O Garoto e o saxofone [12] ~ Declaração

Um conto erótico de Marlon
Categoria: Gay
Contém 3737 palavras
Data: 13/12/2023 02:40:52
Assuntos: Gay, Início, Sexo, Traição

Dia do aniversário da Luiza, fomos para uma baladinha eletrônica. Do caso Caio/Vinícius só sabíamos Caio e eu. Foi o suficiente para a Luiza convidar um ex-amor.

Uma menina e seu dia de aniversário.

Tudo o que ela mais queria era reatar com o seu ex-amor.

Para ela, ex-amor; para ele, ex-camuflagem. Tudo o que a Luiza queria era voltar a ser a namorada do Vinícius, então ela o convidou para a festa também.

Só que eu não sabia, e parece que o Caio também não. Eu passei na casa do Caio e fomos para a boate.

Quando chegamos, a Luiza estava abraçada ao Vinícius. Eu e o Caio paramos instantaneamente, nos olhamos espantados e, em apenas um olhar, transmitimos um para o outro aquela sensação de impotência.

Luiza veio nos cumprimentar, nos abraçou e pegou os presentes sem que ao menos disséssemos “Feliz aniversário!”.

Cumprimentamos as outras pessoas, mas o Caio não cumprimentou o Vinícius.

Eu, por outro lado, apertei sua mão e perguntei como ele estava. Só. Depois me sentei com os outros.

Eu e o Caio ainda nos olhamos mais uma vez, sem acreditar muito no que estava acontecendo.

A festa foi rolando e ficamos todos por fora, todos: eu, Caio, Vinícius, Tom, Luciano e Cláudia.

A Luiza sentou no colo do Vinícius com naturalidade e começou a cochichar no ouvido dele e a sorrir. Era estranho.

- Só eu não me sinto a vontade nessa situação? - perguntou o Tom.

- Não, você não é o único. - eu respondi.

- Minha gente, a Luiza poderia ao menos ter falado que ia convidar esse encosto. - retrucou o Tom.

- Se você quiser, amor, a gente vai embora. - falou o Luciano.

- Não, deixa. Ela convidou a gente, então seremos educados.

- Eu só não sabia que a Luiza tinha voltado para o Vinícius - estranhou a Claudinha.

- Eu também não. - respondi.

O Caio ficou calado o tempo todo e só abria a boca para beber. Eu estava tenso porque, se o Caio estava assim na presença dele, era porque ele ainda sentia algo pelo Vinícius. Eu sentei ao lado e perguntei:

- Tudo bem?

- Aham.

- Não me pareceu seguro!

- Eu só me assustei. Não esperava isso.

- Quer ir embora?

- Não, não seria educado.

- Quer descer para dançar?

- Não, deixa!

Depois os garçons chegaram com o bolo. Tinha muito mais gente convidada pela Luiza do que eu imaginava. Foi só quando o bolo chegou, que eu percebi que ela tinha reservado todo o nosso ambiente para a festa.

Cantamos os parabéns e depois o Tom e Luciano saíram para dançar na pista. O Caio se ofereceu para ir junto. Me deu um “Oi”, disse que iria sair um pouco dali para esfriar a cabeça e depois voltava. Eu concordei, achei melhor mesmo.

Depois, a Claudinha me enturmou com o namorado dela e ficamos conversando. Ele era um cara muito legal, apesar de tímido.

- Cara, vocês combinam mesmo viu?

- Por que, Marlon? - perguntou a Claudinha.

- Porque vocês são muito opostos, você é bem extrovertida e ele é todo tímido. Mas sei lá, eu acho que vocês formam um casal super bacana! Não dizem que os opostos se atraem?

- Hahahahahaha, valeu, Marlon!

- Escuta, vocês viram o Vinícius? - perguntou a Luiza, quando se aproximou.

- Não, não vimos. Você viu, Marlon? - me perguntou a Claudinha.

- Não, não vi.

