Na manhã seguinte, acordei já se a Nanda ao meu lado. Olhei em meu aparelho e vi as horas: 8:30. Levantei-me e não a vi no banheiro. Abri a porta e saí para o corredor, vendo que as meninas continuavam dormindo. Fui até a área social da casa e a ouvi conversando com alguém. Ela estava tão concentrada que não me viu à porta que separa as áreas. Poucas frases e já compreendi o porquê de não querer falar na minha presença.
[...]
[CONTINUANDO]
Meu tesão estava nas alturas e eu já tinha planejado tim-tim por tim-tim como eu arrancaria o couro do meu marido assim que estivéssemos a sós. Para apimentar um pouco mais nosso reencontro, decidi comprar umas “lembrancinhas” para ele que eu sabia que o fariam dar altas risadas antes dos “trabalhos”, propriamente ditos.
Meu fogo, entretanto, foi por água abaixo quando fui recebida por ele com um simples abraço e um beijo no rosto, tudo muito frio, seco, chato, nada do que eu esperava. Naturalmente, fiquei perdida, pois pensei que estivéssemos nos acertando e o meu tesão também fosse o dele. Piorou quando ele inventou aquela desculpinha esfarrapada de atender um cliente, num sábado, no meio da tarde. Qual é!? Nem a Mirian que é a mais inocente acreditaria nisso. Tá, ela acreditou, mas só porque confiava cegamente no pai, já eu não cairia nessa de forma alguma.
Liguei mesmo, cobrei mesmo e iria lá mesmo se ele não tivesse se comprometido a conversar comigo! O que é isso? Meu marido, meu homem, o amor da minha vida me esnobando!? Não aceito! Tudo bem que andei merecendo, mas eu vinha fazendo de tudo para voltar às boas com ele e sabia que não tinha feito nada de errado, nadica de nada mesmo!
Com o seu retorno, tentei me aproximar, mas a Mirian logo me fez abortar qualquer tentativa de diálogo. Ela queria porque queria cozinhar com ele e como gosta disso, acabei cedendo espaço, indo tomar um banho e cochilar um pouco. No início da noite, jantamos um delicioso frango assado com batatas no molho de cerveja, com arroz branco e salada simples de alface e tomate. Com o perdão da redundância, era um prato simplesmente simples, mas “bão demais da conta, sô”! Após isso e um arroz doce caseiro, entreguei alguns mimos para elas e um especial para ele, mas pedindo que ele abrisse depois, reservadamente. O Mark não é bobo e, com um sorrisinho besta, entendeu que envolvia safadeza, difícil foi despistar a nossa caçula, curiosa como a mãe.
Quando foram dormir e fui eu a encarregada de colocá-las na cama, o que fiz com muito prazer, voltei à sala e o flagrei olhando abismado para o seu presente. A cada calcinha que ele retirava de seu pacotinho, um sorriso novo se estampava em seu rosto, acompanhado sempre de diferentes expressões: “Uai!”, “Nu!”, “Caraaaalhu!”. Quando repousou a última calcinha no colo, olhando para a frente sem fechar a boca, aproximei-me e perguntei por que não havia aberto o último pacotinho:
- Hein!? Quatro? - Falou e voltou a procurar no embrulho, logo encontrando a última e mais safada das calcinhas, com uma biju na frente escrito “Foda-me!” e outra atrás escrito “Com Força!”.
- Nossinhora! Benza Deus, hein!? - Falou sem sequer olhar para mim.
Nessa última, o Mark deu uma risada de dar gosto, feliz com a brincadeira e eu aproveitando que não usava nenhuma, mas já estava com a camisola preta, peguei essa última de suas mãos e a vesti, desfilando frente e verso para ele. Daí para um beijo, foi um estalo; para uma nova garrafa de vinho, outro; e para uns amassos gostosos, nem preciso dizer…
Quando tudo se encaminhava para mais uma de nossas trepadas épicas, com ele entrando no papel de dominador que eu adoro tanto, chegando a me deixar molhada, eu pipoquei! Temi, falhei, broxei, eu, euzinha mesmo. Tive medo de continuar nossa brincadeira e falar algo que o desagradasse. Expliquei os meus motivos e ele não contestou. Acho que no fundo, ele também tinha algum receio.
