- Oi!
- Não precisa chorar.
- Não estou chorando.
- Sei... - irônico.
- Quando você voltou?
- Hoje. Agora.
- Por que não me avisou?
- Quis fazer surpresa.
Durante esse tempo, não nos beijamos, não nos acariciamos, nem mesmo nos abraçamos. Foi só um "oi".
- Eu vou na cozinha terminar o almoço. HENRIQUE, VOCÊ ALMOÇA COM A GENTE NÉ? - gritou.
- Se não te incomodar...
- Besta! - e saiu.
Ficamos de pé, um olhando para o outro. A minha boca ainda estava um pouco aberta, a dele estava sorridente. Era incrível aquela calma dele.
- Quer sentar?
- Pode ser.
- Vem.
Ele foi indo em direção ao sofá e sentando-se, me dando espaço ao lado dele.
Eu o vi sentando, fechei a porta, pus os livros em cima da mesinha e sentei ao lado dele.
- Como você está?
- Estou bem, e você?
- Bem também.
Uma conversa cordial, simples, de meros amigos.
- Chegando da faculdade?
- Sim.
- Aff, dia de sábado?
- Pois é, essa é a minha vida.
- Q agora eu estou voltando pra ela e vou fazer parte ativamente.
Era a primeira palavra de afeto que ele me dizia até então.
- Por que você está tão calmo?
- Ah, sei lá; acho que eu nunca estive tão certo de mim.
- Como assim?
- Eu me tornei homem, B.
- Estou vendo.
- E nada mais comanda o meu nariz que não seja eu mesmo... e você.
- E por que isso tudo?
- Porque eu vou voltar.
- Quando?
- Uai, quando acabar lá.
- Ah tá; pensei que estivesse voltando, já.
- Não, não; eu vou voltar quando acabar lá e fazer aquilo que o Hélio te contou.
- Montar o consultório na galeria?
- É... a propósito, quero que você vá comigo conhecer, tá?
- Tá bom.
- E vou te mostrar outra coisa também.
- O quê?
- Depois do almoço.
- O que é, Rique?
- Eba! Ele me chamou de Rique!
- Besta.
- Idiotazinho alcoólatra.
- Viado enrustido.
- Bichinha pão com ovo.
- Tá bom, né; você sabe como eu odeio esses nomes pejorativos.
- Você que começou a me chamar de viado.
- Viado!
- Haha.
- Ei!
- Hum...
- Por que a gente tá tão tímido?
- A gente?
- É! Você não está, não?
- Não, eu estou normal. Por que, você tá?
- Um pouco.
- Por quê?
- Não sei.
- Que loucura!
- Por que a gente ainda não se beijou?
Aí, da cozinha...
- NADA DE BEIJO HOMOSSEXUAL NA MINHA CASA, QUE É DE FAMÍLIA DECENTE!
- Haha... o quê? Esse prostíbulo?
- Hehe.
- Isso aqui é uma casa de aliciar menores e ponto do crack, sua traficante prostitutazinha barata!
- EitaAAAAA! Pegou pesado, Haha... revelou meu segredo, agora eu vou ter que te matar!
- Você era quem deveria morrer, escutando a conversa dos outros.
E esse foi o clima até a hora do almoço.
- Liga não, Henrique; eu não consigo fazer arroz soltinho.
- É, Rique; eu sempre como marmita, porque essa comida não desce, não.
- Haha... está ótimo, Aninha.
- Ana Banana, passa o azeitinho.
- Então, Henrique; volta quando?
- Falta alguns meses, mas volto logo-logo.
- Hum.
- Tá vendo, Rique; ela já quer saber quando você vem pra poder me expulsar.
- Eita, Bem; para; você sabe que isso não é verdade!
- Sei, sua boba; tô brincando.
Aí a gente se abraça como duas crianças bobonas.
- Estava ótimo, Aninha.
- Valeu... Êpa, deixa que eu levo os pratos. Ben, vai com o Henrique para o negócio que vocês iam lá.
- Tá, beijo.
- Vai logo!
- Tchau, Ana. - dois beijinhos - obrigado por me receber.
- Imagina.
- Diz para o Vagner, se por acaso eu for embora e não o encontrar, que eu mandei um abraço.
- Tá, ok; Tchauzinho!
Descemos as escadas, fomos pra rua, onde o carro do Henrique estava estacionado. Entramos. Coloquei o cinto e ele foi arrancando.
- É longe daqui?
- Um pouco.
- Vamos primeiro para o negócio que você quer me mostrar.
- Isso, pra galeria.
- Pra galeria agora, não; para o outro negócio.
- Não, o outro negócio é depois da galeria.
- Não, Rique; para o negócio, agora!
- E eu era o mimado, né? Parece que houve inversão de papeis.
Chegamos na galeria e nada de beijo até então. Imaginem a minha aflição!
- Nossa, Rique; como é grande!
Era enorme: três andares, doze consultórios, estacionamento... enfim, tudo o que um ambulatório precisa.
- E você comprou tudo isso?
- Aham.
- Com que dinheiro?
- Pedi emprestado ao meu irmão.
- Uai, por que não pediu aos seus pais?
- Preferi pedir ao meu irmão, porque eu só queria avisar ao meu pai que iria me mudar pra cá, quando estivesse com o dinheiro em mãos.
- Ah, tá.
