e eles sabiam disso. Por isso sempre se perdoavam e o errado sempre reconhecia os erros. O errado, na verdade, sempre eram os dois.
Mas isso não era importante. Eles se abraçaram, riram e provavelmente tiraram alguma piada do bolso.
Nesse momento em que estive longe percebi que isso era algo que Caio e eu não tínhamos. Nossas brigas eram sempre muito fortes e quase nunca sobravam espaços para um reconhecimento de erro e de um futuro perdão imediato.
Quando o Tom estava preste a ir, ambos me olharam, me procuravam. Quando me acharam, chamaram-me com as mãos.
- Já estou indo, tampinha! - disse o Tom.
- Tchau.
- Tchau. - me abraçou - use camisinha, por favor!
- Hahahahah, entre a gente não tem disso, não. Somos um do outro e mais ninguém. Vai embora logo!
Olhei para o Caio, que me olhou com uma cara de cansado. Ele me abraçou, como se estivesse pedindo um apoio para continuar em pé.
- Estou morto!
- Mas valeu a pena...
- Sim, tudo valeu a pena.
- Foi uma festa surpreendente.
- Surpreendente até mesmo para mim.
- Meu amor, tão cansadinho...
- É. E olhe que ainda precisamos bater um papinho, né?
- É?
- Claro. Vamos discutir isso hoje depois de um banho. É melhor, pois a ideia ainda está fresca na nossa cabeça.
- É justamente disso que tenho medo. Não seria melhor descansar, organizar as ideias e depois discutirmos?
- Bem, eu prefiro hoje, mas se você prefere amanhã...
- Sim, eu prefiro.
- Então está certoFomos para a casa dele, tomamos banho juntos e fomos para a cama. Dormimos rapidamente. Ambos estávamos muito cansados.
Na manhã seguinte, acordei mais cedo, fui para o banho e tomamos café juntos.
- Então fazemos assim: quando eu chegar da faculdade, vou para casa, pego uma muda de roupa e venho para cá. Aí aproveito e durmo aqui.
- Não, é melhor eu ir para lá. Não vou fazer nada a tarde toda mesmo...
- Não vai pegar as coisas na churrascaria?
- Sim, mas vou agora de manhã.
- É, é melhor então.
Não parecia que brigaríamos. Estávamos muito centrados do que queríamos de nossas vidas. Queríamos ficar juntos e não seria um apelido que mudaria nossos planos. Estava tranquilo quanto a isso. Estava disposto a abdicar de ser chamado de Marlonzinho-zinho-zinho pelo bem do nosso relacionamento.
Da casa do Caio para casa, de casa para o trabalho e, em seguida, faculdade. Eu estava louco para encontrar a Claudinha e o Tom para conversarmos.
Depois de um tempo de faculdade, conversar com os amigos fica cada vez mais difícil, pois parece que mesmo próximos, estamos distantes pelos afazeres.
Nos encontramos na lanchonete, só nós três:
- Você e o Caio fizeram as pazes mesmo, né? - perguntei.
- Nem brigamos... - disse o Tom.
- É, em compensação Caio e eu sempre brigamos.
- Brigaram?
- Não, não. Estou comparando a briga de vocês dois com as minhas. Vocês sempre se perdoam com facilidade.
- É porque, em tese, amizade é muito mais descompromissada que um relacionamento. Ou melhor, é muito mais desinteressada. Todo tipo de relacionamento envolve interesse. Os interesses de amizade não envolvem posse como em um relacionamento, digamos, conjugal.
- É, isso é verdade.
- Mas você sabe o que eu acho em relação a isso né? Eu acho que você não deve abrir mão do apelido. Não porque você sente falta e blá, blá, blá, mas porque isso é muita besteira do Caio fazer questão por isso. Vocês dois são tão maiores que isso...
- É engraçado isso né? Essa coisa da gente julgando o Caio. O Caio sempre foi referência de maturidade, de coerência, de inteligência. Nunca que eu imaginaria que um dia estaríamos dizendo que ele está fazendo bobagens - disse a Claudinha.
- Não sei se é engraçado, mas é fato de que isso é uma grande mudança. Eu sinto falta de ser idiota. Sinto falta dele corrigindo os meus erros. Arrisco-me a dizer que sinto até falta de quando namorávamos escondido.
- Não diria que houve inversão de papeis no caso de vocês, até porque não é você que agora dá lições de moral nele. Mas o que eu enxergo é que vocês perderam os papeis que cada um exerce dentro dessa relação - continuou a Claudinha.
- Eu discordo. O meu papel é ser o...machão, o dele é ser o garotinho - eu disse.
- Putz! - disparou o Tom - Hahaha.
- O que foi? - eu perguntei.
- Esses são os papeis de vocês na cama e não na relação.
- Oops, é mesmo. - eu respondi - que tonto!
- É. Antes vocês sabiam o que eram: o Caio estava te guiando para entrar na vida de um homossexual, mas e agora? Vocês estão em pé de igualdade. Vocês têm tudo, sabem que querem permanecer juntos e estão firmes nesse propósito. Mas e agora?
- Será que a gente não está buscando razões que não existem? Eu sempre me pergunto isso quando começamos a discutir dessa forma.
- Depende. Se você não estiver se enxergando nessas descrições, então realmente estamos pondo cabelo em ovo. - disse a Claudinha.
- Não, eu me vejo sim, mas sei lá... nunca me questionei sobre essas coisas com as minhas namoradas antigas.
- Hello! - disse o Tom - mulher não tem cérebro, logo você nunca chegaria a esse nível de discussão com elas.
- Foda-se. - disse a Claudinha.
- Hahahahaha. - eu ri.
- O que o Tom está querendo dizer, mas não tem capacidade para tal, é que a ideia de namoro que você tinha com mulheres era pegar uma que fosse virgem, desvirginá-la, torná-la sua, eternamente e exclusivamente, casar-se com ela e fazer dela a sua escrava da cama, da mesa e do banho. Vai dizer que essa não era a sua ideia de relacionamento?
A Claudinha estava certa. Eu estava antigamente inserido numa lógica quadrada de relação conjugal. Não posso generalizar e dizer que essa é uma ideia heterossexual, mas era uma ideia que eu tinha quando me achava hétero. Mas essa era uma ideia que eu mantinha com todo o respeito. Juro!
Desde o momento em que eu buscava só as virgens para me tornar seu marido, o meu propósito era sempre de ficar com uma e permanecer com ela até o fim da vida. Por isso uma virgem não só de sexo, pois eu a moldaria de acordo com o meu gosto.
São coisas como essa que me mostram como eu evoluí.
Hoje eu enxergo essa lógica como uma das coisas mais estúpidas que um homem heterossexual possa pensar. Ainda mais agora que eu sou feminista (o Caio também é responsável por eu ser defensor da causa).
- Sim, era essa a ideia - disse envergonhado, pois todos somos feministas.
- Mas com o Caio você sabe que a coisa é mais séria. E não é porque é o Caio, ou porque ele é homem, é porque você sabe que o relacionamento de vocês é para valer e que vocês estão em pé de igualdade, então todo cuidado é pouco na hora de analisar as questões.
Conversamos mais um pouco, até que vamos encerrando:
- Sim, mas eu vou me encontrar com ele já-já. O que me dizem?
- Sei lá... Deixe claro que a questão do apelido é porque você sente falta de como vocês eram antigamente e não simplesmente pelo nome. O nome só faz parte do passado. Um passado que você quer reviver... - o Tom interrompe.
- É ISSO, REVIVER! - gritou o Tom.
- O que foi? - eu perguntei.
- Vocês estavam numa vibe e, de repente, isso foi quebrado. Você sente falta é de uma conclusão. Vocês estavam andando e, de repente, - ele faz um som de pancada - bam! Vocês esbarram. O que você quer é voltar ao mesmo caminho por onde vocês estavam andando, entende?
- Mais ou menos. - disse eu meio desacreditado.
- Vocês estavam bem. Você só quer concluir o que vocês estavam construindo. O hoje não se parece em nada com o ontem de quando vocês estavam bem. Vocês estão bem agora, mas não retomaram “o bem” de antes, vocês fizeram outro “bem”. Pegaram outro caminho, entende?
- Acho que sim, mas... em termos práticos, como eu faço para voltar para o primeiro caminho.
- Sei lá. Diga isso ao Caio. Quem sabe ele não tem a resposta para isso?
(...)
E quantos caminhos nós temos que percorrer para entender que somos complicados e que tudo o que devemos fazer é tentar encurtar a caminhada, para não nos cansarmos demais durante o percurso? Por que somos todos tão complicados se todos queremos a mesma coisa e sabemos como obtê-la?
