Até que meu cérebro assimilasse a surpresa de ter o infame Pinguim em minha frente, um silencio se formou por alguns segundos. Quando enfim recuperei minha capacidade de falar, não perdi tempo:
-- Você???? Achava que já estava bem longe e comendo com pauzinhos. Me desculpe, mas não tenho nada para falar com o Sr.
-- Me desculpe, mas o que tenho para falar com o Sr. poderá ser muito importante para nós dois. Respondeu.
-- Não tenho tempo, tenho um compromisso inadiável. Retruquei.
-- Será rápido. Meu avião sai em duas horas para o Japão. Explicou.
Com uma vontade enorme de pular no pescoço dele, fiz um grande esforço para me acalmar. Fiz um cálculo de quanto tempo ainda poderia dispor sem atrasar meu compromisso com minha filha e sugeri:
-- Você tem 10 minutos.
-- Podemos nos sentar? Perguntou.
-- Estou bem de pé. Enfatizei.
Ele estão começou:
-- Para não perder seu tempo vou resumir. Eu sempre admirei muito sua esposa, mas nunca me permiti avançar o sinal pois sabia que ela era casada e as regras da empresa não permitem relacionamento amoroso entre funcionários. Por outro lado, ela também nem me percebia. Todo o tempo que trabalho na mesma empresa que ela, nós não trocamos mais que duas palavras. Mas um dia a Monique que trabalhava no mesmo setor que eu, me fez uma pergunta. Ela queria saber o que eu achava da Patrícia. Eu, desconfiado, falei que a achava muito bonita, competente e inteligente. Ela me falou que já tinha me visto olhado para ela com olhares nada profissionais e se seria do meu interesse em ter algo mais íntimo com ela, uma noite talvez. Tomei um susto, mas me recuperei imediatamente e com o máximo de franqueza disse que com uma mulher como ela uma noite não bastaria. Mas que seria sempre uma fantasia apenas e que sabia que ela era casada e que eu não era uma figura tão atrativa, além de ser contra as normas da empresa.
-- Ela então me confessou que a Patrícia estava insatisfeita sexualmente em seu casamento. Me falou que ela nunca esteve com outro homem além de seu marido e que estava cogitando ter essa experiência. Ela comentou que tinha ficado de encontrar essa pessoa para ela. Que o marido dela estava de acordo e que talvez eu fosse a pessoa ideal, mas que tinha outras opções. Eu sabia que existiam maridos que permitiam suas esposas terem reações com outros, já tive curiosidades de experimentar o mundo liberal na época que era casado e então não duvidei dela. Ela se antecipou e me falou das regras. Que seria apenas uma noite, sem envolvimento amoroso, somente sexo. Claro que devido as circunstancias, mas mesmo desconfiado, disse que seria a realização de um desejo. Perguntei o que eu precisaria fazer. Ela falou que cuidaria de tudo então eu aceitei. Depois de tudo acertado eu fiz uma exigência de que pelo menos nesse dia ela se portasse como uma namorada e não como uma mulher qualquer. Encurtando o assunto, na noite combinada eu senti a Patrícia extremamente nervosa, bebendo toda hora, fria, incomodada com meus toques. Completei o ato de forma mecânica e de tão frustrado virei para o lado e dormi, quando acordei não a vi mais. Resumindo, foi horrível. Fiquei preocupado com ela. Achei que tivesse feito alguma coisa errada. Tentei ligar para ela, mas meu número devia estar bloqueado, por que nem chamava... Durante o final de semana isso me incomodou muito e comecei a desconfiar que alguma coisa não estava certa. Não sei porque, mas precisava tirar esta história a limpo. Como não consegui falar nem com Monique, que também parecia me evitar nem com Patrícia, resolvi me arriscar e te procurar. Afinal você sabia de tudo e tinha concordado. Uma pessoa comum entre nós, que prefiro não dizer quem é para não o comprometer, e sem saber o real motivo, me passou o endereço do seu local de trabalho e estou aqui desde cedo lhe esperando. Não tenho certeza, mas acho que nem tudo o que a Monique me falou sobre sua esposa e o relacionamento de vocês era verdadeiro. Vendo sua expressão de surpresa sei que fui enganado e manipulado.
Realmente eu estava surpreso e disparei num folego só:
-- Nunca confiei em Monique. Desde a primeira vez que a vi, senti algo muito ruim vindo dela. A história de vida dela e sua forma de ver o casamento, fogem completamente dos meus princípios. Mas é problema dela e do marido. Para seu conhecimento, eu e minha esposa tínhamos um relacionamento excelente e eu nunca aprovei nada disso que a Monique lhe falou. Muito pelo contrário, tentei de tudo para impedir essa loucura. Estou quase me separando de minha esposa por isso.
Ele com uma expressão incrédula completou:
-- Meu Deus!!! E eu promovi aquela safada manipuladora.
-- Como assim? Perguntei.
-- Quando ela me falou que tinha outras opções eu perguntei o que eu poderia fazer para ser a primeira. Ela me falou que tinha um cargo vagando na filial de BH e que seu a ajudasse eu seria o escolhido. Explicou e continuou.
Na hora penei que essa informação seria a pá de cal que eu precisava. Com essa informação, a missão amiga estaria quase completada. Só precisava provar isso tudo para a Patrícia. Ela precisava saber o tipo de pessoa que ela tinha dentro de casa e chamava de amiga.
-- Espero que me perdoe, eu nunca aceitaria se soubesse da verdadeira situação de vocês. Mas aquele biscate não perde por esperar. Prometeu com sangue nos olhos. Completou.
Falei que não me importava com o que iria ou não fazer com Monique, mas que deixasse eu e Patrícia fora disso. Ele concordou com um aceno afirmativo de cabeça, ainda irritado com a descoberta de que fora manipulado.