- Vem ver a minha sala. - me puxando pelo braço.
Subimos as rampas de acesso. Era a última sala do último corredor.
As paredes já estavam pintadas, mas não tinha um móvel sequer.
Entramos.
- É linda, Rique!
- É, não é?
- Aham.
Aí eu fui em direção à janela, pra ver a vista.
De repente ele me pega por trás e, comigo de costas, passa a cabeça por cima do meu pescoço e me beija.
Eu só senti a língua dele roçando nas minhas maçãs do rosto e descendo pra minha boca.
Os braços dele se enroscaram na minha cintura e ele começou a estalar a língua dentro da minha boca.
Não resisti.
Por trás me dava agonia, porque eu não poderia sentir o beijo direito, aí me virei e o abracei. Me agarrei no pescoço dele e continuei o beijo.
Era um beijo inflamado pela saudades e distância. Era um beijo de amor, de romance. Era um beijo de dois adolescentes descobrindo o amor juntos.
Demoramos um tempo naquela ternura e não desgrudamos as bocas. Ele foi me pressionando contra a janela e me abraçando mais forte pela cintura.
Sentia a pele do rosto dele roçando em mim e os óculos sendo esfregados nos meus olhos.
Ele estava forte. O meu médico estava forte!
Ele me pegou de jeito e tirando minha calça começou a morder meu pau por cima da cueca.
Meu pau foi endurecendo na boca dele e ele passava a mão nas minhas coxas e não parava de me morder o pau.
Enfiou o dedo com saliva no meu cu por entre a cueca e eu fiquei maluco ali.
Ele estava sedento de vontade e não fazia coisa com coisa, me esfregando com as mãos o tempo todo e resmungando um monte de sacanagens.
Ele continuou babando na minha cueca e apertando o meu saco, enquanto eu reclamava da dor excitante.
Ele tirou a minha cueca e foi me sugando...
- Rique, eu estou todo sujo, acabei de vir da faculdade, me chupa, não!
- Cala a boca.
Ele foi me chupando forte. Ele estava muito agressivo, em contrapartida com a calma que ele estava horas atrás.
Chupou pra valer. Enfiava tudo na boca e sugava muito forte. Cuspia em cima e chupava. Colocava as minhas bolas na boca, mordiscava e voltava a chupar.
- Ai, ai, arr, Rique; eu estou tão sujo...
- Haha... e isso é estímulo pra eu parar? Não funcionou, não, hein, B? O bom é você assim, sujinho; me sinto mais tesudo pra fazer a sacanagem.
Agora vem cá que você vai me chupar como eu chupei você.
Ele desceu a calça e me obrigou a me ajoelhar. Foi tirando rápido o pau da cueca e me colocando na boca.
- Calma, Rique.
- Calma uma porra! Chupa.
Ai ele foi enfiando agressivamente dentro de mim e foi como a língua sufocante que ele tem. Só que essa nova língua tocava a garganta. Eu fazia carinho com a minha língua e ele ordenava chupadas fortes, dizia que estava morrendo de saudades e que merecia uma chupada de respeito.
Mas eu não conseguia, tinha acabado de chegar da faculdade, estava exausto.
- Ah, você está mole; vem, senta no meu colo.
Ele sentou no chão e me fez sentar de frente, em cima dele. Me beijava com desejo e eu já não suportava aquela situação agonizante. Queria logo chegar ao orgasmo, porque eu não suportava uma carga tão grande de sexo.
Ele estava impossível e forte. Eu, mesmo por cima, nem controlava os movimentos.
Ele estava muito ativo. Me tirou de cima dele, me pôs de quatro e veio por trás.
- Vai devagar, porque de quatro dói.
- Já te mandei calar a boca.
E veio com tudo. Ele ia se metendo dentro de mim e eu não aguentava. Pra aumentar o meu desejo, ele começou a me masturbar enquanto fazia os movimentos. Ele começou a se deitar sobre mim e lamber as minhas costas. Foi subindo para o meu ouvido e começou a sussurrar:
- Sentia falta disso? Aposto que sentiu falta do seu macho. Você pode até ter saído com outros, mas eu é quem te faço gemer desse jeito, hein?
- Ai, Rique, não para, não!
- E se eu parar?
Aí ele para.
- Não, Rique, continua!
- Faça por merecer.
- Não, Rique, vai, continua!
Aí ele continua mais forte e me masturbando. Lambendo as minhas costas.
Depois começou a mordê-las. Não podia durar muito tempo. Eu acabei gozando na mão dele e ele goza dentro de mim.
Foi tudo muito excitante. Definitivamente não fizemos amor, fizemos sexo mesmo! E quem disse que não precisamos de um momento como esse? Ou melhor, de momentos como esse?
- Agora vem cá e me dá um beijo do jeito que eu mereço!
Eu ainda estava de quatro, com o rabo todo arreganhado pra cima e meu cu aberto, quando ele se deitou no chão e me puxou pra cima dele para beijá-lo.
Ficamos lá, nus, um em cima do outro, nos beijando, nos amassando, nos abraçando e esfregando nossas virilhas uma na outra. Estávamos muito sujinhos e eu mais ainda, pois tinha acabado de chegar da faculdade.
- Saudades suas.
- Eu também, meu amor.
- Não, Rique, não chora.
- Não consigo evitar.
- Para, Rique, senão eu choro também.
