Bernardo [83] ~ Primeira briga

Um conto erótico de Bernardo
Categoria: Gay
Contém 2038 palavras
Data: 07/12/2023 22:00:22
Assuntos: Gay, Início, Sexo, Traição

O ano de 2009 entrou trazendo consigo a minha primeira briga com Rafael. Estava até demorando... Acho que tinha acontecido tanta coisa no nosso namoro até então, que tínhamos focado muito pouco um no outro. Só quando a poeira baixou, ou seja, quando nossas famílias e nossos colegas se acostumaram (e não necessariamente gostaram) com nosso namoro, eu e Rafael pudemos nos ver realmente num relacionamento sério. Logo, nossa primeira briga era esperada. O que não foi previsto era o motivo.

_Faz um pedido._ falou Rafael baixinho no meu ouvido.

_É ano novo, não meu aniversário.

O relógio tinha acabado de virar meia-noite e nós olhávamos os fogos de artifício explodirem no céu. Estávamos num na sacada de um clube à beira da lagoa da Pampulha numa festa com os pais de Rafa. Definitivamente, eu estava bem mais confortável ali do que sob os olhares atravessados na minha sogra à mesa.

_Você não faz pedidos no ano novo?_ ele me perguntou.

_Não, apenas faço uma retrospectiva do meu ano.

Um ano que começou aos pés da Torre Eiffel com Ricardo. Fazia seis meses que Ricardo não me dava notícias. Eu o tinha no meu Orkut, então eu sabia que ele estava bem, enfim, vivendo, mas era doloroso não poder conversar com ele. Nossa única comunicação fora em agosto quando eu lhe desejei feliz aniversário por SMS e ele agradeceu. Eu estava cumprindo o que prometi, eu me afastei dele para que, nas suas palavras, houvesse a chance de uma outra pessoa aparecer na sua vida. O que mais eu podia fazer? Seu pedido não foi nada mais do que justo.

_O saldo é bom?_ perguntou meu namorado fazendo um carinho discreto nas minhas costas.

_Sim._ respondi olhando no fundo de seus olhos

Ele sorriu, chegou perto do meu ouvido e falou com a voz rouca:

_Então, a gente já fez um social. Que tal aproveitarmos a minha casa vazia e comemorar a virada de ano do jeito que se deve?

_Eu acho que é uma ótima ideia...

Ele riu e saiu me puxando pra fora do clube sem nem mesmo se despedir dos seus pais.

[...]

_Velho... Te amo!_ ele exclamou ao cair ao meu lado na cama exausto.

_Nós estamos ficando muito bons nisso._ comentei rindo me abraçando ao seu corpo nu e suado.

_Sim, mas não quero você se descuidando no treino, viu?

_Sim, senhor capitão!

Em algum ponto do quarto de Rafael, no escuro em meio às nossas roupas jogadas às pressas pelo chão, meu celular começou a tocar.

_Não atende!_ falou Rafa quando fiz menção de me levantar _Fica aqui.

_Pode ser alguém lá de casa.

_Eles sabem que você está bem.

_Podem estar querendo me desejar feliz ano novo.

_Podem desejar amanhã!

Eu ri e deixei que ele me segurasse na cama enquanto o telefone parava de tocar. Quando Rafa recomeçou a beijar meu pescoço, o celular voltou a chamar.

_Ahhhhh!

_Desta vez que tenho que atender, amor._ falei me levantando.

Eu realmente achava que era alguém da minha família me ligando. Por isso, paralisei com o choque do nome no visor. Rafael percebeu.

_O que foi? Não vai atender?

_É o Ricardo.

Lhe lancei um olhar constrangido, embora eu não tivesse motivos para estar.

_Atende, uai._ ele falou tentando parecer tranquilo em relação a isso.

Eu conhecia Rafael muito bem pra saber que ele queria que eu apenas desligasse o telefone e voltasse para cama. Mas eu não podia, era Ricardo. A saudade que eu sentia dele me doía, eu não podia perder aquela oportunidade.

_Alô?_ falei ao atender.

_Alô? Bernardo?!

_Sim, Ricardo, sou eu.

Ele falava de algum lugar muito barulhento, talvez uma festa, mas eu conseguia ouvi-lo bem. Me sentei na cadeira da escrivaninha de Rafael, enquanto o mesmo ficou deitado encarando o teto. Eu sabia que ele estava prestando muita atenção na minha conversa.

