O celular tocou uma notificação de mensagem de texto quase no fim do dia
“Dani, você vem né?”
A mensagem era do amigo Rodrigo que Dani havia feito recentemente no trabalho, era um homem gay afeminado, muito divertido que logo se aproximou de Danielle pela proximidade do tema LGBT.
“Não sei querido, tô meio cansada” — Danielle respondeu a mensagem num tom desanimado
“Ah não, levanta esse rabo aí da cadeira e vem, vai ter bastante gente aqui e você tá nessa fossa aí faz tempo, chega” — Rodrigo disse num tom autoritário
“Vou pensar” — Danielle respondeu desanimada
O telefone tocou, era Rodrigo chamando
Danielle revirou os olhos e atendeu
— Alô — Falou num tom sereno
— Pode parar de putaria mulher, levanta esse rabo, faz um reboco nessa carranca, coloca uma roupitcha sexy e vem que vai estar cheio de gente aqui, eu vou te apresentar uns carinhas
— Ah, Rô, não tô afim não — Danielle respondeu — Hoje de manhã tive uma consulta com a psicóloga que me deixou meio down, não dormi bem a noite
— Melhor ainda, aí você arruma isso, qual a alternativa? Vai ficar enchendo a pança de salgadinho e refrigerante? — Falou num tom divertido
Danielle olhou para o saco de batata frita Pringles e os refrigerantes que havia comprado, era como se ele tivesse adivinhado
— Tem um cara Dani que eu acho que é seu número, eu vou fazer a cupida pra você — Rodrigo falou com uma voz fina
— Cupida? — Danielle perguntou sem entender
— Cupido, só que bem bicha! — Ele falou divertido
Danielle riu
— Entendi — Falou sorridente
— Vai, falei pra ele que você vinha, ele tá ansioso — Rodrigo disse
— Ah meu, sério que você falou isso pro cara? Tá brincando né? — Danielle disse contrariada
— Falei tudinho, falei que você é a maior gatinha, que é trans, que tem bundão, que vai tirar essa cara de macho, que é doida das ideias — Rodrigo disse sério
— Você falou o que? — Danielle disse indignada
Rodrigo deu uma gargalhada
— Eu só falei o essencial, vem, não fica aí não, tô com saudade da gente beber e trocar uma ideia — Falou animado — Vem, vem, vem — Ele falou repetidamente
— Ah, tá bom eu vou sim
— Promete? — Rodrigo disse animado
— Prometo — Danielle respondeu
— Jura em nome do seu Jesus? — Rodrigo disse animado
— Rô, já te falei, não brinca — Danielle o repreendeu
— Tá bom sua chata, vou te esperar então, beijinho — Falou e desligou sem esperar Danielle responder.
Ela terminou o expediente e se deitou na cama.
Morava sozinha na casa do seu tio, anteriormente morava numa casa menor no mesmo quintal, mas ele havia falecido seis meses antes e ela havia herdado tudo o que era dele, isso era uma confusão que a família dela ainda estava em cima.
Olhou para o teto
— Vou ou não vou? — Falou pensativa — Não tô afim de namorar ninguém, odeio ter que conhecer, falar…aff — falou para si mesma, ela costumava falar sozinha
Depois de muito tempo resolveu se mexer, levantou-se e foi tomar um banho, retocou sua depilação higiênica básica, passou creme no corpo e vestiu uma saia longa, preta com riscas brancas, usou uma botinha e um top azul marinho, justo com seu sutiã com enchimento.
Colocou seus brincos de ouro com cruzes delicadas. Olhou-se no espelho, sua expressão estava marcada, triste, havia chorado na noite anterior, as olheiras profundas
— É Dani, vai precisar de massa corrida aqui — Falou pegando a maquiagem mais pesada
Quase quarenta minutos depois ela estava pronta. Olhou na tela do computador, estava olhando um telescópio, queria comprar
— Vou te buscar amanhã querido, só me espera — Falou piscando para a tela do computador abaixando a tampa para desligá-lo
Foi até a garagem e entrou no carro que seu tio havia deixado para ela, um Renault Duster azul metálico, ela amava aquele carro, era grande, bonito, seguro, cheirava como Ariel, seu tio.
