Sem mais nada a tratar naquele dia, nos despedimos, eu à distância e ela sem sequer lhes dar a mão novamente. Saímos da corretora e notei que ela estava tensa, o que me obrigou a perguntar se eu havia feito alguma coisa errada, afinal, estava numa maré tão lamacenta que já me sentia culpado por todas as dores do mundo:
- Não, Gervásio, você foi perfeito. É que… - Ela se calou e respirou profundamente: - Eu preciso conversar com o Mark antes, mas acho que você se envolveu com uma, como eu poderia dizer, “turminha bem barra pesada”...
(CONTINUANDO)
Não entendi a resposta dela e a dúvida deve ter ficado estampada no meu rosto, tanto que ela própria se explicou:
- Mas pode ser tudo uma grande coincidência. Eu só preciso conversar com o Mark antes e ouvir a opinião dele.
- Mas Denise, eu… eu não compreendo.
- Não vamos criar teorias conspiratórias, ok!? Deixa eu conversar com o Mark e depois te retorno, pode ser?
Não deixei. Insisti que queria saber o que estava acontecendo ao ponto dela aceitar ligar para ele na minha frente. Fomos para um restaurante não muito longe dali, a pé mesmo, e ela fez a chamada para o Mark. A princípio, estranhei porque ela começou a conversa de uma forma polida, mas pouco depois estava dando risadinhas como se conversasse com um namorado. Acho que ela se tocou da forma como eu a encarava e, depois de pigarrear, entrou no assunto que parecia ser o que a incomodava:
- Lá foi tudo bem, mas aconteceu algo estranho. - Ela fez uma breve pausa, ajeitando uma mecha de seu cabelo que havia caído sobre seu rosto e continuou: - Assim que entramos na sala, de cara notei que a reunião não seria apenas com o tal chefe do Gervásio e você nem imagina quem estava lá?
Um breve silêncio e ela prosseguiu:
- Isso, o Roger também, mas ainda tinha outra pessoa e essa eu duvido que você adivinhe! - Ela falou e brincou na sequência: - Ganha um prêmio se adivinhar, deixo até você escolher.
Eu não sei o que ele disse, mas ela arregalou os olhos e ruborizou no ato, ficando quase tão roxa quanto a toalha da mesa em que estávamos. Deu um olhada para mim, tomou um gole de uma água que havíamos pedido e continuou:
- Caramba, Mark, como você sabia!? É, ele mesmo, o Rick, ele também estava lá.
Agora eu já não conseguia nem imaginar o que o Mark estava falando, mas ela ouvia tudo atentamente e com uma feição assustada:
- Ma... Ma... Mark! Calma, meu amor, assim você infarta. - Ela falou e me olhou de relance, envergonhada da forma como lhe chamou na minha presença.
Além disso, por algumas expressões faciais rápidas que fez, acredito eu que ele devia estar xingando bastante e isso só aguçou mais a minha curiosidade. Depois de um tempo, agora só ouvindo, em que ela, às vezes, olhava para mim, eles se despediram e ela encerrou a chamada:
- Olha, o Mark, depois de fazer algumas considerações bastante incisivas, disse que acredita que seja só coincidência a presença do Rick na sua reunião, mas ainda assim disse que acompanhará os desdobramentos de seu caso com a máxima atenção, inclusive, que pretende estar aqui no dia do seu acerto.
- Ah, ótimo! Mas quem é esse tal de Rick, doutora? Afinal, lá estavam o meu chefe, o Roger e o Ricar… - Eu próprio me interrompi ao entender a lógica: - Ah, Rick, entendi…
- É, Rick… - Ela fez uma cara de desdém que logo evoluiu para incômodo.
- O que tem esse tal de Rick? Ele fez alguma coisa?
- Olha, eu não me sinto confortável em contar essa história, mas o Mark já me adiantou que você sabe do relacionamento dele com a Nanda e da barra que eles passaram. - Ela falou e eu confirmei com um gesto de cabeça: - Então... O Rick é o cara que bagunçou a cabeça da Nanda e quase causou o divórcio deles.
- Porra! - Falei, surpreso com a coincidência e depois de um tempo em silêncio, apenas a encarando, conclui: - Mas… Então… Eu também não consigo imaginar uma relação entre os dois casos. Para mim, parece uma coincidência também.
- Pois é, foi exatamente o que o Mark também achou, depois de tecer algumas pujantes considerações.
- Ele estava xingando, não é? - Perguntei, sorrindo.
- Como diria a Nanda: Nu! Demais da conta! - Brincou e riu.
Nos calamos enquanto um garçom se aproximava com dois sucos que havíamos pedido assim que chegamos e, ao sair, perguntei:
- Desculpa a curiosidade, doutora, mas como você sabe dessa história toda envolvendo a Fernanda e o Mark?
Ela me olhou por um momento novamente, em silêncio enquanto sugava o suco por um canudinho, fazendo um típico biquinho, ladeado por duas lindas covinhas, e explicou:
- Você sabe da relação dos dois, não sabe?