Eu só queria acabar com isso de vez. Resolver as pendências que eu tinha com o Caio. O que eu previa do futuro era que não teríamos mais tanto tempo hábil para resolvermos os nossos problemas. Na verdade, acredito que nenhum casal que cresce junto, amadurece junto, dura muito tempo se os problemas crescem e não são imediatamente resolvidos. Isso porque, com o tempo... quer dizer, não haverá tanto tempo. E essas briguinhas bobas demandam tempo para serem sanadas.
Só que eu estava enganado. Não seria aquele o dia em que Caio e eu conversaríamos sobre o fatídico apelido. Minha mãe havia reservado justamente esse dia para ter uma conversa definitiva comigo.
Enquanto eu me dirigia para casa, pois o Caio iria para lá, o meu celular toca:
- Alô?
- É o Marlon?
Reconheci de imediato a voz da minha mãe. Arregalei os olhos de susto. Dizem que durante o medo, uma das reações que temos é a aceleração dos batimentos cardíacos. Bem, posso dizer que o meu coração parou de pulsar naquele momento. Acho que até ele se surpreendeu ao ouvir aquela voz.
- M...Mãe?
- Oi.
- Oi.
Três ou quatro segundos de silêncio depois:
- Você está aonde?
- No ônibus, estou indo para casa.
- Você largou da faculdade agora?
- Foi.
- Está livre agora?
- Livre? Livre para quê?
- Para vir aqui em casa. Quero falar com você.
- Sobre o quê?
- Quando você vier, você vai saber.
- Tá. Agora?
- Você não pode agora?
- Posso.
- Então venha. - em um tom quase imperial.
- Certo.
Desligamos sem nem mesmo dizermos “tchau” um para o outro. Quando tirei o celular do ouvido, olhei para ele tentando arrancar respostas dali. Eu queria interrogar o aparelho, pergunta-lhe o que tinha sido aquilo. Quando percebi que ele não responderia, guardei-o no bolso. Demorei um tempo até digerir aquilo. Depois, desci do ônibus.
No ponto, eu liguei para o Caio:
- Alô, amor, você já está aí em casa?
- Estou, pode vir.
- Eu vou demorar para chegar.
- Aconteceu alguma coisa?
- Sim, minha mãe ligou.
- Ligou para você? - surpreso.
- É, ainda há pouco.
- E o que ela queria?
- Quer que eu vá lá conversar com ela.
- Sobre o quê?
- Não sei ainda, ela não disse.
- Ah.
- Você fica chateado se... - ele me interrompe.
- Não, não, não. Claro que não. Corra para lá, agora! - animado.
- Eu estou indo já.
- Certo, certo, amanhã a gente conversa.
- Mas você já vai para a sua casa?
- Não. Vou te esperar chegar. Posso dormir aqui também, se você quiser. Só que não vai dar para a gente conversar hoje, né? Um problema por vez, por favor.
- Pois é.
- Beijos, meu amor. Boa sorte!
- Beijos.
O ônibus estava demorando a chegar. Decidi ligar para o meu irmão. Quem sabe ele não tinha conhecimento do que a minha mãe queria?
- Alô, Ewerton?
- Oi.
- Escuta, você está sabendo o que a mamãe quer comigo?
- Com você? Não. O que foi?
- Ela me ligou e pediu para eu ir lá. Aliás, como ela tem meu número?
- Papai tem o seu número.
- Hum...
- Ela ligou agora?
- Há pouco tempo.
- Ela não disse o que quer?
- Não.
- É, eu não sei. Estou tão surpreso quanto você.
- O que você acha que é?
- Não faço a mínima.
- Tá...
- Óh, mas me liga para me contar, hein?
- Certo.
- Tchau, boa sorte!
- Tchau.
Eu iria precisar de sorte? Bem, de qualquer forma eu tinha duas delas agora. O ônibus chegou e eu senti que ele não deveria ter chegado.
Enquanto me sentava, percebi que eu preferiria ficar brigado com minha mãe e não falar com ela o resto da vida que ir ao seu encontro e ouvir dela o que o meu irmão e o meu pai já tinham me falado do que ela falava de mim.
Quando o ônibus chegou, andei mais duas quadras até a minha antiga casa. Eu sempre demorava muito para voltar lá, mas sempre que voltava parecia que ela ficava cada dia menor.
Toquei a campanhinha e comecei a tremer. Não demorou muito e ela abriu. Não sei por que, mas eu sorri. Tive medo de ficar com cara de bobo sem fazer ou falar nada. Nesses momentos, eu sorrio.
Ela não sorriu. Olhou-me e disse “oi, entre!”.
Ela seguiu para a sala e eu fui atrás. Ela sentou em um sofá e eu em outro:
- Tudo bem? - perguntou ela.
- Tudo.
- E a faculdade?
- Estou indo bem. Estou estagiando agora.
- Eu sei.
- Pois é...
- Não sei se você soube, mas eu e o seu pai vamos nos separar.
- Eu soube já.
- Não estava dando mais e decidimos que era o melhor.
- Se era o melhor... então tem que ser feito.
- Estou pensando em voltar para o interior.
- Para morar?
- Sim.
- É, a senhora é quem sabe.
- Você sabe por que o seu pai e eu estamos nos separando?
- Não.
- É por sua causa, mas não da forma como você está pensando. Eu tenho que contar uma história para você. Quando eu tinha 16, e isso eu morava no interior, você sabe muito bem, sua tia (irmã mais velha dela) já estava se casando nessa época. Só tinha sobrado eu em casa. O seu avô queria se livrar logo das filhas mulheres, porque, para ele, filha era um problema. Ele vivia dizendo para eu me casar logo. Naquela época, menina de 16 ainda brincava de boneca e eu não era diferente. Mas meu pai queria... Eu me interessei por um rapaz muito bonito, eu era louca por ele. Mas a gente não se conhecia, na verdade ele nem sabia que eu existia.
Então o que eu fiz? Comecei a fazer amizade com a irmã dele, que estudava no mesmo colégio que eu. Ai a gente ficou amiga rapidinho e eu ia muito à casa dela. Depois de um tempo eu disse a ela que gostava do irmão dela e ela me disse que não era boa ideia, porque o irmão dela não prestava para mim, ela dizia que eu não ia gostar dele depois que o conhecesse de verdade e tals. Aí eu insisti mais um pouco, mas depois deixei para lá. Continuamos amigas. Um dia eu estava na casa dela e nós estávamos no quarto... - ela parou de falar e começou a chorar. Enxugou algumas lágrimas e continuou - ...ela me agarrou e me beijou. Ela era bem mais forte e eu não consegui me soltar. A mãe dela chegou na hora e nos viu. Para encurtar a história: ela disse para mãe dela que tinha sido eu quem tinha provocado o beijo e espalhou na escola toda. Meu pai soube, passou uma semana me batendo. Ele e o seu avô, pai do seu pai, eram amigos. O seu pai estava chegando daqui da capital, pois ele estava em serviço e o seu pai nunca tinha namorado firme com alguém. Depois que ele servisse o exército, ele seguiria na carreira, aí sabe-se lá quando ele teria tempo de arrumar uma esposa. Então os seus avós nos casaram.
Eu nem sabia o que pensar. Não poderia imaginar que coisas tão medievais pudessem acontecer em pleno século XX. Nem tenho como descrever o que senti, ou o que se passou em minha cabeça. Não tem como. Depois de todo o choque, perguntei:
- Por isso que você não me aceita?
- E o que você queria que eu pensasse?
- Sei lá. Achei que me amasse...
- Eu amava, mas aí você surge com isso...
- E “isso” apaga todo o bom filho que eu fui?
- Você poderia muito bem ter seguido outro caminho.
- Você também. Poderia não ter se casado com o papai, se não era o que você queria.
- E eu tinha escolha?
- Tinha. E eu tive também. Entre fazer o que os meus pais queriam e o que o meu coração queria, eu fiz o que o meu coração estava pedindo. Eu tive escolha assim como você teve. Mas ao contrário do que você pensa, essa escolha não era para... enfim, escolher entre ser hetero ou gay. Você acha que eu acordei um dia e pensei “Ah, vou chocar o mundo. Vou virar gay!”? As pessoas nascem assim. Assim como você nasceu mulher. Você escolheu nascer mulher? Acho que não. Eu também não escolhi nascer gay. Você poderia ter agido diferente: o vovô achava que filha era um problema, mas você não tinha culpa de ter nascido assim. Eu também, mãe, eu também não tenho culpa de ter nascido assim. Você me tratou do mesmo jeito que o seu pai fez com você.
- É diferente, Marlon... - interrompi abruptamente.
- Não é nada diferente. Nada mesmo!
- Como não é?
