Bernardo [16] ~ A vingança

Um conto erótico de Bernardo
Categoria: Gay
Contém 1994 palavras
Data: 02/12/2023 02:34:16
Assuntos: Gay, Início, Sexo, Traição

Tudo o que eu conseguia fazer era rir. Eu me agachava para gargalhar. O ar chegava a me faltar enquanto eu caia no chão sem fôlego. Era tudo tão absurdo que ficava engraçado. Era hilário! Eu e o Rafael fingindo namorar! Para fazer ciúmes no Eric! Quando mais eu pensava naquela idéia estapafúrdia, mais eu ria. Rafael me assistia atento esperando eu parar.

_Você não pode estar falando sério!_ falei ainda em meio a risos.

_E por que não? É um ótimo plano.

_Você é louco._ respondi já começando a perder a graça.

_O que tem de mais? É um simples teatrinho!

Ele falava como se estivesse a beira de se desesperar para que eu entendesse. Mas eu entendia sim, entendia muito bem a idéia e suas conseqüências para Eric. O grande porém era que eu não iria me envolver com outro cara, ainda que fosse de mentirinha.

_Eu não vou fazer isso, Rafael._ falei já recuperado me levantando.

_Por que não? Vai ser ótimo, pagar Eric com a mesma moeda!

_Eu não vou fazer isso.

_Você já perdoou? Não acha que ele mereça pagar por isso?!

_Não é essa a questão!

_Qual é então?!

_Eu não vou me envolver com outro cara!

Já estávamos quase gritando um com outro, mas assim que eu disse aquilo, ficamos parados um olhando por outro. Ele absorvia as muitas informações sobre mim que havia naquela simples frase, eu me lamentava em silêncio por não ter segurado minha língua.

_Você...?

_Você ouviu o que eu disse, tire suas próprias conclusões.

_Você não está ok com isso?_ perguntou se referindo à homossexualidade.

_Não, não estou. Por isso consigo deixar essa coisa toda do Eric passar. Pra mim foi como um presente que ele me deu ao fazer eu parar de desejá-lo. Por isso eu não estou afim de uma vingança.

Falei desabafando aquilo que estava na minha cabeça. Novamente repito que eu não sou desse tipo de pessoa, que solta tudo que vem a cabeça sem pensar nas conseqüências, mas Rafael tinha um certo poder sobre mim. Era como se ele pudesse me ler, como se sua presença tornasse meus disfarces inúteis.

_Então porque concordou em me ajudar?_ perguntou.

Era uma pergunta honesta, só que eu não tinha resposta para ela. Eu não fazia a mínima idéia de porque tinha entrado naquele jogo de vingança. Tudo o que eu sabia era do jeito que eu me senti quando ele pediu minha ajuda.

_Eu não sei. Acho que eu quis te ajudar, arranjar um jeito de estancar aquela raiva toda que você estava demonstrando sábado.

Falei sem olhar nos seus olhos. Eu tinha medo dele ler minha mente e descobrir coisas que eu mesmo ainda não entendia completamente. Rafael ficou um tempo em silêncio pensando sobre as coisas que eu estava lhe contando. Eu já me preparava para ir embora com a certeza que mais nada sairia daquela conversa, mas ele tornou a falar me fazendo ficar:

_Então faça por mim. Eu preciso disso, Bernardo. Esse é meu jeito de virar a página e seguir em frente, e eu preciso de você para isso.

_Rafael...

_Eu sei que você não está ok com tudo isso ainda, mas nós não vamos precisar fazer nada. Só fingir que viramos amigos aos olhos de todos, e vai ser só um beijo aos olhos de Eric, nada mais. Pode até ser sem língua, um beijo técnico.

_Rafael..._ eu suspirei meio rindo, meio cansando de ficar dizendo não.

_Bernardo,_ ele falou me segurando pelos ombros e me fazendo olhar diretamente para seus olhos _por favor

Acho que era recíproco. Do mesmo jeito que ele parecia conseguir coisas só no meu olhar, eu também podia jurar ser capaz de dizer tudo aquilo que ele estava sentindo através do seu olhar. Nos seus olhos eu via a sinceridade do seu pedido. Era um apelo desesperado. Ele realmente precisava daquela revanche para seguir em frente. Eu sempre fui péssimo em dizer “não”, mas isso era ainda mais grave com Rafael depois que estabelecemos essa estranha e incômoda conexão psíquica.

