- Tenho medo disso!
- Relaxa!
- E o que mais?
- Ah, mais nada; eu só lembro que eles se despediram e o Henrique se foi, mas o tio Henry ficou abalado, porque, tipo, ele sempre fez isso, esse negócio de ameaçar o Henrique e o Henrique abaixar a cabeça. Mas hoje ele viu que o Henrique não está pra brincadeira. Sabe o que é isso? É o sofrimento que ele passou na mão da Débora... porque ele viu que não consegue viver sem você.
- Hum.
- Pois é, daqui a pouco ele te liga, ou manda um e-mail, com certeza. Espera só ele desembarcar.
- Se eu não ligar antes.
- Hehe... já tá com saudades, né?
- Ai, nem fala...
- Bem; era só isso; depois a gente se fala, tá? Beijinho.
- Valeu, Hélio, beijinho.
Como vocês já conhecem um pouco do meu gênio, sabem que essa briga no aeroporto, entre o Senhor Henry e o Henrique, me deixaram com o pé atrás quanto a aceitar o apartamento e a mesada.
Mas algo de extraordinário, para não qualificar de outra forma, me fez aceitar. Eu sempre fui um bom profissional. Para aqueles que já me conhecem, sabem o quão humilde eu sou, mas gostaria de dizer, antes de expor os meus motivos que me fizeram aceitar o apartamento, que eu não sou uma pessoa pretensiosa, pelo contrário.
Na sala de aula, me lembro bem que cada discussão era motivo para que os egos se inflassem e as pessoas começassem a se exibir. Uma sala cheia de pessoas inteligentes e exibicionistas, mas não havia um pingo de sapiência.
Em praticamente todas as discussões eu me mantinha calado, achava uma perda de tempo discutir, tanto é, que por vezes, fui tachado de o cara que gostar de deter o conhecimento. Mas isso nunca foi verdade, só achava que não valia a pena expor a minha opinião para que, ironicamente, eu fosse destratado.
Lembro-me que os meus professores me adoravam por isso. O que me fazia ganhar a competição nesse ninho de cobras foi a minha sapiência e não a minha inteligência.
Nada substitui o talento, já dizia uma certa propaganda; e foi isso o que me fez crescer. Tanto é verdade que eu não era uma pessoa arrogante, que era notável o quão diferente eu era fora da faculdade, mas na universidade, que é mais ampla que a faculdade, que se restringe ao curso, apenas, eu era familiarizado com as discussões, principalmente no movimento estudantil, onde eu produzi o jornal por três anos. Nele eu era totalmente diferente.
Enquanto os meus amigos de classe se limitavam a mostrar quem era o melhor na sala de aula, eu decidi que me dedicaria a me fazer fora dela.
O mais legal de tudo é que o movimento estudantil me fez ver o mundo diferente dos meus colegas de curso e nas discussões da sala eu me mantinha calado, mas as pessoas ali sabiam que eu tinha propriedade de sobra para qualquer discussão e, por curiosidade insistiam para que eu me pronunciasse.
Por mais que eles quisessem se mostrar e logo logo tentassem me retrucar, não haviam argumentos plausíveis o bastante para tal. Tudo isso foi fruto do meu interesse em fazer parte da universidade de fato, porque, como o nome já diz, é um universo muito maior.
No movimento eu era amigo de todos, eu era companheiro; na sala, eu me limitava a assistir às aulas porque sabia que o meu futuro estaria fora dela.
Os meus amigos todos eram filhos de gente importante que menosprezam o movimento porque sabem que é esse movimento que luta contra as injustiças sociais provocadas por eles mesmos, mas no mercado de trabalho é esse tino fulgáz que te levanta, principalmente na minha profissão.
Se hoje alguns dos meus companheiros estão empregados na área, não tenham dúvidas, tiveram impulso dos seus sobrenomes.
Eu, por outro lado, fiz o meu nome no jornalismo, na minha cidade, desde cedo e ganhei notoriedade.
Hoje estou bem empregado, obrigado!
Mas foi esse meu dever jornalístico de transmitir a verdade que me ferrou legal. Desculpem o termo.
A única coisa que posso dizer é que um cara importante fez uma coisa que não devia, eu soube e escrevi sobre isso. Ele não gostou e me mandou um recado. Bem, vocês devem imaginar que esse recado não era um "Eu te acho o máximo!"... devo dizer o resto, ou devo confiar na frase que diz que meia palavra basta?
No Nordeste, as pessoas não são assassinadas, nesses casos, nem ameaçadas, agredidas, sequestradas... elas simplesmente somem, desaparecem, puf!
E só se combate poder, com mais poder. E o que no nosso país caracteriza mais poder que dinheiro?
Bem, isso tudo aconteceu um pouco depois de o Henrique desembarcar, portanto, voltemos ao conto:
Ele chegou em Londres e a primeira coisa que fez foi me ligar.
- O Hélio me contou tudo.
- Tinha medo de que você soubesse.
- Por quê?
- Porque agora fica mais difícil de você aceitar.
- Eu já aceitei. De fato que eu agora estou com o pé um pouco atrás, mas agora já era.
- Ufa, menos mal!
- Chegou bem?
- Cheguei sim, amor !
- Eu ia te ligar, mas não tinha ideia de quando chegaria. Decidi esperar.
- Já tá com saudades?
- Muita... Ai Rique, eu te amo!
- Oh, amor, por que está chorando?
- Porque eu quero...
- Eu já sou seu, não precisa chorar por isso.
- Eu tenho medo de te perder.
- Você não vai, por que tudo isso agora?
- Sei lá, me bateu um pânico.
- Não bobão, eu te amo, eu faria tudo por você.
- Promete que vai me fazer feliz?
- Bobo, eu já te prometi isso, lembra? Quando começamos a namorar, eu te disse isso.
- É, eu lembro.
- E então...?
- Tá, ok.
Falamos por mais três séculos pelo telefone e desligamos em seguida.
Nesse período em que o Henrique estava em Londres, estava empregado em um jornal de grande circulação no meu estado e tinha feito a minha fama bem cedo. Sempre era convidado para palestras e mesas redondas nas faculdades e ganhei o respeito dos outros profissionais, apesar da minha pouca idade, vinte e cinco. Tanto é que faço faculdade e isso não me impede de manter o emprego; sempre tive facilidade em escrever.
