Assim que desligamos, Laura veio direto na jugular:
– Você não adiantou dinheiro nenhum para ele, né? Seja honesto.
Achei que era hora de me abrir e contar a verdade. Primeiro, confirmei sua suspeita, negando o adiantamento ao Douglas. Depois, mostrei as mensagens que Josi me repassou e contei do final de semana. Após uma breve comemoração, se dizendo orgulhosa de mim, que eu fiz a coisa certa ao voltar com a Josi, ela voltou a ficar séria:
– Aconteceu uma coisa bem estranha quando saí com o Douglas. – Laura estava um pouco nervosa. – Seu celular tocava o tempo todo e só quando conseguiu se afastar de mim, quando eu fingi entrar na rotisseria, ele se afastou para atender.
Eu não interrompi, esperando ela concluir:
– Fingi que entrei, fui até o balcão, esperei uns minutos, mas logo voltei, saindo pela lateral. Ele estava atrás de um carro, falando baixo, parecia que alguém estava cobrando alguma coisa dele. O que eu consegui ouvir, foi: “Eu já disse que ele está sentindo a pressão, sua viagenzinha de amor deu errado, ela até me pediu conselhos, está desconfiado dela”. – Ela parecia tentar se lembrar de mais alguma coisa. – Ah, ele disse também algo como “o seu investimento vai valer a pena.”
Ele só podia estar falando de mim. “Sentindo a pressão”, “viagem de amor”, “me pediu conselhos” … é claro que era eu. Será que Douglas estava “trabalhando” para alguém? Será que o inimigo estava ao meu lado o tempo todo, se passando por amigo?
Aproveitei e mostrei a mensagem de Juan também. Laura veio se sentar ao meu lado:
– Sabe, meu irmão, um dos motivos de eu ter terminado com o Juan, foi porque ele se tornou insuportável quando você recusou trabalhar com ele, dizendo que queria seguir o próprio caminho. Desde cedo ele reconheceu o seu enorme talento e não se conformava com a sua recusa.
Laura acariciou o meu rosto, sorrindo para mim:
– Ele parecia querer competir com você. Eu disse a ele, diversas vezes, o quanto você o admirava, como o tinha como um mentor, mas ele não sabia falar de outra coisa. O pensamento tem poder e mesmo que você não acredite, não custa nada tomar um banho com sal grosso para afastar vibrações negativas.
Laura ainda não tinha terminado:
– Eu achava que não era sério, que ele falava da boca para fora, mas ele disse, e não apenas uma vez, que primeiro ia deixar você quebrar a cara, para depois voltar rastejando para ele.
Os pontos começaram a se ligar na minha mente. Contei a Laura sobre o que Lucas descobriu, sobre alguém estar manipulando a opinião na internet contra mim. Ela fez uma revelação grave:
– Olha, eu não desacredito. Já vi Juan jogando sujo e essa foi mais uma das coisas que fez com que eu me afastasse dele. Quando se sente ameaçado, ele não demonstra pena ou piedade. Ele é um tubarão, não joga para perder. Se tiver que passar por cima de você, ele irá.
Eu estava muito pensativo, mas Laura ainda não tinha terminado:
– Antes de você, teve um jovem rapaz, um menino muito tímido até, mas que era um artista nato. Ele trabalhava para quase todas as lojas do bairro, criando placas e identidades visuais. Seu trabalho era moderno e bonito e ele logo começou a receber pedidos para criar sites e trabalhar em campanhas para a cidade. Lembro até que desenhou o escudo e os uniformes do time aqui do bairro, que chegou a uma divisão de acesso do estado.
Laura, pensativa, puxava os detalhes na memória:
– Juan ainda estava se estabelecendo e aquele garoto deu muito trabalho para ele, roubando clientes em potencial, já que seus desenhos e projetos eram muito superiores. Do nada, do dia para a noite, o garoto sumiu. Dias depois encontraram imagens de uma câmera de segurança na rua em que ele foi sequestrado e enfiado dentro de um carro, mas o corpo, ninguém achou. Nem o carro usado no sequestro. Nunca mais se ouviu falar dele.
Aquilo me assustou:
– O que você quer dizer? É o que eu estou pensando?
– Na época, Juan acabou sendo o principal suspeito, pois as conversas telefônicas entre os dois, eram sempre com Juan o ameaçando. Mas como ele tinha um álibi sólido, pois estava fora da cidade e não foram descobertas provas que o ligassem ao crime, aquilo não deu em nada.
