Não dormi nada bem noite passada, então cheguei doida para descansar os olhos. Sem conseguir pegar no sono, fui olhar o whatsapp, abri a conversa com Júlia para ver se estava online e percebi que estava sem foto, não aparecia nenhuma informação do contato. Eu tinha sido bloqueada.
O final de semana passou lento e eu passei sem levantar da cama, apenas tomando os analgésicos, ansiolíticos e dormindo. Na noite de domingo, precisei levantar para melhorar minha situação, afinal minha filha chegaria e eu não queria que ela me visse daquela maneira. Tomei um banho, tirei um pouco a bota, a situação ainda estava feia. Já estava aguardando Mih quando Loren me liga...
- Irmã, estamos aqui com Milena e a avó dela que falar contigo - disse Loren
- Oi, Lore. Tudo bem? Perguntou a avó paterna de Milena
- Oi, tudo bem sim - menti - e com a senhora?
- Tudo bem também. Queria falar com você porque quarta-feira é o meu aniversário e eu queria passar com minha neta.
Respirei fundo me preparando para responde-la mas ela continuou
- Eu sei que você e meu filho não estão nos melhores dias, mas eu prometo a você que ela estará segura sobre minha supervisão. Se seus irmãos quiserem ficar também serão bem-vindos, mas por favor, deixa Mimi passar esse aniversário comigo. Não estou tão bem de saúde, temo que seja o último que festejarei aqui na terra...
Aí ela jogou baixo, me desmontou inteira
- Annn, tá bom então. Vou avisar a escola para enviar as atividades e peço que ajudem ela.
- Muito obrigada pela compreensão, não vou esquecer disso!
- A velha está morrendo? Me perguntou Loren de repente
- Não sei, parece não estar bem... Respondi
- O que houver com você? Que voz é essa?
- Acho que minha garganta vai inflamar - respondi mentindo
- E aí? Como foi com Júlia? Perguntou
Pqp, tinha que tocar nesse nome... Senti até uma pontada no coração, as lágrimas vieram aos olhos, mas me concentrei em responder da forma mais normal possível
- Foi ótimo, você nem imagina o quanto - não era mentira tinha sido ótimo mesmo até a discussão - Vou desligar, preciso tomar um banho, bjs
- Tá bom, bjs - respondeu em um tom desconfiado
A campainha tocou e imediatamente minha cabeça só pensou em um nome: Júlia! Mas foi um funcionário entregando um convite para o aniversário de 10 anos do condomínio na terça-feira.
Na segunda-feira pela manhã, quando estava entrando no carro para ir a escola solicitar o envio das atividades, avistei uma pessoa conhecida...
- Victor???? O que está fazendo aqui??? Perguntei
- Então, você tem uma irmã fofoqueira que me mandou aqui para investigar o que tinha acontecido. Estava até agora na casa de Júlia sabendo do arerê de vocês.
Nesse momento, Júlia saiu de casa e entrou em um carro. Provavelmente, indo trabalhar.
- Esqueceu de me bloquear na rua do condomínio - falou Victor rindo - Tá indo pra onde? Bora que eu dirijo enquanto escuto sua versão
- Pra escola - respondi tentando raciocinar a loucura que estava acontecendo (coloquei o endereço no gps)
- Seu pé piorou? Me perguntou
- Torci de novo, na sexta-feira
- Que azar, em
- Loren é louca, ela te mandou aqui só para isso??? Falei
- Ela se preocupa, do jeito dela - defendeu
- E você veio?????
- Ah, ela foi trabalhar e eu estava sem fazer nada... Pensei que mal não iria fazer - Por que a gente tá indo pra escola se Milena não tá aqui?
- As atividades, preciso solicitar o envio - respondi
- Desculpa perguntar, mas você usa maconha?
Me assustei com a pergunta: - QUÊ?? NÃO!
- É que você está toda brisada aí, sei lá... Foi mal
- Eu estou tomando muitos remédios só isso - expliquei
- Vocês vão ficar bem - tocou no meu ombro - Vocês se amam...
- Espero que sim... Deixei escapar sem nem pensar no que estava falando
Quando chegamos, fui falar com a professora sobre as atividades de Milena e ela pediu o que eu já imaginava, que eu passasse o número de contato para Júlia... Suspirei fundo e fui. - Bom dia! Minha filha Milena do 2° A precisa receber as atividades em outro número.
- Bom dia, qual o número a senhora deseja que ela receba?
Falei o número do pai dela e agradeci. Saindo eu só pensava em uma coisa... "Já esfreguei a periquita dessa mulher em minha cara e agora a gente se trata assim???"
Na volta para casa depois de um bom tempo em silêncio, Victor me perguntou: - Você não vai me contar a sua versão?