Uma coisa é você simplesmente escrever, outra coisa é noticiar analiticamente. Eu sei fazer isso em pouco tempo. E tempo é a única coisa que me falta.
Um trabalho enorme surgiu na faculdade e eu me dediquei quase que cem por cento a ele, deixando um desfalque enorme na redação. Levei uma bronca terrível do meu chefe e tive que me desdobrar.
Mas foi na faculdade que fiquei sabendo de uma coisinha que me fez pensar: "Hum, isso dá capa de jornal!".
Quem me dera nunca ter ouvido aquilo, ou sequer ter pensado em escrever sobre.
Para preencher o buraco que eu tinha deixado no jornal, devido aos trabalhos da faculdade, fiz o máximo que pude para escrever algo que suprisse a minha falta.
Do nada, me cai uma pauta que me pareceu interessante. Que fique claro, interessante para mim é tentar fazer a justiça com o poder das palavras e não vender jornal e fazer sensacionalismo.
Por vezes disse "não" ao meu chefe quando este me propunha fazer uma matéria X, sendo que ia de encontro ao código de ética do jornalismo. Por vezes fui ameaçado de ser demitido, mas sempre dizia não a tudo que ia contra aquilo que acredito, e quem me conhece sabe que eu levo as minhas ideologias, mesmo as mais utópicas, a sério.
Mas essa me pareceu interessante, porque era o tipo de matéria que eu queria fazer.
Escrevi, revisei, tirei minhas próprias fotos e até me propus a diagramar a página, se necessário fosse.
Mas quando a matéria chegou, fui chamado a atenção...
- Você tem certeza do que você escreveu? - meu chefe.
- O senhor ainda duvida da minha ética?
- Não duvido que essa matéria seja verdadeira. O que eu estou perguntando é se você tem certeza de querer publicar.
- Claro; se não quisesse não teria escrito.
- Você quem sabe!
E assim foi. Mandaram para a gráfica e no dia seguinte estava estampando a capa do jornal.
- Você está maluco? Você tá mexendo com peixe grande, você não sabe disso? - a Ana me fala.
- E desperdiçar a oportunidade de ferrar com esse povo? Jamais.
- Filho da puta! Você quer morrer?
- Por que tá todo mundo tão alarmado?
- Haha... - irônica - Você vai dizer que não sabe? Ai, não acredito, deixa o Vagner saber disso.
- Hã? Vagner virou meu pai agora?
Ela me olhou com os olhos cheios d'água e fez algo que eu nunca esperei: me deu um tapa no rosto.
- VOCÊ TÁ PENSANDO O QUE DA SUA VIDA? VOCÊ TÁ PENSANDO QUE O MUNDO É COR-DE-ROSA? SEU VIADO DE UMA FIGA! - gritando, chorando e nervosa.
- Calma, Ana... - interrompe.
- CALMA UM CARALHO! OLHE, SUMA DA MINHA FRENTE, SE POSSÍVEL, SUMA DO ESTADO.
- Ana, não é pra tanto .
Ela pegou o telefone e se trancou no quarto.
Minutos depois, ela aparece com a cara vermelha e me oferecendo o telefone.
- O Vagner quer falar com você.
- Oi.
- Benjamim, eu não esperava que você fosse fazer isso.
- Eu é que não entendo; vocês já esqueceram da faculdade, da época em que dizíamos que seríamos justos e éticos na profissão? - disse isso olhando para a Ana.
- E você acha que o código de ética vale a sua vida? Meu irmão, eu estou odiando você nesse momento! Você não tem o que fazer, não? Vá
escrever sobre um favelado morto, agora deixa esse povo em paz.
- Eu é que não acredito no que estou ouvindo.
- Deixa de besteira, Benjamim; você tá pensando que aquelas coisas que a gente discutia na faculdade vão valer de alguma coisa no mundo real? Você tá muito enganado.
- Mas, Vagner... - interrompe.
- Olhe, quer saber de uma coisa? Já tá feito, a merda foi jogada no ventilador, agora se prepare para as consequências, meu amigo. Se prepare!
- Que frieza!
- Uai, é a mesma frieza com a qual você está tratando a mim e a Ana. A gente se preocupa com quem ama e você está desdenhando esse sentimento... se é assim, depois veja as consequências, tchau!
- Desligou.
- Desligou! - imitando a minha voz, com ironia - Vai pra puta que te pariu!
Tomou o telefone da minha mão e foi se trancar no quarto.
Juro que não entendia aqueles dois, mas foi horrível vê-los me tratando daquele jeito. Senti como se tivesse perdido a minha família. Sentei no sofá e comecei a chorar e a me arrepender de ter escrito a matéria, não por causa do perigo, mas por causa do jeito com que eles ficaram. Na verdade, do perigo eu não tinha dimensão, ainda!
Minutos depois do show de horrores, o telefone toca. Era do jornal.
- Olhe, já ligaram pra cá várias vezes querendo tirar satisfação sobre a sua matéria.
- Quem ligou?
- E você não sabe que esse povo não se identifica? Olhe, tá sinistro o negócio aqui, corra pra cá.
- Tá.
Desliguei o telefone às pressas e fui bater no quarto da Ana.
- Ana? Olha, estou saindo, vou para o jornal; estão me chamando lá.
- VAI TOMAR NO CU!
- Ana!
- JÁ MANDEI TOMAR NO CU!
Saí deixando esse clima pairando entre nós. Ela não estava com raiva de mim, estava aflita, preocupada, angustiada pelos meus atos e suas possíveis consequências.
É óbvio que eu a entendia. Mas ainda não tinha dimensão dos meus atos.
É uma parte da vida que odeio lembrar, por isso vou encurtar esse período aqui no conto, até porque não devo dar muitos detalhes.
No dia seguinte, de tarde, umas quinze horas, um telefonema não muito agradável, um bilhetinho não muito bem vindo...
"E agora, Senhor Benjamim... tem ideia da dimensão que suas palavras bonitas tomaram?"
Sim, agora eu tenho!
Fiquei anestesiado. Não sabia o que fazer, o que falar. Nem me mexer eu conseguia. Li o bilhete que chegou logo após o telefonema e fiquei no quarto, pensando no porquê disso ter tomado essa dimensão tão grande.