Após algum tempo e como já tínhamos iniciado uma “DR”, entrei no assunto que me incomodava desde que cheguei: o motivo dele ter me recebido de forma tão estranha e fria. Ele não queria falar e tentou me enrolar por um tempão, mas quando a Nanda quer, Nanda consegue! Cutuquei, cutuquei e cutuquei até ele se abrir. Só que quando ele me contou que era por causa do doutor Galeano, gelei, já imaginando que o bom velhinho tivesse contado algum detalhe de nossas conversas que o tivesse desagradado. No final, quando ele me explicou o motivo de seu estado, fiquei aturdida e brava por ele tentar culpar o Mark por um erro que era meu. Decidi que falaria com o doutor Galeano no domingo de manhã, nem que eu tivesse que ir até sua casa para ser atendida.
Eu já tinha dado a noite por perdida, mas se tem algo que não posso negar é que o contato de pele entre eu e o Mark é um afrodisíaco dos melhores para nós, e se tiver um gostoso beijo de língua então!? Nu, daí é que o pau dele sobe o morro a galope mesmo! Fizemos um amorzinho gostoso, muito bom mesmo e gozamos bem forte, abraçados e aos beijos. Só depois dormimos: ele, até que rapidamente; eu, só um bom tempo depois e somente quando finalizei tudo o que queria conversar com o doutor Galeano.
Na manhã seguinte, antes de todos acordarem, apesar de já passar das 8:00, liguei para o doutor Galeano. Se ele estivesse dormindo, que se fodesse: ele mexeu com o meu marido e teria que me explicar o porquê. Velho filho da mãe! Não explicou:
- Bom dia, minha querida Fernandinha.
- Só se for para o senhor, né!? Que maluquice foi aquela que o senhor disse para o Mark? Ele tá perturbado até agora…
- Fernanda, isso é algo que eu gostaria de abordar com ele. Só acho que se ele mudar uma ou duas coisinhas na forma de agir, melhorará imensamente o relacionamento de vocês. Só isso!
- Mas melhorar o quê? O Mark nunca me fez nada e não quero que o senhor fique plantando minhoca na cabeça dele.
- Não é minhoca, minha cara e… Plantar minhoca!? - Disse e deu uma gargalhada alta: - Só você para me fazer rir de manhãzinha assim, Fernanda.
- O quê? - Perguntei por não ter visto graça alguma no que eu havia falado.
Ele riu mais um pouco e se explicou:
- Fica tranquila… Deixa eu conversar com ele e te garanto que ele te ajudará a terminar em grande estilo essa história com o Rick.
- Ara, que história o quê? Cê tá louco!? Eu já terminei com o Rick, ouviu? Tá tudo terminado! Ter-mi-na-do! Não tenho que acabar o que já acabou, e ponto final!
- Fernanda, minha querida, realmente eu não vou adiantar nada.
- O senhor só pode estar ficando gá-gá, doutor. - O interrompi, irada com a forma como falou do meu marido: - O Mark só está sendo protetor, exercendo o papel de um bom marido. Só isso!
- Ô, mineirinha complicada, sô! - Disse e deu uma gostosa risada: - Entenda, querida, toda história tem que ter um começo, meio e fim. A vida é assim: nascemos, vivemos e morremos! Só que você viveu uma história muito interessante e intensa com esse tal Rick, mas não teve a chance de terminá-la, e, de certa forma, de viver o luto para voltar ao Mark. Talvez você só precise terminar o que começou…
- Claro… que… não! Jesus, mas d’onde o senhor tirou isso!? Seria a ruína do meu casamento, homem do céu! Vou nem cogitar isso. Não e não! Esquece. - Mas tive um “insight” e o intimei: - Peraí! É sobre isso a conversa que o senhor quer ter com ele? Pode parar! Não quero que o senhor proponha isso para o Mark. Está me entendendo? O senhor está proibido de propor isso. Vou brigar com o senhor se fizer isso!