- Tá, eu vou tentar. É que eu estava com tanta saudade... Não disso, exatamente, mas de você, só de você, de sentir você assim desse jeito, aqui, pertinho.
- Eu também, amor.
- Eu não me importo que você tenha saído com outras pessoas; eu sei que ninguém te toca do jeito que eu te toco.
Era a segunda vez, desde que ele havia chegado, que ele falava sobre isso: de eu sair com outras pessoas. Mas eu não saía com outros homens, na verdade, eu nem saía e nem saio até hoje pra lugar nenhum com ninguém. Saio com o casal maravilha de vez em quando e com o pessoal das faculdades e olhe lá. Mas no geral eu nem saía. Mas ele insistia nisso e eu não estava entendendo.
- Mas, amor; eu não saio com ninguém desde que você se foi.
- Você não precisa ficar com vergonha de dizer isso, é justo que você tenha feito.
- Pode até ser justo, mas, justiça seja feita aqui, então: eu não saí com ninguém.
- Tem certeza?
- Claro! Só se eu sou sonâmbulo e não sei. Ou podem ter feito um clone, mas eu não saí com ninguém, amor.
- Tudo bem.
- Por que, você saiu?
- Não, mas eu imaginei que você fosse fazer isso.
- Por quê?
- Porque você saiu uma vez com alguém, quando a gente terminou, lembra?
- O Érique e só.
- Até do nome você lembra.
- Claro, foi a única pessoa com quem eu saí, fora você.
- Tá, não precisamos entrar em detalhes.
- Concordo... estava tão bom, tudo!
- Quer continuar? - com uma voz e um rosto sapeca.
- Claro, quero a parte dois.
- Haha... então vem.
E ele se levantou, começou a vestir a roupa.
- Mas não tem a parte dois?
- Tem, mas não é aqui.
- Hã?
- É, se veste logo.
Aí eu fui me vestindo, sem entender nada do que se passava.
Depois de vestido, ele me puxou pelo braço e fomos descendo as escadas.
- Para, Rique, devagar.
- Vem logo, molenga!
Fomos para o carro e ele, como um moleque sorridente, arrancou e fomos em direção à praia.
- É a surpresa que você me prometeu?
- É!
Chegamos a um prédio, entramos na garagem e subimos rapidamente pelo elevador.
Estou narrando rápido para se ter a noção de como foi rápido esse passar de tempo.
- Onde estamos, Rique?
Estávamos em um apartamento amplo e claro, com muitas paredes de vidro e uma vista linda, muito parecida com a vista que eu tive na minha primeira vez... Afinal, era a mesma praia.
- De quem é esse apartamento?
- Nem imagina?
- Não, eu nunca vim aqui.
- É seu!
Me disse isso me oferecendo as chaves.
Gelei no mesmo momento.
Como ele poderia simplesmente me dar um apartamento? Um apartamento?
- Haha... tá falando sério?
- E você acha que eu brincaria com isso?
- Guarda essa chave, Henrique; nem quero ver.
- Henrique? Não; me chame de Rique!
- Guarda essas chaves.
- Você não quer aceitar a chave da nossa casa?
- Oh, Rique; você não sabe que... - interrompe.
- Eu sei que você não gosta de partilhar comigo as coisas.
- Rique... - interrompe.
- Benjamin, aceite isso e pronto! - me dando na mão.
- Mas... - interrompe.
- Nada de mais. Esse apê é nosso e você vai ocupá-lo enquanto eu não estou na cidade.
- Ai, Rique... - já chorando.
- Oh, meu amor, é a nossa casinha, mas você tem que ficar aqui e cuidar dela por nós. Quando eu chegar de Londres, quero encontrar você aqui de roupão, uma taça de vinho e um chinelão para eu por nos pés.
- Te amo!
Pronto! Foi o ápice. Nos beijamos e voltamos ao chão, porque o apartamento, assim como o consultório, estava desmobiliado. A gente foi se rasgando - eu mesmo já estava com a blusa toda rasgada - e tirando as roupas rapidamente. Ele foi abrindo o zíper e abaixando as minhas calças.
Foi me beijando no pescoço e me fazendo suar. Me mordia, agora de leve, e sussurrava:
- Meu lindinho, saudades de você, te amo tanto, ain...
Agora sim fizemos amor.
Foi devagarzinho, lento e gostoso. Eu podia sentir as veias do pênis quente do Henrique dentro de mim, pulsando, enquanto ele me sugava a pele do pescoço.
Eu não controlava os meus impulsos e instintos... gemi como um louco e pedia mais.
Ficamos um deitado sobre o outro e ainda um pouco vestidos. Não mudamos de posição, mas o amor foi maior que qualquer ato selvagem.
Eu sempre fui mais romântico e ele sempre foi muito carente. Era unânime entre nós dois: é sempre melhor fazer amor que sexo.
Ele gozou em mim e ficamos ali no chão do apartamento, olhando o teto, até que ele...
- Tá vendo ali? Vamos pôr um lustre lindo; ali vamos pôr a namoradeira e na varanda vamos por uma rede.
- Mas isso só será um lar quando você vier pra cá.
- Eu sei.
- Por favor, Rique; não demora pra voltar!
- Não, não demorarei.
- Quando você vai, amanhã?
- É.
- Aff.
- Pois é. Vim só pra fazer a surpresa. Amanhã os primeiros caminhões vão chegar com os móveis e você vai ter que estar aqui.