- Eu acho tão engraçado, sabia? Vocês homofóbicos são hilários. Você acha que alguém em sã consciência iria escolher um estilo de vida como esse? Você acha que alguém que pudesse escolher, escolheria ser odiado pela família, apontado na rua, ser discriminado na escola, ser chamado de pecador...? Você acha que eu sou maluco? Do mesmo jeito que você não teve culpa do que te aconteceu, eu também não. E outra, não é só porque essa menina aí te beijou desse jeito grosseiro e espalhou mentiras que todo gay é desse jeito não. Somos humanos como outro qualquer. Tem hétero bom e hétero ruim, não tem? Pronto, tem gay bom e gay ruim também. Assim como tem mulher vadia e mulher religiosa.
Assim como tem homem que estupra e homem que faz voto de castidade. E se no fim de tudo isso que eu te disse você ainda não me aceitar, vou te dizer uma coisa que serve para você e serve para todo mundo que é homofóbico: se eu sou tão nojento assim, ignore as minhas nojeiras e finja que eu não existo, cada um vive a sua vida e acabou.
Eu estava decidido a gritar com ela. Não dei espaço para ela falar e despejei tudo o que eu tinha na garganta. Agora era o fim de verdade. Eu estava com medo de ser o fim, com ela me dizendo coisas horríveis. Mas eu até gostei. Gostei do fato desse ser o fim, o fim desse jeito. Ela me odiaria para sempre, mas ficaria claro, pelo menos para mim, de que eu estava certo.
Ela ficou um tempo pensativa. Talvez refletisse sobre tudo o que eu acabara de despejar. Ela enxugou um pouco as lágrimas e disse:
- Se eu não te amasse, tudo seria mais fácil.
- Não faz diferença para mim.
- Isso porque você não me ama.
- Você não sabe. Como pode saber se te amo?
- Sei lá... já não sei de mais nada.
- Antes que eu comece a falar de você, falemos de mim: entendeu tudo o que eu disse?
- O que você vai falar de mim? O que você tem para falar? - perguntou desafiadora.
- Deixemos isso para depois. Entendeu o que eu disse?
- Do que está falando?
- Da minha culpa, da minha suposta culpa.
- Me perdi na conversa.
- Eu acabei de berrar que não tenho culpa de ser gay.
- Ah sim...
- E então? - falei.
- Será que não tem mesmo? - ela desdenhou.
- Bem, se eu tiver, a culpa é toda sua.
- Minha? - assustada.
- Sim, sua. Quem me criou? Quem me educou? Quem me ensinou ou deveria me ensinar o que é certo e errado? O papai esteve fora de casa durante todo esse tempo. Se algo poderia ser feito quanto à minha sexualidade, então a culpa é sua.
- Isso não é justo!
- Não, não é. Mas se houver culpados, então a senhora é a culpada.
- Talvez realmente tenha sido a falta do seu pai em casa.
- E porque o Ewerton não é gay? A mesma falta que o papai fez para mim também fez para ele. Temos os mesmos pais, moramos na mesma casa, dividimos o mesmo espaço, os mesmos brinquedos, saíamos para os mesmos lugares. No entanto eu sou gay, ele não. - respirei fundo - Entenda, mãe, por favor, não há culpados. Ninguém é culpado. Eu nasci assim. Livro-te de toda a culpa, pois não há culpa nenhuma. Já te disse, isso não compete a ninguém. Não é justo que você me odeie, não é justo que me atire pedras. Eu não tenho culpa de nada e não fiz nada de propósito, tão pouco fiz para te magoar. Não me trate como o seu pai te tratou. Sabe? Se você me tratar como o seu pai te tratou, te odiarei sem culpa. Se você me tratar como o meu avô, você será pior que ele. Você sentiu na pele o que é sofrer por algo que você não tem culpa e somente por causa da ignorância de uns e outros, que nada têm a ver com a sua vida. Não faça o mesmo que o vovô fez. Não seja como ele. Não estou te implorando, nem pedindo isso por mim. Já disse, não faz diferença se você me odiar com ou sem fundamento. Ódio é ódio. Mas faça isso por você mesma. Não quer uma vida nova? Comece por nós.
Ela ainda soluçava e enxugava as lágrimas. Eu mesmo não acreditava que tinha dito tudo aquilo. Não faço ideia de onde que aquelas palavras haviam surgido.
Eu tinha acabado de conhecer a história da minha mãe com o meu avô e já comentava como se soubesse desse fato há muito tempo.
Talvez porque sofrimento pela ignorância dos outros, por mais distintos que eles sejam, ainda é sofrimento e ainda é ignorância.
- E então? - perguntei.
- Eu não sei, Marlon. Eu não queria sentir isso, mas eu sinto.
- Não tenho pressa. Só quero sair daqui e saber que você sabe que eu não tenho culpa.
- Eu posso entender isso.
- Pode mesmo?
- Acho que sim, mas ainda não gosto da ideia de você namorar um rapaz.
- E que mal eu te faço ou faço ao mundo se eu beijo um homem ao invés de uma mulher?
- Não é agradável.
- Quem disse isso? Seu pai?
- Já chega de falar do meu pai. - disse zangada.
- Já chega por quê? Ele ainda te magoa, você também me magoa.
- Se é o que você quer para a sua vida, então seja feliz.
- MÃE! - gritei furioso.
- O que é, menino? - assustou-se.
- ACABEI DE DIZER MIL VEZES QUE NÃO TENHO CULPA! - continuei gritando agressivamente.
- E eu ouvi. Estou dizendo para você fazer da sua vida o que quiser. Está achando ruim?
- Estou.
- O que você quer de mim?
- Você diz para eu ser feliz como eu quiser. Droga, mãe, eu não escolhi. Devo repetir? Quando você diz que eu devo fazer da minha vida o que quiser, ao mesmo tempo você diz que isso é uma escolha. Não é uma escolha. Eu não tive escolha. O que eu sinto é que gosto de homens, então não diga para eu fazer o que quiser, pois não namoro rapazes porque quero, porque escolhi. Não!
- E eu já entendi.
- Então não diga para eu fazer da minha vida o que eu quiser. Você gosta de homens também, então não vou dizer “faça da sua vida o que quiser”, pois o único gênero pelo qual você pode se apaixonar é o masculino. Não é uma escolha: ou você se sente atraída por homens, ou nada feito.
- Tá, tá, tá...
- Ponha isso na cabeça!
Acho que a partir daquela conversa eu nunca mais deixaria que alguém dissesse que homossexualidade é uma escolha. Estava tão determinado, que senti as veias pulsando quando eu me defendia.
- E você, vai mesmo voltar para o interior?
- Está decidido.
- Certo. Eu quero que você seja feliz. Quero mesmo. Faça o que eu fiz: se permita.
- Eu não contei tudo, Marlon. Eu traí o seu pai.
- Traiu? Com quem? - perguntei espantado.
- Com quem você acha?
- Com o cara lá irmão da menina lésbica?
- Ele mora aqui na cidade, mas está voltando para o interior. Ele é viúvo.
- Nossa! - disse sorrindo.
- Está sorrindo? - perguntou estranhando.
- Você já estava se permitindo e eu nem sabia. Hahahahahahaha.
- Me respeite, Marlon.
- Não é falta de respeito. Juro que essa risada é de felicidade. Um pouco de surpresa também, pois não imagino você traindo o papai.
- Não fale assim. Eu não traí por trair.
- Não estou julgando. Mas...o papai já sabe disso?
- Sabe. Mas ele não pode falar nada. Ele sempre me traiu também.
- E você sempre soube?
- Claro, não sou burra!
Fechei-me.
Era estranho a mamãe falando que traía o papai e ouvi-la dizer que sempre soube que o papai a traía também.
Era péssimo, na verdade. Percebi naquela hora que esse era o tipo de relacionamento que eu não gostaria de cultivar. Isso não é viver.
Mamãe estava se permitindo só agora, mas ela teve que trair para isso. Percebi que a minha atitude em assumir e brigar com o mundo era muito mais digna, mesmo que eu não seja ninguém para julgar.
- Bem, então...seja feliz! - disse ainda abobalhado.
- Obrigada - disse ela envergonhada.
- Quando você vai mesmo para o interior?
- Antes de ir, eu te comunico. Mas vou em breve.
A conversa parecia que tinha se encerrado. Eu me levantei e ela ergue-se em seguida.
- Eu já vou indo, então.
- Certo.
Pensei em pedir-lhe um abraço, mas nem eu mesmo sabia se queria um. Fiquei um tempo a olhá-la e me senti tímido para qualquer coisa.
- Bem, então...tchau né? - disse eu.
- Tchau, Marlon - disse ela de forma doce.
Eu sorri e fui andando para o portão. Ela veio atrás. Quando eu abri a tranca, ela passou a mão pelo meu ombro. Era um ensaio de um abraço. Eu me virei, a abracei, mas foi um abraço rápido. Sorri de novo e saí.
No ponto de ônibus, eu ligo para o Caio:
- Oi.
- Oi, amor, já conversou com a sua mãe?
- Já.
- Tudo bem?
- Tudo.
- Que bom. Vem para cá agora?
