CAPÍTULO OITO
*** PEDRO FERNANDES ***
— Marjorie? Queria me ver? — pergunto, ao bater na porta, no fim das aulas de segunda-feira, depois de ter recebido mais um recado entregue por Bruna enquanto corria para fora do IABE.
— Sim, entre — pede e eu obedeço, me sentando imediatamente diante da mesa da coordenadora. — Acredito que você tenha algo para me dizer? — sugere e eu inclino a cabeça levemente antes de entender do que se trata. Aquele cretino. Fecho os olhos por alguns instantes.
— Marjorie, eu posso explicar — começo. — Tudo o que eu fiz foi passar as informações contidas no relatório individual, eu…
— Pedro, do que você está falando? — me interrompe e eu franzo as sobrancelhas, confusa.
— Do que você está falando? — Acho melhor perguntar.
— Nós combinamos que você me daria uma resposta até o dia de hoje. Uma resposta para o senhor Maldonado, Pedro. — Agora, é ela quem me olha confusa e meu queixo quase vai ao chão com sua afirmação.
— A proposta de emprego ainda está de pé? — Pisco, mais do que surpreso, atordoado.
— Por que não estaria? — Ergue uma sobrancelha questionadora e eu desvio os olhos.
— Você falou com ele, Marjorie?
— Sim, e o homem está um pouco impaciente. — Sua declaração me faz rir.
Passei menos de uma hora na companhia de Hugo Maldonado e mesmo assim sou capaz de atestar que dizer que ele está um pouco impaciente é o eufemismo do século. Aquele homem não tem uma gota de paciência sequer circulando pelo seu corpo.
— Eu não entendo — murmuro baixinho, mais para mim mesmo do que para minha coordenadora, no entanto, ela ouve.
— O que você não entende? Achei que tivesse tirado todas as suas dúvidas na semana passada. Como você não fez nenhuma pergunta sobre o contrato, achei que estava tudo bem.
— Não, Marjorie. Não é isso. Você tem certeza de que Hugo Maldonado disse que a proposta ainda estava de pé? — questiono e ela larga os papéis que alinhava em um bloco sobre a mesa.
— Pedro, o que está acontecendo? — Mordo o lábio, dividido entre contar ou não. Mas que alternativa eu tenho, certo?
— Bem... — Expiro com força. — Digamos que o senhor Maldonado não recebeu muito bem algumas das observações feitas no relatório de Beatrice.
— Sobre a administração de frustrações?
— Exatamente. Ele basicamente se recusou a me ouvir, tratou todos os meus argumentos com desdém, e no fim, simplesmente se levantou e foi embora. Ele nem mesmo assinou o termo de ciência da reunião.
— Entendo.
— Então eu achei que…
— Que isso significava que ele estava retirando a proposta de trabalho.
— Sim, e eu não entendo como ele pode não estar. Marjorie, aquele homem não gosta de mim. — Minha coordenadora passa algum tempo em silêncio, ponderando.
— Bem, gostando de você ou não, ele ainda precisa de um agente do IABE se quiser legitimar o ensino domiciliar da filha e nos termos que ele quer, esse agente é você. — Balanço a cabeça, concordando.
— Bem, mas eu não acho que eu possa trabalhar pra ele. Por mais que eu adore Beatrice e acredite que essa solução seria boa para ela, talvez seja uma forma de o universo ensinar ao seu pai que ele não pode protegê-la do mundo o tempo inteiro, nem impedir que ela tenha frustrações — digo de uma vez e ela balança a cabeça antes de entortar os lábios.
— Eu estava preocupada que você fosse me dizer isso.
— Achei que você concordasse com as observações que foram feitas sobre Beatrice. — Estranho o comentário.
— Eu concordo. Não era delas que eu estava falando.
— De quê, então?
— Sobre não poder trabalhar para ele. — Franzo o cenho outra vez, confusa. — Eu recebi uma ligação hoje, Pedro — avisa, e um gelo inconveniente percorre minha espinha. Dessa vez, não suspeito. Sei exatamente quem estava do outro lado da linha. Marjorie espera por uma resposta e quando não sou capaz de lhe dar uma, continua: — Você poderia ter me contado. — Rio sem humor e desvio os olhos por um segundo.