A Luiza saiu angustiada atrás dele. De repente a angustia também me toca fundo e eu penso no Caio. E assim como dois mais dois são quatro, eu juntei Caio e Vinícius numa mesma equação. Eu só não sabia qual seria o resultado dessa conta.

Uma coisa seria certa: se meus cálculos estivessem certos, eu ao menos teria certeza de que eu não entraria nessa soma. Na verdade eu seria subtraído!

Pedi licença para a Cláudia e saí à procura do Caio, ou pelo menos do Vinícius. Fui até a pista, buscar o Tom e o Luciano. Foi difícil achá-los, mas quando os achei, logo vi que o Caio não estava com eles.

- Cadê o Caio?

- Ah, ele disse que ia subir. Não subiu não?

- Não!

- Ah, deve estar no banheiro.

- Ou vai ver que ele encontrou alguém no meio do caminho! - interrompeu o Luciano.

Será que ele realmente encontrou alguém no meio do caminho? Alguém que eu conheço? Aquela euforia de pessoas dançando com aquela música frenética estavam me deixando louco. Eu queria apertar o “mute” da pick up do DJ e mandar todo mundo embora.

Com muito esforço eu cheguei ao banheiro, mas o meu coração já dizia que ele não estava lá. As minhas esperanças estavam sendo liquidadas a cada batida da música, as lágrimas já surgiam nos meus olhos.

Por sorte eu não conhecia ninguém ali por perto e tudo estava escuro demais para que uma lágrima fosse vista. Decidi então sair daquela euforia toda e ir para a rua.

Cheguei ao estacionamento e, quando eu ia desativar o alarme do automóvel, eu vejo um casal se beijando apaixonadamente, encostados em uma das portas do meu carro. Com uma olhada mais examinadora, eu vejo que não são um homem e uma mulher. Mais de perto ainda vejo tudo aquilo que eu temia, tudo aquilo que eu tinha certeza e tudo aquilo que eu não queria ver.

Eu custo a acreditar, mas não há como enganar a visão. Todas as lágrimas, que estavam brotando nos meus olhos, cessaram. Eu parei de chorar e fiquei estático olhando aquele casal, que por sinal, tinham bastante sincronia nos beijos.

Eu olhei para o chão, talvez procurando uma saída subterrânea ou até mesmo a minha cova. Mas não achei.

Então eu voltei para a boate, passei pela pista de dança, enxuguei minhas lágrimas no banheiro, me recompus, peguei uma bebida no bar e voltei para a festa da Luiza.

- Estava aonde?

- No banheiro, Claudinha.

- E o Caio, onde se meteu, heim?

- Deve estar dançando com o Tom.

Minutos depois o Vinícius chega, senta ao lado da Luiza e a beija. A minha vontade era de quebrar uma garrafa na cabeça dele. Eu o fitava com ódio. Por sorte o escuro e as luzes coloridas não permitiam que ele visualizasse minha expressão.

Depois chega o Caio e se senta ao meu lado. Preferi não olhá-lo, ou sabe-se lá o que eu faria.

- Menino, aquela pista está uma coisa! - disse ele ofegante.

- Dançou muito? - perguntou a Claudinha.

- Nossa! Faz tempo que eu não danço assim.

Eu tomava goles enormes, até que o Caio me interrompe:

- Ei, motorista, não pode beber não. Lembra-se? Você tem dois casais e um lindo garotinho para levar para casa!

Eu pus o copo na mesa, obedecendo-o.

- Hahahahahaha, agora quem bebe sou eu! - disse ele pegando o meu copo.

A festa estava longe de acabar, mas lá para umas 4hs da manhã, nós fomos saindo.

- Marlon, não precisa levar a gente não. O Luciano prefere ir de táxi - disse o Tom.

- Sabemos porque o Luciano prefere o táxi, não é, Tom? Seria muito constrangedor dizer “Marlon, querido, para aqui no motel, pois eu e Lu vamos descer!” - brincou o Caio.

- Hahahahahaha, filho da puta! - respondeu o Tom.