- E se essa for a única forma de você resgatar a plena confiança dele em você, hein? A sua única chance de tornar o Mark novamente seu, com o “plus” de resolver eventuais pendências com o Rick? Ou será que o seu sentimento por ele é tão forte que poria o seu casamento em risco?
- Não pode ser a única forma, não pode! Eu… - Pigarreei, tentando engolir o choro que anunciava chegar forte: - Tenho medo…
- Medo de se tornar confiável novamente ou medo de perdê-lo de vez? Eu penso que se você for, se resolver e voltar, terá comprovado para o Mark que ele não tem nada a temer.
- É! Eu… Eu entendo, mas tenho medo de, nesse processo, acabar cometendo um erro que faça a gente se perder de vez. Eu já fiz isso antes, mesmo sem querer…
- Fique calma! Eu ainda não expus para ele a minha teoria. Quero conversar com ele e sentir se existe abertura para algo nesse sentido. Venha me ver e conversaremos melhor. Talvez, até uma sessão conjunta entre vocês, o que acha? Quinta-feira, pode ser? Mas só será conjunta a depender da forma como ele receba e processe a minha teoria, está bem?
- Tudo bem! Vou na quinta, à tarde. Pode ser por volta das 14:00? - Calei-me e ele confirmou, então nos despedimos: - Tá bom. Beijo, doutor. Até mais.
Fiquei perdida em meus próprios pensamentos. A teoria dele não fazia sentido, certamente não faria para o Mark; para mim, então, era pior, pois eu tinha medo da forma como as coisas poderiam se desenrolar. Ouvi passos vindo em minha direção e ao me virar, Mark, estava se aproximando. Deu-me um bom dia, um beijo na boca e ficou me encarando, calado. Eu sabia o que ele queria:
- Falei com o doutor Galeano. Ele não me explicou tudo, mas parece que ele tem uma teoria que envolve, eu, você e o Rick. Não entendi direito, por isso não vou tentar te explicar, mas eu quero que você não se sinta obrigado a nada, entendeu? Você é o meu marido, eu sou a sua mulher e sei que a gente, juntos, pode resolver tudo. Não precisamos colocar mais ninguém nesse meio, principalmente o Rick.
- O que foi que ele te falou?
- Mark, por favor, eu não entendi mesmo. Ele tentou me explicar, mas… É tudo tão confuso… Prefiro que você converse com ele primeiro e depois a gente conversa, pode ser?
- Eu… Eu ouvi parte da sua conversa… - Falou, constrangido.
- Ouviu a parte em que eu recusei a ideia dele?
- Ouvi!
- Então… Converse com ele e se você confiar em mim, converse comigo. - Depois senti que o havia intimidado com a minha forma de falar e me expliquei: - Não se trata de confiar, desculpa, me expressei mal. Se você se sentir à vontade para partilhar, converse comigo. A gente pode se ajudar. Eu tenho certeza disso.
Ele me olhou com uma ternura que há tempos não tínhamos um com o outro e os meus olhos marejaram. Há tempos, eu não o sentia tão conectado comigo como ali, naquele instante. Acariciei seu rosto e beijei sua boca com uma ternura dos tempos do início de nosso relacionamento. Ele, após isso, me abraçou e não consegui conter uma lágrima fujona: não era de tristeza; não era de alegria; era de um medo ainda sem lugar no tempo e no espaço.
[...]
Não consegui ouvir toda a conversa entre a Nanda e o doutor Galeano, mas o que ouvi, dava conta de que o doutor tinha alguma teoria que envolvia o Rick como parte da solução de nossos problemas. Isso me deixava ainda mais em dúvida sobre o que ele havia me falado: insegurança, medo? Nada se encaixava… Nada! Minha conversa com a Nanda foi breve, pois eu não queria viver em função daquilo, então decidi pegá-la e as meninas para fazermos alguma atividade externa. Fomos passear no lago de nossa cidade. Depois almoçamos fora, fomos passear num parque, enfim, “batemos perna”, como se diz aqui em Minas, sem nos dar tempo de pensar em nada mais que não fosse aproveitar o momento. Voltamos para casa já com a noite caindo. Logo, as meninas foram para o banho e, cansadas, dormiram mais cedo. Nanda e eu evitamos tocar nos assuntos que nos afligiam.
