Nem sei a hora que peguei no sono, mas acordei por volta das 9 da manhã. Olhei para o lado e não vi minha esposa. O barulho na cozinha o aroma de café fresco, denunciava que ela estava preparando nosso café da manhã. Sabia que era ela, pois nossa filha não faz nada na cozinha, nem lava seus próprios copos.
Era manhã de domingo e sabia que nossa filha não acordaria antes das 11h. E com um sentimento amargo na boca, uma cabeça pesada pela noite mal dormida e muitas coisas para conversar com minha esposa, me levantei, fiz minha higiene e fui para a cozinha sem saber o que esperar. Mas com uma convicção do que falaria para ela.
Cheguei na cozinha e percebi um clima um pouco tenso, devido a sua face fechada e aparentemente preocupada. Dei bom dia e antes que eu falasse mais alguma coisa ela se adiantou:
-- Amor, me desculpe por ontem...
Eu pensei comigo, que bom ela desistiu. Mas antes de poder me contentar de verdade ela continuou:
-- Eu não deveria colocar uma responsabilidade desse tamanho nas suas costas me sinto egoísta e manipuladora. Assim sendo, eu assumo total responsabilidade sobre essa decisão.
Eu não consegui entender o que isso queria dizer e perguntei:
-- Como assim?
-- Simples... ela falou. Eu vou decidir como vou realizar esse meu desejo sem sua opinião ou permissão. Eu sei que isso vai ser difícil, mas tenho certeza que você vai superar e poderemos seguir em frente com nossos projetos de vida após tudo isso.
Como eu fiquei totalmente mudo de surpresa ela continuou:
--Na sexta, a empresa vai promover uma festa de despedida para ele no restaurante Premiere as 20 h... Já reservei um quarto no hotel ao lado. Após o evento seguirei para lá com ele, passarei a note e voltarei na manhã seguinte para ser somente sua para o resto de nossas vidas.
Perplexo e quase gaguejando falei:
-- Quer dizer que não importa como me sinto. Não importa minha opinião. Existe alguma maneira de eu te convencer do contrário? Quem é esse cara? Como ele é? Disparei a perguntar de forma insana e ininterrupta.
Ela com uma frieza e determinação impressionantes tentou me acalmar:
-- Relaxa, não é o fim do mundo. Nada mudou nem mudará no que sinto por você. É somente sexo, sem compromissou ou sentimentos. Sei que é complicado para você entender, mas sei que nosso amor vai superar tudo. Neste momento não tem o que fazer para que eu mude de ideia e quanto menos souber da pessoa melhor a não ser que você faça questão. Já pesquisei e li muito sobre o assunto, já conversei com pessoas que passaram ou passam por problemas similares a esse e te garanto que tudo está sob controle.
Logo imaginei quem seriam essas pessoas.
Neste momento percebi sob a mesa, seu celular, e uma coisa me despertou a atenção. Após uma mensagem que possivelmente seria de notificação de algum app, a tela se iluminou e pude perceber uma ligação realizada a uns 10 minutos atrás, para sua “amiga”, Monique. E tudo fez sentido. Imaginei que ela ligou para a miga falando da minha reação negativa ante sua pergunta da noite anterior. Sendo assim, penso eu, que ela deve ter aconselhado ela a tomar as rédeas da decisão sob a possibilidade de não poder realizar seu desejo. Que ela era livre. Que eu não era seu dono e blá, blá blá. Vale ressaltar que nossos aparelhos não são bloqueados e que sempre tínhamos autorização para usa-los caso necessitássemos sem aviso prévio. Isso não era um acordo e sim algo que nunca precisamos estabelecer regras devido a uma confiança mútua e natural.
Após isso falei:
-- Fico triste que sua decisão já esteja tomada, mas quero deixar registrado minha total desaprovação dessa sandice. Quero também alertar que toda escolha tem consequências e que não posso garantir de que elas serão do seu agrado. Espero que você esteja segura de que esta decisão tenha sido tomada de forma individual, sem participação ou influencia de terceiros, para depois, no futuro, precisar dividir a responsabilidade com outras pessoas.
Ela acenou positivamente com a cabeça, e falou um pouco mais assustada, tentando amenizar:
-- O que eu posso fazer para diminuir seu descontentamento. Quer que eu filme, que que eu te conte como foi para te provar que não houve sentimentos envolvidos?
