Abri meus olhos lentamente e fitei as pessoas que me ouviam. Elas me aplaudiam, e muitas com lágrimas nos olhos. Me assustei um pouco pela emoção que pude causar neles.
Vítor me sorriu enquanto aplaudia, ainda abraçado com Mariana.
Sorri tímido e abaixei a cabeça.
- Minha gente, já é quase meia noite, vamos lá fora ver os fogos!
Era a Dona Rosa nos chamando. Todo ano o Senhor Alfredo promovia uma pequena queima de fogos.
Todos foram se dirigindo para o exterior do casarão.
Todos menos Vítor e a namorada. Eles estavam subindo as escadas tentando não chamar a atenção.
Eu sabia o que os dois tinham ido fazer.
Aquilo começou a me doer fisicamente, mas mesmo assim eu os segui por impulso e subi as escadas também.
Vi quando entraram no quarto e encostaram a porta. Eu os observei pela fresta da porta entreaberta. Lá fora já se ouvia a contagem regressivaPor que você me chamou aqui, Vítor?Porque eu tive medo que o mundo acabasse sem que eu fizesse issoIsso o quê?Meu coração se apertou enquanto os rostos deles se aproximavam lentamente. Eu sabia o que viria em seguidaSeus lábios se encontraram.
- FELIZ ANO NOVO! - todos gritaram no andar de baixo.
Os dois se beijavam apaixonadamente.
Desencostei-me da porta e entrei no banheiro mais próximo. Liguei a luz e me olhei no espelho. Meus olhos estavam vermelhos e as lágrimas desciam pelas minhas bochechas. A dor era enorme e eu começava a entender o motivo...
Uma das piores tristezas que podemos sentir é quando não vemos nossa dedicação a algo ou alguém ser recompensada.
Era assim que eu me sentia em relação à minha amizade com Vítor.
Não que ele tenha deixado nossa amizade de lado pra priorizar seu namoro com Mariana, mas era assim que eu me sentia: que eu havia sido trocado por ela.
O que eu estava sentindo era ciúme.
Aos poucos eu fui entendendo que eu estava começando a amar o Vítor.
Eu não queria amá-lo. Era errado, pecaminoso, imoral... Era feio.
Mas como pode aquilo que eu sentia... Aquele amor tão puro ser feio? Afinal de contas amar não era uma coisa divina e sagrada?
Isso foi criando um nó na minha cabeça. O que mais me fazia sofrer não era a ideia pecaminosa de que eu era gay, mas a perspectiva de que eu poderia perder a amizade do Vítor quando ele descobrisse.
Decidi que o melhor a fazer era suprimir esse sentimento.
Ele acabaria sumindo se não houvessem estímulos. Tudo o que eu precisava fazer era não ver o Vítor.
Só a intenção de por isso em prática me fazia sofrer, mas era um mal necessário. Eu tinha certeza que em um futuro próximo essa se mostraria a minha melhor opçãoLogo após a festa da virada do ano eu pus meu plano em prática e viajei para passar um tempo com meus avós numa fazenda próxima dali.
Não despedi de nenhum dos meus amigos, muito menos do Vítor.
Era um lugar calmo e ermo. Eu teria paz para pensar num jeito de sair daquele turbilhão de emoções que eu me encontrava.
Meu pai me levou. Não estranhou meu comportamento, pois eu sempre fui um garoto mais reservado, não demonstrava sentimentos facilmente.
Minha mãe pareceu desconfiar da saudade repentina que senti dos meus avós, mas não disse nada, apenas me desejou boa viagem.
Dona Maria e Senhor Leopoldo, meus amados avó e avô, foram nos receber.
Depois de instalado no quarto que sempre me era destinado naquele casarão barroco, fui me servir dos doces e salgados que minha avó fez para me receber.
- Esta broa de fubá está maravilhosa, vó!
- Tudo para agradar meu convidado especial...
- Assim eu fico mal acostumado.
- Ótimo, desse jeito você volta mais vezes.
Rimos um pouco enquanto conversávamos sobre o réveillon. Obviamente eu escondi alguns detalhes. Depois do papo resolvi sair um pouco para andar a cavalo.
- Volte cedo para não perder o almoço, viu?
- Pode deixar, vó, só vou matar as saudades da fazenda.
- Certo, peça um cavalo para o Zeca. Ele é o nosso empregado temporário.
Fui caminhando em direção ao estábulo que ficava um pouco afastado da sede da fazenda.
Quando cheguei me deparei com um rapaz jovem, porém com um jeito de homem. Ele tinha a pele morena por causa do sol e uma vasta cabeleira negra que chegava até aos seus ombros.
Quando me viu ele abriu um grande sorriso branco e perfeito. Fiquei um pouco desconcertado com sua beleza rústica e pelo comichão que senti ao vê-lo, mas me recompus e ofereci a mão em um cumprimento.
- Você deve ser o Zeca, eu sou o Bernardo.