- Que são liberais? Sim, sei.
- Então… Eu sou… Bem, digamos que eu seja uma amiga íntima do casal, entende? Beeeeeem íntima…
- Por isso você disse meu amor, né? - Perguntei aturdido com aquela novidade: - Você transa com eles!?
Ela se viu pega no flagra e ficou roxa novamente, quase engasgou com o suco, aliás, engasgou, tossiu, se recompôs e me encarou pronta para me xingar, mas foi novamente polida e saiu pela tangente:
- Olha, Gervásio, minha amizade com eles é uma questão minha. Não vou ficar te falando das minhas intimidades, ok?
- Ah não… Tá, claro! Desculpa…
- Estou apenas te acompanhando hoje a pedido do Mark que já tinha outro compromisso agendado e não poderia vir, nem sei se irei prosseguir no seu caso. Então, não folga comigo porque eu...
- Desculpa, Denise, desculpa! - A interrompi, envergonhado da minha gafe: - É que eu conheço a Fernanda há muito tempo, fizemos faculdade juntos, e naquela época, ela era muito, mas muito certinha, sabe? Daí anos depois eu a encontro novamente e descubro que ela se tornou uma liberal! E eu nunca havia conhecido um liberal, daí conheço logo um casal e agora você, então foi uma grande surpresa. Acho que tô meio atordoado até agora.
- Mas eu não sou liberal; bem, não como eles! Sou apenas uma amiga íntima do casal mesmo, só isso e… - Ela bebeu um outro grande gole do seu suco e encerrou nossa conversa: - Ah, quer saber, Gervásio? Eu não vou continuar dando explicações, não. Desculpa, mas eu mal te conheço.
- Não, por favor, eu que te peço desculpas novamente.
Terminamos nosso suco e, dado o horário, a convidei para almoçar, mas ela recusou, alegando que teria um compromisso inadiável. Despediu-se de mim e saiu do restaurante. Foi impossível não acompanhar o balançar daquela loira estupendamente linda enquanto ela se afastava, aliás, eu e todos os marmanjos naquele recinto. Inadvertidamente, acabei resmungando:
- Mark, filho da puta…
Decidi almoçar por ali mesmo, tentando absorver todas as informações dos últimos dias. Assim que fui servido e já comia, a curiosidade me corroía por dentro. Quando terminei de comer não tive dúvidas, liguei para a Fernanda. Ela me atendeu após o celular tocar umas três vezes:
- Oi, Gervásio. Tudo bem?
- Tudo, Fernanda… - Resmunguei, mas não me contive: - A Denise, então…
- Só um instante. - Ouvi ela pedindo licença para alguém e depois de segundos ela me retornou: - Pronto! Agora a gente pode conversar. Eu estava na mesa com a minha família e tem certas coisas que não dá para falar na frente das minhas filhas, né?
- É… Ah, desculpa, estou atrapalhando o seu almoço.
- Esquece disso! - Ela falou e riu antes de continuar: - Então, você conheceu a Denise…
- É sério então? Você, assim…
- Gervásio, meu amigo, se ela falou, tá falado.
- Mas ela não disse nada, só que era uma grande amiga íntima do casal.
- E é isso aí: muiiiiiito íntima! Principalmente do Mark…
- Minha nossa senhora! O que que é isso, hein!? Esse Mark… Porra! Acho que davam banho com leite de rosas e mel nesse garoto, porque vai ser gostoso assim lá na puta que pariu!
Ela deu uma gargalhada das mais gostosas que já ouvi na minha vida:
- E ó, posso falar? Ele é muito gostoso mesmo! A Denise é caidinha por ele. Vive dizendo que se eu largar dele, ela pega com as duas mãos, pernas, coxas e todo o mais que puder oferecer.
- E você não se incomoda? Não tem ciúmes dela?
Ela se calou por um instante e falou:
- Sabe que hoje não. Já tive muito, mas hoje convivemos de boa. - Ela explicou, deu uma risada e completou: - E hoje ela é realmente uma grande amiga nossa. Já até nos ajudou em alguns momentos de crise. Para falar a verdade, acho que se a gente propusesse dela fazer parte do casamento, como um trisal, ela toparia fácil.
- Caralho! Ah, o Mark vai ter que me passar o nome do perfume que ele usa, a vai!
Rimos um pouco desse comentário besta e passamos a conversar sobre como tinha sido a reunião. Quando eu falei que o tal Ricardo era ninguém mais ninguém menos que o Rick, notei que ela ficou incomodada:
- O Mark já tá sabendo disso? - Ela me perguntou.
- Tá. A Denise já ligou e conversou com ele.
- Saco! Tudo o que a gente não precisava agora é que o defunto aparecesse, não agora que a gente está se entendendo tão bem.
- Pelo que a Denise me falou, o próprio Mark parece que acredita só ter sido uma coincidência.
- É, pode ser, mas sei que se ele cruzar com o Rick não vai ser legal, não mesmo.