- Amanhã?
- Eita, amanhã é domingo, esqueci, segunda feira os móveis vêm.
- Tá.
- Ei!
- Fala.
- Me beija? - com uma cara de pidão.
Dormimos em um hotel. Ele queria me levar pra falar com os pais dele, só pra dar um “oi”, mas eu não quis e bati o pé.
Não pela Dona Edna que sempre foi um amor comigo, mas o Senhor Henry... sei lá, era estranho naquela situação.
Decidimos também que eu não iria me despedir dele no aeroporto, pois seria pior para os dois. Enfim, dormimos.
E o dia só está começando...
Fomos para o mesmo hotel onde fizemos as últimas pazes, quando eu soube que ele iria pra Londres.
Nos hospedamos e estávamos um pouco sem fôlego, já que praticamente tivemos que rodar a cidade para transar em lugares diferentes. - uma no consultório e a outra no apartamento. Fomos para o banho e pedimos um café regional pra depois. A gente só conseguia ficar abraçado e deixando a água cair na nossa pele. Uns beijos ou outros, mas basicamente ficamos só agarradinhos.
- Vira e mexe, eu lembro do passado. - ele.
- Eu também, quase todo dia.
- Me lembro mais do primeiro ano de namoro. As nossas dificuldades eram tão bobas comparadas com as de hoje.
- Ah, eu não achava bobas, mas elas condiziam com a nossa imaturidade da época, eu ainda nem sabia se ia assumir e tals.
- É verdade, mas é que parece que era mais fácil suportar aquelas dificuldades que as de hoje.
- Isso eu concordo. É porque na época a gente não tinha esse instinto de responsabilidade. Quer queira, quer não, a faculdade era uma extensão da escola.
- Aham... e era divertido também.
- Era mesmo.
- Pena a gente não dar valor às coisas no momento em que elas acontecem.
Pegamos o sabonete e começamos a lavar as costas um do outro e continuávamos o papo. O mais interessante é que eu sentia que, na verdade, a gente não tinha se separado e nem que tinha passado esses meses todos. Parecia que ele tinha passado o fim de semana fora.
Tudo isso por causa da sintonia que havia naquele banho.
Depois do banho, comemos e fomos pra cama. Segundo a música, o Henrique tinha virado burguês porque agora ele tinha mania de dormir de meias e cueca...
- Sei lá, se tornou hábito, desde que eu estou lá.
- Haha... besta.
Pus a cabeça sobre o peito dele, que estava depilado, enquanto ele enrolava os meus cachos entre os dedos e falava das novidades sobre o curso, sobre Londres e tudo o mais que ele estava passando sem mim. Eu também fiz o mesmo.
Mas voltando ao peito depilado, teve uma coisa que eu notei no Henrique de diferente da última vez que nos vimos; uma coisa que se tornou conjunto devido aos diversos fatores.
Vou explicar: o que eu notei de diferente desde a última vez que nos vimos é que ele estava com uma aparência muito jovem. Ele tinha deixado o cabelo crescer na altura do meio do pescoço, deixou a barba, mas ela era bem feita e definida, diferente do emaranhado que estava antes. Agora usava uns óculos com uma armação preta fininha, o que o deixava mais fofo. Emagreceu. E, no entanto, ficou mais musculoso. Na certa ele voltou a malhar ou simplesmente a gordurinha que tinha ido desvendou a boa forma daquele homem.
E o tórax estava depilado...
- Você voltou a se depilar?
- É.
- Por que isso agora?
- Porque... você não gosta?
- Por mim tanto faz, mas por que você decidiu voltar a se depilar?
- Ah, porque eu precisava ter poucos pelos no braço e nas mãos pra fazer as coisas, aí aproveitei e depilei o peito e a axila.
- Ah, você também depilou o suvaquinho?
- Aham.
- Hum.
- E também porque eu estou mais esportista esses meses. Corro muito, ando muito de bicicleta e voltei a malhar. E pelos são tão anti-higiênicos no meu caso... Não que eu transpire muito, você sabe que eu soo pouco, mas tenho feito muito exercício.
- Menos mal; pensei que você tivesse virado gogo boy.
- Haha... só me choco com você!
- Tá, mas me conta mais, tem muito cérebro pra reinar, lá?
- Haha...
Varamos a noite papeando da vida nos continentes distantes.
A manhã chegou e com ela a despedida. Ele ainda insistiu um pouco para eu ir ver os pais dele e como o clima não era legal para briguinhas bobas, concordei.
- Eita menino, saudades suas! - Dona Edna toda feliz comigo.
- Eu também.
- Ainda estudando muito, né?
- Aff, nem fala, Dona Edna.
- Mas eu achei que tivesse voltado a ser a sua sogrinha...
- Err...
- Voltou, mãe.
- Por que ele não me chama de sogrinha?
- Haha... pergunte pra ele.
- Parem de falar de mim como se eu não estivesse aqui.
Senhor Henry ainda não tinha falado comigo; ficou no canto da sala observando o entrosamento; talvez por vergonha ou por mal humor.
A irmã mais nova do Henrique passou na sala, me cumprimentou e saiu para um compromisso.
- Benjamim, já que o Henrique vai ficar fora esse tempo, o que você acha de me ajudar a decorar o consultório?
- Não mãe, eu já contratei um... fique sossegada.