Quer dizer, é claro que eu sabia, mas não esperava.
Também me ligaram do sindicato informando que já sabiam do caso, por debaixo dos panos, mas que nunca tiveram coragem de publicá-lo. Fiquei mais irado ainda porque, afinal de contas, era como se eu tivesse servido de bode para todos os jornalistas. Não houve apoio, portanto.
Me bateu um desespero enorme que tomou conta do corpo todo. Minha cabeça estava a prêmio.
- Vagner, eu... - comecei a chorar.
- O que foi, Benjamim? Você está em casa?
- Estou.
- Ainda bem! Me deu um susto agora...
- Que foi?
- Achei que você já estivesse ligando do cativeiro.
- Eita, Vagner... já está pensando que eu vou ser sequestrado?
- Ah, Benjamim... enfim, o que foi?
- Me ligaram.
- E aí?
Enquanto eu contava para o Vagner a forma como aquela voz misteriosa me ameaçava, ele ia se desesperando do outro lado da linha.
- Ai, Benjamim, sai daí logo.
- Por quê?
- Você não disse que te mandaram bilhete? Então, eles sabem onde você mora... quer dizer, onde moramos. Ai caramba, cadê a Ana?
- Trabalho, eu acho.
- Enfim, sai daí.
- E pra onde eu vou?
- Aí eu já não sei, só sai.
- E fico na rua, mais desprotegido ainda?
- Pensa aí em um lugar.
- Ai, não me vem nada na cabeça... Ah! Será que...
- O quê?
- ...os pais do Henrique me aceitam lá por hoje?
- Boa, boa, vai pra lá agora.
- Mas eu tenho que ver se eles me querem lá.
- Claro que sim, vai pra lá. Vou ligar pra Ana não ir pra casa.
- Ai, Vagner, desculpa, desculpa por isso! - chorando.
- Para, Benjamim; deixa disso, você é da nossa família, agora sai daí.
Estava com o telefone nas mãos, pronto pra ligar pra casa dos pais do Henrique, mas aí eu tive medo e decidi ligar para ele antes.
- Mas por que isso?
- Depois eu te falo, só liga pra eles pedindo pra me receber lá, porque estou indo pra lá agora.
- Tá, B; mas chegando lá, me liga que eu quero saber dessa aflição toda.
Eu não tinha tempo para explicar, até porque eu precisava sair dali o mais rápido possível. Peguei as chaves, o celular e saí. Peguei um taxi e fui.
Chegando na casa dos pais dele, fui, enfim, recebido.
- Henrique me ligou desesperado! O que houve? - Dona Edna.
- Ai, é tão ruim de falar, mas... - o telefone toca.
- Benjamim? É o Henrique. - disse me passando o telefone.
- Não aguentei e liguei. O que houve?
- Rique... - voltei a chorar.
- BENJAMIM, FALA LOGO, ESTOU NERVOSO!
- Me ameaçaram de morte.
- Hã? Fala sério, Benjamim. - disse com desleixo.
- Não é brincadeira, não, Rique; é sério.
- E por que iam fazer isso com você?
- Porque eu escrevi uma matéria aí.
- Que matéria "aí" que você escreveu?
- Rique, eu... eu... estou com medo, Rique!
- Tá; fica aí, minha mãe te ajuda em que precisar; daqui a pouco eu ligo.
Desligou na minha cara. Me senti desamparado com esse gesto, mas consciente de que estava no lugar mais seguro naquele momento. Porque não era de proteção real que eu estava sentindo falta naquele momento, era colo.
- Menino, q história é essa? Me conta!
- Pois é, Dona Edna...
Eu estava na sala íntima com a Dona Edna, aos prantos. Ela me amparou como uma mãe e ficou bastante preocupada e me deu razão por ter escrito. Talvez porque ela também tivesse esse instinto social de justiça que perdurou desde a sua época de faculdade, ou não soubesse dos riscos comuns da profissão, ou ainda para não me contrariar naquele momento difícil.
Minutos depois, o Henrique liga.
- Eu liguei para o papai. Ele disse que vai ajudar no que for necessário e disse que vai entrar em contato com umas pessoas.
- Como assim?
- Relaxe, não é nada do que você está pensando. Olha, eu estou aqui perto do aeroporto, vou negociar uma passagem aqui, e amanhã, ou depois, eu estarei aí. Não se preocupe com nada, você está seguro; deixe que o meu pai resolve.
- Estou com medo, Rique.
- NÃO PRECISA TER MEDO, CONFIE EM MIM, NÃO VOU DEIXAR QUE TE FALTE NADA. AGORA, NÃO IMPORTA O QUE VOCÊ FEZ, EU ESTOU COM VOCÊ, FIQUE CALMO, VÁ DESCANSAR, DORMIR, SEI LÁ, ESQUEÇA O QUE VOCÊ LEU, OUVIU E VÁ FAZER OUTRA COISA; VÁ VER TELEVISÃO, ENFIM, MAS NÃO SE PREOCUPE. EU TE AMO, VOCÊ NÃO SABE DISSO? EU NÃO DISSE QUE IA TE FAZER FELIZ? PRONTO, RELAXE QUE JÁ, JÁ, EU CHEGO. - gritou e desligou.
- O que ele disse?
- Desligou.
- Mas o que ele disse?
- Que o Senhor Henry vai resolver tudo.
- Ah, então tá certo.
- Quanta calma!
- Oh, meu filho; relaxe! Não é a primeira vez que o Henry livra a cara de alguém desse jeito.
- O que a senhora quer dizer com isso? Ele vai mandar matar, é isso?
- Haha... não, meu filho; não é isso, não.
- É o que, então?
- Deixe isso com quem entende.
E foi assim, nesse enigma, que a minha vida estava sendo guardada.
Quando o Senhor Henry chegou, fui conversar com ele e saber o que se passava.
- A minha ideia é tornar público. Só assim, se por acaso algo acontecer comigo, as pessoas saberão o porquê. - falei.
- Não; o negócio é saber falar com as pessoas certas.
- Tenho medo disso, Senhor Henry!
- Relaxe, eu estou tomando conta de tudo. Falou com o Henrique?