Conversamos mais algumas amenidades por bons minutos e nos despedimos. Eu não tinha mais nenhum compromisso naquele dia, então decidi dar uma volta para espairecer. Fui a um shopping, onde passeei, assisti um filme, fiz um lanche e depois, já de noitinha, retornei para o hotel. Tomei um relaxante banho e me deitei para assistir um pouco de televisão, mas a imagem da bela doutora Denise não me saía da cabeça. Acabei sacando meu pau e fazendo uma bela homenagem para ela, coisa de moleque mesmo, mas foi uma das mais gostosas punhetas que bati na vida e como gozei gostoso, farto, abundante. Realmente foi uma pena não ter sido uma trepada de verdade porque tenho certeza que eu a teria impressionado muito. Já por volta das onze acabei adormecendo e não fosse por uma chamada que recebi pouco depois da meia noite, teria sido uma deliciosa noite de sono:
- Alô, quem? - Perguntei ainda atordoado pelo sono.
- Gervásio? É Denise. - Uma voz doce, quase hipnótica, sibilou do outro lado da chamada.
- Denise, a “advogata”, digo, doutora Denise? - Falei, despertando definitivamente.
- Isso! Está podendo falar?
- Sim, sim, claro. Algum problema?
- É, então… Pode parecer estranho ou uma coincidência muito forçada, mas meu carro deu problema bem perto do hotel em que você está hospedado e o guincho está demorando um pouco para chegar. Será que você não poderia vir ficar comigo um pouco? Tenho medo de ficar sozinha na rua numa hora dessas.
- Me passa sua localização que já estou indo. - Respondi já saltando da cama.
- Ok. Aguardo. Obrigada. - Disse e desligou.
- Eu que te agradeço. - Resmunguei, sorrindo para mim mesmo.
Vesti rapidamente uma roupa e logo ouvi o som da notificação com a localização dela. Realmente estava bem perto do meu hotel, coisa de cinco minutos, no máximo, de caminhada. Fiz em dois minutos, praticamente correndo e logo a vi, já com o guincho se aproximando para rebocá-la. O guincheiro, inclusive, já parecia estar tentando jogar um charme para cima da minha “advogata”, mas quando cheguei, ela passou a me dar a atenção que antes dispensava a ele. Naturalmente ele não gostou, mas também não tinha muito o que fazer: ela era literalmente muita areia para o seu caminhãozinho:
- Obrigada por vir, Gervásio e desculpa ter te incomodado. Mal eu te enviei a minha localização e o guincho chegou. Inclusive, se você quiser ir, eu vou entender…
- Ir!? De forma alguma! Fico até sua situação estar resolvida. Faço questão. - Falei todo solene, fazendo o guincheiro entortar ainda mais o bico para mim, porque talvez ele ainda tivesse uma mínima esperança de traçar aquela deusa nórdica.
Fiquei acompanhando todos os procedimentos e ele parecia atrasar por querer. Não sei se a intenção dele era cansar, mas dali eu não arredaria o pé até ele sair com o carro dela. Assim que ele terminou de içar o carro e preencher o recibo de coleta, entregando para a Denise, fez uma pergunta:
- A senhora quer que eu a deixe em algum lugar, dona?
Denise a olhou, sorriu, mas descartou de vez:
- Não, não. Obrigada, querido. Meu amigo me fará companhia até meu Uber chegar.
Decepção, essa era a expressão dele. Derrotada, subiu na boleia e saiu, deixando-nos para trás:
- Por que não tomamos um drink no bar do meu hotel? Ele fica aberto até bem tarde. Depois, se for o caso, eu até te levo…
- Você quer beber para depois dirigir, Gervásio!? Que combinação exótica, poderosa e errada, não acha?
Eu ri da invertida e precisei tentar um novo ataque pelo flanco esquerdo:
- Tudo bem então. Eu dirijo, te levando até sua casa e lá você me oferece uma bebida. Melhor assim?
- Ah tá… - Disse e riu: - E, depois? Como você voltaria se tiver bebido? De Uber?
Minha vontade naquela hora foi de falar que eu não queria voltar ou, na pior das possibilidades, voltaria a pé, de joelhos se fosse necessário, mas só depois de dar uma deliciosa trepada naquela loira espetacular. Eu só tinha mais uma chance e eu precisava ser prudente:
- Tá! Bebemos no bar, conversamos um pouco, depois eu chamo um Uber e vou com você até a sua casa, depois ele me traz de volta. Pode ser assim?
Um lindo sorriso de conformismo, típico de quem aceitava perder uma batalha, mas não a guerra, iluminou o seu rosto:
- Tá bom, mas só um drinkzinho, ok? Depois eu chamo um Uber Black e vou embora sozinha. Já sou bem grandinha e sei me cuidar.
OS NOMES UTILIZADOS NESTE CONTO E OS FATOS MENCIONADOS SÃO FICTÍCIOS E EVENTUAIS SEMELHANÇAS COM A VIDA REAL É MERA COINCIDÊNCIA.
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