- Sim, estou no ponto. Já-já estarei aí.
- Estou esperando.
- Beijo.
A viagem até a minha casa era longa. Deu para pensar em toda a vida. Desde o momento em que descobri o sexo, passando pela descoberta do Caio, descoberta da minha sexualidade e descoberta do mundo que enxergo hoje.
Se fosse para resumir em uma palavra, eu diria “decepção”.
Nada me animava. Parece que tudo conspira para que você chegue à conclusão de que nada é perfeito e de que tudo deve ser errado ou ruim porque é da natureza das coisas que isso aconteça.
Com exceção do Caio. Eu amo muitas pessoas nessa vida, mas me parece que todas elas podem sumir que não sentirei falta. Não o Caio. Não posso dizer que ele é a única coisa que me faz feliz, pois seria injusto, mas sem ele eu não vivo, não. Era o meu consolo.
Ao chegar, subi as escadas, abri a porta e encontrei o Caio no sofá assistindo TV.
- Oi meu amor! - disse ele docemente.
Eu sentei ao lado dele, o olhei com cara de triste e pedi:
- Me abraça?
Ele não fez cerimônia e me abraçou imediatamente. Ele não disse uma palavra. O único som que ouvíamos era o da televisão.
- Cadê o Lu?
- Saiu. Foi comprar alguma coisa.
- Então me põe para dormir?
Ele desfez o abraço, me olhou nos olhos, sorriu como se estivesse achando tudo muito gracioso. Levantou-se, estendeu a mão para mim e disse:
- Vem!
Eu achei aquilo de um carinho imenso.
Sorri e lhe dei a mão. Ele me puxou para o quarto e me sentou na cama, sentou-se no chão e começou a tirar os meus tênis, depois as meias. Levantou-se e se inclinou para tirar o meu cinto e desabotoar a calça.
- Levanta os braços. - pediu ele.
Tirou a minha camisa, me empurrou na cama, me fazendo deitar, e começou a puxar a minha calça. Depois ele tirou a bermuda e se deitou comigo. Ele enfiou o rosto entre o meu ombro e o pescoço, enroscou as suas pernas nas minhas e me abraçou.
- Caio, tira a camisa - choraminguei.
Ele se ergueu um pouco e tirou a camisa. Voltou a deitar-se. Comecei a enchê-lo de selinhos.
- Seu cheirinho está tão bom... - disse ele.
- Cheiro da rua?
- O seu cheiro original.
- Você gosta?
- Muito.
E ele continuou enfurnado no meu pescoço.
Depois de muitos minutos:
- Caio, promete que nunca vai me deixar?
- Prometo!
- Eu te amo. Na volta para cá eu percebi que você é tudo na minha vida. Não que eu não soubesse antes, mas hoje ficou mais claro.
- Quer conversar sobre hoje?
- Não. Só queria te dizer que você tem muita responsabilidade. Muito mais que antes. Se você me deixar, eu morro.
- Se eu te deixar, eu me mato.
- Então não me deixe.
- Não vou te deixar.
- Promete? - pedi com voz de choro.
Ele ergueu a cabeça para me ver. Ele me olhou com estranhamento e comoção.
- Marlon, querido, o que houve? Não precisa ficar assim. É claro que eu nunca vou te deixar. Eu fui um idiota no passado, mas o passado é passado. Eu também sinto que você já faz parte de mim e também sei que perder você seria a coisa mais triste.
- Eu sei que não faz sentido esse meu choro agora, mas é que hoje eu cheguei à conclusão de que você é tudo o que eu tenho. Eu não tenho mais nada além de você.
- É claro que você tem, meu amor. Você tem o seu irmão, tem o seu pai, tem os seus amigos, que são verdadeiros... - eu interrompi.
- Não, Caio. Tudo isso eu conquistei com você e por você. Eu nunca tive a minha família, pois me censurava a dizer um simples “te amo” para eles; nem tinha amigos de verdade. Tudo surgiu depois de você. Nada terá mais valor se eu te perder.
- Mas você não vai me perder!
- Promete?
- Prometo, prometo, prometo!
Ele me abraçou forte e começou a chorar também.
Eu sentia as suas lágrimas banhando o meu ombro. No fim, ele acabou dormindo em meio às lágrimas e eu fiquei admirando o teto e guardando o sono do meu amor.
Parecia infantilidade minha, mas eu queria mais que nunca que o Caio me chamasse de Marlonzinho-zinho-zinho.
Queria esquecer isso. Isso pouco importava diante do meu medo infundado de perder o Caio, mas eu ainda pensava nisso. E pensava forte.
Quando o relógio já registrava a madrugada, eu me conectei à internet. Encontrei o Tom online.
- Por que não veio dormir aqui hoje?
- Meus pais não deixaram... acho que eles tem medo que eu emagreça por estar transando demais.
- kkkkkkkkkkkk
- Razz
- Está fazendo o quê?
- Lendo contos.
- Eu pensei que você já tivesse parado com esse vício...
- Eu também, mas hoje não tem nada interessante para fazer.
- Vai, manda o link.
- Espera.
E eu recomecei a ler os contos daquela comunidade. Alguns ainda valiam a pena ler.
Debrucei-me em cima da mesa e passei os olhos nos textos. Eles não me prendiam mais a atenção como antes, mas algo voltou a me chamar a atenção e me fez enxergar um fato novo: os leitores realmente se envolviam. Achei curioso. Achei uma ideia:
- Tom, sabe o que eu estava pensando agora? E se eu escrevesse um conto?
- Você? Por quê?
- Para o Caio.
- Por quê? Homenagem?
- Mais ou menos isso.
- E o que é então?
- Estou cansando de pedir para ele voltar a me chamar de Marlonzinho-zinho-zinho, então vou pedir para que outras pessoas façam isso por mim.
- Os leitores?
- Sim.
- :O
- O que você acha?
- Que lindooooooooooooooooooooo!
- Hehehe! Então está decidido. Quando as férias vierem eu começo a escrever, mas ó, é segredo de estado, viu?
Eu estou tão ansioso, sabiam? O que será que o Caio vai pensar quando ler?
Estou me programando para mostrar o conto para ele. Eu pensei em mostrar numa sexta feira, pois aí ele teria tempo de começar a leitura e terminá-la antes da segunda.
Para quem se lembra, o Caio já está estudando Gastronomia, então não quero que ele se atrapalhe com as aulas.
Tenho medo que ele fique zangado. Ele não gosta do apelido, mas isso nunca foi problema. Mas agora muita gente que ele nem conhece sabe o porquê. Fico preocupado. Mas acredito que ele gostará sim da surpresa.
Segundo o Tom o Caio irá gostar muito.
Não pretendo me mostrar porque meu pai é PM e há uma série de complicações. Desde pequeno que eu e meu irmão fomos educados a nunca falar sobre a profissão do meu pai a estranhos.
Não que eu ache que alguém vá me sequestrar, mas, como dito antes, agora muitas pessoas de todo o país sabem da minha história em muitos detalhes. Até mesmo a minha rotina, pois ela não mudou nada. Espero que compreendamCaio e eu teríamos uma conversa logo em seguida. Teríamos.
Quando ele acordou, eu ainda estava no computador.
- Tão cedo na internet?
Ele estava deitado, espremia os olhos para me ver melhor. Depois de alguns bocejos, ele se levantou e veio até mim. Sentou-se no meu colo e beijou a minha testa.
- O que está vendo aí?
- Nada, só estou no MSN.
- Hum... olha, o Tom!
- Estávamos conversando. Mas ele já está off.
O Caio virou-se para mim, sorriu e perguntou:
- E como vai o meu príncipe de armadura branca?
- Bem... - não muito convincente.
- Bem, desse jeito?
- Ainda abalado com o papo que minha mãe e eu tivemos.
- Sei.
- Quando eu tiver ânimo, eu te conto.
- Não tenho pressa.
Voltei minha atenção para o Caio. Fechei mais um pouco as pernas e abracei a sua cintura, puxando-o para o meu peito. Ele se deixou cair em cima do meu tórax e deitou-se. Pôs a cabeça em cima do meu ombro e começou a acariciar os meus antebraços.
- E quanto à nossa conversa? - perguntou ele em outro bocejo.
- Deixa para lá.
- Deixar para lá?
- É.
- Tem certeza?
- Tenho.
- Mas...você quem quis conversar...
- Não quero mais.
- Por quê?
- Não sei, não vejo muito sentido nisso agora. Vamos deixar as coisas esfriarem mais ainda. Vamos ver mais água passando debaixo dessa ponte. Quem sabe, se depois disso tudo, a gente não acerta essas contas de vez?
- Lembro-me de uma vez que você disse o quanto era difícil resolver coisas que já se passaram. Elas sempre voltam e com muito mais força. Tem certeza de que é isso o que você quer?