- Ele ligou.
- Pronto. Me dê as chaves da sua casa que eu vou pedir pra alguém pegar as suas coisas e você fica aqui.
- Eu ainda acho que a gente tem que tornar público.
- Pessoas como esse cara não se intimidam assim. Caras como ele sempre têm superiores e são esses superiores que eles temem, sacou?
- Não.
- Enfim, me dê as chaves e tudo fica certo.
Ele falou com calma tudo aquilo, como se estivesse falando da queda da bolsa ou de uma nova máquina japonesa. Percebi até uma certa familiaridade do Senhor Henry com casos do tipo. Preferi não entrar em detalhes. - cavalo dado não se olha os dentes, principalmente aqueles de puro sangue que salvam a sua vida.
- Eu não queria incomodar, mas é só mais um pedido.
- O quê?
- Eu moro com um casal de colegas... - interrompe.
- Sei, sei.
- Então, eles também correm risco, porque esses caras sabem onde eu moro e por conseguinte, eles também.
- Hum, sei; ah, mas tem problema não. Basta eles não dormirem lá hoje, depois eles podem voltar.
Eu não sei se eu tinha medo por tudo parecer fácil demais, ou por estar duvidando da sorte. No jantar, eu...
- Eu queria agradecer a hospitalidade de vocês.
- Bobagem, Benjamim.
- Senhor Henry, olha; me desculpa tudo, o incômodo, o... - interrompe.
Não precisa disso.
- É que a gente não tem um relacionamento muito bom. Esses dias então... - interrompe outra vez.
- A culpa é minha. Eu que prendia demais o Henrique e não o deixava andar com as próprias pernas. Achava que estava fazendo o bem, mas estava podando a liberdade dele, afinal, ele já tem trinta e dois anos... enfim. E você também; bem, eu gosto muito de você, gostei de vocês terem voltado depois daquele casamento lamentável.
Eu ainda dormia na casa dos sogros quase dois dias depois do incidente. Era madrugada. Eu tenho um sono, digamos, um pouco pesado, mas não pesado o bastante para acordar rapidamente. Por exemplo, não importa a iluminação ou o barulho, eu consigo dormir, mas nesses dias de tensão qualquer coisa me acordava.
Um barulho de pneu e os faróis de um automóvel me acordaram. As janelas da casa dos pais do Henrique são enormes, altas e largas e deixam muito da luz externa entrar.
Pois bem, um carro durante aquela madrugada invadiu o meu sono sem prévio aviso, mas ignorei segundos depois e voltei a dormir.
Passaram-se minutos desde então e comecei a sentir uma mão acariciando o meu cabelo e um peso a mais sobre a cama onde eu estava dormindo.
- Que escuro! Quem é?
- Não me reconhece mais? - disse sorrindo.
Nem podia acreditar. Parecia que fazia tanto tempo que não nos víamos.
Despertei repentinamente, olhei para aquele rosto animado, que trazia um sorriso convidativo de quem vem do norte.
Quanta saudade!
Esfreguei os olhos, tentando visualizá-lo melhor e o abracei.
- Riquee!
- Ai, que delícia vir de longe e ser recebido assim... Oh, meu amor, eu estou aqui.
- Ai, que bom, você aqui. - ainda abraçado.
- É ótimo.
- Estava morrendo de saudades.
- Eu também, bobão!
- Vem, vem, deita comigo, vamos dormir de conchinha.
Ele tirou os sapatos, entrou debaixo do lençol e ficamos abraçadinhos de conchinha.
Ele começou a dar selinhos na minha nuca e ficamos rindo como duas crianças. Depois:
- Ei, cadê meu beijo?
- Hum, tá aqui.
Eu me virei para a frente dele e nos beijamos. Ficamos abraçadinhos naquele beijo.
Depois de muitos como esse, ele tirou o jeans para ficar mais confortável.
- Me conta o que houve.
- Hoje não; hoje é dia de curtir a sua presença. Vem, me abraça de conchinha de novo e vamos dormir.
- Ok, ok .
Acordamos abraçadinhos, sentindo o cheiro um do outro, eu por cima do braço dele enquanto as pernas dele estavam sobre as minhas.
A boca dele estava pousando na minha nuca e a minha no bíceps dele. Às vezes eu penso que adoraria ter uma foto nossa dormindo juntos desse jeito, tirada de cima; deve ser uma visão linda, porque a sensação que eu sinto quando acordo com ele nessas situações é de um bem estar infinito, e depois, ele é tão lindo que fico tentando imaginar como deve ser olhá-lo de cima dormindo como um bebê, ainda por cima abraçadinho a mim como a um ursinho de pelúcia.
Depois dos primeiros bocejos, um ouviu do outro um "Bom dia, amor!", um beijo rápido e ficamos lá deitados, um olhando para o outro de mãos dadas na cama.
- Vai me contar agora?
- Pode ser.
E contei.
- Papai me contou alguma coisa, mas eu queria ouvir de você.
- Hum.
- Eu nem sei o que dizer.
- Diga qualquer coisa, mesmo sendo crítica.
- Não farei críticas, você, de certa forma, foi correto, mas nem sempre o correto é o melhor a se fazer. Você sabia que poderia se dar mal depois disso, né?
- Não tinha ideia.
- Ah para, B, você sabia!
- Sei lá, eu acho que eu estava tão animado em escrever sobre, que eu nem me toquei nas consequências.
- Não é o Benjamim que eu conheço.
- É, eu sei. Me perdoa?
- Eu perdoo nada! - brincando.
- Haha...
- Não tem o que perdoar, B; você não fez nada errado.
- Parece que o seu pai resolveu mesmo, hein; esse negócio!
- É.
- Você não está com medo, nem nada... a menos que você esteja calmo para não me transmitir pânico...
- Não, estou calmo mesmo. Depois que falei com papai, fiquei tranquilo.
Eu só vim mesmo pra te ver, ver se você estava bem com isso tudo... ai, olha, a vontade que eu tenho - mudando o tom de voz - é de arrebentar esse cara com um taco de sinuca, enfiar em tudo quanto é buraco e fazer outros no corpo dele... Aff, que ódio! Se eu o vir na frente não respondo por mim... ameaçando você! Como ele ousa? Haha – irônico - Não sabe com quem se meteu. Ah... mas eu mato bonito!