Eu já puto da vida, e muito nervoso retruquei:
-- O que você pensa que eu sou?? Um corno manso, um cuckold que sente prazer em ver minha esposa trepar com outro?? Descontentamento uma ova, eu estou e muito puto da vida. Não tenho nada contra quem gosta, cada um se satisfaz da forma que gosta, mas você sabe que eu não tenho este fetiche e esse perfil. E mesmo que um dia você me pedisse para imaginar uma possibilidade de entrar nesse universo, não seria da noite para o dia. Não seria imposta. Não seria com a faca no meu peito.
Quem é você? Onde está minha esposa e companheira de 15 anos? Onde foi parar a mãe de minha filha? O que houve com a pessoa que eu tinha como certa de envelhecer ao meu lado?? Não te reconheço. Sei que está sendo manipulada por terceiros e espero que reflita sobre isso, e torço para que até esse dia fatídico, o juízo tenha voltado a sua mente.
Acho que ela imaginando que o sentimento entre nós era forte e o poder da nossa união, poderia perdoar tudo, não arredou o pé e disse:
-- Fico triste por pensar assim, mas tenho certeza que ainda vamos rir muito desse dia e que com o tempo entenderá o que aconteceu. E que isso só fortalecerá nossa união. Nosso amor é mais forte que tudo.
Após essa última fala dela, o silencio imperou de forma sepulcral, meu olhar faiscava de ódio, não conseguia olhar para ela. Preferi recuar antes de fazer uma besteira.
Me lembrei de um trecho da música de Zé Ramalho. “Meu domingo está perdido, vou para casa entristecido, da vontade de beber”. Levando em consideração que eu não bebo, o texto estava perfeito para o momento. Nunca gostei de bebidas alcoólicas, e não seria agora, que mais preciso de lucidez que iria começar. Sai de perto antes que eu falasse algo que me arrependeria pro resto da vida. A sorte está lançada, restava esperar até sexta para ver se algo mudaria.
Prometi a mim que não tocaria no assunto durante a semana, meu trabalho exige concentração total e isso poderia me prejudicar.
Durante o dia quase não nos falamos. Até nossa filha estranhou, pois éramos umas verdadeiras maritacas de tanto que conversávamos. Dei uma desculpa de dor forte de cabeça e ela entendeu, ou não.
A semana passou conforme o domingo. Silenciosa. Era casa, trabalho, casa, sem muitos diálogos e sem tocar, nenhuma vez sequer, no assunto nefasto.
Não fizemos amor durante a semana, não havia clima. A semana foi passando de forma automática, no trabalho como se fosse um robô, em casa como se fosse um fantasma.
Desta forma acordei um dia e percebi que era sexta feira. Infelizmente o dia chegou.
Acordei com um gosto amargo na garganta, uma sensação de derrota de fraqueza. Minha esposa estava no banho e em cima de uma cadeira dentro de nosso closed, um vestido tubinho preto, que eu conhecia bem. Destacava sua silhueta de forma sensual, delineava a sua cintura, e valorizava sua redonda e bem durinha bunda. Exaltava seus magníficos seios de forma provocante. Uma lingerie também preta e delicadamente rendada, daquelas que gostaria de tirar levemente com os dentes enquanto dedilhava tudo o que é mais sensível no corpo dela. A roupa não era vulgar, pelo contrário, mas muito sedutora.
Ao ver aquilo me deu uma angústia sem tamanho e minha respiração começou a acelerar, meu coração aumentava seus batimentos e uma raiva começou a tomar conta. Sabia que toda aquela produção, não era para mim. Precisei de muito controle para me acalmar, não ia enfartar por uma decisão louca de minha esposa. Mas a vontade era de rasgar toda aquela roupa. Mas isso só adiaria o inevitável.
Ela saiu do banho e me viu estático na cama olhando para a roupa que ela usaria na sua aventura. Vendo o cenário e temendo pelo pior ela resolveu encobrir o clima:
-- Amor, após o expediente tenho um jantar com os funcionários da empresa, não me espere acordado.
Eu debochadamente e com uma voz demonstrando descontentamento falei:
--Jantar????
Ela me repreendeu:
-- Não piore as coisas para nós, não se martirize, encare isso como um marido compreensível e maduro. Abra sua mente.
Nada vai mudar no que sentimos um pelo outro.
Eu Ainda insatisfeito:
-- Não garanto isso de minha parte. Falei e fui tomar banho.
Quando sai do banho, ela já tinha saído de casa. Acho que para evitar maiores constrangimentos e discussões ao vê-la vestida. Me arrumei e fui para o trabalho. Durante o dia parecia um zumbi. Não tive fome para almoçar e fiquei o dia todo a um triz de ter uma crise de ansiedade ou pânico. Problemas que eu nunca tive antes.