- Sim, pois não enxergo mais isso como um problema. Pelo menos não agora. E você também não enxerga. Então eu vou deixar isso passar. Se eu perceber que esse tempo não deu certo, a gente conversa de novo, ok?
- Sim, senhor, Capitão Gelatina!
- Capitão Gelatina?
- É. - levantou-se do meu peito - Olha só essas bochechinhas de gelatina! - disse enquanto apertava-as com as mãos.
- Hahahaha, mas você, hein?
Beijamo-nos apaixonadamente e voltamos para a cama, para dormir o que nos restava de sono. E de conchinhaPassaríamos o réveillon na praia, mais uma vez. O pai do Caio estava fechando um negócio com um outro empresário, que tinha uma casa na praia.
E como uma coisa leva a outra e nessas coisas de sociedades todos fingem ser da mesma família, o pai do Caio resolveu aceitar o convite do futuro sócio.
Mas não ficaríamos, Caio e eu, muito tempo nessa festa.
Antes disso, a minha mãe me ligou do interior. Ela estava morando com o tal cara por quem ela foi apaixonada na adolescência.
Entre a conversa que tivemos e essa ligação de feliz ano novo, minha mãe e eu nos falamos muitas vezes. Ela me contou que o meu agora padrasto tinha um pequeno rancho, criava um pequeno rebanho de ovelhas e fazia queijo para o comércio local. No início eu achava tudo muito estranho, pois nunca imaginei minha mãe no campo.
Exceto pelo preconceito que ela tinha contra a minha sexualidade, ela sempre me pareceu moderna. Mas isso era um pré conceito meu e pré conceito por preconceito, eu preferi simplesmente desejar-lhe sorte.
Meu pai estava “solteiro”, mas nunca sozinho. Não é porque é o meu pai, mas eu devo concordar com o Caio de que o meu coroa é realmente um homem muito bonito e que desperta muita segurança, além de transmitir muita virilidade
É estranho falar assim do próprio pai, mas se fosse uma filha, ela falaria a mesma coisa.
Ainda mais, se fosse uma filha falando que sua mãe é uma “verdadeira gata” ninguém estranharia, então eu também vou tentar abandonar esse meu pré-conceito de que achar o próprio pai bonito é estranho.
Com ele também passei a falar mais e ele me ligou para desejar feliz ano novo.
Meu irmão passaria o réveillon comigo, mas a família da Gabriela iria para outra cidade e ele, como quase marido, foi junto.
Quem não gostou muito foi o Augusto, pois ele também passaria as festividades de fim de ano conosco, mas não pôde. Nós sentimos falta dele.
Outra pessoa também que sentimos falta, mas que se mantinha sempre e a cada dia mais distante era o Vinícius. Não era de propósito. Ele estava trabalhando muito e o novo namorado não era assumido, então ele tinha certas privações.
Da festa do sócio do pai do Caio, fomos para uma famosa balada de réveillon da nossa cidade.
Era sempre assim, desde que nos tornamos amigos. Caio, Tom, Luciano, Claudinha, Diego, Luiza e eu sempre saíamos nos réveillons juntos. Sim, a Luiza voltou a nos acompanhar mais nas nossas andanças.
Quando chegamos à festa, o Caio imediatamente comprou duas garrafas de champanhe e taças de plástico.
- Tão cedo, amor? - questionei a compra das bebidas.
- Não, é só para reservar logo as nossas garrafas.
Dançamos muito antes dos fogos que anunciariam o ano de 2009.
Antes das explosões, enchemos nossas taças e brindamos a nossa amizade.
Foi um momento lindo, cheio de lágrimas e sorrisos bobos. Na contagem regressiva, chocamos mais uma vez nossas taças e bebemos. O Caio me abraçou forte, de uma maneira inesperada.
- Nossa, que abração! - disse eu com o Caio ainda agarrado a mim.
- Feliz 2009, meu amorzão querido!
- Feliz 2009 para você também, meu Cacazito!
- Nossa! - ele desfez o abraço - Cacazito?
- É, hahahahaha.
- Isso é tão, tão, tão início das aulas, lembra?
- Lembro de algumas coisas...
- Se eu te pedisse para tirar a camisa agora, você tiraria?
- Hã? Por quê?
- Porque sim.
- Mas...
- Por favor!
- Mas por que isso agora?
- É rápido, juro!
- Qual a sacanagem?
- Não é sacanagem... juro!
Olhei mais um pouco para o Caio com um olhar examinador. Ele fez uma cara de cachorrinho molhado, ajoelhou-se diante de mim, juntou as mãos e começou a implorar com os olhos. Então, ali, na frente de todos, eu tirei a camisa.
No momento em que fiz isso, algumas pessoas vaiaram, outras aplaudiram, outras assobiaram. Fiquei envergonhado. Mas assim que tirei a camisa, o Caio tirou um volume do bolso. Era uma outra camiseta branca. Ele me ofereceu e eu, sem perguntar nada, a vesti.
- Gostou?
Quando olhei para a estampa, vi:
“Feliz dois mil e...”
- Não está incompleto não? - perguntei.
- Atrás está o complemento. - disse ele sorrindo.
- Ah, covardia me mandar vestir sem ver.
- Eu não mandei. Você quem vestiu sem ver.
- Estava com pressa, né? Vai, me diz o que tem atrás?
- “...sempre!”
- Sempre? - estranhei.
- Sim: “Feliz dois mil e sempre!”
- Ai, seu danadinho!
Mais outro abraço selando o início desse anoA minha esperança é de que o meu namorado leia o conto e goste da minha singela homenagem. Não sei escrever como ele escreve, mas eu acho que consegui transmitir tudo o que eu sinto. Cada vírgula, cada palavra, cada erro de digitação ou ortográfico mostra, de maneira muito fiel, o que eu sou, o que eu vejo, o que eu sinto e o que eu prevejo para o nosso futuro.
Talvez, se eu nunca o conhecesse, descobrisse de maneira muito pior acerca da minha identidade sexual.
Talvez se eu nem sonhasse que existe alguém como ele, eu saberia o que significa o amor.
É inexplicável que um sentimento tão simples e tão banalizado, às vezes, hoje signifique tudo o que foi esses últimos quatro anos.
Eu esperava escrever muitas coisas para esse fim, mas estou sem criatividade. É uma pena, mas acredito que tudo o que já escrevi compensa a minha falta de capacidade de agoraMarlon para Caio:
Tudo o que já foi dito, Caio (sim, agora falo diretamente com você, meu amor) é um pedido bobo de desculpas por ter te traído.
É também um pedido bobo para que você nunca me deixe. É uma súplica para que você nunca se canse de mim. Quero que sejamos felizes e estejamos unidos para todo o sempre.
Unidos até “dois mil e sempre!”.
Queria te dizer que o amor que eu sinto por ti é imensurável, não por ser um sentimento, mas por ser de origem desconhecida. Desconhecida dentro de mim.
Não sei de onde surgiu tanto amor e tão pouco sei por que amo um homem.
O que sei é que te amo porque você é bom e nada mais me resta a dizer sobre você.
E, por fim, é este conto um pedido bobo para que você volte a ser um pouco o Caio que você já foi.
Lembro de você como um garoto aparentemente ingênuo e serelepe, que me fazia rir das coisas mais infantis que já ouvi. Quer queira, quer não, sinto falta disso. Obviamente você não deixou de ser o moleque que já foi, mas me falta uma coisa:
- Me chama de Marlonzinho-zinho-zinho quando você me acordar amanhã de manhã?
Mas eu não estou sozinho nessa. Muita gente que você e eu não conhecemos, de alguma forma, nos querem muito bem. Leram o que escrevi sobre nós e estão dispostos a me ajudar nessa homenagemComentários sobre o pedido do Marlon:
Logo após este pedido do Marlon, choveram comentários dos leitores, pedindo ao Caio que voltasse a chamar o namorado de Marlonzinho-zinho-zinho...
Foram páginas e páginas de pedidos para o Caio.
Bom, eu, como já disse antes, vou pedir ao Caio que leia na sexta feira, para que ele tenha tempo de ler no fim de semanaA Claudinha também postou um comentário no conto e era mais ou menos assim:
“Oi genty
Eu sou a Claudinha, amiga do Marlon e do Caio.
Como eu estou no trabalho, vou tentar falar o mais rápido possível com vocês.
Queria agradecer às pessoas que se agradaram comigo, melhor dizendo, que foram com a minha cara. srsrsrsrs.
O Marlon conseguiu me retratar muy bien, aliás eu nem sei como esse menino se lembra de tanta coisa... Aff.
Agora para o Caio:
Seu aleijado hipócrita, piranho, vagabundo, qué mi acabá com a minha vida mesmo?
Lembro de um dia na praia quando a gente foi nas férias no início desse ano. Você dormiu, estava mega cansado e todo vermelho, todo assado. Quem manda ser branco-papel? – Rsrsrs.