— Você teria me contratado?
— Eu precisaria ter pedido autorização — admite.
— E eu não teria sido aprovado, Marjorie. — A mulher de pele escura e cabelos grisalhos empurra a bochecha com a ponta da língua, pensativa.
— Eu te contratei há dois anos. Houve tempo desde então.
— E o que eu diria? — Inclino a cabeça me sentindo extremamente honesto. — “Olha Marjorie, caso isso te interesse, minha avó é uma mulher rica e muito considerada no meio empresarial brasileiro, inclusive, talvez ela conheça os donos dessa escola. Eu sou seu herdeiro por direito. Mas não se preocupe, isso não vai afetar minha capacidade de trabalho?” — despejo a explicação que não faz sentido agora e nem teria feito em qualquer momento dos últimos dois anos apenas para provar meu ponto. — Me desculpe, Marjorie. Não vejo como isso teria ajudado a qualquer um de nós dois. — Um latejar súbito atinge minha têmpora conforme a compreensão do que está prestes a acontecer se enraíza em mim.
— Eu entendo — concorda. — Mas isso não muda o fato de que você está numa posição complicada, Pedro. Quando Tereza Belford me ligou hoje perguntando a seu respeito… — diz e meu coração para por alguns segundos ao ouvir o nome da dona do Instituto Atheniense Brasileiro de Educação. Isso é pior, muito pior do que se tivesse sido minha avó. Marjorie poderia ser convencida a ignorar uma ligação de uma mulher influente se não a conhecesse, mas ignorar a própria chefe seria insubordinação, para dizer o mínimo. — Depois de receber uma ligação de Marieta Alves Fernandes, foi um pouco difícil saber o que dizer.
— Eu estou sendo demitido? — pergunto diretamente, sentindo os olhos arderem.
— Não. — Pausa e eu solto o ar que sequer notei ter prendido. — Pelo menos, não ainda. — Marjorie suspira longamente e desvia os olhos, parecendo tentar se decidir entre falar ou não alguma coisa. — Eu não deveria te dizer isso, Pedro. — Volta a me encarar. — Eu sequer deveria estar te contando sobre essas ligações, mas conheço o profissional que você é e não acho justo que isso seja descartado por causa do seu sobrenome. Eu não sei o que exatamente está levando sua avó a fazer algo assim, mas Tereza ainda não tomou nenhuma decisão. Eu te disse antes, você está no começo da sua carreira. Acumular favores não é uma coisa ruim. Tereza Belford pode querer não contrariar sua avó, mas ela certamente também não vai querer contrariar Hugo Maldonado.
— Você está me dizendo para aceitar o emprego — concluo, baixinho.
— Na pior das hipóteses, você adia a decisão de Tereza por seis meses, embolsa um valor que levaria pelo menos 5 anos pra conseguir se fosse professor regente em uma escola de alto padrão como o IABE e recebe duas excelentes cartas de recomendação, uma minha e outra do senhor Maldonado. Na melhor delas, quando você voltar, o pedido da sua avó já vai ter sido esquecido e você recebe a promoção que merece — afirma e eu quase rio de desespero, porque ser demitido não é a pior hipótese.
A pior hipótese é ser acusado de homicídio, o que não seria nenhum grande absurdo se eu tiver que passar seis meses convivendo diariamente com o pai da Beatrice. Além disso, ele pode decidir me demitir antes do fim do contrato e o que eu faria?
— Eu posso pensar?
— Eu não acho que você tenha mais do que vinte e quatro horas. Hugo Maldonado até poderia esperar, mas Tereza não. — Assinto.
— Tudo bem, Marjorie. Muito obrigado. — Ela inclina a cabeça, solidária, e eu me levanto.
Saio da coordenação com o coração pesado e a mente a mil por hora. Demissão ou aceitar trabalhar para um homem que já deixou mais do que claro que não respeita minha formação? Nenhuma das duas coisas parece particularmente atraente.