- Ah claro, o neto do seu Leopoldo. Prazer. - falou apertando firme minha mão e não deixando o sorriso se perder no rosto.
- Prazer. Vim pedir um cavalo pra andar pela fazenda.
- Tá certo, vamos lá dentro que a gente pega um.
Ele foi andando na minha frente.
Tudo que eu conseguia prestar atenção no momento era no balanço da sua bunda dentro da calça jeans justa ao andar. Despertei do transe rapidamente. Foco! Não podia esquecer que meu objetivo naquela viagem era justamente esquecer essa perversão.
- Pronto, leva a Glória. Ela é bem mansa, não corre muito, é ótima pra um passeio.
- Ok, obrigado, daqui a pouco eu te devolvo ela.
- Sem pressa. Deixa que eu te ajudo a subir.
Não entendi se ele realmente achou que eu nunca havia montado num cavalo ou se aproveitou do momento para me segurar bem firme pela cintura e me colocar em cima da égua.
- Obrigado. - disse tentando me recompor.
- De nada.
Ele continuou sorrindo enquanto eu saía com Glória.
O meu plano não estava dando certo.
Eu estava naquela fazenda a menos de quatro horas e a única coisa que eu consegui foi achar outro objeto de desejo.
Andei com Glória por toda a propriedade. Foi impossível não relembrar os momentos felizes que passei com Vítor naquele lugar quando éramos crianças.
Brincávamos correndo pelos campos ou nadando na cachoeira ali perto... Tudo tão inocente...
Não consegui segurar as lágrimas. Era um passado recente demais, maravilhoso demais, contrastante demais com o momento atual.
Eu desci da égua para poder respirar um pouco enquanto me apoiava numa árvore. Eu estava tão imerso na minha própria tristeza que não vi quando alguém se aproximou por trás de mim.
- Está chorando por quê?
Pulei longe com o susto. Era o Zeca. Ele parecia intrigado e preocupado com meu estado. Também pudera...
- Desculpa, não queria te assustar.
- Não, tudo bem.
- Por que você está assim? Se machucou?
- Não, deixa pra lá. Não é nada.
- Como não é nada? Você está chorando. Sua vó mandou vir te buscar...
- Esquece, você não viu nada.
- Se não quer contar tudo bem. Eu te levo de volta para o casarão.
- Não precisa, eu sei o caminho.
Subi rapidamente na égua e saí dali.
Fui um pouco grosso com ele, mas não me preocupei com aquilo no momento. Depois eu me desculpava com ele. Ele não tinha culpa da péssima fase pela qual eu estava passando.
Disfarcei as minhas lágrimas para não ter que me explicar para a minha avó.
Almocei com ela e meu avô a famosa e deliciosa comida mineira.
Subi para meu quarto e rapidamente adormeci. Como lá sempre dormíamos cedo, só desci mais tarde para jantar. Tudo o que eu queria era dormir e esquecer os meus problemas.
Acordei mais tarde do que previa no dia seguinte. Desci a escada e encontrei minha avó na cozinha.
- Eita! Até que enfim você acordou!
- Acho que era sono acumulado.
- Deve ser. Já vou começar a fazer o almoço, mas guardei uma rosquinha pra você.
- Obrigado vó, vou comer no caminho. Vou até a cachoeira nadar um pouco.
- Tudo bem, mas não se atrase para o almoço.
- Pode deixar.
Fui ao estábulo pegar a Glória e me desculpar com Zeca pela grosseria do dia anterior, mas ele não estava lá. Apenas peguei a égua e segui para a cachoeira que ficava um pouco afastada do casarão.
Quando fui me aproximando ouvi o barulho da água caindo. Aquilo já ativava minha memória, mas segurei o choro. Já havia chorado demais. Amarrei Glória numa árvore próxima e fui para a cachoeira. Ouvi um barulho incomum na água, como se alguém estivesse nadando lá.
Me aproximei e vi roupas masculinas na beira da água. Me escondi atrás da mata e observei; tinha medo que fosse algum estranho.
Era o Zeca. E estava nu.
Meu pau quase pulou para fora da cueca quando constatei que era Zeca que estava nadando nu ali.
Fiquei assistindo aquilo tudo de longe. Seu corpo era musculoso, mas nada exagerado. Era lindo, a visão do paraíso. Seu peito era bem definido, sem pelos, com grandes mamilos rosados. Nas pernas haviam uns poucos pelos que subiam até a base da bunda. Sua bunda era grande e redonda, como a calça jeans justa já havia denunciado. Seu pinto era grande, mais escuro com sua pele, e tinha uma virilha com pelos que subiam ralos até o umbigo.
Era bem diferente de mim que não tinha nenhum pelo no meu corpo. Eu era totalmente liso.
Eu estava tão excitado que me desequilibrei e caí fazendo barulho, denunciando meu esconderijo.
- Quem está aí?