- Não, Rique; para com esse papo de morte!
- O papo eu paro, mas eu juro, se eu o vir algum dia, eu mato.
- Não, para!
- Ah, B; dá um ódio... ameaçando você... mando ele pro raio que o parta e ainda faço coisas.
- Que coisas?
- Ah, sei lá, corto centímetro por centímetro do corpo dele com uma tesoura de unha.
- Ai, Rique; para que isso me dá medo... seu pai já está me dando medo, agora vem você.
- Papai?
- Sim.
- Por quê?
- Ai, Rique; ele falou que resolvia tudo de um jeito que... sei lá, me assustou.
- Você pensou que ele ia mandar finalizar o cara?
- É.
- Haha... não bobo, Não é isso não, tá louco?
- Pensei horrores.
- Na certa você pensou que a minha família é da máfia.
- Essa foi a hipótese mais leve.
- Haha... idiota... te amo, bobão alcoólatra.
- Para; bichinha pão com ovo.
- Haha.
- Lindo!
- Mas não é isso não... É que você sabe que grana é tudo nesses casos e todo mundo conhece o meu pai. Eu não sei dos detalhes, mas ele só fez com que as pessoas certas soubessem que você é protegido dele, na certa um superior desse filho da puta. E esse superior mandou ele baixar a bola.
- Mas é como dizem: cavalo dado...
- Hum...
- Tá... Mudemos o assunto: voltas quando? Amanhã?
- Acho que passo a semana aqui.
- Eba... Nãoo! - mudando o tom de voz.
- Uai, por quê?
- Você vai perder aula, essas coisas.
- Ah, que bobagem... E depois, você está precisando de um pouco de colo.
- É, estou mesmo, viu? Mas eu quero você lá.
- Ninguém pediu sua opinião aqui, eu decidi, tá decidido.
- Cadê a democracia desse relacionamento?
- Tá aqui, óh...
Ele me pegou forte pelos braços e me fez rolar pela cama, passando por cima de mim e exibindo a força que ele tinha; superior à minha.
Começamos a brincar de brigar. Ele ficou em cima, mostrando que era o machão forte e me obrigando a dizer coisas.
- Quem é o seu macho?
- Ai, ai, ai, haha... para.
- Para nada; quem é o seu macho, hein?
- Haha... é o leiteiro.
- Como é a história? - me apertando mais e fingindo estar bravo.
- Haha... tá bom, o padeiro.
- Benjamim, Benjamim; olha lá o que você diz; só pergunto essa vez: quem é o seu macho?
- É aquele surfista novinho que eu paquerava.
- Ai, garoto, você pediu por isso... e ainda me provocou da maneira mais baixa. Sofra as consequências, agora.
Aí ele se deitou por completo em cima de mim e ficou pressionando o corpo dele inteiro contra o meu, me fazendo ficar sem ar e sentindo o peso todo dele sobre mim.
Que homem pesado!
- Ai, ai, ai, tá bom, é você!
- É o quê? Não ouvi.
- É você, é você!
- Quem é o seu macho? Hein?
- É VOCÊ, É VOCÊ, É VOCÊ! AI, AI, AI, AI, HAHA.
- Hein?
- AI, AI, EU JÁ DISSE QUE É VOCÊ; PARA DE ME MACHUCAR; HAHA.
- Nada disso, você tem que aprender a me respeitar, tá pensando o que da vida? Não, meu filho, comigo é assim, agora você vai sentir um macho de verdade.
- Ui que meda! Haha.
- Como é? Ainda zomba? Me aguarde...
Nesse momento ele deposita toda sua força contra o meu corpo, me maltratando, quer dizer, me fazendo aprender a lição do macho.
- AI, RIQUE, TÁ BOM, TÁ BOM, VOCÊ VENCEU, VOCÊ VENCEU!
- Tá, vou aliviar a barra.
Ele sai de cima de mim, se deita ao meu lado, me puxa com força e me tasca um beijo. Não. Me tasca o beijo...
- Beijo nostálgico.
- É, né? Nossa, faz tempo isso!
- Aham.
- Te amo tanto, seu porra! Você nem sabe o quanto...
- Eu sei que é o bastante pra eu te retribuir como você merece e como eu gosto de fazer.
- É verdade. Eu sou feliz, sabia? Nunca pensei que pudesse dizer isso um dia, mas taí, eu sou feliz!
- Rique, que lindo!
- Mas você tá tranquilo, né?
- É, mais relaxado.
- Pode ficar, pode confiar, eu garanto isso.
- Tudo bem, eu confio.
- Você sabe que eu não colocaria você em risco, né?
- Sei sim, amor; estou mais tranquilo.
- Tá relaxado?
- Sim.
- Huuumm! - voz maliciosa.
- Que foi?
- Você está todo relaxadinho... - foi me pegando pela cintura e se aproximando.
- Ai, seu pervertido!
- Pervertido nada, estou com saudades. Você não quer que eu pergunte de novo quem é o seu mach, quer?
- Nãããoo!
- Haha... então me sirva como a um sultão.
Ele voltou a me beijar e a me abraçar enquanto estávamos deitados. Ele foi desabotoando a camisa e voltando a me abraçar. Começamos a envolver as nossas pernas umas nas outras e eu voltei a sentir aquela pele tão familiar. Os pelinhos das coxas rígidas daquele neurologista, as mãos grandes de cirurgião percorrendo as minhas costas. Um especialista em corpo humano me tocando com tanto desejo e eu só podia beijar, retribuir os toques daquela língua enorme com a minha pequena boca e gemidos surdos. - coisa que ele adora, por sinal - Pude senti-lo por sobre o tecido da cueca e ele também pode perceber que eu também estava excitado. Colocamos nossos pintos à amostra e, enquanto eles se tocavam em baixo, nossas línguas se acariciavam em cima.
Ficamos mais grudados naquele beijo e as virilhas se tocavam, espremendo nossos paus.
Começamos a suar também.