Minha mente trabalhava freneticamente: “Será que Juan seria capaz de tal coisa? Não, não era possível. O conheço desde sempre, aquilo era algo inimaginável de se pensar.” Fiquei surpreso com tudo aquilo:
– Por que você nunca me contou? Nunca disse nada?
Ela parecia triste, mas foi honesta:
– E contar como? Dizer que eu desconfiava do meu próprio namorado? Papai ainda estava fora do ar, sofrendo, você na faculdade, longe de casa … há quem eu poderia contar?
Laura me fez sinal para esperar e continuou:
– Aquela foi a primeira vez que eu terminei com Juan. Aquilo me assustou demais. Como eu estava apaixonada e era idiota, acabei aceitando sua inocência. Alguns meses depois, ao lidar com um concorrente, ele acabou o ameaçando.
Naquela altura, ela estava bastante nervosa, mas continuou a falar:
– Suas palavras, ou o que eu me lembro, foram: “me desafie e você vai acabar igual aquele moleque. Tenho certeza de que você sabe do que eu estou falando.”
Laura respirou, tentando se acalmar, mas logo prosseguiu:
– Esse rapaz também sumiu, mas um tempo depois ele estava fazendo sucesso na internet. Você não deve saber quem é, pois foi bem no começo do YouTube. Hoje já nem me lembro mais do nome também.
Laura se levantou, me deu um abraço apertado e me acalmou:
– Bom, só quero que esteja preparado para tudo. Prefiro acreditar que o Juan jamais o ameaçaria, ou faria algo com você, mas é aquela coisa, a gente só conhece as pessoas verdadeiramente, quando nos afastamos dela e as contrariamos. – Ela me deu beijo na bochecha. – Ah, apesar de triste pela Rafa, estou tão feliz que você e a Josi se reconciliaram … vou tomar banho e deitar. Vai ser na sua cama mesmo, não tem outra e ela é bem grande. Tente não fazer barulho quando for para o quarto, tenho sono leve.
Laura saiu, me deixando ali na cozinha com meus pensamentos. Douglas, Juan, o cancelamento forjado … nada se encaixava. Eu só tinha perguntas, nenhuma resposta.
Peguei meu notebook, precisava conferir o GPS do carro e saber se Douglas foi diretamente para casa. Ele até foi para casa, mas não sem antes passar em dois outros endereços. Nenhum deles eu conhecia. Ele ficou por dez minutos em um apartamento no centro e por outros quinze em uma casa no bairro em que morava. Anotei os dois endereços para pesquisar depois.
Cansado, também tomei meu banho e fui me deitar. Laura já estava apagada e eu apenas a cobri, me deitando ao seu lado. Não demorei a pegar no sono, cansado fisicamente da viagem e mentalmente por toda a confusão ao chegar.
Acordei muito cedo, ainda nem tinha clareado. Para desestressar, tentar começar bem o dia que prometia ser intenso e desafiador, fui malhar. Tive que usar meu carro de final de semana, um modelo antigo reformado que era o meu xodó.
Acabei não fazendo todas as séries, e muito desligado, levei vários esporros dos instrutores da academia. Preferi voltar para casa e ao trabalho, aproveitando para dar uma passada na minha sala comercial, futura sede da minha agência e dar uma olhada no andamento da reforma.
Demorei mais do que gostaria, anotando as coisas que não estavam muito bem feitas. Já eram quase nove da manhã e quando eu estava entrando no carro, prestes a voltar para casa, senti o telefone vibrar e fiquei muito feliz ao ler o nome no visor. Atendi:
– Bom dia, meu amor! Só queria ouvir sua voz, ter certeza de que não estou sonhando e que somos novamente um casal. É só isso mesmo, eu te amo. Boa sorte e que seu dia seja muito melhor do que ontem.
Brinquei com a Josi:
– Impossível ser melhor. Ontem você estava peladinha nos meus braços. Hoje será uma fila de problemas a resolver.
Ela riu:
– Seu bobo, estou falando de quando chegou em casa, não antes. Preciso ir, está na minha hora.
Nós nos despedimos e eu voltei para casa. Ao chegar, um carro diferente estava parado no meu portão. E quando o motorista saiu, fiquei muito feliz em reconhecer um dos meus antigos professores da faculdade, um educador que eu admirava e que sempre me protegeu, reconhecendo o meu talento. O mestre Aurélio, Doutor em propaganda e Marketing, sorriu ao me ver estacionar e caminhar em sua direção:
– Meu jovem, há quanto tempo. Está mais forte, parece até um homem já.