_Bernardo!_ gritou Ricardo ao telefone, me dando a certeza de que ele tinha bebido _Que saudade de você!

_Saudade de você também._ eu ri e respondi no automático.

Rafael bufou alto, o que me fez perceber que aquela noite não ia acabar bem. Fiquei terrivelmente dividido entre desligar o telefone para não magoar Rafael e continuar matando as saudades de Ricardo.

Eu te liguei pra te desejar feliz ano novo._ ele falou com a voz mais calma, mas ainda denunciando algum consumo de álcool _Eu estava aqui rodeado por toda essa gente e comecei a lembrar de você, do nosso beijo embaixo da torre Eiffel quando o ano virou. Quando eu percebi, eu já estava chorando. Não é aqui que eu queria estar, não é com essas pessoas que eu queria estar.

_Ricardo...

Ao mesmo tempo que eu fiquei sem jeito pelas palavras dele, eu lutava contra as minhas emoções para não falar a coisa errada pra Rafael ouvir.

_Porra, Bernardo! Você está com ele, não comigo!_ ele gritou claramente derramando lágrimas _Eu juro que estou tentando seguir em frente, mas é difícil quando vejo seu rosto em todos eles. Eu não sei mais o que fazer...

_Eu... Eu não sei o que te dizer, Ricardo..._ falei lutando pra manter a voz firme.

_Desculpe. Eu não devia ter ligado. Eu só queria dizer que eu te amo.

_Eu..._ eu gostaria de poder responde-lo como devia, mas não podia fazer isso com Rafael _Feliz ano novo, Ricardo.

_Tchau..._ ele falou triste antes de desligar.

Eu desliguei e fiquei encarando o telefone. Fui impossível segurar uma fungada.

_Sabe o que adoro?_ falou Rafael sem deixar de encarar o teto _Ver o meu namorado chorar por outro homem.

_Rafa, por favor..._ pedi implorando pra ele deixar aquilo passar.

_Eu estou errado? Você acharia isso confortável, por acaso?

Esfreguei meus olhos com força tentando me manter lúcido para a briga que Rafael queria ter.

Não, não está errado, realmente deve ser muito desconfortável. Mas você devia saber que é a primeira vez em seis meses que falo com uma das pessoas que mais marcaram a minha vida, e eu realmente não queria brigar por isso._ falei meio que contra-atacando _Só esperava um pouco de solidariedade de você nesse momento.

_Solidariedade uma porra! Eu não tenho sangue de barata!

_Ser solidário aos problemas do seu namorado é ser fraco?

_É, se os problemas forem relacionados ao ex-namorado!

_Então, na sua visão, eu devia ter um ataque toda vez que você fala de Carolina?!

_Não se faça de idiota!_ ele falou se sentando na cama e me encarando _Você sabe que a situação é completamente diferente?

_Diferente por que? Você se compadece da dor que causou nela, eu me compadeço da dor que causei nele.

_É diferente, sabe por que?_ ele falou com lágrimas nos olhos _Porque eu deixei de amar Carolina, mas você nunca deixou de amar Ricardo!

Eu engoli aquilo em silêncio. Como negar? Como responder? Eu realmente amava Ricardo, nunca deixei de amá-lo, mesmo à distância. Logicamente, meu silêncio após aquela declaração não soou bem.

_Eu devo ser um trouxa!_ Rafael falou ferido.

_Rafa..._ comecei, mas não sabia o que responder ainda.

_Vai lá! Pega um avião e corre atrás do seu namoradinho! Ele tá lá te esperando.

Ele correu pro banheiro e bateu a porta. Eu fiquei no mesmo lugar pensando melhor nas minhas palavras. Eu não tinha nenhuma dúvida sobre meus sentimentos por Ricardo e Rafael, ou seja, que eu amava meu namorado mais do que meu ex. O que eu não sabia era como explicar para Rafael aquilo. No momento em que voltei a namora-lo, não foi como se todo o meu passado amoroso tivesse desaparecido. Muito pelo contrário, se não tivesse havido Ricardo, talvez eu não fosse a pessoa que eu sou hoje e, por extensão, não estaria com Rafael.

Rafael saiu do banho mais calmo, mas ainda ferido, o que era demonstrado pelo seu silêncio. Ele se deitou na cama e se virou para o canto da parede, como para mostrar que não queria nem me ver. Eu calmamente me deitei na cama ao seu lado, mas não fiz nenhum movimento de aproximação. Fiquei olhando para o teto ainda pensando nas palavras certas.