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— Obrigado — agradeço ao funcionário, passando por ele depois de um breve contorcionismo para recuperar minha identidade e o ingresso validado.
O balde de pipoca em minhas mãos poderia alimentar uma pequena família e o copo com um litro de refrigerante vai fazer maravilhas pela minha bexiga, mas eu não me importo. Algumas pessoas fazem listas de prós e contras quando precisam pensar, outras contam seus problemas para um terapeuta, eu gosto de vir ao cinema, sozinho.
Entro na sala quase vazia e procuro meu lugar na penúltima fileira. Ocupo as duas poltronas ao meu lado com minha bolsa e meus doces e estico as pernas, apoiando-as sob o assento à minha frente. Além da pipoca, passei nas Lojas Americanas e comprei chocolates e balinhas. Quem precisa de um encontro quando se tem tanta variedade de porcarias?
Ainda faltam alguns minutos para os trailers começarem e eu me ocupo enviando uma mensagem para Melissa, avisando que mudei minha rota e vim parar aqui, ao invés de ir direto para casa. Mesmo que eu não esteja aqui pelo filme, ninguém gosta de gente que fica mexendo no celular durante a sessão.
Meu primeiro instinto quando deixei a sala de Marjorie foi o de fazer uma visita à minha avó. No entanto, confrontá-la não mudaria os fatos. Ela diria meia dúzia de frases arrogantes, faria um discurso gélido sobre a necessidade de que eu entenda o meu lugar e provavelmente encerraria dizendo que se cansou da minha brincadeira de fazer minhas próprias vontades e por isso se sentiu no direito de intervir.
Depois de alguns minutos pensando, percebi que a melhor maneira de frustrá-la era simplesmente ignorando-a. A segunda melhor maneira é aceitar o conselho da minha coordenadora e trabalhar para Hugo Maldonado. O problema é que quanto mais eu penso sobre essa segunda, mais ela parece uma maneira de frustrar a mim mesmo, também.
Recosto-me na poltrona, enfio a mão no saco de pipocas e levo uma poção à boca. O sabor amanteigado explode, me fazendo relaxar e eu deixo que meus pensamentos corram soltos enquanto olho para a tela sem prestar atenção em nada além dos meus próprios pensamentos.
Quando as luzes acendem e todas as minhas guloseimas já foram devoradas, ainda tenho muitas dúvidas, mas há uma certeza que é maior do que todas elas. Marieta Alves Fernandes não me vencerá pelo cansaço! Pego o celular em minha bolsa e digito um e-mail de apenas duas palavras para Marjorie.
“Eu aceito.”
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*** HUGO MALDONADO ***
O prédio cinza de seis andares tem uma fachada mal cuidada e nenhum porteiro, e embora eu já tivesse visto fotos do lugar, presenciar a situação ao vivo e a cores só me dá mais certeza sobre a necessidade de vir aqui. Desço do carro e observo da calçada a imagem que antes investigava através das janelas: a rua comum tem movimento de carros e ônibus e em frente ao prédio, ladeado por outros residenciais e alguns pequenos comércios, há uma praça.
Enfio uma mão no bolso e balanço a cabeça delado para o outro, negando. Tento empurrar o portão de grade verde escuro que já viu dias melhores com a mão livre e constato que pelo menos ele está trancado. Não sei por que me importo, mas a falta absoluta de segurança desse lugar me coloca em um estado estranho de ansiedade.
Felizmente, de acordo com a mensagem na tela do meu celular, não precisarei me preocupar em entendê-la, porque ela não importa, não mais. Uma mulher abre a porta de entrada do prédio e sai dele. Ela estaca no lugar, parada no que é uma área de acesso precária, quando seus olhos batem em mim e suas sobrancelhas se erguem antes de ela me analisar dos pés à cabeça e decidir que é uma boa ideia tentar um sorriso sedutor. Jura?
Coço a sobrancelha, sem paciência para esse tipo de coisa e a mulher finalmente volta a caminhar, abandonando a porta do prédio.