Aí você deitou no peito do M e passou o resto da tarde dormindo. o M nem curtiu mais a praia por sua causa, ele passou o resto do dia deitado com você na areia. Imagino que ele nem tenha se importado; imagino que ele tenha gostado muito mais de ter passado a tarde inteira enrolando os seus cachinhos do que brincando com a gente.
Mas se eu for citar tudo o que o M já fez por você seria muita covardia.
Eu mesma nem sei como se explica esse texto que ele escreveu aqui. E eu não sei por que vc maltrata tanto o M, pois basta olhar nos olhos dele para perceber que ele é louco por você. Que você é tudo e um pouco mais. Você sabe que nunca vai encontrar alguem como ele.
Caio, miguxo rsrsrs, lembra quando eu, você e as meninas estávamos falando dos namorados de cada uma e quando chegou a sua vez o M simplesmente chegou na hora dizendo OI AMOR, VIM TE BUSCAR, VAMOS?
Aí eu disse CAIO, NÃO PRECISA FALAR MAIS NADA NÉ?
Esse é o M que a gente conhece, esse é o cara que merece todo tipo de mimo.
Um apelido não é nada demais, e se você está se trocando por um apelido, desculpa, mas você não merece namorar o M não. Sorry!
MARLON, SE O CAIO NÃO TE CHAMAR, VIRA HÉTERO E NAMORA COMIGO?
HEIN?
HEIN?
HEIN?
Casal lindo e absoluto, amo vocês do fundo do meu intestino grosso!!!
Vocês se merecem de tão lindos que são...”
Caramba!!!
(...)
O Caio começou a ler ontem à noite. Provavelmente ele vai passar o fim de semana inteiro lendo, pois não acredito que ele leia tudo de uma vez. Se bem conheço o meu namorado, ele vai parar a cada crise de choro (amor, chora não, senão eu choro também, tá?).
Como vocês sabem, eu moro com o Luciano. Aproveitei que o Tom veio aqui transar com ele (hahahahaha) e o arrastei para o computador. E ele também deixou um comentário no meu conto para o Caio:
“Oi povo!
Antes eu só queria dizer que a Claudinha não é nada disso que o M falou. Ela é falsa, mentirosa, rouba os namorados das pessoas e é maria-purpurina. Prontofalay!!!
E também queria dizer que não é inveja não, mas a primeira pessoa que deveria vir aqui seria eu, mas ela se adiantou e veio na frente. #vaca.
E outra coisa, esse povo que me chama de chato-loiro isso é inveja porque eu sou loiro natural, tá?
Caio,
enxuga os olhos (porque eu sei que você está chorando horrores tá?) para me ler melhor.
Só para variar um pouco, eu vou rasgar seda para você.
Eu nunca serei como você e nunca conseguirei fazer o que você faz. Você é quase perfeito e eu te admiro pelo cara incrível que você é. Não me surpreende em nada que o M seja louco por você. Eu acho que vou falar mais de mim do que do M.
Eu te amo muito e não consigo imaginar um mundo sem você. Eu já era assumido quando nos conhecemos, mas eu nunca me senti tão livre depois que te conheci. Você consegue ser imprescindível mesmo quando não há necessidade e você sabe do que eu estou falando (lembra?). E se um dia a gente ficar distante (fisicamente falando) eu espero que você pratique a sua criatividade para que a gente se una de novo, pois não conseguiria viver sem o seu sorriso bobo de menininho e sem o seu coraçãozinho de cogumelo.
Mas você consegue ser mais especial ainda ao lado do M e em nome disso que eu vim para te implorar para que volte a chamá-lo pelo nome que VOCÊ CRIOU. VOCÊ QUEM CRIOU ISSO!.
Amanhã de manhã, ou quando você terminar de ler o romance, eu quero que o M me ligue louco gritando que você voltou a chamá-lo de Marlonzinho-zinho-zinho!
Beijos, minha Madonna de pênis!”
(...)
Estou prestes a ter um ataque de nervos. Serio mesmo!
O Caio me ligou chorando muito só para dizer que está quase terminando de ler. Ele disse que está na parte em que ele conhece o Seu Guilherme, então está próximo de acabar né?
Eu estou em casa, o Luciano e o Tom saíram e me deixaram.
Ah, Eu deveria mesmo ter contado como foi que eu informei ao Caio sobre o conto:
(...)
Na sexta feira eu cheguei do trabalho e, como não tinha aula, fui para a casa dele. Antes de ir para lá, eu o chamei para conversar. A gente estava deitado na cama aí eu disse assim...oops, parece até continuação do conto né? hahahaha:
- Amor, eu fiz uma coisa para você! - nervoso.
- O quê? - curioso e todo alegrinho.
- Eu escrevi a nossa história na internet.
- A nossa história?
- É.
- Por quê?
- O porquê você vê depois que ler.
- Mas por que tudo isso?
- Você vê depois que ler. Mas me promete uma coisa? Promete não ficar zangado comigo?
- Não creio que eu fiquei, mas nunca se sabe né?
- Ai, Caio, não diz isso. Eu vou ter um troço!
- É brincadeira.
- Eu te amo muito.
- Eu sei. É por isso que eu te amo também.
- Então eu vou fazer o seguinte: eu vou deixar o link no computador e você começa a acessar e ler depois que eu for embora, tá?
- Tá!
- Não me ligue, não se comunique comigo de forma alguma depois que começar a ler. Eu só quero saber de você quando estiver terminando, aí você me liga, ok?
- Nossa, que mistério!
- Me promete?
- PrometoNós nos beijamos e ficamos agarradinhos na cama. Eu passei o resto da noite fazendo cafuné nos cachinhos dele. Depois o beijei na testa, levantei-me e pus o link.
- Tchau, meu amor. - disse já chorando.
- Por que você está chorando? - disse ele se levantando.
- Nada, só estou emocionado!
Ele ficou de pê e foi ver o link no computador.
- Ué, mas é Orkut?
- Sim. Estou indo. Te amo.
Não vi mais o Caio desde entãoDepois de um tempo ele também comentou no conto. E foi um comentário enorme e que chocou muita gente.
Mas ele sempre foi muito sincero e verdadeiro.
Ele deixou um testamento para mim e para todos os leitores também:
“Eu sou o Caio.
Bem, eu não saberia traduzir em palavras o que palpita no meu coração. Eu espero que todos entendam que eu sou um ser humano e que erro também. Não é arrogância, mas eu sei e tenho consciência disso, de que represento muita coisa para muitas pessoas.
Os meus amigos veem em mim força e determinação, veem apoio e fraternidade.
Mas apesar de tudo isso, eu sou humano. Concordam? Pergunto-lhes isso porque eu sei que errei muito e, mesmo sabendo que não devo satisfações da minha vida a ninguém, compreendo a importância que vocês dão em obter uma resposta minha. Não se assustem, não estou falando em um tom grosseiro.
Ler esse enorme texto (aliás, por que essa comunidade se chama “Contos Eróticos”?) era como sentir um imenso Dejá’Vu.
Vi toda a minha vida passar diante dos meus olhos.
Marlon, me impressiona muito que você se lembre de tantos detalhes. Obviamente também me lembro de tudo, mas talvez não soubesse exteriorizar isso da forma como você fez.
É estranho, não sei para quem direcionar esse texto, se para os leitores ou se para o Marlon.
Quando comecei a ler, tomei um susto, pois era um texto escrito em primeira pessoa e muita coisa que eu não sabia me foi revelada. Muitos dos sentimentos do Marlon me surpreenderam. Ao meio da leitura, eu já havia me acostumado com o fato de que eu era um personagem em uma história online.
Mas foi mais surpreendente ainda saber que essa “homenagem” não era desinteressada. A cada vez que eu lia o tal apelido no monitor, eu me sentia traído. Mas eu mal sabia que, ao fim da leitura, tudo não passou de um pedido para que eu voltasse a chamá-lo por esse nome que eu criei. Espero não estar parecendo frio, pois essa é a minha forma de falar mesmo.
Tenho plena certeza de que, se fosse eu a escrever esse texto, ele seria bem maior. Primeiro porque eu tentaria justificar tudo: as minhas atitudes, os meus gestos, os meus pensamentos, as minhas falas... Eu sou o tipo de pessoa que gosto que me vejam da maneira que sou. Se me interpretam errado, eu já acho que tem algo errado. Não gosto que tenham uma imagem irreal de mim, pois me esforço para parecer quem realmente sou - e que isso não se confunda com “parecer quem gostaria de ser”. Não me lembro de fazer tipo para ninguém. Ou eu me omito ou eu me mostro 100%.
Marlon sabe disso.
Se fosse eu a escrever esse texto, pode ter certeza, querido, que você leria muito mais do que eu li. Eu escreveria muito sobre o que penso e sobre o que pensei em cada minuto. Você se surpreenderia. Nada que uma conversa não resolva a sua curiosidade por saber o que eu pensei em cada momento, pois posso te contar depois, serei sempre um diário aberto (nesse caso, um blog aberto).