Em instantes o motor estava roncando pelas avenidas da cidade rumo à casa de Rodrigo do outro lado da cidade, parou em uma vaga na rua, tinha mais carros do que ela gostaria, ficou imaginando se todos estavam na mesma festa que ela.
A casa de Rodrigo ficava num bairro de classe média, uma casa grande com um pequeno salão de festas.
Ela o chamou e entrou, assim que ela surgiu no salão com ele viu que haviam muitas pessoas, cerca de 30, reconheceu algumas, os pais de Rodrigo e mais alguns do trabalho
— Gente, gente — Rodrigo chamou a atenção — Essa bonitona aqui é a Danielle, ela tá solteira hein! — Falou para todos da festa
Danielle arregalou os olhos e deu um soco no braço dele
— Oh, retardado! — Falou em pânico
Ele riu debochado e agarrou o braço dela
— Vem comer magreza, aposto que não comeu nada hoje com essa cara chupada — Ele arrastou-a para a mesa
Ela percebeu muitos olhares, alguns homens levantaram copos para ela como se brindasse de brincadeira, ela sorriu e acenou com a cabeça, estava extremamente envergonhada, quando pararam ao lado da mesa ela o repreendeu
— Caralho Rô, que papelão, não faz isso não que eu entro debaixo da terra — Danielle falou nervosa
— Ah, relaxa benhê, todo mundo é do bem aqui e olha a quantidade de bofe que tem, a maioria tá solteiro e você tá um arraso hoje — Falou animado
— Mas e o cara que você disse, quem é? — Perguntou curiosa
— Ah, eu tenho que ver — Ele disse pensando
— Ah Rô, sério que você inventou isso?
Ele riu
— Mais ou menos, tenho alguém em mente, come aí que vou dar um jeito nisso
— Não, isso que eu ia falar, não dá jeito em nada, hoje não to boa, só vim por você mesmo
Ele deu um beijo na bochecha dela
— Que fofa, pena que eu não gosto de novela — Falou e saiu arrumando o cabelo inexistente em um movimento exagerado
Danielle achava engraçado.
Estava num dia introspectivo, então se aproximou de quem já conhecia e começou a conversa, em determinado momento as pessoas se afastaram e ela ficou isolada, pegou o celular e abriu, estava na tela do telescópio, ficou olhando as especificações.
— Ta vendo o que aí? — Rodrigo apareceu olhando por cima do ombro dela
— Um telescópio — Ela falou simples — Vou comprar um
— Pra que? — Rodrigo perguntou curioso
— Pra enfiar na bunda Rô, pra que você acha que serve um telescópio? — Ela falou num tom ríspido
— Grossa! — Ele disse num tom falsamente ofendido — Ah, já sei, calma ae
Rodrigo se afastou, Danielle não deu atenção, menos de um minuto ele se aproximou empurrando alguém, Danielle levantou o olhar, era um homem branco, bem alto, corpulento, cabelos negros com fios grisalhos.
— Dani, Dani — Rodrigo empurrava o homem que parecia vir a contragosto — Esse aqui é o Marcelo, o cara que eu te falei
Ela olhou incrédula para Rodrigo, tinha vontade de estrangular ele
— Ai Rô, por Deus — Danielle falou sem graça
O homem parou ao lado dela
— Prazer, meu nome é Marcelo — Esticou a mão para ela
Danielle pegou na mão dele e cumprimentou e instintivamente se aproximou para um beijo na bochecha um pouco constrangedor
— Prazer, Danielle — Ela respondeu
— Você queria falar comigo? — Marcelo perguntou curioso
— Eu? — Ela franziu a testa e olhou para Rodrigo
— Ah sim, eu menti, Marcelo, ela ta vendo telescópio e é uma chata igual você, nerdona igual você — Falou colocando a mão no ombro de Marcelo, em seguida colocou a mão no ombro de Danielle — Dani ele tem telescópio e o resto você ouviu, conversem — Rodrigo deu as costas e saiu andando
A boca de Danielle secou, ela sentiu um suor frio descer pela coluna, queria jogar uma cadeira na cabeça dele.