Estranhei sua presença, já que ele morava a mil quilômetros de distância:
– Professor, o que está fazendo aqui? Nossa, desculpe, é um prazer revê-lo.
Fiz sinal para que ele me acompanhasse, entrando em casa. Ele me seguiu:
– Me aposentei e acabei voltando para a minha terra natal. Você sabe que eu sou daqui, por isso nos demos tão bem.
Assim que chegamos a sala, Simone nos interrompeu:
– Clay, precisamos lidar urgentemente com aquelas três empresas. Eu sinto que perdemos, mas talvez, se você falar com eles, quem sabe?
Meus três pupilos logo reconheceram o professor tão renomado e vieram cumprimentá-lo. Infelizmente, nenhum deles teve a honra de ser aluno daquele mestre brilhante.
Douglas também chegou e todos estavam confusos com a presença do Senhor Aurélio. Laura, já com o café passado, percebeu o momento e tentou distraí-lo, me dando tempo para lidar com nossos problemas urgentes.
Por quase meia hora, Mestre Aurélio apenas nos observava, analisando a situação, fazendo observações para Laura, que respondia afirmativamente a tudo o que ele falava.
Tentei conversar com meus clientes por telefone, mas eles estavam irredutíveis, tentando proteger suas marcas da exposição negativa. Entendi e me resignei.
Senhor Aurélio, chamando minha atenção, pediu que eu me sentasse ao seu lado. Com um sorriso de satisfação no rosto, ele disse:
– Eu estou, desde sábado, ciente dos seus problemas. Minha netinha, seguidora da tal influenciadora, viu uma foto sua no meu escritório e me contou o que estava acontecendo na internet.
Eu achei estranho:
– O senhor tem uma foto minha no seu escritório?
Ainda sorrindo, ele explicou:
– Não só sua, mas de todos os alunos brilhantes para quem tive a honra de ensinar. Mas são apenas seis no total.
Todos pararam o que estavam fazendo para ouvir. Ele voltou a falar:
– Vamos mudar o foco um pouco. Analisem a situação de uma perspectiva diferente.
Todos o olhavam sem entender, mas também, ninguém o interrompia:
– O que vocês acham que são os seguidores? Para que servem? Qual o objetivo do influenciador ao tentar captá-los?
Laura foi a única a responder:
– São fãs, pessoas que admiram o trabalho do influenciador. Para que servem, eu já não tenho certeza. Além de dinheiro nas visualizações de conteúdo, Inflar o ego gigante desses adolescentes mimados?
Todos riram, menos o mestre Aurélio.
– Isso também, minha jovem, mas perceba, que sempre que um influenciador atinge um determinado número de seguidores, ele se torna um garoto propaganda, um vendedor de produtos. O que podemos concluir?
Ninguém ousava falar nada, mas eu sabia muito bem onde aquele velho genial queria chegar:
– No fundo, tudo é dinheiro.
O mestre sorriu para mim:
– Exatamente! Onde tem dinheiro, é necessário propaganda, pois ela é a alma do negócio.
Eles nos olhou sério:
– Se você quer reverter essa negatividade, está na hora de se promover, vender o seu peixe melhor do que quem deseja lhe prejudicar.
Ele se levantou, se despedindo de Laura e se virando para mim:
– Agora eu deixo tudo em suas mãos, você é mais do que capaz de reverter essa situação. Mãos à obra. – Ele se encaminhou para a porta. – Venha me ver quando essa crise passar, temos muito a conversar.
O levei até seu carro, peguei seu novo número de telefone e endereço, e nos despedimos. Era a terceira vez que ele vinha me visitar, mas a primeira em que não pude dar atenção. Me sentia triste por aquilo, em dívida. Prometi a ele que assim que as coisas se acalmassem, eu o recompensaria. Ele se despediu minimizando a situação, dizendo que chegou sem avisar e que eu não tinha porque me preocupar.
Ao entrar novamente na casa, percebi um Douglas impaciente e me aproximei:
– O que foi, cara? Algum problema?
Ele foi direto:
– Problema nenhum, mas não sei como posso ser útil aqui. Eu sou de botar a mão na massa, não de resolver crises. Se tem serviço, manda, é comigo mesmo. Parado aqui, sou inútil. Não acha melhor que eu volte para a reforma, que faça as coisas andarem? – Todo sorriso dele para mim parecia debochado. – E outra, ainda tem aquela coisa que você me pediu. Preciso ir atrás, confirmar.
