Senti uma movimentação na cama e acordei, eram umas 2h, Juh estava sentada. Sabia que ela estava nervosa porque pela manhã iríamos até a casa dos seus pais e ela teria uma conversa difícil mas necessária. Eu nunca precisei passar por isso, mas sei que é a realidade de muitas meninas por aí. Comigo foi simples, meus pais sempre viram eu beijando amigas e quando eles chegaram na minha casa e eu apresentei uma garota, não foi nenhum susto. Mas eu sei que fui privilegiada nesse aspecto, e o fato deles terem a mente aberta, de entender que ali é só amor, me favoreceu muito. Tenho completa noção de que essa benção infelizmente não ocorre em todos os lares, e era o caso da minha gatinha.
Ainda deitada, estiquei meu braço para ela, que se acomodou novamente ao meu lado.
- O que você tá sentindo, amor? Perguntei colocando seus cabelos para trás da orelha
- Não sei, acho que estou nervosa, ansiosa... Uma mistura de coisas, quero falar logo mas não quero que amanhã chegue
- Você já sabe como quer falar com eles?
- Quero sentar com você de frente para eles, falar de uma vez e sair de lá o mais rápido possível
- Eu acho que não vai ser rápido - disse dando um cheirinho no pescoço dela
- É, eu também não... - Concordou comigo
- E se eu fizer uma massagem pra você relaxar o corpo e tentar dormir? Perguntei
- Massagem, massagem, não é? Perguntou rindo
- Não vou fazer nada erótico, hahahaha - falei
Peguei um óleo essencial de lavanda e passei em suas têmporas, massageando bem de leve, coloquei algumas gotas no umidificador também. Depois peguei um óleo para pele e passei pelo seu corpo, pressionando, apertando as tensões, fiz isso por toda sua estrutura e quando fui verificar, ela já dormia. Deitei novamente e também caí no sono.
Já a caminho da casa dos meus sogros eu só ficava torcendo no pensamento para eles não serem tão cruéis com Júlia. Ela, aparentava estar melhor do que de madrugada, colocou as músicas que ela gosta bem alto no carro para ir cantando a plenos pulmões. Acho que foi uma boa tática, depois ela me disse que foi sugestão da terapeuta.
- Finalmente suas musiquinhas de jovem serviram pra alguma coisa, môh - falei zoando porque nosso gosto musical é bem distinto e nós alopramos uma a outra com isso
- As suas de velhos não tem esse poder - jogou de volta
E ri chamando para um beijinho
Chegando lá, ficamos uns 10 min dentro do carro, apenas em silêncio, ela com os olhos fechados, eu fazia um carinho na sua coxa e apenas aguardava ela estar pronta.
- Me dá um beijo de boa sorte - pediu rompendo o silêncio
- Claro, amor - e dei um beijão, bem gostoso para encher ela de energia kkkk
Descemos, a mãe dela se surpreendeu vendo a gente lá mas ficou muito feliz, logo o pai dela surgiu também e Juh falou que precisavam ter uma conversa séria sobre algo importante. Visivelmente ficaram preocupados e a chamaram para o escritório, onde o diálogo seria mais reservado. Júlia segurou minha mão e fomos.
- Eu estou com muito medo do que pode acontecer depois dessa conversa porque eu amo muito vocês... - começou a dizer Juh, suas mãos estavam um pouco molhadas de suor e bem frias, eu fazia um carinho bem discreto - esse tempo morando sozinha, descobri muitas coisas sobre mim que eu não sabia, conheci muita gente nova também, entre elas Lore. Ela é muito especial, cuida muito de mim, me encoraja a ser mais e... me ama! Eu também a amo e nós estamos namorando.
- O QUÊ? EU NÃO ACREDITO NISSO! - gritou minha sogra
- Mãe, calma deixa eu...
- CALMA? VOCÊ QUER QUE EU TENHA CALMA? - interrompeu ela levantando - SATANÁS ESTÁ TE USANDO, MINHA FILHA. ISSO NÃO É COISA DE DEUS!
- Pai... - falou Juh olhando para ele que se mantinha sentado
E o meu sogro não dizia nada, apenas tinha um olhar triste
- A CULPA É SUA! - apontou a mãe de Juh pra mim - ANTES DE VOCÊ, MINHA FILHA NÃO ERA ASSIM, ELA SEMPRE SE RELACIONOU CORRETAMENTE, NORMAL!