Fomos saindo, nos despedimos da Luiza e descemos. Entramos no carro e sumimos dali.

No caminho, o Caio foi soltando piadinhas e demonstrando o quanto ele estava feliz naquela madrugada.

Deixei a Cláudia e o namorado e segui, com o Caio, para a casa dele. Quando chegamos, ficamos alguns segundos calados e sentados dentro do carro.

- Tudo bem, Marlon?

Eu não respondi. Eu ainda estava com as mãos pousadas no volante e a cabeça baixa. Sentindo todas as veias pulsando. Eu estava furioso. Eu apertava o volante com vontade. Eu respirava fundo. Eu pensava nas vezes em que eu tive que ver o Caio chorar por causa do Vinícius e das vezes que eu tive que consolá-lo e, principalmente, das vezes em que ele me jurava que nunca mais voltaria com ele, nem mesmo por um dia.

Eu estava fervendo. Eu estava sentindo a impotência da minha condição. Eu pensava um pouco se isso tudo também não era culpa da minha covardia, mas eu estava mais furioso do que qualquer coisa.

- Marlon?

As lágrimas foram brotando nos olhos, mas eu estava borbulhando de raiva.

- E então, foi bom o beijo?

- Que beijo?

- ORA, VAMOS, CAIO, VOCÊ ACHA QUE EU SOU IDIOTA? - gritei furiosamente.

Ele se assustou. Encolheu-se no canto do carro e me olhou com enormes olhos.

- Eu não vou te bater, se é isso que você está pensando!

- Você está diferente... - disse ele com uma voz trêmula.

- Então, me responde: foi bom o beijo?

- Que beijo, Marlon?

- Porra, Caio! O seu beijo com o Vinícius.

Ele ficou calado, abaixou a cabeça e começou a chorar.

- Está arrependido?

- Eu não queria...

- Deu para ver que você não queria. A forma como você beijava ele, como abraçava... Eu percebi direitinho que você estava achando tudo um saco.

- Não, Marlon, eu não queria, eu juro!

- Jura? Eu vi, Caio. Vai negar o que eu vi?

- Foi só um beijo...

- Você é a pessoa mais suja que eu conheço. No dia do aniversário da Luiza. Você não existe. Você é a pessoa mais fácil que eu conheço. Você é nojento.

- Por que você está dizendo essas coisas? Me ofende, sabia?

- E a mim? Você acha que eu não me sinto ofendido?

- Como assim?

- Esquece, Caio. Você não é merecedor de nenhum tipo de perdão. Eu não sei como um dia eu pude me apaixonar por você!

Assim como um soluço, aquelas palavras saíram de dentro de mim sem eu perceber.

Depois do revelado, ainda estava me sentindo traído e apertando o volante do carro nas palmas das minhas mãos, enquanto tentava segurar as lágrimas.

Depois eu olhei para frente, vi a rua deserta e escura. Percebi então que, em poucos segundos, eu havia revelado tudo ao Caio. Eu não acreditava que tudo aquilo tinha sido dito assim, dessa forma. Se eu pudesse, teria esperado o momento certo. Mas como eu saberia qual seria o momento certo?

Eu demorei algum tempo até olhar o Caio. Mas depois do que eu disse, um silencio constrangedor tomou conta da cena.

Quando eu finalmente tomo coragem, visualizo um Caio sério. Ele estava me olhando, mas não demonstrava surpresa ou tristeza (dois sentimentos que eu esperava que ele fosse sentir, quando eu finalmente o dissesse). Ele estava simplesmente sério. Me olhava com um pouco de curiosidade, talvez.

- Eu já desconfiava - disse ele quase soluçando.

- Já?

- Sim.

- Então você sabia que eu estava apaixonado?

- Não. Eu desconfiava que você fosse gay, mas não pensei que você estivesse apaixonado por mim.

- Por que não falou nada?