Acabou o expediente e fui para casa. Ainda restava um pingo de esperança de que ela tivesse desistido. Quando cheguei em casa o silêncio me despertou para a triste realidade. Sabia que minha filha tinha ido visitar os avós após sair da escola e iria passar o fim de semana com eles. Esse silêncio me fez cair derrotado no sofá da sala.
Eram ainda 19 h. O evento da empresa deveria ser as 20h. Sendo assim ainda dava tempo de eu tentar alguma coisa. Fui na cozinha, tomei uma água, respirei bem fundo e pensei, enquanto tiver bambu tem flecha, como já dizia o excelente Everaldo Marques. Parti para o tudo ou nada. Primeiro liguei para o celular de Patrícia, chamou várias vezes e nada de alguém atender. Tentei, mas três vezes e nada de resposta. Mandei uma mensagem dizendo. “Você ainda vai continuar com isso?”. Em cinco minutos recebi a seguinte resposta: “Não vou, mas responder mensagens hoje para o nosso bem. Fique em paz e pense em nós. Amanhã será outro dia, e com certeza melhor”.
Mesmo com essas palavras não desisti. Me lembrei do nome do restaurante que ela falou onde seria realizado o evento de despedida do cara. Joguei uma roupa no corpo, peguei o carro, joguei o nome do restaurante no Maps e parti. Eram 19:30 h e demoraria uns 40 minutos para chegar lá.
Eram 20:15h quando cheguei. Estacionei o carro em uma rua em frente ao restaurante e a uns 40 metros do hotel. Apaguei os faróis e esperei. Preferi não a confrontar no evento, afinal sou marido dela e não dono e da forma como estava nervoso, poderia sair ainda como vilão da história. Eu ia tentar uma última cartada, mas respeitaria, mesmo que insatisfeito, a sua vontade.
O outro motivo, ainda que oculto e mascarado em minha mente, para que eu estivesse lá, era par ver com que tipo de pessoa ela resolveu aplacar seu desejo de ter outro homem. Afinal, no meu entendimento, quando se trai alguém, deve ser com uma versão melhorada de seu cônjuge.
O tempo passou arrastado, mas me mantive firme no meu propósito. Quando deu 23H, percebi uma movimentação na porta do restaurante. As pessoas iam saindo e cumprimentavam com apertos de mão e abraços um homem em um terno preto e muito elegante. Deduzi que só poderia ser o cara. Reparando bem na pessoa, me decepcionei por completo. Ele deveria ter entre 44 e 50 anos, baixo, por volta de 1.60m a 1.65m, bem barrigudo e totalmente careca. Nada contra pessoas desse porte, mas era visível a diferença entre nós, e bem diferente do que eu achava que minha esposa tinha como exemplar masculino. Se fosse por tesão, ele passava longe do que ela sempre me cobrou como físico, altura, etc. Foi aí que eu percebi que a escolha deveria ser apenas por uma curiosidade mesmo. Afinal, o que ela queria era ter sexo único com outro homem e não um relacionamento extraconjugal duradouro. Mas isso não diminuía o problema. Minha vontade era sair do carro, dar uma de Batman e arrebentar o Pinguim na porrada. Mais uma vez me contive e pensei agora no meu futuro e da minha filha. Pela primeira vez na vida, eu tinha, sem perceber, excluído minha esposa do meu possível futuro em meus pensamentos.
10 minutos mais tarde e nada de minha esposa. Eu já comecei a ficar esperançoso, quando uma figura linda, que eu conhecia bem, sai do restaurante. Todos já tinha ido embora, menos o Pinguim que esperava “alguém”. Quando ela se aproximou dele, eu já me preparava para intervir. Afinal era minha última cartada. Na escuridão da rua em que eu estava, eles não podiam me ver. Mas eu podia vê-los devido a iluminação do restaurante. Quando levei a mão para abrir a porta do carro eu vi quando ela o abraçou pela cintura e ele retribuiu o mesmo gesto e saíram caminhando como dois namorados em direção ao hotel. Em momento algum ela hesitou. Manteve ele em seu campo visual, não se preocupou em saber se estavam sendo vistos, não olhou em volta. Manteve-se em linha reta para o seu objetivo, caminhado sem pressa. Percebi que ela não tinha dúvidas do que queria e nada iria fazê-la mudar. Uma intervenção minha poderia acabar em tragédia devido ao meu nervosismo. Me encolhi no banco do carro derrotado e observei os dois entrando no hotel. Pensei comigo mesmo, num misto de tristeza, amargura e decepção, que era o fim. Liguei o carro e fui em direção a minha casa, já sabendo o que tinha que fazer.
Continua....