Fingimos estar tudo bem e tivemos uma nova noite de amor, desta vez lenta, um papai e mamãe simples, apenas para podermos ficar olhos nos olhos, para que pudéssemos nos reconectar, nos sentir mais intensamente, só eu e ela. Há muito não via minha esposa gozar com lágrimas nos olhos.
Na segunda-feira, tomado por nossos compromissos, o dia passou rápido. A noite entrou célere e sucumbimos ao cansaço do labor. Não chegamos a transar.
Na terça, a rotina se repetiu, mas após o almoço, saí de viagem para a cidade do doutor Galeano. Cumpri a minha agenda de compromissos e dez minutos antes do horário combinado, lá estava eu sentado na saleta de recepção. Às 14:55, ele abriu a porta de seu consultório e se despediu de uma paciente, uma loira, madura e belíssima, talvez no auge de seus cinquenta anos. Ela esbanjava vitalidade e alegria. Ao passar por mim, deu-me um sorriso que não tive como não corresponder, mas ficamos só nisso. Ele então veio em minha direção e me recebeu com um abraço e, britanicamente, às 15:00, fechou a porta de seu consultório comigo dentro:
- Isso que é ser pontual! - Brinquei.
- Não gosto de atrasos, Mark. Eu acho um desrespeito você marcar um compromisso e não atender ou ser atendido no horário combinado.
- O senhor deveria experimentar ser advogado em dia de audiência. Já cheguei a ter que aturar mais de três horas de atraso de juiz...
- Quê!? Se sou eu, surtava. Dava um baita piti, nem que fosse para sair preso.
- Surtar com um juiz!? O senhor só pode estar brincando, né?
Ele me conduziu até a poltrona de atendimento e foi até sua máquina pegar dois cafés. Nossa intimidade era tanta que ele já não mais perguntava se eu queria, porque eu sempre aceitava. Serviu-me e se sentou à minha frente. Bebemos duas goladas, em silêncio, olhando um para o outro e eu o intimei:
- Tá! Explica direito essa história.
- Pois bem… Mas vamos por partes, ok? Destrinchando o frango mesmo… - Deu uma longa cheirada em sua xícara, curtindo o aroma, depois olhou rapidamente por cima do meu ombro e me encarou: - Você ama sua mulher, Mark?
- Uai, claro… Claro que sim! Que pergunta é essa?
- Calma! Vamos chegar lá. E ela ama você, não ama?
- Bem, eu… Doutor, essa é uma pergunta que o senhor deveria fazer para ela, não é? Eu acredito que sim! Mas só ela poderia responder isso com certeza.
- Sim, é claro, mas pela nossa experiência e convivência com ela, acho que podemos inferir que ela te ama, não podemos?
- Sim, eu… é… Sim!
- Tá… Será que ela tem medo de te perder por tudo o que aconteceu recentemente, influenciada ou não pelo tal Rick?
- Uai… Acredito que sim também. Pelo menos, ela já disse isso várias vezes pra mim.
- Aham… - Resmungou, fez uma pausa, tomando um novo gole, e me encarou: - E você, tem medo de perdê-la?
- Uai, doutor, não sei se é medo, mas é claro que eu não gostaria disso. Amo a minha mulher, temos uma vida em comum, família, filhas, história, bens... - Respondi e o encarei mais sério ainda: - Continuo sem entender onde o senhor quer chegar?
- Calma, homem, calma… Chegaremos lá! Eu só quero ir bem devagar para você ir juntando os argumentos, montando o quebra-cabeça, entende? - Falou e virou a sua xícara de café: - Mark, você se considera um homem liberal?