- Eu chamei Júlia para morar comigo, ela disse que já estava sendo arriscado eu lá enquanto ela cuidava de mim e que só estava fazendo esse favor porque era o único jeito - Falei de uma vez
- Nossa... É...
- Não precisa dizer nada - eu disse
Cheguei em casa e nos despedimos, agradeci por ele ter dirigido seria uma tarefa arriscada e difícil com o pé daquele jeito e pedi: - Por favor, não deixa Loren me enlouquecer
- Olha... Ela vai querer saber cada palavra que trocamos, mas eu vou tentar
- Vocês estão se dando bem, né? Nem perguntei mas parece que sim
- Estou vivendo um sonho, e espero nunca acordar...
- Que bom, cunhado - falei forçando um sorriso
- Agora vou indo, e vocês... tenham juízo e se resolvam logo
Depois de dias, fiz minha primeira refeição, não foi nada saudável, mas pelo menos estava ingerindo algo. Tomei meus remédios e apaguei, só acordei no outro dia, quando peguei meu celular QUARENTA E CINCO LIGAÇÕES PERDIDAS, todas de Loren.
Liguei para ela já esperando um surto
- Oi, me ligou?
- Se eu te liguei? Eu quase apareci aí! Por que não me atendeu?
- Eu dormi - fui franca, sem me importar muito
- Lore, por acaso você está se dopando? Me perguntou
- Acho que sim...
- Irmã... Dormir não vai resolver seus problemas com Júlia
- Eu sei
- Quer que eu vá aí?
- Não, não precisa
- Quer que eu ligue para ela?
- Nem pensar!
- O que quer que eu faça para te ajudar?
- Nada, tudo vai se resolver... De uma maneira ou de outra!
- Tá bom então...
- E outra coisa, para de mandar seu investigador atrás de mim!
- Hahaha, ele foi ótimo e ainda dirigiu pra você... Devia me agradecer
- Irmã, vou desligar... Obrigada por se intrometer em minha vida... Bjs!
- É sempre um prazer, beijinhos
A casa estava uma bagunça e eu resolvi fazer uma faxina. Coloquei o som no talo e mancando de um lado para o outro fui encontrando diversas coisas que me lembravam Júlia... Roupas dela, bilhetinhos que ela deixava no espelho, até peças minhas com o cheiro dela... Não só o perfume mas também o cheiro da pele.
Doía o peito lembrar dos nossos momentos fofos ou sensuais, minhas lágrimas transbordavam os olhos. Será que não era mesmo melhor eu dormir?
Resolvi pegar um ar, espairecer... Mas eu estava sem sorte!
Sentei em um banco da pracinha e vi Júlia chegando com um cara... Pareciam íntimos, eles riam, ele passava a mão no cabelo dela e subiram para o ap. Toda a minha melancolia se transformou em raiva!
Entrei novamente em casa e avistei o convite do condomínio jogado, ali que eu iria afogar minha mágoa.
Quando deu o horário, saí muito bem arrumada. Usei um vestido preto bem apertado, sem alças e fiz uma maquiagem bem básica mas com um batom bem vermelho. O look só não estava melhor por causa da maldita bota.
Sentei no bar, da festa e comecei a virar doses de vodka até que uma mulher, muito bonita por sinal, sentou ao meu lado. Me cumprimentou e começou a puxar assunto. O nome dela era Caroline, e bem discretamente, ela parecia flertar comigo. Eu estava sem um pingo de paciência para isso. Sentei ali para beber até esquecer meu nome, mas conversamos bastante. Ela perguntou sobre o meu pé, expliquei toda a situação e ela falou que era ortopedista e pediu para olhar. Eu deixei... Ela tirou a bota e mexia, pressionava. Levantei a cabeça e pude ver Júlia do outro lado, com o mesmo cara de mais cedo observando Caroline examinando meu pé. Assim que percebeu que eu a via, mudou a direção do olhar...
- Meu patrão, desce mais 3 doses, por favor - pedi ao garçom
- Agora que me toquei, você tá tomando remédio e bebendo???? - Perguntou Caroline pondo meu pé de volta na bota
- Eu estou há dias tomando remédios e não melhora, hoje resolvi me curar na cachaça
- Você não quer que eu tente cuidar de você de outra maneira? - Se arriscou sorrindo
- Drª, qual o seu nome mesmo? Perguntei
- Caroline - Ela respondeu
- Caroline, você é linda, não me entenda mal... Mas tá vendo aquela mulher ali - apontei para Júlia - ela é dona de cada pensamento, desejo ou aspiração minha.
- Primeiro fora que eu levo na vida, acredita?! Disse rindo
- Desculpa, hoje foi um péssimo dia...
- Pega leve na bebida, ela não tem culpa - disse saindo para a pista
- Obrigada pelo conselho!