Eu percebi o desconforto dele tentei ser o mais duro possível, mas de forma educada. Lembrei até de uma frase de um certo revolucionário argentino.
Nessa hora bolei uma forma de provar tudo para a Patrícia e iria aproveitar o ódio que o Pinguim estava de Monique para liquidar esse assunto. Falei:
-- A merda já está feita. Só tem uma forma de você minimizar o problema, e sair desse imbróglio de forma menos cafajeste. Digo minimizar, porque infelizmente resolver está fora da sua alçada. Vou ligar para minha esposa e pedir para ela desbloqueá-lo e explicar que ela receberá um texto seu de suma importância para ela. Hoje, durante o dia, preciso que mande essa história detalhada para ela. Não quero me vingar de Monique, pelo contrário, quero distancia daquela presença negativa. Mas preciso provar a Patrícia que ela foi manipulada e de que não devemos confiar abertamente em ninguém hoje em dia. Isso ajudará ela a se defender de pessoas desse tipo daqui para frente.
-- Quanto ao Sr. lhe dou um conselho. Antes de acreditar piamente em alguém, ainda mais quando se trata da vida de outras pessoas, se informe, pesquise. Sei que existem muitas pessoas adeptas ao mundo liberal. Mas imagino que essas pessoas não tratam suas aventuras com terceiros. Sei que eles não precisam de uma cafetina. São pessoas independentes e que escolhem seus parceiros de forma criteriosa. São pessoas que, com certeza, tem também seus princípios. Eu respeito todos eles, mas não tenho vontade nem perfil para iniciar neste mundo.
Tudo que é feito com honestidade, empatia e cumplicidade tem uma grande chance de dar certo. Independentemente de ser liberal ou monogâmico.
-- Minha esposa foi manipulada sim, mas não foi forçada e nem chantageada a nada. Ela pode ter sido iludia sim, mas fez por vontade própria. Ela provavelmente só não se sentiu à vontade na hora. Espero que tenhas aprendido essa lição. Caso queiras aprender melhor sobre este mundo ou qualquer outro. procure literatura, casas especializadas, sites específicos e pessoas qualificadas antes de se embrenhar em furadas. Lhe desejo boa viagem e boa sorte no Japão.
Depois de lembrá-lo sobre o texto que ele precisava enviar para a Patrícia, falei que estava com pressa, me despedi e parti rumo ao encontro com minha filha. No caminho liguei para Patrícia e falei rapidamente que ela precisava desbloquear o Marcelo e que era imprescindível que ela fizesse isso, pois ela iria receber um material que lhe ajudaria muito. Depois de protelar um pouco e sem entender o verdadeiro motivo ela concordou e desliguei. Meu objetivo era mandar a gravação que tinha feito da proposta de Monique após ela receber o material de Marcelo, assim jogaria a pá de cal e encerraria mais este problema. Assim esperava.
Cheguei 10 minutos atrasado, mas minha filha estava no local combinado me esperando. A aparência dela estava um pouco abatida, mas me recebeu com um sorriso. Ela entrou no carro, me deu um beijo e partimos em silencio para o restaurante.
Chegando lá, deixei ela botar para fora toda a sua preocupação e amargura. Contei tudo para ela excluindo os detalhes mais sórdidos. Usei uma linguagem mais adequada a sua faixa de idade. Falei sobre em que estes eventos poderiam mudar nossas vidas, mas também a acalmei, lhe prometendo que sempre estaríamos presentes em sua vida.
Falei que a mãe dela fez escolhas terríveis e que as consequências já chegaram e infelizmente ainda não acabaram. Haveria muita dor e mágoas pela frente. Que ela não crucificasse a mãe pois ela a amava e não seria saudável ela se afastar dela por ora. Escolhas ruins não definem caráter elas moldam o caráter e só provam que somos humanos. Não devemos passar a mão na cabeça dela nessa hora, pois ela precisava ter consciência que fez outras pessoas sofrerem, mas também não podemos abandoná-la. Ela entendeu meu ponto de vista e prometeu ligar para a Patrícia. Ela falou que ainda não estava à vontade para falar pessoalmente com ela, por enquanto mas já era um começo.
Essa conversa com minha filha me fez lembras das que eu tinha com meu pai e me lembrei de uma em específico. Eu devia ter uns 17 anos e foi mais ou menos assim:
“Meu filho, em um relacionamento tudo pode acontecer, você pode envelhecer e morrer ao lado de sua amada, mas também, pode ser que suas vidas se separem em algum momento por motivos diversos. Neste caso tenha em mente uma coisa. Nunca conheceremos uma pessoa por completo, independentemente do tempo que passemos ao lado dela. Não transforme suas ex em sua inimiga, tente sempre que possível, um consenso e uma convivência de harmonia e paz, principalmente se tiver filhos. Neste caso é pior ainda, pois existirá um vínculo eterno entre vocês. Não vai querer ter uma mulher rancorosa e vingativa rondando sua vida.”
Não entendia até hoje o real motivo dessas palavras naquela época. Mas como meu pai foi noivo antes de conhecer e se casar com minha mãe, imaginei que ele deve ter passado por algo preciso. O importante é que hoje esse conselho estava ajudando a conduzir meus problemas atuais de uma forma bem melhor.
Bom... voltando ao presente, tinha que voltar ao trabalho. Levei minha filha para casa e retornei para a empresa. Não podia me esquecer que Dra. Marize iria me atender as 18h. O dia passa tranquilamente até o momento que recebo uma ligação de um número desconhecido. Como recebo muitas ligações de clientes, não me preocupei em atender. Do outro lado uma voz conhecida e ameaçadora gritava:
Continua.....