- Doutor Galeano, vamos parar de fazer firula e ser mais objetivo, vamos!? O que o senhor quer afinal? O senhor conhece a nossa história, sabe como ninguém tudo o que já passamos e conhece o nosso estilo de vida. Por que o senhor está rodeando tanto?
- Claro que eu conheço e, por isso, cheguei a uma conclusão, uma teoria, que espero que você também alcance. Só, por favor, responda a minha pergunta, ok?
Eu já estava ficando cansado daquele papo, mas, curioso, resolvi colaborar:
- Sim. Sou um homem liberal.
- E ela?
- Também, sô!
- Qual é a premissa de um casal que vive um relacionamento liberal, Mark?
- Varia de casal para casal…
- Mesmo!? Mas não há nada em comum a todos? Ou será que você está tentando fugir da resposta?
- E por que eu faria isso? - Perguntei, mas ele não se deixou abater e ficou me aguardando: - Doutor, eu penso que a base comum é deles ou uma das partes poderem se relacionar com outras pessoas, que sejam de fora do relacionamento. Independente das regras que cada casal crie, o objetivo me parece que é esse.
- Ahhhh… Isso, isso, isso, isso… - Falou, cruzando os dedos das mãos e batendo um dedão no outro, introspectivo: - A Fernanda, nesse caso que teve com o Rick, fugiu ao combinado entre vocês?
- A princípio, não.
- Por que “a princípio, não”? Explique, por favor.
- Porque, como uma mulher liberal e ainda liberada por mim para interagir com ele, teve o tal caso. Então, por isso não. - Virei a minha xícara de café e o encarei: - Só que temos uma regra, talvez a maior, que é não deixar que a nossa vida liberal prejudique nossa família. Então, eu acho que, quando o Rick tentou roubá-la de mim e ela não terminou com ele nesse momento, ela, indiretamente, acabou fazendo isso, colocando nossa família em risco.
- Ok… Ok… Mas calma lá! - Falou, ajeitando-se em sua poltrona e agora batendo o indicador esquerdo sobre os lábios, pensativo, mas retornando a me encarar: - Você a culpa por isso?
- Não sei se é exatamente culpá-la, mas ficou uma coisa estranha entre a gente…
- Ahamm… - Concordou com um leve meneio de cabeça: - Você acredita que a Fernanda errou ao se apaixonar pelo Rick?
- Ela falou isso para o senhor, que está apaixonada pelo Rick!? - Perguntei, meio surpreso com a pergunta.
- Não, não falou, mas Mark, vamos ser sinceros aqui, falando de um homem bem maduro para um homem maduro: você sabe que ela se apaixonou por ele, não sabe? Seja sincero, não tenha medo, porque tudo o que estamos conversando ficará somente entre nós, ok?
- Doutor, eu não posso falar por ela. Para mim, em nossa última conversa sobre esse tema, ela me disse apenas que gosta dele e… - Calei-me lembrando de um detalhe na conversa que tive com ela.
- Talvez o quê, Mark? Compartilhe!
- Nós tivemos uma conversa antes dela viajar para São Paulo e ela me contou, meio que por cima, o que vocês conversaram aqui. Só que ela frisou bastante para mim que apenas gostava do Rick, que talvez até tivesse se apaixonado, mas que passou e se não tivesse passado, passaria…
- Olha… Para mim está bastante claro que não passou e que ela usou o verbo “gostar” apenas para relativizar a paixão que sente por ele, mas não se engane: ela ainda está apaixonada por esse rapaz.
- Tá, mas… Doutor, eu estou ficando confuso. Por que tudo isso? De que adianta eu saber se ela está ou não apaixonada pelo filho da… - Calei-me antes da língua me derrubar, respirei fundo e continuei: - Por aquele lá?
- Já, já, chegaremos nisso, só não me deixa perder a minha linha de raciocínio. Qual é mesmo?... Ah, é! Vou perguntar novamente: você acha que a Fernanda errou ao se apaixonar pelo Rick?