— Posso ajudar? — pergunta em uma voz enrouquecida que é tudo, menos sexy como ela deseja.
— Na verdade, sim. Esqueci minhas chaves — minto.
— Você não mora aqui — declara e o sorriso em seu rosto se amplia, como se ela tivesse acabado de me pegar no flagra e agora eu lhe devesse uma. — Eu saberia se você morasse aqui. — Ronrona e eu preciso me esforçar muito para não revirar os olhos.
— Não, eu não moro. Mas tenho um apartamento que subloco.
— Nunca vi você aqui antes.
— Isso é porque eu não costumo vir aqui. — Os olhos da mulher se estreitam.
— Talvez você devesse.
— Dificilmente — respondo e ela dá uma risadinha, não entendendo ou não querendo entender o significado da minha economia de palavras.
Aceno com o braço, indicando-lhe que passe pelo portão entre nós e depois de outra risadinha irritante, dá de ombros, escolhe uma entre as muitas chaves do molho em suas mãos e enfia na fechadura que nos separa. O portão gradeado é aberto e eu estendo o braço, mantendo-o assim.
A mulher, que aparentemente tem sérias dificuldades de interpretação de gestos, amplia o sorriso, acreditando que essa foi uma atitude cavalheiresca da minha parte e eu inclino a cabeça para trás, buscando paciência.
— Foi um prazer te conhecer... — Pausa, esperando que eu complete com o meu nome e eu quase rio.
— Boa noite — me resumo antes de passar pelo portão e deixar que ele bata.
Subo os dois pequenos degraus entre a área comum e a porta de entrada do prédio antes de entrar nele e ser atingido com força pelo cheiro inconveniente de velharia. Olho para cima, para os lados, descobrindo alguns pontos de infiltração no teto e outros descascando nas paredes, além da falta de um elevador. Mas que caralhos?
Irritado, subo o primeiro lance de escadas e, quase de frente para elas, encontro o que procuro, o número 202. Investigo a porta melhor pintada do que toda a estrutura de concreto ao seu redor e percebo a falta de uma campainha ou de um olho mágico, pelo menos. O nível de irresponsabilidade envolvido nessa escolha faz meu sangue rugir nas veias e eu bato na porta com muito mais força do que seria necessário.
Três pancadas contidas e eu ouço um “Já vai” ser gritado. Apoio as mãos na cintura enquanto espero pelo que parece ser uma eternidade antes de a porta finalmente ser aberta e revelar uma mulher ruiva, de olhos verdes, rosto sardento e pernas incrivelmente longas vestindo algo que se parece com um pijama velho. A colega de apartamento, eu suponho.
Ela pisca os olhos pequenos algumas vezes antes de franzir as sobrancelhas, como se duvidasse da realidade do que está acontecendo e eu arrasto uma mão pelos cabelos e empurro a ponta da língua contra a bochecha.
— Boa noite — começo, já que ela continua em silêncio, mesmo depois de um minuto inteiro. Ela abre a boca, mas, para minha surpresa, não é comigo que fala.
— PEDRO! — grita e vira a cabeça para trás, olhando para o interior do apartamento. — TEM UM GOSTOSO PERDIDO NA NOSSA PORTA! É SEU? — Dessa vez, sou eu quem duvida da realidade do que está acontecendo, mas nada muda enquanto a garota ruiva espera por uma resposta.
Continuamos parados nas mesmas posições, ela com uma mão apoiada na porta, a outra na cintura e o corpo virado para trás; eu, com uma mão no bolso, a outra agora solta ao lado do corpo, encarando-a sem fazer ideia do que está acontecendo.
Um corpo pequeno e extremamente curvilíneo desponta em minha visão, por trás da porta aberta, vestindo um short tão curto que deveria ser considerado um atentado à saúde de qualquer homem, enquanto esfrega uma toalha nos fios escuros, tentando secá-los.