- Eita, sogrinha, acabou de dizer que a senhora tem mal gosto.
- Percebi a indireta.
- Haha... por que a senhora não ajuda o Benjamim a decorar o apê?
- Mas você não já comprou os móveis?
- Sim, mas eles não vão escolher o lugar de ficarem, sozinhos, né?
- Eu iria adorar.
Senhor Henry foi se aproximando, abraçou a Dona Edna pela cintura e ficou me olhando firme. Tremi na hora e baixei a cabeça.
Eu sabia que para aquele Senhor eu representava a contradição do filho dele para com ele mesmo.
Era por minha causa que o Henrique voltaria para o Brasil e deixaria a Inglaterra para a Rainha.
Era desejo do Senhor Henry que o filho medicasse na terra dos seus ancestrais, mas os planos dele não se concretizariam por minha causa e eu estava ali, na sua frente, na casa dele, desfrutando da recepção de sua esposa e do apoio incondicional de seu filho.
Me senti péssimo.
- Você está trabalhando do quê mesmo? - ele me perguntou.
- Eu?
- Sim.
- Eu não estou trabalhando no momento.
- E tá vivendo como?
- Meus pais me ajudam.
- Hum.
Esse "hum" me matou, e como eu disse anteriormente: o dia só começou.
Sempre terá algo para atrapalhar esse relacionamento!
Será que me rogaram essa praga e eu estou sentindo as suas consequências nefastas?
Houve, por gentileza, algum momento em que esse romance estivesse passando por um mar de rosas?
Nem mesmo um córrego de rosas eu vi banhar esse barco.
Por um momento, aquele senhor me meteu medo.
- Pois é, Henrique; às vezes eu tenho que concordar com o Benjamim: você tem que deixá-lo independente; até porque ele mesmo preza por isso.
- Não entendi, pai.
- Uai, ele não fala que quer trabalhar sempre? Não vejo motivos pra que você seja contrário a isso.
- Mas eu estudo, Senhor Henry; não tenho tempo para trabalhar, se eu tivesse já estava empregado; tem uns bicos, mas é coisa pouca.
- Mas você sempre fala que quer ser livre, mas vai deixar que o Henrique te sustente agora?
Houve um momento de silêncio porque ninguém sabia o que dizer.
Estava constrangedor.
Ao mesmo tempo que o Senhor Henry não dizia explicitamente o que realmente queria dizer, todos nós naquela sala sabíamos exatamente o que ele queria expressar.
- É uma coisa acertada pai, entre mim e o Benjamim. Já está certo isso, foi um sacrifício para convencê-lo, mas ele aceitou; é sem volta, além do mais, somos casados agora.
- Vocês são jovens; não há pressa; quanto mais tempo vocês passarem investindo em vocês mesmos, melhor.
- Mas já está certo, pai; já foi decidido.
- Eu sei, mas pensem bem nisso.
- A gente já pensou bastante. A gente já é grandinho, pode deixar que nada está sendo feito de forma irresponsável.
O Henrique disse isso e uma risadinha quase que instantânea soou dos lábios do Senhor Henry, ironicamente.
- Além do mais, do que adianta passar tanto tempo investindo em nós mesmos se o que queremos é ficar juntos? Vamos chegar aos quarenta anos pensando que ainda somos jovens e que ainda há um futuro longo pela frente, para que a gente o desfrute depois, mas quando formos ver, estamos com oitenta e não desfrutamos um do outro. O senhor sempre soube do que eu realmente queria, não sei por que isso agora.
Acho que era a primeira vez que o Henrique discutia civilizadamente com o pai, ainda mais na minha presença; pior ainda, por minha causa.
O Senhor Henry fez cara feia e calou-se.
A partir daquele momento, soubemos que não era uma boa ideia eu ficar para o almoço. O Henrique deu uma desculpa de que queria me levar pra passear na praia e saímos.
- Desculpa o meu pai, ele só quer o meu bem, você sabe.
- Sei.
- Tá chateado?
- Não.
- Tem certeza?
- Tenho.
Estávamos no carro, ele dirigia. Parou no estacionamento da praia.
- Que solzão!
- Hum.
- Quer sorvete?
- Não, obrigado.
- Eu quero, estou com sede.
Foi no quiosque, comprou uma casquinha.
- B, tem sorvete de chiclete. Você ainda gosta desse sabor, né?
- Gosto.
- Moço, me dá um desse.
- Não quero, Rique.
- Por quê?
- Porque não estou afim.
Ele ficou me olhando estranho; se virou para o rapaz do quiosque e disse:
- Cancela o de chiclete, é só o de toffe mesmo.
Se você não está aceitando nem uma casquinha de sorvete, imagina se você vai aceitar um apartamento, né?Esqueça o meu pai, BA gente vai brigar de novo?
- Não estou brigando.
- Mas está calado.
- Quer melhor maneira de se evitar uma briga?
- Fale alguma coisa.
- Não tenho nada pra falar.
- Você vai aceitar a minha proposta, né?
- Eu já aceitei.
- Tá.
Ficamos andando na orla, calados.
- B, eu vou embora hoje, daqui a pouco, não me deixe ir assim.
- Assim como?
- Assim, nesse clima.
- Que clima?
- Esse! Eu sei que o meu pai... - interrompo.
- Eu já esqueci isso.
- Esqueceu nada.