Fazia algum tempo que eu não fazia amor. Desde a última vez que ele tinha voltado pra Londres. A primeira coisa que me lembro quando essa transa me vem à mente é o cheiro do Henrique. Três palavras: cheiro de macho. O suor misturado com aquele aroma forte de perfume encorpado masculino, cheiro de homem quando chega engravatado do trabalho, cheiro de homem quando passou o dia todo sem um carinho, cheiro de homem com a barba para ser feita, aliás, cheiro de homem de verdade é a mistura de perfume, suor e pós-barba. Posso sentir o cheiro só de tentar descrever para vocês o que me embriagava naquele amasso...
- Eu poderia ficar assim o resto da vida.
- Tá me apertando muito forte, Rique.
- Mas é assim que é bom, é assim que você gosta.
De fato, quem não gosta? A frescurinha ao pé do ouvido, a delicadeza nas palavras e a agressividade nos gestos...
E ainda tinha aquele cheiro de homem. Meu homem. Como fazia tempo que ele não dormia naquele quarto! Ele não sabia se ali tinha camisinha e nem ele tinha na carteira. Me perguntou se eu tinha na minha.
- Claro que não! - quase bravo.
- Uai, por quê?
- Por quê? Porque eu andaria com uma camisinha na carteira?
- Prevenção? - irônico.
- Me prevenir de quem?
- Ai, desculpa; haha... agora que eu entendi.
- Dããããã, hehe.
- Vou dar um jeito.
- É bom mesmo, não vou ficar de pau duro à toa.
- Pelo que me consta, quem vai usar o pau sou eu e não você.
- Como se você não fosse pedir o meu depois de usar o seu. Te conheço, Henrique!
- Haha... tá, tá, depois a gente discute isso, mas que fique claro: se eu achar só uma camisinha, quem usa sou eu.
- Tá.
Ele me deu um beijo, vestiu a cueca e a calça e saiu do quarto em busca de uma camisinha pela casa. Por um momento eu pude esquecer das ameaças de morte.
Na verdade, eu nem sabia o que era morte, ou vida, só sabia que estava na cama à espera do meu amor e estava muito feliz, obrigado!
Ele volta alguns minutos depois com algumas camisinhas na mão e um sorriso infantil no rosto. Exibia as camisinhas como troféu.
- Achei, achei!
- Demorou, hein?
- Você não acredita onde eu encontrei.
- Onde?
- No quarto da minha irmã.
- O que tem de mais?
- Como assim o que tem de mais? É a minha irmã, poxa!
- Rique, você ainda achava que sua irmã era virgem? Por favor, né!
- Não, mas eu não precisava saber que ela tem um estoque de camisinhas para um corpo de bombeiros inteiro.
- Haha... mas isso é bom, quer dizer que ela se cuida e ela é jovem, tem mais é que se divertir. Agora, você bem que queria um corpo de bombeiros inteiro só pra você, né?
- Eeeu? Eu só tenho olhos pra você, amor.
- Sei. - irônico - Me enrola que eu estou com frio?
- Haha... cala a boca, seu garoto abusado... e me beija.
Me puxou forte para junto dele e voltamos a nos beijar loucamente. Não demorou muito pra que ele tirasse a cueca e a calça novamente e lá estávamos nós na cama nos amassando.
Ele pôs a camisinha e me pegou de conchinha. Saudade de sexo nenhuma ia tirar a emoção de se fazer amor com quem a gente ama. Sim, não transamos, fizemos amor. Ele fez tudo devagarzinho. Me abraçou com carinho, me deitou sobre o braço dele, encaixou as coxas nas minhas e me beijava na nuca, ou sussurrava amores ao pé do ouvido. O pau dele estava quente e pulsava dentro de mim. Eu podia sentir as mãos dele acariciando a minha barriga enquanto entrava no meu corpo com o pinto. Eu só conseguia gemer e deixar que aquele corpo me conduzisse para a felicidade.
Demoramos a chegar ao clímax, não saímos daquela posição, mas quando gozamos... a camisinha transbordou, porque mesmo depois dele ter gozado, continuou se esfregando em mim, agora um pouco mais atrevido.
Ele começava a morder a minha orelha e a dizer mais sacanagens que carinhos e ficou mais agressivo no vai-e-vem.
Do amor, fomos para o sexo. Homens têm dessas necessidades.
Ele tirou a camisinha para pôr outra.
- Quero nem saber se agora é a sua vez. Eu vou usar o pau de novo.
Pôs a camisinha e começamos nos beijando de novo. Agora estávamos de joelhos em cima da cama, um de frente para o outro... e nos atacando com as línguas.
Depois ele senta na cama e me pede para sentar em cima dele, de frente.
Depois do encaixe perfeito, ele comanda os movimentos. Mesmo comigo em cima, era ele quem tinha a força para nos movimentar naquela loucura de aromas e corpos suados.
Ele me fazia subir e descer numa rapidez incrível até mesmo para a minha anatomia. Pensei que não aguentaria, mas o prazer nos faz suportar tanta coisa, inclusive quando a gente ama.
No fim, eu estava lubrificado somente com o suor das virilhas se tocando. Ele me beijava e não largava a minha boca.
Eu nem conseguia respirar e ele sabe o quanto isso me deixa mais vulnerável. Ele sabe que quando eu perco as forças é quando eu mais sinto prazer e ele sabe como explorar isso.
Por fim, não saímos daquela posição durante um bom tempo, até que ele vai se deitando, fazendo com que eu me deite sobre ele, mas ele não parava de me beijar e, por estarmos deitados um sobre o outro, o sexo voltou a ser amor.
Nos desprendemos por um momento para darmos mais atenção ao beijo.
Ele começou a rolar na cama me fazendo ficar por baixo e iniciou um beijo mais lento e molhado. Fazia tempo que ele não me fazia isso: ele começou a cuspir dentro da minha boca e depois espalhava toda a saliva com a língua. Talvez se fosse outra pessoa eu sentiria nojo, mas não o Henrique. Dele eu jamais teria algum tipo de frescura. Faria tudo, se possível!
Depois do beijo by Henrique, voltamos ao prazer das peles e músculos sensíveis. Ele se introduziu dentro de mim novamente e voltou com a mesma velocidade. Não tinha jeito, ele gozou rapidamente e soltou um gemido agressivo enquanto espremia os olhos.