Mas talvez você tivesse mais raiva de mim do que eu tive de você. Você é impulsivo, age como se fosse o fim. Eu me controlo até o último minuto, mas para tanto eu preciso pensar. E se a gente não controla o que pensa, pode ter certeza de que eu escreveria pensamentos sobre você, sobre nós, coisas que você não gostaria de saber.
No que concerne ao período em que nos conhecemos, não tem nada de tão grave. Gostei de você no início, mas a sua macheza me afastou e me fez me apaixonar por um dos seus melhores amigos. Disso você e todos os leitores sabem. Ou seja, isso, além de não ser novidade, não é nada que mereça destaque.
Quando você se revelou para mim, pensei em coisas das quais acredito que você saiba também. Mas quando você começou a me namorar e a se esconder do mundo ao mesmo tempo... É a partir daí que os meus pensamentos sobre você e sobre nós ficam estranhos e nebulosos.
Não chore, caso esteja lendo e esteja espantado. Não precisa chorar. Eu já chorei por nós dois. Sim, você me traiu e eu me traí. Levei até as últimas consequências a minha obsessão pela minha auto-confiança e auto-determinação.
E quantos outros autos não seria necessário colocar aqui?
Fui muito seguro de mim quanto ao Arthur (?) - não entendi por que você deu esse nome tão lindo a uma pessoa tão feia, mas enfim... - e acabei perdendo você em um beijo.
Mesmo que sem querer, mesmo que eu tivesse a minha parcela de culpa. Perdi você em um beijo, por alguns segundos, pois, em alguns segundos, você desejou a boca dele.
Isso é passado?
Era, até eu me ler nesse texto. Sabe o que mais me surpreendeu? Como eu sou intransigente. Talvez eu quisesse, por muitas vezes, algo de você que você não poderia me dar nunca, ou pelo menos naquele momento em que eu pedia. Eu não consegui ser compreensivo.
Me vejo como alguém que errou mais do que eu mesmo sabia. Não gostei de mim nesse texto. Não sabia que eu era assim. Li algumas das minhas falas nos seus diálogos e reconheço que era eu, mas custei a acreditar que eu tive coragem de falar tanta asneira.
Se me lembro, só de uma coisa não me arrependo: de ter sido firme com você no período em que namoramos escondido. Eu sei que as pessoas erram e eu disse isso ao começar a escrever, mas não consigo entender como eu possa ter errado tanto. Talvez você não entenda por que eu estou martelando tanto nisso, acho que você não consegue enxergar os erros que eu cometi. Eu não sei por que sou tão complexo. Eu não sei, sinceramente, porque você me ama. Eu sou tão difícil e você é tão doce. Eu não sei o que pensar.
Por outro lado, gostei de rever alguns momentos. Mas não quero falar deles. Não gostei das descrições das nossas relações. Totalmente desnecessário. Não sou uma pessoa cheia de pudores e nem poderia ser, mas acredito que ninguém deveria ficar sabendo disso. Na verdade, “esses sexos aí” eram os momentos que freavam as minhas lágrimas. Eu lia algo tão significativo e, de repente, sexo. Aí eu parava de chorar para “ver” que eu estava fazendo sexo oral. Não gostei. Eu peço desculpas aos leitores que vêm a essa comunidade no intuito de ler esse tipo de coisa, mas eu sou uma pessoa comum. Mais uma vez, não sou recatado ou coisa parecida. Só sou alguém que tem o direito à sua privacidade.
Voltando ao tal beijo, se foi realmente daquela forma que tudo aconteceu, acho que precisamos conversar sobre. Há muitos pontos em que minha cabeça se esforçava por apreender aquelas palavras. Mas se foi realmente assim que aconteceu, eu, de certa forma, me sinto um pouco mais aliviado.
Mesmo não querendo, acho que estou sendo muito rígido. Eu não sou rígido não é? Então eu devo dizer também que gostei de ver o nosso amor traduzido em palavras. Gostei de ver que você me ama de verdade. Gostei de ver que você reconhece o meu amor. Gostei de ver os seus ciúmes bobos e as suas defesas do nosso amor perante a sua família e às outras pessoas.
Vejo que você cresceu muito. Já eu acho que regredi bastante. Muita coisa se aprende com os erros, mas eu não aprendi muito. Me tornei bobo. Ao menos foi interessante essa retrospectiva. Deu para avaliar muita coisa. Você realmente se tornou o homem que eu gostaria de ter ao meu lado. Sim, você é um homem de verdade, um homem que muita gente gostaria de ter para chamar de seu. Eu tenho sorte, não nego.
Não consigo pensar em mais nada que não seja nos meus erros. Está difícil digeri-los.
Muito mais que um pedido, esse texto deveria ser um exemplo para todos os casais.
Foi uma boa ideia, de fato! Imagino todos os casais que se amam escrevendo sobre o tempo que se passou entre eles. Com exceção das “cenas” de sexo, que, mais uma vez, foram muito desnecessárias.
Ainda estou muito emocionado. É estranho ver um monte de gente desconhecida dando pitaco. É confuso. Foi confuso algumas vezes. Muita gente desaprovou as coisas que fiz e expressou isso em comentários. Olha, sou humano como qualquer outro e no meu lugar muita gente faria pior do que fiz.
O meu erro é pensar demais, pensar nas consequências de tudo e enxergar por todos os ângulos as minhas atitudes.
Enquanto eu faço tudo isso, muita gente simplesmente age. Nada do que faço é impensado, mas mesmo assim eu erro. Prefiro muito mais errar assim, a errar na ignorância.
Eu peço perdão aos que se sentirem ofendidos. Peço do fundo do meu coração. Não sou uma pessoa falsa. Quando falo que é “do fundo do meu coração” é porque é mesmo.
Acho muito válido que vocês tenham tomado essa história para si e tenham posto o Marlon no colo. Acho justo que vocês o defendam e que palpitem, mesmo que os acontecimentos narrados já tenham se passado. E acho justo também que me critiquem, ao mesmo tempo que li muitos elogios e mensagens carinhosas, que me emocionaram muito.
Também senti o carinho de vocês em relação a mim. Mas, quanto aos erros, quero que pensem o que fariam no meu lugar, mas sendo vocês mesmos e não sendo eu.
Ou seja, eu errei porque sou quem sou.
Vocês errariam sendo vocês mesmos, mas na minha posição? Como seria esse erro? Em que proporção? Muitos disseram que não se importariam com coisa tal, que perdoariam muitas coisas das quais eu não perdoei com facilidade.
Mas eu não fecho os olhos diante de nada. Os meus íntimos às vezes me chamam de revolucionário, de “salvador da pátria” na ironia, mas eu não ligo. Prefiro ser alguém não hipócrita, que reconhece os seus valores e sabe das suas obrigações, que uma besta alienada que diz “deixa para lá”, enquanto os erros se multiplicam.
Tem muito erro meu que eu me arrependo de tê-lo cometido, mas são erros conscientes, de alguém que sabe quem é de verdade.
Saber quem somos de verdade não é fácil e eu tenho a certeza de que eu sei quem sou.
Enfim, quanto ao apelido, não vou falar nada agora. Marlon, você deveria muito bem saber que, após ler isso, eu iria me fechar num casulo e pensar, pensar e pensar sobre tudo. Então, se você queria uma resposta imediata, dançou. Você me conhece, sabe que eu ainda vou reler tudo e tirar meus posicionamentos e fazer apontamentos acerca de cada detalhe que eu ache “curioso”.
Quanto aos leitores, relaxem, eu nunca vou deixar esse homem me escapar de novo. Mas é justamente essa palavra, o “novo”, que precisa ser reformulada para o nosso futuro como casal.
Eu realmente espero não ter sido grosso, mas esse foi um dos raros momentos de impulsividade que já me acometeu. E eu reconheço todo o carinho e respeito dos leitores.
Gostaria de agradecer a cada palavra de afeto para comigo e para com o Marlon. Vocês também escreveram esse conto, pois muita coisa que eu li entre uma postagem e outra do Marlon mudaram algumas reflexões minhas.
Isso é muito interessante: um livro onde os leitores acompanham o passo-a-passo.
Não tenho mais muito o que dizer. Só agradecer a tudo e todos e Boa noite!
Virei outra vez para comunicar a minha conclusão. Por mais sincero e cru que eu seja, eu tenho certeza absoluta que muita gente vai me achar arrogante.
É sempre assim, isso é um saco.
As pessoas costumam me julgar sem me conhecer. As pessoas costumam me acusar sem perceber que esse é um juízo errado e que me magoa profundamente.