- Você quer que eu aceite o apartamento? Você quer que eu aceite a mesada? Eu não já aceitei? Você não disse que não tem mais volta? Então! Quem cala, consente.
- Mas você está bravo.
- Você acha que eu estou bravo com você?
- Com o meu pai.
- Você tem como fazer voltar o tempo? Tem como fazer com que eu me sinta menos mal pelas palavras dele? Não, então deixa eu esquecer isso e esqueça também, fique sossegado, tudo está como você quer; relaxe!
Diante dos argumentos, ele não poderia falar mais nada, só aceitar que eu estava chateado pelo discurso do pai e que eu tinha total razão de assim estar.
Eu já tinha feito tudo o que ele queria. Na verdade, o que ele sempre quis. Mas ele não poderia deixar de aceitar que eu tinha o direito de estar daquele jeito.
Eu não estava chateado, nem irado, nem bravo, nem qualquer outro sinônimo desse.
Eu me sentia humilhado e triste.
Sentia como se eu tivesse me aproveitando da boa vontade do Henrique. Mas eu já tinha prometido a mim mesmo que não ia mais brigar com ele por isso, então, deixei passar.
A tarde foi passando.
- Eu queria poder passear com você de mãos dadas aqui nesse calçadão.
- Mas é impossível.
- Por que a gente não tenta?
- Não estou afim, Henrique.
- Viu? Você ainda está chateado.
- Você quer que eu volte atrás?
- Não.
- Então não toca mais nesse assunto.
- Eu quero o seu bem estar, só estou preocupado.
- Tá; só que você já tá enchendo o saco, porra! O seu pai foi um grosso, ponto! Era isso que você queria que eu falasse? Ótimo, já falei, agora já chega de falar nisso, que saco!
- Eu sei que o meu pai errou... - interrompo.
- Eu sei que você sabe, eu também sei. O fato de a gente falar sobre isso muda alguma coisa do que aconteceu alguns minutos atrás? Para de falar nisso, eu estou pedindo.
- Tá, desculpa!
- Não precisa pedir desculpas, só não fale mais disso, eu já me senti humilhado demais hoje.
- Foi tão grave assim? Você está muito magoado, né, amor? - parei de andar e olhei pra ele.
- Qual a parte do para de falar disso que você não entendeu? Chega, acabou, não quero mais falar sobre isso, nem como eu me sinto, para de falar disso, por favor, Henrique, já deu o que tinha que dar.
- Tá, tá, tá, desculpa.
Não falamos mais nada durante o percurso.
Ele estava todo sem graça, porque estava errado e porque eu estava finalmente consentindo com o que ele queria, mas já sentia as consequências da minha escolha. As mesmas consequências que eu relutava para não obter, mas agora, pelos desejos (se bem que agora necessários) do Henrique, eu já levava a fama de manso...
Como já tinha sido decidido, eu não iria para o aeroporto me despedir dele. Mas, devido aos últimos acontecimentos...
- Eu sei que você não quer que eu fale mais disso, mas só por causa do que aconteceu hoje, vem comigo pro aeroporto se despedir? - ainda no calçadão.
- Mas já não tinha ficado certo de que eu não ia?
- É, mas se você não for... sei lá, eu não quero ir pensando que estamos brigados.
- Não estamos.
- Mas o clima está ruim.
- Não tenho culpa se hoje tá fazendo sol.
- Dãããã... não estou falando disso, né?
- Só conheço esse tipo de clima.
- Você vem?
- Não.
- vai, B!
- Não, Henrique.
- Riqueeeee!
- Tá.
- Venha, por favor!
- Não.
- Ow, B; vem, eu estou pedindo.
- É melhor não; não quero que seja difícil. Vai ser pior pra nós dois.
- Mas aí eu vou te ver antes de ir.
- A gente vai pra um lugar reservado, se despede melhor e com calma. Não é melhor?
- Mas eu queria tanto... aff!
- Não vou não, Rique; melhor assim.
- Tá, não vou mais encher você.
- Beleza.
Demos a volta, entramos no carro e fomos para o apartamento.
- Quando eu voltar de vez, essa vai ser a nossa casinha.
- Você já disse isso.
- Eu sei, mas é que quero que você tenha plena ciência de que realmente será.
- Já tenho.
- Vamos deixar as friezas de lado e nos despedir como a gente merece?
- Já deixei.
- Tá. Me beija gostoso?
Eu estava muito P da vida.
Ele começou a me beijar e eu não ia retribuir. Ia ficar só com a boca aberta à disposição dele, mas fiquei com pena e retribuí.
Demos mais alguns amassos e daqui a pouco deu a hora de ele ir pra casa, pegar as malas e ir pra Londres.
- Você não vai mesmo?
- Não, é melhor assim.
- Tá bom, amorzinho.
E ele foi.
Eu voltei pra casa e fui dormir. Tentar esquecer as coisas ruins desse dia, afinal de contas, muita coisa boa também tinha acontecido.
O saldo do dia foi bastante positivo: eu finalmente o encontrara, depois de tanto tempo separados, e percebo o quanto ainda o amo e o quanto ele ainda me ama; que o amor não tinha sofrido recaídas ou fora enfraquecido com o tempo; nem mesmo se desgastado.
O melhor de tudo foi perceber o quão homem o Henrique tinha se tornado e como ele estava bem, saudável e feliz; bem diferente da última vez que nós tínhamos nos visto.