Pedi alguns minutos a ele, apenas como desculpa, dizendo que iria ver se o pessoal poderia lidar com tudo, mas minha intenção era falar com Lucas. Assim que ele me deu sinal verde, dizendo que o backup no celular era feito rapidamente, liberei o Douglas. Novamente, ofereci o carro para que pudesse vigiá-lo pelo GPS. Ele aceitou prontamente, sem nem desconfiar.
Assim que Douglas se foi, reuni o pessoal. Seguindo as orientações do mestre Aurélio, uma ideia surgiu. Um contra-ataque rápido e certeiro era necessário. Peguei meus nove clientes menores, os mais antigos, que estavam comigo desde o começo. Todos eram muito bem avaliados e os sorteei entre Lucas, Simone e Lariane. A ideia era simples: melhorias estéticas em cada logo e propaganda e, além das melhorias estéticas, também funcionais em cada site.
Era o primeiro teste real dos três e precisava ser feito no menor tempo possível, de preferência naquela mesma semana. Não era uma tarefa complicada e muito menos um bicho de sete cabeças. A base já estava toda pronta e serviria também para que eu testasse na prática cada um deles.
Mas não era só isso, a cereja do bolo já estava pronta e eu apenas precisava antecipar uma situação. Eu tinha um grande lançamento guardado para a inauguração da minha agência em duas semanas e se meu maior parceiro concordasse, a empresa de informática, também minha patrocinadora, aquele poderia ser um trunfo decisivo para mim.
Liguei para eles e após uma difícil negociação, concordaram em me ajudar. Lógico que após diversas garantias futuras e algumas concessões da minha parte. Eu ainda tinha um cliente grande, mas como era um contrato novo, com lançamento de identidade visual recente, achei melhor deixá-los quietos. Só o fato de não me abandonarem, já era motivo de comemoração.
Trabalhamos incessantemente durante todo aquele dia e boa parte da noite. Josi me ligou, mas falamos rapidamente. Douglas passou para deixar o carro, mas precisando focar no que eu realmente precisava resolver, acabei não dando atenção para aquele problema. O GPS estava ligado, seu celular clonado e eu poderia me preocupar com aquilo depois. Antes de tudo, eu precisava recuperar a minha reputação.
A surpresa do dia ficou por conta de uma outra ligação, por vídeo, já no final da noite e que eu não esperava, mas que acabou sendo providencial. Para ter privacidade, fui para o quarto antes de atender. Preocupada comigo, Rafaela queria saber notícias. E estava incrivelmente linda na chamada. Ela começou justamente pela Josi, me provocando:
– Então, se resolveu com sua ex? Contou a ela o que eu disse?
Me fiz de bobo:
– E o que foi que tu disse?
Ela riu:
– Vai mesmo me fazer repetir? Homens e seu ego …
Para testá-la, saber se ela falava sério, resolvi colocar fogo na situação, dizendo a mesma coisa que disse para Josi:
– Aquela safada é igual a tu, vocês são farinha do mesmo saco.
É claro que ela se assanhou inteira, sem conseguir esconder sua excitação:
– Opa! O que está querendo dizer?
Fui honesto:
– Vocês são duas safadinhas, querem a mesma coisa. Ela disse o mesmo que você.
Rafa não acreditou:
– Para de bobeira, rapaz! Meu coraçãozinho frágil não aguenta essas brincadeiras.
Lhe dando o meu sorriso mais safado, confirmei:
– Falo sério. Ela disse que topa e ainda me fez algumas propostas a mais.
Inteligente até demais, Rafa sacou tudo:
– Já até imagino … ménages com outras mulheres, acertei?
Apenas sorri, confirmando. Ela disse:
– É só você lembrar que eu sou a primeira da fila e está tudo certo. – Ela não perdeu a oportunidade, se insinuando para mim. – Vai mesmo deixar de ser um careta? Não acredito …
Rafaela merecia o meu máximo respeito e eu me mantive sincero:
– Nossa relação ainda é muito frágil, mas quando Josi e eu chegarmos a um consenso, prometo que você será a primeira a saber. No momento, tenho problemas mais sérios a resolver.
Como aquela era uma ligação para saber notícias e acabou tomando um rumo inesperado, Rafaela defendeu seus seguidores e eu concordei com ela, dizendo que já sabia que as coisas estavam vindo de outro lugar, de alguém que tentava me desestabilizar, aproveitando a situação.