- Eu não acho que ela tenha procurado se apaixonar, só aconteceu.
- Isso! Um sentimento. Nasce do nada, cresce por pouco, floresce para muitos e, às vezes, morre também do nada…
- Tudo isso para o senhor me falar que ela não me ama mais? - Perguntei, tentando antecipar onde eu achei que ele pretendia chegar.
- De forma alguma, meu caro Mark, eu nunca falei ou sugeri isso! Ela te ama demais, imensamente, de uma forma única, quase devocional, mas ela está presa numa dicotomia contraditória, pois precisa se negar um sentimento para não desagradar um e para não dar falsas esperanças para outro. Você entende isso?
- Nu! Ainda bem que eu fiz direito… - Falei e sorri nervoso com o rumo daquela prosa: - Não tô entendendo muito bem não.
- Já vai entender, fica calmo. Mais uma pergunta então… Você hoje, confia plenamente na Fernanda? Digo, por exemplo, se ela quiser sair para uma “baladinha” sem você, você concordaria, sem qualquer receio?
Eu não respondi de imediato, olhando para o meu lado esquerdo, enquanto tentava formular uma resposta, mas acho que a minha expressão facial respondeu por mim, tanto que ele próprio se adiantou:
- Eureca! Foi o que pensei… - Só então notei que ele me encarava avidamente, quase debruçando em minha direção sobre os próprios joelhos: - Mark, para mim está muito claro que ela se ressente de ter se apaixonado pelo Rick, algo que ela não pode controlar, o que piorou quando você se envolveu nessa história.
Eu o encarava em dúvida, mas ele não se deixou abalar:
- Nasceu e cresceu vertiginosamente, acho que nem mesmo eles esperavam tanto. Só que não tiveram a chance de vivê-lo e vê-lo florescer ou morrer. Aliás, quando você se envolveu, retirando dela a palavra final, acabou subjugando-a e isso fez um mal terrível para ela e para você também: para ela, porque atingiu sua autoestima; e para você, porque abalou a confiança que você depositava nela.
- Mas eu nunca falei isso para ela…
- Talvez não diretamente, mas ela é mulher, ela sente isso e está totalmente perdida, sem saber como a história dela com o Rick se resolveria e também sem saber como recuperar a sua confiança, cumplicidade e o próprio amor de ambos, que ficou abalado, e você não imagina o quanto isso tem feito mal para ela.
- Nu! Doutor, o que é isso!? - Eu o encarava perdido e tentava compreender: - Tá… Acho que estou entendendo... Recuperando a confiança, restabelecemos nossa cumplicidade que irá fortalecer novamente os nossos laços, é isso?
- Isso!
- Ok! Ótimo, lindo, maravilhoso mesmo, doutor, mas como fazemos isso? Pensa bem, eu não vejo como ela possa resolver as duas situações: para ela se acertar comigo, deverá se afastar definitivamente do Rick, mas para ela se resolver com ele, nunca conseguirá se resolver comigo. Não tem jeito!
- Essa é a parte complicada… - Ele falou, fazendo um bico com os lábios e entendi que, se antes não fora fácil, dali em diante, seria uma pauleira total: - “Nunca conseguirá” foi uma péssima expressão, Mark… Olha, acho que para vocês conseguirem derrubar de vez esse muro que foi criado entre vocês, você e somente você terá que superar a sua própria insegurança…
- Insegurança! Mas que raio de insegurança é essa? Insegurança de que?
- De que pode perdê-la para o Rick durante esse processo…
OS NOMES UTILIZADOS NESTE CONTO SÃO FICTÍCIOS, MAS OS FATOS MENCIONADOS E EVENTUAIS SEMELHANÇAS COM A VIDA REAL PODEM NAO SER MERA COINCIDÊNCIA.
FICA PROIBIDA A CÓPIA, REPRODUÇÃO E/OU EXIBIÇÃO FORA DO “CASA DOS CONTOS” SEM A EXPRESSA PERMISSÃO DO AUTOR, SOB AS PENAS DA LEI.