- Porque não queria te pressionar a falar nada. E depois, se você não tinha me contado até agora, era porque não se sentia seguro para tal. Mas eu estava pronto, para quando você me dissesse isto. Eu estava pronto para ser o seu amigo de verdade. Eu sempre quis um amigo gay, quando eu me descobri; alguém para contar minhas lamúrias. Eu estava me preparando para ser esse amigo para você.

Ficamos em silêncio. Toda a raiva tinha se dissipado. Eu estava ansioso para saber o que viria depois.

- Quando você descobriu que era gay?

- Quando percebi que estava apaixonado por você! - disse meio bravo.

- E quando foi isso?

- Quando você começou a dizer que queria esquecer que era gay.

Silêncio novamente. Minutos, talvez.

- Você está mesmo apaixonado? - perguntou carinhosamente.

- O que importa?

- Importa sim!

- Para quem? Para você?

- Eu nunca faria nada para te magoar.

- Mas já magoou.

- Não fiz conscientemente. Não sabia que você gostava de mim.

- Mas já estou magoado e agora nada mais importa. Desça do carro!

- Marlon...

- Desça!

Ele ficou um tempo sentado, me olhando.

Ele queria me consolar, mas para mim seria muita humilhação. Eu não suportaria aquilo. Na verdade, a presença do Caio, naquele momento, me era angustiante. Eu desci do carro, dei a volta nele, abri a porta do lado dele e o ordenei:

- Desça!

Ele me olhou de baixo para cima, baixou a cabeça um pouco, respirou fundo e desceu finalmente. Quando eu comecei a voltar ao carro, ele me segurou pelo braço.

- Não precisa ser assim.

Soltei o seu braço e fui embora. Nem esperei que ele entrasse em casa, como de costume. Não derramei mais nenhuma lágrima.

Cheguei em casa, tomei banho e fui dormir.

No dia seguinte eu ainda estava um trapo. Tomei meu café e voltei para cama.

Passei o dia de meias e cueca, na cama. Só saía dela para comer ou ir ao banheiro. À noite, eu recebo visita.

- MARLON, O CAIO ESTÁ AQUI. - gritou minha mãe atrás da porta do meu quarto.

Eu o receberia?

A vontade era de mandá-lo embora. Eu respirei fundo, a fúria voltou com toda a força.

Depois pensei bem: “Marlon, seja maduro. Uma hora ou outra esse encontro tem que acontecer”.

Abri a porta. Ele estava ali em pé. Camiseta azul turquesa, jeans e chinelos de dedo. Estava de óculos e com as mãos para trás. Trazia um sorriso no rosto. Um sorriso não muito expansivo. A ira aumentou só de olhar para aquele garoto bonito. Eu abri mais a porta e dei espaço para que ele entrasse.

- Trouxe isso! - estendeu a mão e me ofereceu um tablete de chocolate.

Eu peguei o tablete e joguei em cima da cama. Eu nem olhei o tablete. Na verdade, não tirei os olhos dele. Ele ficou em pé, na minha frente.

Assustou-se ligeiramente com o meu ato de jogar o chocolate na cama. Olhou o chocolate de longe e recuou o sorriso.

- O que você quer?

- Não sei qual será o rumo dessa conversa, e muito menos sei se essa será a última. Mas foi preciso eu vir aqui. A gente precisa conversar.

- Incrível, não é, Caio? A gente sempre precisa conversar, acertar alguma coisa, pedir desculpas por algo. Vai ver que isso é um sinal.

- Pode ser. Mas somos amigos antes de tudo e devemos prezar ao menos isso.

- Essas palavras ficam muito bonitas na sua boca.

- Por que não sentamos e guardamos as facas? Não precisamos nos atacar desse jeito. Se você precisa me atacar, é porque você está com medo de alguma coisa.

Eu peguei a cadeira do computador e sentei. Estendi a mão para a cama, mostrando ao Caio onde ele deveria sentar. Ele sentou, mas antes afastou o chocolate, para que não sentasse em cima.

- E então? - perguntei.

- É seguro conversar aqui?

- Como assim?

- Alguém pode ouvir?

- Falemos baixo.

- Ok. Por que você não começa?