- D. Jacira, a única coisa que fiz para sua filha foi dar todo meu amor
- VOCÊ DEVERIA TER VERGONHA, VOCÊ TEM UMA FILHA! COMO VAI EXPLICAR ESSA ANORMALIDADE PARA ELA????
- Ela entendeu melhor do que a senhora - disse Juh, em um tom triste
- VOCÊ NÃO VAI VOLTAR PARA LÁ! - decretou
- Bom, eu vim tentar conversar em paz, sabia que seria difícil mas não ia conseguir viver em paz escondendo isso de vocês, sendo alguém em público que claramente não sou. A verdade é que eu precisava dessa liberdade para viver o meu amor. Tenho clara noção que o nosso relacionamento não tem nada de errado, nós somos felizes e já somos uma família... Espero que um dia vocês entendam que eu só estou me permitindo amar... Agora vou indo - e levantou
A mãe dela pediu para esperar e saiu do escritório, Sr. José continuava mudo e sentado olhando para a gente
- Pai, o senhor quer dizer algo??? - Perguntou Juh mas ele só acenou com a cabeça que não
Alguns minutos depois volta D. Jacira com o padre, Juh ficou desacreditada, minha sogra pediu para eles dois conversarem a sós e saímos.
- Você... Você fez isso com Júlia, ela não era assim, a culpa é sua! Eu confiei em você, deixei você e sua família em baixo do meu teto, cuidei bem da sua filha e você faz isso com a minha!
- A pessoa que a senhora conheceu ali, é uma pessoa ruim? Aquela família que esteve aqui, são pessoas ruins? Tudo aquilo de bom que a senhora viu que somos, nós somos para Juh... Eu sinto muito por amar sua filha, é o que a senhora quer que eu diga??? - falei tentando ser paciente
Ela agora ficou em silêncio que só foi quebrado quando Júlia saiu com o Padre, diretamente para meus braços
- Aqui na minha casa não, soltem-se - decretou minha sogra
- E aí, padre, convenceu ela? Falou que essa prática leva ao inferno?
- Calma, calma... Vamos nos sentar um pouco - Pediu o padre
- D. Jacira, a senhora ama a sua filha não, é? - Perguntou o padre
- Amo, claro, por mim ela não tinha saído de perto de mim, mas o pai dela achou que era de bom tom... Aí no que deu
- Não a nada a fazer, ela escolheu o rumo da vida dela. A senhora vai ter que aprender a respeitar, aceitar e continuar amando. É a vida dela...
Me surpreendi pois estava esperando um exorcismo
D. Jacira saiu e foi para o seu quarto, o padre se despediu da gente pois estava bastante ocupado, só veio até a pousada pois D. Jacira chegou lá na igreja desesperada
- Pai - tentou Juh novamente mas dessa vez tentando abraça-lo, não foi correspondida, ele apenas andou para o quarto se juntando a sua mulher
Abracei Júlia, o coração dela disparado, somente agora suas lágrimas saíram
- Você foi muito forte, amor - dei um cheirinho no seu pescoço - Vai ficar tudo bem, tá?!
- Eu estou me sentindo bem, apesar de tudo... Sabia que seria assim...
- Eu te amo, meu amor - falei
- Eu também te amo, amor - e me deu um selinho - Vamos?
- Vamos!
No caminho ela veio me contando o que o padre conversou. Falou que não sabia muito bem porque tinha sido chamado, que a única coisa que poderia fazer era acolhe-la
- Legal, né? Da parte dele, não esperava
- Eu também não, achei que ia ser um porre...
Quando chegamos perto de casa, comecei a pensar que estava cheia de gente e talvez não fosse o que Juh quisesse naquele momento.
- Môh, lá em casa tá cheio de gente, prefere ir para outro lugar mais calmo, com mais silêncio?
- Não, quero ir para nossa casa, para nossa família, para nossa bagunça, para nosso caos!
Fiquei tão feliz com a resposta, principalmente pelo "nossa casa" e o "nossa família".
Entrei no nosso condomínio e estacionei, enchi ela de beijos, conseguia ver seu sorriso lindo. Apesar de tudo, ela estava leve e feliz.
- Antes da gente entrar, dá uma olhada no Instagram - disse Juh
Quando verifiquei, ela tinha postado diversas fotos nossas, de diferentes momentos com uma musiquinha jovem do cantor preferido dela e a legenda: "Permita-se ao amor".
Aí entrarmos em casa, todos falavam sobre a postagem, estavam felizes por nós, era perceptível!
Foi um dia bem feliz!