— Bem, fomos enganados — Ouviu Marcelo dizer
Ela o olhou de novo, estava vermelho, visivelmente envergonhado
— Pois é né — Danielle disse, respirou fundo — Se você quiser voltar para onde estava eu não vou ficar chateada, tá tudo bem
— Não tenho nada melhor pra fazer e eu gosto bastante de telescópio, quer ajuda com a sua compra ou isso era mentira também? — Ele perguntou interessado
— Ah não, não é mentira — Ela pegou o celular — To olhando esse carinha aqui ó
Mostrou para ele
Marcelo pegou o celular e olhou, deu uma olhada nas especificações por alguns segundos
— Olha, não é ruim, mas tem duas coisas
— Hmm? — Danielle murmurou interessada enquanto prestava atenção nos contornos do óculos marrom protegendo seus olhos azuis
— Primeiro o que você quer ver? Lua, Marte, Saturno, Andrômeda? — Respirou um pouco e disse — E qual é o seu orçamento?
— Ah… Eu… — Danielle não tinha uma resposta — Não sei o que eu quero ver, só quero ver, Lua talvez, Saturno seria legal também, talvez Marte, dá para eu ver os “Os canali”? — Ela perguntou olhando para Marcelo com sinceridade
Ele sorriu
— A gente pode trincar a lente ou sujar ela, aí dá para ver
Ela sorriu, ela se referia a um antigo erro de interpretação onde um famoso astrônomo com um telescópio achou ter visto canais artificiais em Marte, mas tudo se mostrou um erro de interpretação e talvez problemas na lente do telescópio.
— Não precisa — Respondeu sorridente
— E qual seu orçamento? — Marcelo perguntou
— Ah… acho que uns tres paus, é pouco? — Danielle perguntou sem saber ao certo
— Não, é um valor bom, da para comprar algo bem legal já, eu posso te indicar uns modelos, tem uma loja no centro que vende, posso te indicar o melhor e você da uma testada
— É? Que bacana, eu tava pensando em ir buscar amanhã nessa loja — Danielle falou pegando o celular da mão de Marcelo
— Amanhã eu não posso, preciso trabalhar — Marcelo disse pensativo
Danielle não o havia convidado, mas ficou quieta, ele logo sacudiu a cabeça
— Ah, desculpe, eu to me convidando, você não me chamou — Marcelo falou parecendo confuso
Danielle riu
— Não tem problema, se você pudesse ok, mas me fala que eu busco
— Não vou me convidar de novo, desculpe — Ele disse se recompondo
Danielle achou engraçado ele se atrapalhar, parecia inseguro como ela
— Você trabalha de sábado? faz o que? — Ela perguntou curiosa
— Eu sou médico, dou plantão em um posto no sábado
— Médico? — Ela perguntou pensativa
— É — Ele afirmou depois de vê-la pensativa — Experiência ruim com médico?
— Não! — Ela se corrigiu — Não, é que eu acho que nunca conheci um médico
— A primeira vez é sempre mais gostoso — Marcelo falou sem pensar
Danielle ficou sem expressão olhando pra ele
Marcelo coçou o pescoço
— Caramba, eu não sou tão babaca assim, desculpa — falou inseguro
Ela riu divertida
— Tudo bem Marcelo — Ela falou mais animada
— Agora eu que digo, quer que eu me vá e te deixe em paz? — Ele perguntou receoso
— Eu não quero, só se você quiser — Ela disse se surpreendendo com a própria receptividade, o jeito natural dele de falar sem pensar agradava ela, parecia natural,
— Posso pegar uma bebida para você? — Ele falou olhando em volta mais animado — Cerveja, uma batida?
— Não, eu não bebo, sou evangélica — Danielle falou explicativa
— Ah, qual denominação? — Ele perguntou curioso
— Consagração Cristã do Brasil — Danielle respondeu sem pensar muito
— Eu também! — Ele falou animado — Congregação da Zona Sul
— Eu sou da Zona Leste, Guaianazes — Danielle respondeu
— Estou no Capão Redondo — Marcelo disse
— Nossa, que longe! — Danielle disse desanimada
— Longe de onde? Depende do referencial — Marcelo disse — Do meu ponto de vista Guaianazes é longe também
— Do centro, eu acho que estou a uns vinte e dois quilômetros — Danielle disse pensativa — E você?
— Acho que isso também — Ele disse pensativo — É, nós dois moramos bem longe!