Sabia que poderia ser mal interpretado, até parecer um canalha, após falarmos sobre ela e Josi, sobre ménages, mas eu precisava encontrar aliados e confiava nela:
– Eu bolei uma estratégia. Na verdade, fui orientado a isso. – Ela me encarava curiosa. – Em breve, lançarei uma sequência de novas campanhas, clientes que quero colocar em evidência. Minha intenção é combater esse cancelamento com trabalho, mostrando a competência da minha equipe …
Eu nem precisei terminar de falar, pois Rafaela logo se ofereceu a ajudar:
– Perfeito! Conte comigo, vou repostar e pedir likes. É o mínimo que posso fazer depois de ter contratado os seus serviços e me sentir meio responsável por como tudo aconteceu e terminou.
Vendo que ela ficou triste, a acalmei, tentando animá-la:
– Tu não tem culpa de nada, para de falar bobagem. Você foi a primeira a sair em minha defesa, a me ajudar. – Eu também não queria parecer desesperado. – Eu agradeço o apoio, mas só se não for causar mais problemas, afinal, você também deve satisfações a sua patrocinadora.
Rafaela foi direta:
– Não nesse caso. Nas minhas redes sociais mando eu. Depois do que aconteceu, da forma como mudaram a minha decisão em te escolher, pedi ao meu advogado para avaliar o que eu posso e não posso fazer. Quem eu apoio, ou deixo de apoiar, é uma decisão minha.
Lembrei a ela que não era bem assim:
– Mas eles podem cancelar o contrato, te substituir. Ou não?
Rafaela se encheu de orgulho:
– Poder, até podem, mas … Sabe quantos pedidos eu analisei antes de fechar com eles? Fui eu que os escolhi, não o contrário. Todos os dias tenho propostas para mudar de lado, mas não o faço. Se eles não quiserem mais, tem quem quer. Nenhuma empresa, em sã consciência, subestima o poder de vinte milhões de seguidores.
Realmente, Mestre Aurélio tinha razão. É só mudar o foco que fica fácil entender. Redes sociais, seguidores, engajamento, não mais é do que a evolução da propaganda e do comércio. Com o apoio da Rafa e da minha equipe, eu tinha tudo para reverter a situação.
Antes de nós nos despedirmos, Rafaela voltou a investir, mas de forma mais inteligente:
– Olha, Clay, eu realmente apreciei o nosso tempo juntos, mas eu preciso ser honesta, para que não fique nada pendente. Eu gosto de você, adorei o que a gente teve, mas foi apenas sexo. Minha vida é tão corrida, tão desregrada, que eu jamais teria tempo para uma relação amorosa. Sinto falta de sexo, e se vocês dois concordarem e se acertarem, eu adoraria me aventurar com vocês. É só chamar.
Que pedrada! Eu me achando o tal, e a lapada veio forte. Nós nos despedimos e desligamos. Admirei ainda mais aquela mulher forte e independente, ciente do que quer e sem medo de se expor. Do jeito que as coisas caminhavam, com Josi e ela unidas pelo mesmo objetivo … não sei, não … minha resistência começava a fraquejar.
Quando voltei a sala e me preparava para dar uma espiada nas andanças e no backup do celular do Douglas, Lucas e Lariane me pediram ajuda, desviando meu foco mais uma vez. Confesso que até me senti aliviado, pois mesmo desconfiado, eu ainda mantinha uma pequena esperança de que o Douglas se mantinha leal a nossa amizade. A traição de um amigo, ainda mais um que é considerado como irmão, tem um poder mais devastador até do que a traição de uma mulher.
Meu telefone voltou a vibrar, Josi chamava por vídeo e eu voltei ao quarto para atender:
– Estou atrapalhando? Tentei te ligar meia hora atrás, mas só dava ocupado.
Fui honesto:
– Desculpe, eu estava em uma chamada com a Rafa.
Ela me olhou com um sorriso sacana:
– Então quer dizer …
Já cortei logo:
– Não quer dizer nada. Pelo menos, não agora. Sossega o facho. Minha vida está complicada demais no momento.
Mas não cortei totalmente:
– Vocês são duas safadas, tô fodido.
Josi se surpreendeu:
– Tá querendo dizer o quê? Que contou a ela o que conversamos?
Não resisti e a provoquei:
– Ela disse que topa, tu disse a mesma coisa … estou perdendo, dois a um.