Depois de todo aquele sacrifício, ele ficou me olhando e respirando fundo para recuperar o fôlego. Soltou um sorrisinho lindo e espontâneo.
- Saudades!
- Eu também!
Voltamos aos beijos e ficamos deitados.
Estávamos exaustos e dormimos abraçados um ao outro, suados e satisfeitos.
Como já era manhã, acordamos por volta das quatorze horas. O sol já não estava tão forte como ao meio dia, mas ainda era incidente no quarto. Acordamos com a sua claridade. Mas não dissemos uma palavra.
O Henrique mesmo, quando acorda, parece criança. Fica cheio de manha e fica se agarrando em mim. Solta gemidos frouxos e surdos e fica esfregando o queixo no meu ombro. Me obriga a ficar de conchinha mesmo quando não estou afim, mas fazer o quê? Ele é mais forte que eu. Depois, fica falando como criança...
- Hum, já é dia, papai?
- Dããã, não sou seu pai.
- É sim, é sim, papai!
- Para, Rique; haha.
- Paro nada! Humpf!
- Vai, pruma, porra!
- Ai, que palavra feia, vou dizer pra mamãe.
- Hum, menino ingênuo.
- Bebê quer carinho.
- Você fica ridículo falando assim, sabia? Haha.
- Você bem que gosta.
- Tá, eu admito; você fica muito tesudo falando assim.
- Hum, sabia, seu safado!
- Safado é você, bebê pilantra.
- Vem, me beija.
- Sai pra lá... e esse bafo?
- Não quer que eu te obrigue, quer? - já apertando os meus braços.
- Ai, não, não, tá bom, eu beijo.
- Hum, assim que eu gosto. Agora diz: papai quer bitoquinha!
- Nem morto; não vou dizer isso.
- Vai sim. - apertando o meu braço.
- Aaai! Tá, tá, seu chato, eu digo!
- Então diz.
- Papai quer bitoquinha.
- Haha... e eu que sou o ridículo? Haha.
- Ain... você me paga, Rique pilantra!
Uma briga de cão e gato começou naquela cama. Uma briga gostosa! Adivinhem quem era o cão?
- Ei, seu safado, eu ainda não fui o ativo, né?
- Huhu... você quer?
- Na verdade não, quero conversar.
- Nãão, B, vamos brincar!
- Não, vamos DRrizar (discutir a relação).
- Não, vamos brincar.
- Você volta quando pra Londres?
- Já disse, semana que vem.
- Não, Rique, volte amanhã.
- Isso é que é vontade de me ver.
- Você sabe que não é isso... é simplesmente porque eu não quero que você perca coisas importantes por minha causa.
- Mas a coisa mais importante pra mim é você.
- Eu sei, mas eu não gosto disso.
- Você tá cada dia mais chato. - brincando.
- Não estou brincando.
- Então eu devo dizer que você tá mais chato, só que com tom sério.
- Tá, tá; diga o que quiser.
- Você foi ameaçado de morte, meu amor; como você acha que eu me sinto?
- Mas... tá - me conformei.
- Isso quer dizer sim?
- É, fique.
- Hum, que lindinho, meu amor pedindo pra eu ficar. Sabe quanto tempo eu esperei por isso?
- Pelo quê?
- Você me pedir pra ficar!
Fiquei todo sem graça, porque sabia que era verdade. Quanto tempo o Henrique não esperava por um “fica, Rique!” dito por mim.
Ele, o carente, eu o metido a maduro. Dois bobões que nunca diziam o que queriam de fato, agora sentindo na pele o que é ser mudo.
- Desde quando aquela pessoa - Débora - ficou entre a gente que eu espero que você me peça pra ficar com você. Sabe, se você tivesse me pedido isso antes... ah, nada disso teria acontecido...
- Eu sei.
- Mas calma, não estou te culpando; eu sei que o maior culpado sou eu. Enfim...
- Ai, não; nada de ficar se culpando agora.
- Tá; chega de lamentações, eu quero mais é nhanhar!
- Haha... sai pra lá, maníaco!
- Hum, taradinho; vem cá, garoto!
- Ai, não puxa meu cabelo!
- Puxo sim. Vem me beija.
Aquele grosseirão me fez beijá-lo. Eu me fiz de desgostoso, pra fazer o charme, claro.
Mas não transamos mais, só namoramos na cama. Tomamos banho e descemos para o almoço.
- Ah, Rique; eu tenho que ligar pra Ana e pro Vagner avisando...
- Tá, vamos pra sala íntima.
Minutos depois.
- Você está aí desde ontem? - a Ana.
- É. Ó... avisa ao Vagner que eu já resolvi tudo; o pai do Rique acertou as minhas contas com o cara lá e... bem... estamos seguros, inclusive vocês dois.
- Ai que bom, Benjamim! Você está se sentindo melhor?
- Não pelo fato de ter feito vocês dois passarem por isso também.
- Não esquenta.
- O Senhor Henry disse que vocês podem voltar pra casa.
- Tá. E você e o Rique, como estão?
- Pois é, ele tá aqui, veio me ver.
- Ai, que maravilha! E aí, como é que é?
- Brigamos.
- DE NOVO? - berrando.
- Sim; ele puxou meu cabelo e me obrigou a beijá-lo, vou dar parte na delegacia da mulher.
- Haha... idiota; me fazendo de besta.
Nesse momento o Henrique fica gritando próximo ao telefone.
- MENTIRA, ANINHA, ELE QUE FICA FAZENDO CHARME.
- E eu não sei? Esse pornográfico!
- Como é? Mas Ana? Nunca mais eu compro a sua cocaína, sua racha!
Caímos na risada.
Depois da ligação, fiquei mais tranquilo.
Uma coisa é você se expor, assumir uma responsabilidade grande que pode por em risco a sua vida; outra coisa bem diferente é você envolver pessoas que ama e que nada têm a ver com os seus atos.
Ao menos estava tudo bem para eles (Ana e Vagner).
Almoçamos.
- Que horas, amor?
- Hum, já passa das duas.
- Acho que se eu correr, ainda pego alguma aula.
- Aula hoje? Nem brincando! Vai passar o dia comigo.
- Mas, Rique... - interrompe.
- Nada de "mas". Poxa, B; vim passar a semana com você, não me abandone, ok?