— O quê? — Pedro pergunta ainda sem se dar conta da minha presença, saindo de algum cômodo do apartamento e caminhando em nossa direção, distraído com a tarefa de secar os cabelos. Quando ele levanta os olhos, é para arregalá-los ao se deparar comigo, parado em sua porta, vidrado na figura pequena com tanta pele exposta, que eu sequer consigo desviar o olhar. — Você tem que estar de brincadeira! — murmura.
— O quê? Não é seu? Então eu posso pegar pra mim? — a ruiva pergunta, mas o amigo continua com a boca aberta, parecendo incapaz de acreditar no fato de que realmente estou parado na porta do seu apartamento numa quinta-feira à noite.
— Boa noite, Pedro — cumprimento e isso o tira da paralisia. Pedro elimina a distância entre nós com passos largos.
— O que você está fazendo aqui? — Vai direto ao ponto, espumando de raiva e aquela sensação de divertimento que me atingiu nas poucas vezes em que ele me desafiou antes, volta com ainda mais força. Mordo um sorriso e antes que eu tenha a chance de responder, a voz da colega de apartamento soa.
— É sério, Pê! Não posso ficar com ele pra mim? —pergunta e eu ergo uma sobrancelha, esperando pela resposta de Pedro que não faz mais do que fuzilar a amiga com o olhar. A mulher ergue as mãos em sinal de rendição antes de dar de ombros, se virar e sair.
— Não vai me convidar para entrar? — pergunto quando somos deixados sozinhos e ele ri, ultrajado.
— Não — responde categoricamente. — O que você está fazendo na minha casa? — repete a pergunta.
— Acredito que tenhamos algumas coisas para discutir.
— E você achou que isso te dava o direito de bater na minha porta? — pergunta irritado e os sentimentos em seu rosto são tão fáceis de ler que me surpreendem.
Pedro sente-se invadido e eu tenho vontade de sorrir, porque ele não teve qualquer pudor em fazer o mesmo comigo na reunião escolar. Ele estava fazendo o trabalho dele. Minha mente alerta, mas eu também estou fazendo o meu, cuidar da minha filha e garantir seu bem-estar. Continue se enganando, Hugo.
— Você não me ligou.
— Só se passaram três dias desde que recebi seu telefone.
— Já se passaram três dias desde que você recebeu meu telefone e se você vai trabalhar pra mim, é melhor aprender rápido que eu não gosto de esperar. — Todo o rosto do homem se contrai em uma expressão de desgosto. — Vai me deixar entrar agora? — questiono e ele inclina a cabeça, pensativo, antes de olhar para algum ponto atrás de si mesmo no apartamento.
— Não — decide. — Você quer conversar? Tudo bem, nós vamos conversar. — Dobra o lábio inferior para fora em uma expressão conformada. — Mas você vai esperar aí fora enquanto eu me troco e, depois, nós vamos até a padaria do outro lado da rua. São oito da noite, ela só fecha às dez, você não vai entrar no meu apartamento e só terá duas horas do meu tempo. Nada além disso. Porque caso tenha se esquecido, eu ainda não trabalho pra você — avisa e, dessa vez, não engulo sorriso.
HomenzinhHomenzinho da porra! A fim de equiparar o placar, Pedro lentamente empurra a porta na direção do meu nariz sem se importar em descobrir se concordo ou não com suas condições.
Enquanto o corpo pequeno e curvilíneo se torna uma visão cada vez mais distante através da porta que se fecha, meus olhos, inconsequentes, se recusam a ignorar a súplica da minha mente teimosa para que eles não percam nada daquela visão que, provavelmente, nunca mais se repetirá.
Por isso, eles se esforçam para captar cada pequeno detalhe minimamente exposto: o tórax exposto, o vale entre o peito salpicado por sardas, os mamilos duros, a barriga macia, os quadris largos e as coxas grossas. Lindo pra caralho é o que Pedro é, além de irritante e terminantemente proibido também.
A porta bate e eu não escondo o sorriso em meu rosto. O garoto é uma armadilha. A aparência pequena e frágil atrai, mas basta se aproximar o suficiente para descobrir um espírito orgulhoso e cheio de determinação capaz de devorar homens inteiros. Sim, Armadilha parece o apelido perfeito para ele.