As pessoas tem medo da verdade, mas eu não tenho culpa se no fundo é a verdade a única coisa que importa e é a verdade a única coisa que quero praticar. Não, não sou o dono dela, mas serei sempre seguidor de seus rastros.
E Marlon, querido, já que não nos falamos diretamente enquanto eu lia a nossa história, então também não nos falaremos até eu voltar a escrever aqui.
Ou seja, será por aqui que você terá a minha resposta. Não me ligue, não me mande e-mail, não venha aqui em casa. Peço permissão para usar a conta desse perfil, ok? Falo sério.
Beijos.
Caio A.”
(...)
E depois de mais algum tempo ele parece que sentiu que as pessoas tiveram uma ideia errada sobre ele e deixou outro comentário para todo mundo:
“Justamente o que pensei: a maioria, senão todos me interpretaram errado. Mas isso foi bom. Me fez enxergar com mais nitidez algo que eu já imaginava.
O que eu digo, por muitas vezes, não condiz com o que penso. A questão é que gosto de ser direto e claro, mas acabo me tornando rígido. E vou voltar a bater na tecla do “não sou arrogante!”, pois acho necessário que vocês tenham essa visão.
Acho que vocês mesmos não sabem da importância que têm nesse episódio e estão todos se anulando agora.
Não façam isso, por favor!
A diferença entre uma história escrita pelo Marlon e uma história escrita por mim é que ele sabe fazer com que as pessoas enxerguem a verdade, já eu iria impô-la a qualquer custo. Ainda bem que vocês, pelo menos, têm a visão correta de mim. Uma visão desenhada pelo Marlon.
Hoje passei o dia inteiro relendo o “conto”. Mas como já estava familiarizado, me voltei mais para as narrações que para os diálogos.
É, eu sou idiota mesmo. Não consegui enxergar o romance em tudo isso. Mas não mudei de opinião quanto ao que eu disse antes.
Estou super cansado, pois madruguei relendo e só acabei agora.
O Marlon me ligou hoje e eu disse que ele viesse ver o que escrevi. Não sei se ele leu (acredito que sim), mas ainda não deu sinal de vida. Liguei de novo pedindo permissão para usar essa conta e ele me disse em meio às lágrimas que eu estava autorizado. Perguntei-lhe o porquê de estar chorando e ele respondeu que estava com medo das coisas que disse.
Eu ri. Perguntei-lhe se ele estava surpreso, perguntei-lhe se ele esperava outra coisa de mim, pois, se esperava, então ele não me conhece de verdade.
No fim de tudo eu ri. Fiz tempestade em copo d’água. Essa é a verdade.
É como muitos disseram, inclusive o XXX. A minha identidade está segura, então não há o que temer. E também nem era isso o que eu temia. Recebi alguns depoimentos e, como o Marlon parece que não vai usar essa conta até o momento da minha resposta, eu responderei por ele, posso?
Eu realmente queria que vocês não tivessem a imagem errada de mim. Me esforço tanto para ser compreendido, para ser amável...
E eu gostaria de agradecer mais uma vez as mensagens afetuosas, que me fizeram pensar bastante.
Então teve uma outra versão dessa história? Mas como assim? Ela era diferente desta? O que tinha de diferente?
Não sei se o Marlon aparecerá para falar algo. Acredito que não. Acho que ele virá apenas para ler. Então, coração, se você estiver lendo isso, pare de chorar, por favor. Como já disse ontem, eu já chorei por nós dois. E não chore só porque eu choro. Fique firme para que, nos meus momentos de fraqueza, você seja a minha fortaleza, o meu cavaleiro de armadura branca. Vou manter o meu “coraçãozinho de cogumelo” quietinho, tá?
Também não sei se o Tom e a Claudinha aparecerão, mas, de qualquer forma, obrigado amigos. Eu também os amo muito. O Marlon conseguiu descrever vocês com perfeição. Pude rir com vocês, como se estivessem ao meu lado. Foi bom porque também pude conhecer fatos em que vocês participaram, mas que eu não estava presente. Que bom que vocês sempre mantiveram a sinceridade. Vocês sabem o quanto eu prezo por ela.
Tom, querido amigo, se você soubesse o quanto te amo, não teria tanto medo de me ver longe.
Claudinha, raio de luz, a sua dedicação ao meu namoro é linda e confortante. Nunca deixe Marlon e eu abandonados. Precisamos muito do seu zelo.
Beijos a todos.
Caio A. “
(...)
Não se preocupem comigo, pois estou bem. O Caio me ligou hoje e conversamos um pouco. Ele disse que tinha postado uma segunda vez aí fui ver.
Acho que ele mostrou a todo mundo como ele é de verdade e isso é muito legal.
Estou tranquilo porque ele não ficou chateado, zangado, irado... enfim. Ele não gostou de eu ter contado as nossas relações, mas ele não ficou me pondo culpa, pois ele sabia que eu não tinha má intensão.
Eu nem tenho mais esperanças de que ele volte a me chamar de Marlonzinho-zinho-zinho.
Acho que nem precisa ser íntimo para saber que ele não vai voltar a me chamar, né? Basta ler o primeiro post dele. Mas não estou triste, só decepcionado, pois eu mesmo me iludi.
Mas agora falando de uma forma mais solta e menos melancólica: dá para sacar por que eu amo esse menino agora?
Hahahaha.
Ele me deixa louquinho da Silva. Eu fui mesmo meio bobo em achar que eu pudesse esperar outra coisa do Caio. E sabem do que mais? Valeu muito a pena escrever a nossa história aqui. Eu tenho certeza que ele achou romântico, pelo o que ele me falou via telefone. Estou mais leve e todo bobão agoraVou contar algumas coisas que estão acontecendo e depois eu volto a falar sobre o Caio e eu.
Minha mãe está gravida mentalmente. Vou ter um irmãozinho, ou irmãzinha. Ela e o marido novo pretendem adotar. Minha mãe não pode mais ter filhos por causa da idade. Minha mãe também disse que o marido dela e a irmã lésbica estão brigados por causa de tudo o que aconteceu. Aí eu fiquei com medo de ela ainda estar magoada com a minha orientação, mas ela disse que não.
Disse que quer que nas férias Caio e eu façamos uma visita, talvez até passar uns dias no sítio.
Meu pai recebeu bem a notícia, afinal ele não ama a minha mãe mesmo...
Ah, sabem por que o Tom chamou o Caio de Madonna de pênis?
Porque o Caio deu a ideia da nossa turma fazer a nossa formatura com o tema "Confessions" (eu não gostei da ideia, mas...). A roupa dos formandos vai ser tipo Xanadu + anos 80 + Hung up + Studio 54.
Ele disse que as impressões iniciais que ele teve do conto estão passando. Ele disse que foi legal se ler, deu para refletir sobre muitas coisas que já passaram, mas que ficaram insolúveis.
Mesmo assim ainda disse que o sexo era desnecessário (eu ri muito quando ele disse isso). Aí ele me contou que a coisa boa disso tudo é que ele deixou de odiar o "Arthur".
Contou que durante todo esse tempo ele guardava ódio dele e que por isso toda vez que ele lia o apelido no conto ele se sentia mal. Mas ao saber do fim de tudo e de como se deu aquele terrível beijo, ele percebeu que o ódio não tinha sentido em existir.
Pergunta repetitiva: dá para não amar alguém assim?
Resposta antiga: Não!
(...)
Ontem à noite cheguei da faculdade e encontrei o Caio aqui em casa.
Fiquei surpreso, pois, desde o dia em que ele soube do conto, nós não nos vimos.
Perguntei-lhe o que fazia aqui e ele disse apenas que veio dormir comigo. Já fiquei alerta. Poderia ser que ele tivesse vindo para me dizer "aquilo" durante a manhã, mas poderia ser também uma forma de ele me dizer que não conseguiria me chamar mais por "aquele" nome.
Era mais provável, convenhamos, que na manhã seguinte (no caso a manhã de hoje), que ele me acordasse para justificar os motivos que o levariam a não conseguir mais me chamar deEu mesmo já estava conformado.
Pois bem, nem sei como consegui dormir. Na verdade ele percebeu que eu estava tenso, então fez um pouco de tudo para me acalmar e me por para dormir.
O que fizemos? Namoramos, claro! Mas não posso falar muito sobre isso, porque, como vocês já sabem, ele não gosta que eu conte das nossas intimidades.
Então eu dormi super bem, obrigado!
Pela manhã ele acordou depois de mim. Eu fiquei acordado, rolando na cama, esperando ansiosamente para que ele acordasse também. Quando isso aconteceu, ele se espreguiçou, espremeu os olhinhos (super fofo né?) e me sorriu com um "Bom dia!".
Namoramos mais um pouco, mas eu não aguentava mais esperar e perguntei se ele não tinha se esquecido de nada. E sabem o que ele me respondeu?
- Esqueci de quê, Marlonzinho-zinho-zinho?
>>> FIM <<<
História Real