Ambos riram
— Ah então você é o chato da festa igual eu? — Danielle perguntou sorridente
— Sou sim, o motorista da rodada
— Ah, isso é um saco né? — Danielle disse desanimada
Conversaram por quase três horas direto, Rodrigo olhava de longe satisfeito
— Bem, eu preciso ir, tá na hora de criança ir pra cama já — Danielle disse
— Eu vou também, posso te acompanhar até lá fora? — Marcelo perguntou
— Claro — Danielle se animou
Foram se despedir dos amigos e de Rodrigo, Danielle o encontrou sózinha
— Vocês já vão embora juntos? Deu certo então! — Rodrigo disse animado — Sabia que vocês eram a cara um do outro.
— Não, tá louco! — Danielle disse — eu vou pra minha casa e ele pra dele, a gente só vai até o portão junto
— Que que eu vá? vai que você agarra ele! — Rodrigo disse engraçado
Danielle revirou os olhos
— Engraçadinho — Danielle disse sarcástica
— Mas ó, Dani, não magoa o meu amigo, ele ainda tá meio frágil eu acho — Rodrigo disse
— Normalmente quem fica magoada sou eu — Ela disse — Frágil por que?
— Pronto, vamos? — Marcelo se aproximou dos dois
— Vamos, Danielle disse
Marcelo se despediu de Rodrigo
— Cuidado hein Marcelo, ela vai te agarrar! — Rodrigo falou de forma afeminada
— Rodrigo! — Danielle falou severa!
— Ah, desculpa — Ele riu, Marcelo também riu
Foram em direção ao portão da casa
— Você vai embora como? — Marcelo perguntou enquanto saiam
— Meu carro está ali do outro lado — Danielle disse apontando — E você?
— O meu está ali, atrás do seu — Mostrou o carro prateado modelo japonês
Pararam na rua, não era movimentada
— Você vai pra casa agora e sai amanhã cedo pra trabalhar? é perto do seu trabalho? — Danielle perguntou caçando algum assunto para adiar a despedida
— Não, eu não moro lá no capão, eu aluguei um quarto para ficar mais fácil, venho as vezes, eu moro em Araras com meus filhos — Marcelo respondeu tirando os óculos e limpando as lentes.
— Filhos? — Danielle falou assustada, não sabia disso
— Sim, eu tenho duas meninas e um menino — Marcelo disse sorridente — São a luz da minha vida
— Ah — Ela respondeu preocupada e desanimada — Entendi, eles moram com a sua esposa?
— Não, eles ficam sozinhos, a mais velha já é maior de idade — Marcelo respondeu recolocando os óculos
— A mãe não mora com eles? ela fica com você aqui em São Paulo? — Danielle perguntou preocupada
Ele sorriu, mas parecia entristecido
— Ela está com Jesus agora, fazem quatro anos — A resposta dele foi melancólica
— Oh — Danielle respondeu e demorou alguns segundos para prosseguir — Ah, desculpe, que o nosso senhor a tenha em bom lugar, fui indelicada
— Não, não se preocupe, não tinha como você saber.
Danielle ficou desconcertada e introspectiva
— Nosso amigo colorido devia ter dado mais informações sobre nós, mas suspeito que ele inventou esse papo de cupido segundos antes de nos apresentar
— Eu também acho — Danielle disse sorridente
— Eles são engraçados — Marcelo disse
— Eles quem? — Danielle perguntou curiosa
— Os Gays — Marcelo disse — Afeminados na verdade
— Ah é? — Danielle engoliu seco — E o que você acha deles?
— Acho engraçado, são animados e tal, mas vivem em pecado — Marcelo disse
— Por que pecado? — Danielle perguntou querendo saber a opinião dele
— Por que um homem não pode se deitar com outro homem em hipótese alguma, isso é pecado, aposto que você já viu isso na bíblia
Danielle coçou a cabeça
— É, eu já vi, mas acho que não é tão simples assim — Danielle disse severa
— Bem, está escrito com todas as letras, parece simples — Marcelo falou — Mas enfim, eu não posso julgar, como médico atendo todos sem preconceito algum, mas é pecado
— Entendi — Danielle disse entristecida
— Desculpe, eu falei algo que te chateou? — Marcelo perguntou preocupado vendo a expressão dela
— Hmm, não, são só pontos de vista — Danielle insistiu — Preciso ir, obrigada pelo papo, boa noite
Falou indo em direção ao carro, Marcelo a segurou pelo braço
— Espera, por favor — Ele falou interessado
— O que eu disse que te chateou, me explica, às vezes eu falo sem pensar mesmo
Danielle respirou desanimada
— Olha Marcelo, eu que não tô na vibe mesmo, tudo bem, gostei de te conhecer, mas é isso — Falou tentando dar um fim à situação
— Eu gostei muito de você, não quer sair pra jantar uma hora dessas? Por minha conta claro, vamos marcar
— É melhor não — Danielle disse decidida
Ele olhou para ela e se aproximou, tocou a cintura dela, era mais alto, Danielle era uma mulher alta também, mas ele a obrigava olhar para cima.