_O que eu estou prestes a fazer?!_ perguntei em voz alta mais para mim mesmo do que para ele.

_Isso é um sim?_ perguntou abrindo um sorriso.

_Droga! É!

_Obrigado cara!_ respondeu me envolvendo num abraço.

Meu coração se acelerou quando senti o calor do seu corpo junto ao meu. Como era bom seu perfume... Como era macia sua pele... Como era boa a sensação da sua barba por fazer arranhando de leve minha bochecha... Como seu abraço era firme e dava uma confortante sensação de segurança... Como era boa aquela sensação no meu estômago como se eu estivesse caindo em queda livre diretamente da estratosfera...

Todo mundo já percebeu o que estava acontecendo, mas eu resolvi fechar meus olhos. Seria só um beijo e nada mais. Eu estava tão enganado...

[...]

Eu ainda estava meio aéreo com o abraço de Rafael, mas ignorava totalmente os motivos. Não tentava nem mesmo justificar com alguma mentira para mim mesmo. Eu estava bem, e estava bem com isso. Nós dois estávamos parados em frente a porta já fechada da nossa sala.

_Pronto?_ perguntou Rafael.

_Pronto._ falei num suspiro _E como vamos fazer?

_Humm. Vamos entrar rindo, como se estivéssemos rindo de uma piada, mas discretamente, nada muito exagerado.

_Ele não vai desconfiar da nossa amizade repentina?

_Talvez, mas vamos fazê-lo acreditar nela.

_Ok.

_Vamos?

_Vamos.

E lá fomos nós. Abrimos a porta e entramos juntos rindo, mas rapidamente nos reprimindo pois o professor já estava dando aula. Tudo milimetricamente calculado, lógico. E lá estava Eric, no seu lugar de sempre. Eu o encarei por poucos segundos, mas foi tempo o bastante para notar que ele estava péssimo. Parecia que ele não dormia a uma semana. Tinha olheiras escuras e profundas, uma expressão abatida e os olhos ainda mais tristes que o de costume. Mas notei também sua cara de surpresa quando nos viu juntos, nos comportando como velhos amigos. Me deu pena dele e quase sorri em solidariedade, mas antes de eu acabar com todo nosso plano, Rafael me puxou discretamente e foi me guiando para dois lugares vagos ao lado de Alice. Alice era outra que nos encarava. Corajosamente olhei para ela e tudo o que ela fez foi um sinal negativo com a cabeça, deixando bem claro que desaprovava o que estávamos fazendo.

Para vocês conseguirem visualizar melhor a cena, Rafael estava sentado na minha frente, Alice à minha esquerda e Pedro à minha direita, todos nós no fundo esquerdo da sala, enquanto Eric estava sentado no canto direito. Todos na sala pareceram estranhar um pouco minha nova amizade com Rafael, o que me deixou um pouco inquieto, mas logo ninguém mais estava prestando atenção na gente. Ninguém excluindo Eric e Alice. Mesmo sem olhar para ele, eu senti o olhar de Eric me queimando. Rafael parecia estar muito concentrado na aula, também não dava bola para ele. Tentei seguir seu exemplo e me concentrar no professor, mas Alice me cutucou.

_Além de cúmplices agora vocês são amigos?

Ela perguntou sussurrando, mas foi o bastante para Rafael ouvir e virar para trás intrigado.

_Sim, ela sabe._respondi para ele e depois me virei para Alice _Depois conversamos, agora não.

Ela balançou a cabeça negativamente deixando claro que desaprovava aquilo tudo. Novamente tentei me concentrar na aula, mas naquele dia eu estava destinado a não ser deixado em paz. Pedro, sentado ao meu lado, me cutucou e falou sussurrando:

_Depois temos que conversar sobre aquele assunto que você ia me ajudar.

O professor já estava me encarando demais, e como eu não queria passar pelo vexame de ser expulso de sala por conversar demais na faculdade, não respondi Pedro. Arranquei um pedaço da última folha do meu caderno e escrevi:

“Eu não esqueci, no intervalo a gente se fala.”

Entreguei o bilhete para ele, que riu, escreveu uma resposta e me entregou:

“Conversando por bilhetinhos? Somos meninas de doze anos de idade?”