Fui pra casa e fiquei remoendo o pedido que o Henrique me fizera pra acompanhá-lo ao aeroporto e começava a me arrepender.
Realmente tinha ficado um clima chato e, apesar de estarmos bem agora, eu sei como ele fica depois de episódios como esse: ele fica todo melancólico, cabisbaixo e não põe um sorriso nos lábios até ter certeza de que está tudo bem e de que ele é o homem da minha vida.
Por vezes eu já peguei o Henrique me dizendo que adorava o fato de ele ser o meu homem.
Ele adorava sentir isso. Adorava sentir que ele era o meu refúgio.
Todos nós sabemos o quanto ele é carente e dependente, por isso que ele dava valor à sensação de ser o meu porto seguro.
O arrependimento estava rolando na minha cabeça, mas horas depois descobri que fiz a escolha certa de não ter ido.
- Hélio? Tudo bem?
- tudo e você, Ben?
- Tudo indo.
- Agora você tá feliz, né? Henrique veio só pra te ver.
- Pois é, voltamos.
- Ah, disso eu já sei, eu fui com ele para o aeroporto.
- Foi, é?
- Aham, eu não ia perder a oportunidade de rever o meu irmãozão querido.
- Imagino.
- Mas foi bom você não ter ido.
- É, rapaz, ia ser difícil a despedida.
- Nããoo! Não por isso. O Henrique e o meu tio brigaram no aeroporto.
- O Henrique e o pai?
- Sim.
- Por quê?
- Uai; vai dizer que não sabe?
- Por minha causa?
- Basicamente. Bom, você sabe que o meu tio não tem nada contra você, ele só é contra ao Henrique voltar pra cá, pra ficar aqui.
- É, eu sei... mas me conta, como foi isso?
- Ah, o Henrique estava todo triste por causa do que aconteceu lá na casa dele e tals.
- Hum, você já soube, né?
- Aham; ele me contou, quer dizer, a minha prima contou no aeroporto.
- Sei, sei.
- Aí o tio Henry foi perguntar de que horas era o embarque. Pra que ele fez isso? O Henrique estava furioso; aí ele falou: "Não interessa!"
- imitando a voz do Henrique - e se virou. Então o tio Henry deu um tapa nas costas dele e respondeu: "Você está maluco, me respondendo desse jeito?". Aí o Henrique: "Você tinha que estragar tudo! Você me fez brigar com o Benjamim"... - interrompo.
- Ele disse isso? Que a gente tinha brigado?
- Disse.
- Mas a gente não brigou!
- Mas você sabe como o Henrique é. Na certa ele achou que você ficou com raiva dele também.
- O pior é que eu o conheço mesmo e sei que isso é bem possível... aff, será que ele não consegue identificar uma briga? Continua, vai.
- Aí o tio: "Primeiro, baixe esse tom comigo...". Aí o Henrique: "Baixo nada, eu já baixei demais: baixei o tom, baixei a cabeça, chega! Eu só quero viver em paz e viver do jeito que eu quero, agora eu estou mais do que livre, nem do senhor eu dependo mais pra nada, portanto me deixe em paz, eu vou viver a minha vida como eu quiser e com quem eu quiser e principalmente, eu vou viver onde eu quiser!". Aí o tio disse: "Ah, é assim? Então veremos". Aí o Henrique: "Veremos? O que veremos? Fale!". Aí o tio: "Pode dizer adeus para o seu consultório". Aí o Henrique: "Você tá maluco? Não foi com o seu dinheiro que eu comprei a galeria". Aí o tio disse: "E você acha que o seu irmão tinha aquela grana toda pra te dar assim, do nada? Você só comprou aquela galeria e o apartamento porque eu dei o dinheiro para o seu irmão te dar como se fosse dele".
- Ai meleca!
- Pois é.
- O Henrique deve ter ficado arrasado.
- Haha... - risada irônica - Parece que você desconhece quem é o seu homem agora. Não percebeu como ele está diferente?
- Sim e daí?
- E daí que ele não ficou calado. Ele enfrentou o meu tio e disse: "Tudo bem, eu não me importo, por quanto o senhor vende o apartamento e a galeria?". Aí o meu tio ficou com cara de tacho, sem entender bulhufas.
Aí o Henrique: "Vamos, por quanto o senhor vende tudo? Eu compro!". Aí o meu tio: "deixa de falar besteira, Henrique". Disse isso desconversando porque viu que o negócio estava sério. Aí o Henrique: "Nada de besteira, quanto o senhor quer?". Aí o meu tio: "Cala a boca, Henrique, foi só uma ameaça boba, eu não faria isso". Mas a coisa estava séria mesmo, tipo, eles não estavam gritando no meio do aeroporto nem nada, até porque minha família tem classe, haha. - achei a piadinha dele desnecessária, mas enfim... - Mas a coisa estava seríssima porque o Henrique estava mesmo disposto; quem via ficava com medo. Aí o Henrique disse: "Nada de boba, o senhor passou na minha cara que quem comprou foi o senhor, agora eu quero saber quanto é que o senhor quer". Aí o meu tio: "Henrique, cala a boca". Aí ele: "Calo nada, agora o senhor vai me vender". Aí o meu tio: "E você vai arrumar essa grana onde? Posso saber?". Aí o Henrique: "Pode saber sim, vai sair da minha herança, eu não tenho uma parte do patrimônio garantida por lei, por ser seu filho? Ótimo! Nem precisa me dar mais e nem quero saber quanto é, nem mesmo se ela é muito maior que a galeria e o apartamento juntos; mas nem precisa me dar mais, o que eu quero do senhor é só as escrituras das propriedades no meu nome e ponto final".