- Não fui eu quem te procurou, então comece você!

- Eu só vim para saber como estamos.

- Não estamos.

- Alguma coisa estamos: amigos?

- Conhecidos é mais adequado.

- O que você espera de mim?

- Eu já esperei muito. Hoje não espero mais nada.

- Para de me atacar, Marlon. Seja franco.

- Eu estou sendo. Eu esperava amizade, depois eu descobri que queria algo mais, mas sei que você não pode me dar. Então, não espero mais nada, porque não quero só amizade e se você só pode me ofertar isso, então não espero nada de você.

- Eu só não quero que você sinta raiva de mim. Eu não suportaria isso.

- Eu já suportei tanta coisa, Caio.

- Eu não suportaria, porque gosto muito de você. Não consigo imaginar você com raiva de mim.

- Você tem medo que as pessoas não gostem de você!

- As pessoas não. As pessoas que eu gosto sim. E depois, eu não tive culpa. Mesmo desconfiando de você, certeza eu não tinha, e mesmo se tivesse, eu só saberia que você é... e não que você gostava de... enfim.

- Se você soubesse, faria diferença?

- Claro que sim.

- Claro que não. Você por acaso não iria naquele estacionamento, se soubesse?

- Eu teria evitado o antes do estacionamento. Eu o procurei antes do estacionamento. E depois, Marlon, se você gostasse de alguém e essa pessoa quisesse ficar com você, você deixaria de ficar com ela só porque você sabe que outra pessoa gosta de você?

- Se fosse alguém que não merece, eu não ficaria mesmo. Principalmente no seu caso, que tinha dois motivos para não fazer isso: o primeiro é o histórico de patadas que ele te deu e o segundo é que ele tinha voltado a namorar a sua amiga.

- Luiza e eu não somos amigos.

- E isso já é bastante para você ficar com o namorado dela?

- Eles não estão namorando.

- Como não?

- Não estão. Ela o convidou, ele foi. Ela quis ficar com ele, ele concedeu. Só isso!

- Só isso? Parece tão fácil.

- Eu não resisti. Eu estava indo muito bem, fazia semanas que eu não ligava para ele, ou mandava email, ou teclava pelo MSN. Mas eu o vi ali... eu não consegui me controlar.

- Não é desculpa.

- Você me culpa mais porque gosta de mim e não consegue ver que é difícil sim!

- Talvez seja isso. Mas não tira a sua culpa. Você rasteja para ele. Você se humilha se for preciso.

- Você acha que eu me sentia bem depois de cada encontro que eu tinha com ele no passado?

- Mas o reencontrava sempre.

- É difícil largar de quem se gosta. Me diga você mesmo.

- O que quer dizer com isso?

- Você não me largou!

- Não zombe de mim! - falei um pouco mais alto.

- Não estou zombando. Quero que você entenda o que eu sinto e parece que a única maneira de te fazer entender é fazer comparações com o que você vive.

- O que eu sinto por você é saudável.

- É saudável até o ponto em que você precisar se rebaixar para ter o que deseja.

- Eu não faria isso.

- Será? Você ainda não fez uma loucura por amor, porque nunca amou. E agora que ama, não pode demonstrar. Mas se você fosse livre para sair dessa casa e dizer “Mãe, pai, vou me encontrar com o meu namorado, volto logo!”, talvez você me entendesse.

- Não entendo mesmo.

- Eu não tenho nada a perder, Marlon, só o desejo que me consome. Você, por outro lado, tem muito a perder. Me diz, por que você ainda não tinha me dito o que você me disse ontem?

- Por medo.

- De quê?

- De que você me rejeitasse.

- Será que era isso mesmo? Será que era só isso?

- Não duvide de mim. Você não é ninguém para duvidar.

- Será que era só isso que te impedia? Duvido muito.

- Não ouse...