Se aproximou devagar ambos se olhando nos olhos, ela o achou incrível, não era um ou outro comentário que iria fazer ele deixar de ser incrível, ele se aproximou e os lábios dele tocaram o dela, ela fechou os olhos, sentiu a mão dele no pescoço dela, acariciando a cabeça, sentiu a língua dele invadindo sua boca, acariciou a língua dele com sua própria, colocou as duas mãos no peito dele e o empurrou, ele chupou lábio inferior dela.
— Não, para! — Ela falou ofegante — Eu, eu — Ela respirou, sentiu tesão como a muito não sentia, seu corpo estava arrepiado, sentia uma pressão no meio das pernas, olhou para ele assustada
— Desculpe, você não gostou, fui cedo demais? — Marcelo perguntou preocupado — Eu acho que não sei mais fazer essas coisas de namorar, ficar
Ela olhava assustada
— Eu — Ela falou com a respiração pesada — Tem uma coisa que você precisa saber sobre mim, e eu não vou fazer rodeios
— O que? — Ele perguntou sem entender — Você é comprometida? Por que se for me perdoe eu não sabia
— Não, não sou — Ela respondeu tomando coragem — Eu sou outra coisa
A coragem lhe faltava, fechou os olhos e pediu ao senhor Jesus fazer a realidade mudar, fazer ela ser uma mulher de nascença, implorou para Deus fazer com que toda sua vida até ali fosse um sonho e ela não tivesse que falar o que iria falar
Abriu os olhos, nada havia mudado, Marcelo a olhava com curiosidade
— Eu sou uma mulher transexual — Danielle disse olhando-o nos olhos
Marcelo sacudiu a cabeça de forma negativa, parecia não entender
— Éééé… — Ele balbuciou sem evoluir o pensamento por alguns segundos — Você disse que era evangélica, como isso é possível
— Interpretações, a bíblia é um livro de interpretações — Danielle disse
— A Bíblia é a palavra de Deus na terra — Marcelo disse direto
— Não, ela é o que os homens entenderam da palavra de Deus, com todos os seus preconceitos, limitações, vontades e limites de dois mil anos atrás
Marcelo ficou olhando para ela por alguns segundos, ambos em silêncio, ele se aproximou e esticou a mão para ela, parecia desconcertado
— Então tá, bom, boa noite, Paz de Deus! — Segurou na mão dela e balançou como se cumprimenta um homem
— Paz de Deus — Ela sussurrou e o observou, ele deu as costas e atravessou a rua indo em direção ao próprio carro, ela observou quando ele ligou e passou por ela sem nem mesmo olhar.
Ela respirou fundo, visivelmente frustrada, foi até o carro, sentou-se ao volante, colocou o cinto, ligou e saiu, andou alguns metros e parou.
Ficou olhando para o meio do volante, o símbolo prateado refletiu seu rosto, ela segurou o voltando com as duas mãos
— Puta que pariu! — Gritou — Eu sou uma desgraça mesmo, sou um demônio! — Se sacudida freneticamente tentando arrancar o volante enquanto gritava de desespero — Deus por que não me mata logo e acaba com meu sofrimento?
Encostou a cabeça no volante e chorou copiosamente, estava sozinha, ninguém para ver, ninguém para auxiliá-la, sentia seu penis ereto pelo beijo que havia dado, bateu no meio das suas pernas com seu punho e se apertou em punição, em minutos se acalmou e voltou a seguir o GPS até em casa com as lágrimas secas no rosto.
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Beijinho, Rafinha