Nem me dei ao trabalho de responder, amassei o papel e tentei me concentrar na aula, sem sucesso. Tudo o que eu conseguia pensar era em como seria meu recreio: eu teria que conversar com Rafael sobre Alice saber sobre nossa relação, teria que conversar com Alice sobre minha relação com Rafael, teria que conversar com Pedro sobre sua relação com Alice, e possivelmente seria interrogado por Eric sobre minha nova relação com Rafael. Decidi que o melhor a fazer seria abaixar a cabeça e dormir, tentando descansar um pouco para o que me esperava.

Só ousei levantar minha cabeça quando ouvi o professor se despedir. Quase que imediatamente, Alice, Pedro e Rafael se viraram na minha direção, mas falei antes que qualquer um deles abrisse a boca:

_Eu vou ao banheiro e não quero ninguém me seguindo. Eu tenho o direito de mijar em paz. Depois eu vou na lanchonete, se quiserem falar algo comigo, vai ser lá. Com licença.

Falei e saí da sala antes que algum deles respondesse. Como foi dito, fui ao banheiro e adivinha quem me esperava do lado de fora de um dos boxes? Sim, ele, Eric. Ele me encarava de braços cruzados encostado na parede. Não sei a sensação que ele estava querendo me passar, mas tudo o que consegui sentir por ele foi pena ao ver suas olheiras e sua expressão triste. Fingi que não o tinha visto e fui direito à torneira lavar minha mão. Estávamos sozinhos ali.

_Então quer dizer que você e Rafael agora são amigos? Chegam na sala juntos rindo?

Desliguei a água e sequei minhas mãos numa toalha de papel, ainda o ignorando.

_Não vai responder?

_Não lhe devo satisfações da minha vida.

Eu tentava manter o controle, mas aquele ciúme idiota seu me fez lembrar de tudo. Sua dissimulação foi me enchendo de raiva.

_É que eu acho muito estranho, duas pessoas tão diferentes que de repente se tornam amigas, sabe?_ sua voz tinha uma pitada de descontrole.

_Bom, eu acho que descobrimos algo que tínhamos em comum no último sábado._ respondi.

Eu não era muito dado a acessos de raiva ou revanchismo, mas não posso negar o quanto eu me senti bem ao vê-lo ser atingido pelas minhas palavras. Ele realmente não esperava uma reação mais agressiva vinda de mim. Talvez de Rafael, mas não de mim. Ele tentou fingir que se recuperou.

_Olha quem está mostrando as garras!

_Combina com meus novos chifres.

Olhei para ele e notei que seus olhos estavam cheio de lágrimas. Ele estava ferido, mas continuava lutando para sair por cima naquele embate e assim começar a discutir sobre seu erro. Mas ele pareceu desistir dessa estratégia:

_Bernardo, por favor, me escuta...

_Não._ o interrompi _Já ouvi tudo o que eu tinha para escutar.

_Olha, eu não estou mais com ele, nós terminamos ontem!

Eu ri custando a acreditar que ouvi aquilo.

_ELE terminou com você ontem!_ falei num raro acesso de raiva _Ele ouviu nossa conversa no sábado e depois nós dois tivemos um papo bem proveitoso, sabe?

Seus olhos se arregalaram e sua pele conseguiu ficar ainda mais branca que o de costume.

_Escute bem, Eric._ falei tentando controlar minha voz para não gritar e chamar atenção _Eu não quero mais você na minha vida. Se vamos mesmo ter que conviver pelos próximos cinco anos, que seja com o mínimo de contato possível. Dispenso até o seu bom dia. E me arrisco a dizer que Rafael espera o mesmo de você. Agora, com licença que eu tenho pessoas melhores para conversar durante o intervalo.

Saí do banheiro sem esperar por uma reação sua, mas se fechasse meus olhos, ainda conseguia ver as lágrimas descendo pelo seu rosto, os olhos fundos, tristes e vermelhos, e sua expressão de dor. Eu não tinha mais pena dele. Eu estava sentindo uma mistura venenosa de mágoa e raiva. Agora eu queria mesmo aquela vingança!

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Comentários

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Etcha! Ri muito com as cenas. Estou com pena do Eric. Vingancinhas de adolescentes costumam ser crueis.

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