Josi sorriu seu sorriso mais lindo e safado:
– Só falta você topar. Proposta melhor do que essa tu não vai conseguir em outro lugar.
Querer eu queria, mas ainda não tinha certeza, me sentia um hipócrita, me aproveitando da situação. Não neguei, mas não confirmei:
– Preciso passar por essa tempestade antes de pensar em qualquer outra coisa …
Solidária, Josi me entendeu:
– Eu entendo, amor! Desculpa por insistir, só queria te descontrair um pouco, tentar te animar.
Acabamos conversando sobre nós, sobre nosso futuro, amenidades, sacanagem e antes de nos despedirmos, ela contou:
– Douglas esteve aqui hoje. Ficou na rua, estacionado, atrás de um caminhão grande. Achei que era você, por causa do carro e pedi a uma amiga de um comércio próximo para tirar uma foto. Ele veio mesmo me vigiar. – Josi ria sozinha. – Como combinamos, pedi ao meu amigo gay para me acompanhar até a lanchonete e fomos de braços dados. Enquanto lanchávamos, acariciei as mãos dele, deitei minha cabeça em seu ombro … – Ela resolveu me provocar. – … só faltou uns beijinhos …
Não entrei no jogo dela:
– Você não presta, mulher. Onde fui amarrar meu burro?
Josi ria gostoso, linda e descontraída, mas ainda não tinha terminado:
– Juan saiu um pouco mais cedo e logo o reconheceu também. Eles conversaram por quase meia hora, pareciam amigos de infância.
Juan e Douglas até se conheciam, mas nunca foram próximos. Nunca achei que eles tivessem aquele nível de intimidade. De qualquer forma, também não era nada tão estranho. Pelo menos, era o que eu achava.
Me despedi da Josi e antes de voltar a sala, aproveitei para dar uma olhada nas andanças do Douglas durante o dia, assim que o liberei de manhã. Além da reforma da agência, ele esteve em mais três outros lugares com meu carro: uma casa de massagens, aquele mesmo endereço do centro do dia anterior e por último, na agência de Juan, assim como Josi informou. Tirando o fato dele ter estado em uma casa de massagens durante o expediente, nada ali chamava muito a atenção.
Decidi olhar o backup do celular, mas tirando os aplicativos protegidos, como bancos e afins, a única coisa desprotegida eram as redes sociais e o Whatsapp. No Instagram e no Messenger, só havia interações com mulheres, tentativas de aproximação, alguns foras, outras ele conseguiu, mas o Whatsapp estava bem estranho, já que suas conversas estavam configuradas como mensagens temporárias e praticamente tudo já tinha sido excluído.
Uma coisa me chamou muito a atenção, pois a lista de conversas, as pessoas com quem ele falou, se manteve. Juan estava entre elas. Aquilo cheirava mal, ainda mais depois do que Josi me contou, sobre a forma como eles interagiram. Aquilo me preocupou demais. Por que apagar as conversas do whatsapp, mas não dos outros aplicativos? Quem apaga em um, apaga em todos.
Eu não tinha como resolver nada naquele momento e voltei a focar no meu maior problema. Por dois dias, minha equipe trabalhou arduamente, só parando para comer e dormir. Na quarta à noite, cheio de saudade, fui ver a Josi. Dormimos no motel, ou melhor, cochilamos entre as fodas.
Além da Laura, que eu não queria sobrecarregar, me abri com a Josi, dividindo com ela as minhas preocupações. Ela me ouviu e me acalmou, sugerindo uma opção:
– Eu tenho uma amiga, uma grande amiga na verdade, que de vez em quando trabalha com um detetive. Você não acha melhor contratar um profissional para resolver de vez esse problema?
Aquela não era uma má ideia e eu pedi para ela falar mais:
– Eu sei que ela o ajuda quando ele precisa se aproximar de homens como o Douglas. Acho que ela seduz os caras, consegue para ele acessos que ele não teria normalmente. O nome dela é Natasha. Quer que eu marque com ela lá em casa, para ela explicar melhor como funciona?
Josi me surpreendeu, aquilo era genial. Um amador como eu, ainda mais em conflito por vigiar um amigo, jamais conseguiria respostas facilmente. A sugestão da Josi foi certeira, e como agradecimento, fodi aquela bucetinha quente com ainda mais vontade e gratidão.
Mas antes de qualquer coisa, na quinta-feira, minha equipe havia terminado o desafio que eu propus e nossa resposta estava pronta. Era hora da ação.
Continua.