- E sobre o seu pé, repousa e faz as fisioterapias que seu médico passou urgentemente ou você vai ficar uns três meses assim...
- Valeu, de verdade, Drª - agradeci
Voltei o olhar para Júlia e agora ela dançava com o seu novo par, parecia feliz... Talvez a melhor opção seria voltar para casa. Apesar de beber bastante, eu não estava bêbada, nem isso eu consegui naquela noite.
No meio do caminho, os dois passavam por mim, ao chegar na frente do ap dela, eles se despediram. Ele foi embora e Júlia tentava abrir a sua portaria, pois estavam todos os funcionários também na festa.
- Quer ajuda? Perguntei
- Não precisa, obrigada!
Peguei as chaves das mãos dela e rapidamente abri
- Posso levar minhas coisas que estão aí? Improvisei
- Agora? Vou precisar arrumar
- Eu espero
Subimos no elevador em um silêncio super constrangedor, sentei no sofá para esperar e meus pensamentos estavam embaralhados tentando achar um jeito de falar algo. Ela voltou com tudo que era meu ensacado e me entregou.
- Então é assim que a gente termina? Me perguntou
- Você quer terminar? Perguntei
- Você já arranjou outra pessoa, fala a verdade - me confrontou
- Eu? Você que estava agarrada com um macho lá na festa, até em sua casa ele estava hoje
- E você com uma mulher! - Se defendeu - Você pode flertar a vontade e eu tenho assentir?
- Eu não flertei com ninguém, apenas fui educada conversando com quem estava bebendo ali ao contrário de você
- Você nem se quer tentou! Eu fui até você, no mesmo dia e com certeza você já estava nos braços de uma puta se consolando - gritou
- Seu mal é esse, Júlia. Você não procura saber dos fatos. Eu torci o pé, novamente, assim que cheguei em casa. E no outro dia quando entrei no whatsapp, eu estava bloqueada.
- Eu... não... sabia... - falou lentamente
- E mesmo assim, não perdeu tempo para encontrar outra pessoa - gritei também
- ELE É MEU PRIMO - disse ela em seguida - O primo gay que a família isola. Eu estava pedindo conselhos de como falar para meus pais. Está satisfeita? Parece que eu não sou a única que acusa sem saber dos fatos!
Agora eu estava sem palavras, meu peito inflava mas o ar não parecia vir. Comecei a chorar, com a cabeça baixa e ela se sentou ao meu lado, também chorando.
- Você quer terminar? Júlia me perguntou
- Não - respondi - E você, quer?
- Não - e encostou a cabeça no meu ombro
Passei o braço por trás dela
- É melhor voltarmos a raiz do problema... - Por que você não quer morar comigo? Perguntei
- Só vou morar contigo quando tudo estiver as claras para minha família - disse enfática - eu me expressei muito mal naquela noite, por isso pesso desculpa. Eu quis dizer que acho muito difícil meus pais, que moram muito próximos daqui, não ficarem sabendo que a filha deles vive com outra mulher. E você e Mih aqui, naquele momento, era a melhor coisa que poderíamos fazer para você ficar bem e ela não perder aulas.
- Eu também errei em sair disparada para casa, deveríamos ter conversado naquele instante. Pouparia muitas dores de cabeça...
- Senti sua falta, gatinha - falei abraçando-a
- Você nem imagina o quanto eu senti a sua - e me beijou
- Quero refazer meu pedido da aposta, posso?
- Pode, amor, por favor
- Nunca mais vamos brigar e ficar sem se falar. Tudo tem que ser resolvido no mesmo dia, antes da gente ir dormir. Fechado?
- Fechado - e pulou no meu colo para um beijo mais longo
Como era bom ter Júlia ali tão perto novamente, nos meus braços...
- Que saudade do seu beijo amor - falei e voltei a beija-la
- Você pode dormir comigo hoje? Me perguntou
- Eu dormiria com você todos os dias se eu pudesse - respondi
- Acho que quero contar aos meus pais - falou
- Sem pressão? Perguntei
- Sem pressão. Eu só vou conseguir desenvolver nossa vida quando fizer isso. Você já foi paciente demais até...
- Amor, eu sei que os últimos dias não pareceu assim, mas eu não quero que você tome uma atitude tão séria achando que se não fizer isso eu vou largar sua mão... Porque eu não vou! Claro que eu quero que você abra o jogo para meus sogros mas faça isso quando se achar pronta, tá bom?
- Te prometo que não vai demorar muito - disse o meu amor
Juh dormiu primeiro, eu fazia carinho nos seus cabelos e apreciava seus rosto tão próximo ao meu. Ali, naquele instante eu prometi a mim mesmo que nunca mais deixaria aquela mulher.
- Eu te amo tanto, Júlia... - Falei mesmo sabendo que ela não ouviria