Eu estava uma pilha de nervos. Eu estava apertando o telefone na mão e nem estava sentindo.
- Ai, ai, não acredito que o Henrique falou isso. - já chorando - Hélio, por favor, por favor mesmo, me liga daqui a cinco minutos? Por favor, me liga tá?
- Tá bom, Benjamim.
Aí eu desliguei e soltei um grito de medo. Eu estava tremendo, suando frio, chorando muito e me deitei na cama e comecei a espernear, me jogar de um lado para o outro. Eu sentia que estava prejudicando o Henrique.
- HENRIQUE, SEU MALUCO, EU NÃO VALHO TUDO ISSO!
Era o que eu gritava pra mim mesmo.
Eu fiquei maluco com a narração do Hélio ao pé do ouvido.
O Henrique tinha dado um salto maior que a própria perna; pelo menos pra mim.
Talvez ele tivesse tido um ataque impulsivo como é de costume, mas e se ele se arrependesse depois? Eu fiquei deitado na cama; depois me ajoelhei na mesma e fiquei com os cotovelos apoiados na janela acima da minha cama e fiquei olhando o nada lá fora, segurando o telefone com a mão esquerda, esperando o Hélio.
- Por que você pediu pra eu te ligar daqui a pouco?
- Porque... sei lá, me deu pânico só de te ouvir falando o que aconteceu.
- Mas você percebe o que realmente está acontecendo? O Henrique pode estar mesmo amadurecendo, ou até mais, pode estar mesmo amadurecido.
- Ainda tenho as minhas dúvidas; já vi o Henrique fazendo coisas do tipo e se arrependendo depois.
- Eu estava lá, eu vi. Não acredito que ele possa se arrepender.
- Pode ser.
- Quer que eu continue?
- Manda.
- Então, quando o Henrique disse isso, o meu tio ficou besta, nem acreditava nas palavras dele. E pra mim, o meu tio teve medo, porque percebeu que já perdeu as rédeas do filho, afinal, a única coisa que o prendia ainda ao tio Henry era a dependência financeira. E se agora até disso o Henrique se desfaz, pronto, o tio Henry deixa de ter o controle sobre ele. Mas enfim, depois que o Henrique disse tudo aquilo, meu tio ficou todo calminho e disse: "Calma, Henrique, não é pra tanto". Mas o Henrique quis nem saber e disse: "Calma uma ova", e começou a chorar na frente de todo mundo. Ele estava histérico, aí o meu tio foi abraçá-lo e ele ficou afastando o meu tio. Aí a tia Edna foi apartar lá e sentou o Henrique e me pediu pra comprar uma água. Eu fui. Quando voltei o Henrique já estava mais calmo e o meu tio sentado do lado dele, esperando ele se acalmar, pra poder falar. Aí eu dei a água e ele bebeu num gole só. A minha tia disse: "Beba com calma", mas ele já tinha bebido o copo todo. Meu tio disse: "Eu não pensei que você fosse ficar desse jeito", aí o Henrique disse: "E você pensa em mim?". Aí o tio Henry disse: "Você é meu filho". E o Henrique: "Então por que você não me deixa ser feliz, caralho? O senhor não acha que eu já tive privações demais na minha vida? Eu só quero viver aqui, com quem eu quiser e da forma como eu quiser, porque dinheiro eu sempre vou ter; não sei por que o senhor tem essa obsessão em me querer morando lá". O tio: "Mas é que eu acho que é o melhor pra você". E o Henrique: "Mas o melhor pra mim, quem decide sou eu e pra mim o melhor é aqui, ao lado do Benjamim. Coitado, eu já fiz ele sofrer demais, eu abandonei ele pra viver uma mentira e eu mesmo fiquei na merda como senhor bem viu. O senhor quer que eu repita a burrada? E o senhor o tratou como um aproveitador e ele não é nada disso". Aí o tio: "Eu sei, eu acho que me expressei mal, eu sei que ele não é um aproveitador". E o Henrique interrompeu e disse: "Até porque se ele fosse, ele poderia muito bem ter aceitado a minha oferta de ficar no apartamento quando eu me casei. Eu só consigo viver com ele, com ninguém mais e se eu só posso tê-lo aqui, é aqui que eu vou ficar. Poxa pai, me deixa pelo menos fazer o que eu quero agora!". Então o tio disse: "Ta bom, eu só quero o seu bem, você já é um homem, já sabe o que faz, não se preocupe, você volta quando terminar tudo lá em Londres e volta para o seu consultório e a sua casa, que vão estar te esperando aqui.". E o Henrique disse: "Mas aquele negócio de eu comprar ainda está de pé.", O meu tio: "Não, garoto, deixe de besteira!". E o Henrique: "Não, é sério, eu quero comprar.". Então o meu tio: "Não vou vender, vou te dar.". Aí o Henrique disse: "Não aceito, quero comprar, eu posso até aceitar demorar a pagar, mas vou pagar centavo por centavo. É a minha palavra final".