- Ouso sim e digo mais: pense bem, se você pudesse dizer o que sente para a sua família e amigos, sem medo, me fala, o que te impediria de me dizer o que você me disse ontem? Você disse aquilo no impulso, mas há quanto tempo que eu não importo com o Vinícius? Há quanto tempo você vem presenciando a minha, digamos, “recuperação”? O que te impedia de me contar anteontem, por exemplo? Era só o medo de me perder?

Eu não poderia negar que ele estava certo. Apesar de toda a raiva, ele estava certo. Eu poderia ter contado há mais tempo, eu poderia ter tentado conquistá-lo há mais tempo e nada disso teria acontecido.

Não estava achando que a culpa era minha, mas estava reconhecendo que o Caio também não tinha a culpa toda que eu o estava acusando.

- E se eu tivesse dito há mais tempo, você não teria ficado com o Vinícius?

- Talvez não. Você foi me buscar em casa, me levou à festa, me fez companhia. E eu ainda poderia ter pensado nas vezes em que você me serviu de ombro e me foi amigo verdadeiro. Eu posso ser tudo de ruim, mas eu não faria essa sacanagem com você. Eu não ficaria com o Vinícius sabendo que você estava a dois andares acima de nós. Você acha mesmo que eu ficaria?

- Você acabou de me perguntar se eu deixaria de ficar com alguém só porque eu sei que outra pessoa gosta de mim. Suponho que você queria que eu respondesse não.

- Supôs certo. Mas eu não ficaria com ele, sabendo que você me deixaria minutos depois em casa. E não estou falando isso pela carona, é claro, mas pelo respeito e segurança que eu sinto por você e em você. Marlon, alguma vez eu já te traí? Se alguma vez eu não te disse algo, foi por mim que eu fiz isso. Você tem raiva de mim pelos motivos errados. Se você não sentisse o que sente, seria como a Claudinha e o Tom. Eles também não aprovam o Vinícius, mas eles não agem como você. Você age porque tem outros sentimentos em jogo. Mas eles são somente amigos, tão bons amigos como você. Eles me dizem o mesmo que você diz. Eles dizem que eu me humilho e me rebaixo quando... enfim. Mas eles não sentem raiva de mim por isso. Você sente, porque, além de eu fazer algo que você não aprova, eu machuco o seu coração. Mas eu, em nenhum momento sabia que te magoava desse jeito e se soubesse, faria um esforço enorme para não magoar.

Ficamos em silêncio. Ele estava certo! O que dizer? Ele estava certo.

- Então o Tom e a Claudinha sabem do Vinícius?

- Sabem, mas eu pedi que eles não te contassem, porque já havia percebido que você era... e talvez, se eles ficassem comentando isso com você, bem, talvez te afetasse um pouco.

- Eles sabem que você desconfiava de mim? - perguntei assustado.

- Não, claro que não. Nem mesmo o Tom, que eu sei que é uma pessoa que nos entende. Mas não, não disse. - depois de uma pausa longa - Está vendo que você tem medo que as outras pessoas saibam de você?

- É claro que eu tenho!

- E foi esse um dos motivos que te impediu de me dizer antes o que você me disse ontem.

Ficamos mais uma vez calados. Não havia mais nada para ser dito. Tínhamos feito as pazes, mas não sabíamos se ainda éramos amigos. Até porque eu não queria mais ser apenas amigo.

- Toma! - disse ele, me oferecendo o chocolate - põe na geladeira, antes que derreta. Eu estou indo - se levantou.

- (demorei um pouco para me levantar) E nós, como estamos agora? Ou melhor, como ficamos?

- Eu só posso te oferecer a minha amizade.

Mais um momento de silêncio. Foi com o silêncio que eu respondi que a amizade não era o bastante. Ele entendeu o meu silêncio, como tudo o que eu dizia em silêncio para ele. Ele sorriu, pôs a mão no meu ombro e saiu.

- Não precisa me acompanhar até a porta. Tchau!

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Ah! Como dói amar e não ter a reciprocidade do ser amado. Passei isso algumas vezes, antes de casar. Dói bastante! Caio está sendo honesto. Mas isso não diminui a dor.

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