Eu ainda amo o Ricardo, Rafa, eu não posso mentir pra você sobre isso. E eu não estou nem mesmo tentando esquecê-lo, porque eu não quero. Só que eu te amo muito mais do que amo ele.

Rafael deu um forte fungada, indicando que estava chorando.

_Ele foi uma parte muito importante da minha vida. Aliás, durante todo um ano, ele foi toda a minha vida. Não se joga fora alguém assim. Eu sempre vou escolher você, mas não me peça pra fazer essa escolha, por favor. Deixa eu ficar com a última migalha do que foi Paris para mim?

Ele não respondeu. Permaneceu na mesma posição.

_Eu amo ele e vou amar pra sempre, mas meu escolhido é você. Eu podia ter escolhido ele quando voltamos para o Brasil ou quando ele veio pra festa do Pedro, mas eu escolhi você. Então, para de sofrer com isso. Eu entendo o seu ciúme, e é por causa dele que nunca falo de Ricardo com você, mas isso não quer dizer que ele deixou de existir para mim. Sempre foi você, Rafa. Então, não, eu não vou pegar um avião e me jogar nos braços dele. Eu já estou nos braços de quem eu queria.

Rafael se virou e, ainda sem me olhar, me abraçou com muita força, como se tivesse medo de que eu fugisse.

_Eu não gosto dele. Eu sempre acho que ele vai te roubar de mim._ ele falou com a voz quebrada.

_Ninguém vai me roubar de você._ respondi o abraçando de volta _Ricardo se declarou para mim muitas vezes, mas ele nunca fez nada para me roubar de você. Ele é um bom perdedor.

_Que seja._ ele deu um longo suspiro _Sei lá... Eu tenho medo que um dia você canse de mim e corre de volta pra ele.

_Eu nunca vou cansar de você, Rafa.

_Vai... Um dia você vai se cansar do meu ciúme, dos meus ataques, das minhas explosões...

_Do mesmo jeito, você um dia pode se cansar da minha insegurança, da minha mania de pensar demais, da minha frieza. É um risco que assumimos.

Pensei com muito cuidado antes de dizer as próximas palavras.

_Eu posso te prometer de amar pra sempre. Eu tenho essa certeza. Mas eu não posso te prometer que ficaremos juntos para sempre. E você também não pode prometer e eu não duvido do seu amor por mim. Um relacionamento é um risco que se assume, Rafa. Só que ninguém para muito pra pensar nisso.

_Nós não vamos ficar juntos pra sempre?

_Nós vamos ficar juntos até o momento em que esse relacionamento fizer bem para nós. E eu espero que seja pra sempre.

Não era bem a resposta que ele queria ouvir, mas foram as mais sinceras que pude dar. Rafael sempre foi um romântico incorrigível, para o bem ou para mal. Na sua cabeça, amor eterno ainda era sinônimo de ficar junto para sempre. Eu sempre fui mais realista. Essa era nossa eterna disputa. Não seria apenas uma ou duas vezes que ele me acusaria de não acreditar no nosso futuro e eu o acusaria de ser muito ingênuo.

_Eu escolhi você porque eu sei podemos fazer ser para sempre.

Ele ficou calado por um tempo, ainda se abraçando com força em mim. Ele levantou a cabeça e eu encarei seus olhos molhados.

_Promete me amar pra sempre?

_Prometo._ respondi com toda a certeza do mundo.

Ele me deu um longo beijo e se deitou sobre meu peito. Fiquei acariciando seus cabelos até ele cair no sono.

Assim terminou nossa primeira briga. No dia seguinte, Rafael me acordaria risonho e procurando por sexo, como uma criança travessa. Minhas palavras o afetaram, com certeza, mas eu não sabia se ele realmente entendia a minha visão ou se apenas ignorava achando que eu adotava um discurso realista por segurança. O fato é que aquela briga foi realmente deixada para trás.

Porém, aquela não foi a nossa última briga motivada por Ricardo.

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Comentários

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Ah! Finalmente chegou um novo capítulo. E já com um clima meio pesado. Bernardo está cada vez mais maduro, consciente das realidades da vida. Isso não quer dizer que isso traz mais felicidade, mas traz uma certa serenidade em relação aos caminhos que a vida nos leva.

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