Como resistir a uma chantagem emocional dessas?
- Tá, seu chato!
- Depois do almoço, vamos pra piscina; faz tempo que eu não sei o que é uma.
- Lá não tem piscina?
- Dããã, quer que eu congele? Vem, já terminou?
- Mas eu não tenho sunga.
- Hum, que menino pudico... vai de cuequinha mesmo, oras!
Fomos nadar. O clima infantil ainda pairava entre a gente.
- Jogar água no meu olho! Vem cá, eu quero falar uma coisa.
- O quê? - fui nadando.
- Eu já decidi como vai ser a nossa semana.
- Hum, fala. - me agarrando no pescoço dele, enquanto ele nadava por nós dois.
- Seguinte: já vi que você e aula não se separam, então eu vou para as aulas com você.
- Eba! Vai me ver dando uma de inteligente...
- É; depois das aulas a gente faz alguma coisa, sei lá, almoça fora e depois eu te levo pra algum lugar, não sei, a orla talvez.
- Orla, é? Legal... que tal se a gente convidasse o Vagner e Ana um dia nessa semana, pra praia? Faz tempo que a gente não faz um programa desses.
- Tá. Escuta: como anda a arrumação do apê?
- Ah, tá indo. Eu e sua mãe estamos vendo decoração, essas coisas que sua mãe adora. Na verdade deixei a cargo dela.
- Sei, explorando a minha mãe.
- Eu? Eu não; ela que está fazendo na maior boa vontade...
- Pilantrinha!
- Mas eu não sei como anda o consultório.
- Ah, mas isso eu sempre estou por dentro, pode deixar
- E hoje, o que faremos?
- Não sei.
Ficamos na piscina até começar a ficar frio. Depois fomos namorar um pouco no quarto.
Nesse dia eu recebi umas ligações do jornal, perguntando como eu estava e blá, blá, blá. Super preocupados não? ¬¬
Não lembro de ter feito mais nada o dia todo além de ficar de cuequinha e meias na cama, debaixo dos lençóis, no aconchego dos braços do Henrique.
Nada mal pra encerrar uma semana tão turbulenta. Nada poderia tirar o meu sossego. Nada. Exceto os beijos malucos do Henrique ou os beliscões que ele me dava no bumbum.
Quando todo aquele clima divertido passa, ou quando não tem ninguém olhando, geralmente ficamos românticos demais.
Enjoa até quem vê - eu acho - porque melamos muito o nosso relacionamento.
Bem, somos românticos assumidos e autenticados como espécimes em extinção pela ABA - Associação dos Bobos Apaixonados.
Somos membros honorários.
- Amor?
- Hum.
- Tá acordado?
- Não.
- Para!
- Huhu... o que é?
- Vem mais pertinho, de conchinha.
- Eu quero ficar abraçadinho assim.
- Não, de conchinha é melhor.
- Não, assim é melhor.
- B, você sabe que não tem vez... vem logo, garoto!
- Tá, tá.
- Aí sim.
- Melhor agora?
- Muito melhor, vamos ficar nus?
- Tá.
- Tá.
- Já disse que adorei esse perfume, Rique?
- Já.
- É gostoso.
- Que nem o dono.
- É, bobo!
- Mas sou o seu bobo preferido.
- É sim, lindinho!
- Hum, beijo.
- Fecha a cortina pra ficar mais escurinho.
- Não, deixa assim porque já, já, a lua aparece.
- Tá.
- Ela vai testemunhar o nosso namoro.
- Sabe do que eu estava lembrando esses dias? Da nossa briga de torcidas, lembra? Na biblioteca.
- Eu também estava pensando nisso esses dias, tipo, como é que eu pude me apaixonar por você?
- Hã?
- Calma, deixa eu explicar. É justamente por causa dessas briguinhas que a gente tinha no curso. Eu poderia te odiar e pra falar a verdade, acho que odiava, mas era um ódio que eu amava sentir, me esquentava o sangue, era novidade pra mim. A graça de ir na biblioteca era te ver, principalmente quando você ficava sozinho. Aí eu ficava te observando, era tão legal, eu me sentia um voyer.
- Hehe... e eu todo ingênuo.
- Haha... é verdade, você era tão bobinho.
- Ainda sou.
- Não, nem vem; hoje você não engana mais ninguém, te conheço, laranjeira.
- Ai, Rique, ainda sou puro!
- Aham... - irônico - mas o que eu mais gostava daquela época era que você ficava enrolando os cachinhos com os dedos enquanto lia, comia escondido na biblioteca, sabendo que era proibido.
- Haha... é verdade, afinal, eu passava o dia lá; aí levava uma marmitinha.
- Muito fofo.
- Para de zombar.
- Não, falo sério, muito fofo. Você tinha os seus dezessete aninhos, maturidade de trinta e experiência de um garoto de treze. Se bem que você tinha cara de um menino de quinze. E hoje te dou dezoito.
- Haha... não tenho cara de tão novo assim, não!
- Tem sim.
- E nem duvido naquela época tão assim também, não.
- Mas eu adorava. Eu não sei se você se lembra, mas eu ficava na prateleira atrás da sua quando você ia procurar livros.
- Dessa eu não sabia.
- Às vezes eu escondia os seus livros.
- Que maldade, Rique!
- Eu fazia por maldade mesmo, mas era uma coisa instintiva, te fazia ficar na biblioteca mais tempo. Eu só não gostava quando você estava com os seus amigos, porque você perdia aquela ternura e ficava metido a engraçado.
- Eu sou engraçado, tá! - dando língua.
- Eu sei, mas é que você ficava todo dado pro lado do Vagner.
- Se o Vagner não tivesse casado, até hoje você ia achar que a gente tem um caso.
- Ia mesmo.
- Bobão!
- Só estou cuidando.
- Ui.
- Hehe... bitoquinha, bitoquinha, vem mais juntinho, encaixa mais.
- Mais junto que isso só se passar Super Bonder.
- Acho que tem um disso ali.
- Haha... sabe do que eu mais gosto de me lembrar? De quando você me sequestrou para aquela dispensa... eu morrendo de febre e você abusando de mim.
- Eu estava no gás. Nem me tocava que você estava tão mal, quer dizer, eu até me tocava, mas eu estava tão excitado