Para fazer a doação de um rim, além dos exames gerais, de imagens e funcionalidade para saber se o órgão está apto, três testes de compatibilidade são feitos. O do grupo sanguíneo, o tecidual e o cruzado.
Kaique, Júlia, eu e até Milena fazemos parte do mesmo grupo sanguíneo O com o RH negativo e o teste cruzado deu negativo para nós duas, ou seja, não haveria reações adversas entre nossos sangues. A compatibilidade do tecido decidiria tudo, já era sabido por nós que a chance de alta compatibilidade era mínima então estávamos torcendo por uma boa e o comprometimento de uma vida inteira em monitoramento. O meu foi um bom resultado e isso foi um alívio imenso para nós. Independente de qualquer coisa, o transplante seria feito e nosso filho já tinha o rim que precisava, mas o teste de Juh surpreendeu a todos pois beirou a perfeição. É quase impossível de acontecer nesse caso onde geneticamente não havia ligação entre eles e sem a ajuda de um banco de dados. Mas para a nossa alegria, aconteceu!
Foi muito emocionante receber o resultado, estávamos com ele há pouco tempo e contemplamos de perto como era difícil a vida de quem estava preso a máquina. Kaique não fez amizade com ninguém porque dormia em quase todas as sessões, mas eu, que o levei na maioria das vezes por conta da disponibilidade de horário, conheci várias pessoas com finais felizes, tristes e outras que ainda hoje lutam por um.
- Finalmente, amor, temos o rim do Kaká! – disse Juh pulando na minha cintura e me beijando
Estávamos no meio da rua, pois tínhamos acabado de sair do hospital. Muita gente olhava, mas naquele momento eu não ligava para mais nada, a vida do meu filho estava a salvo.
Deixei Júlia no trabalho e ela disse que queria contar em casa, eu também achava melhor assim e foi uma verdadeira tortura pra minha gatinha porque a única vontade dentro dela, na verdade, dentro de nós era gritar para o mundo inteiro ouvir aquela notícia maravilhosa.
- Nós temos uma coisa ótima para contar! – disse a eles
- Kaká, você vai ganhar o rim da mamãe! – falou Juh de uma vez
Ele ficou extremamente surpreso, nós o abraçamos, porém ele permanecia estático.
- Aquilo que eu falei para a gente rezar naquele dia era isso... – disse Mih
- A gente rezou pra mamãe perder um rim? – Perguntou um pouco chateado
- Calma, eu não vou perder um rim – explicou Juh – mas você vai ganhar um. Com tanta coincidência que aconteceu, só existe uma conclusão. Deus colocou você em nossas vidas, tanto no processo da adoção, que não foi da forma comum, afinal a gente te conheceu antes quanto agora para o transplante. Você não é só compatível comigo, mas com Lore também. Eu só vou ser a doadora por questão de números. Não vou perder, vou doar e doando, eu vou ganhar muito mais só em saber que a vida do meu bebê está segura.
- E a prof disse que dá pra ficar bem só com um, ele cresce, bebê – disse Mih rindo
- Tá rindo de que, bebê? – Perguntei para Milena fazendo Kaique finalmente soltar um sorriso
- Os dois são meus bebês – falou Juh rindo – Mas eu quero saber se está tudo bem em você receber, Kaká
- Sim! – disse firme e com um sereno sorriso nos lábios
- A gente podia ver um vídeo no YouTube de como é, né? – Perguntou Mih
Eu até pesquisei, mas não encontrei nenhum apropriado, poderia assustar eles, então dei a ideia de simular. Deitei os dois, lado a lado e saí desenhando como eu achava que seria. O médico vai fazer uma incisão aqui – passei o piloto na lateral do abdômen de Júlia, ela começou a rir pois fez cócegas, continuei explicando, mas o clima do quarto estava divertido - aí vai pegar o rim da mamãe e pôr aqui no bebê - fiz um risco nele também que já ria mas gargalhou quando sua pele entrou em contato com o piloto
- E nós vamos cuidar dos nossos bebês, não é, mãe?! - Disse Mimi
- Com certeza, meu amor! - confirmei
Kaique sentou e ficou olhando os rabiscos e questionou: - A gente vai ter cicatriz para sempre?
- Sim... - afirmei
- RADICAL! - disse animado
- A gente pode dizer para as pessoas que é uma marca de nascença - falou Mih
- As pessoas acreditam que somos gêmeos, vão cair facinho nessa - disse Kaká
- QUÊ? - Juh e eu perguntamos
- Vocês estão falando por aí que são gêmeos? - Perguntei
- Kaká! - Exclamou Milena com as mãos na cabeça
- Foi mal... - Meu filho lamentou com a mão no rosto
- A gente só falou isso para o pessoal da escola - disse minha filha com um sorriso meio desesperado
- Não gosto de mentiras... - falei olhando para eles
Olhei para Juh e tinha certeza que ela queria rir.
- Mãe, eu vou fazer uma cirurgia, a senhora não pode brigar comigo - disse Kaique todo faceiro pulando em mim
Depois disso não tinha como manter a seriedade. A brincadeira da noite virou ouvir a reação dos colegas quando eles diziam que eram gêmeos enquanto a gente virava álbum de figurinhas de tanto que desenharam em nós.
O banho foi extremamente demorado e as obras de artes só saíram com álcool, enquanto passava no corpo de Kaique, ele pediu para deixar o do abdômen e assim eu fiz.
- Agora vão dormir, mentirosos - falei rindo
- Foi uma mentirinha pequena, mãe - disse Mih
- Cirurgia... - lembrou Kaique
- Estou sendo chantageada pelo meu próprio filho? - Falei fingindo um choque
- Sim!!! - confirmou cinicamente
Eles foram deitar e nós fizemos o mesmo, mas antes de dormir, ficamos conversando.
- Você foi mais uma vez brilhante com essa ideia de simular o que vai acontecer no transplante... - disse Juh entrando nos meus braços
- E você com aquele discurso? Quase gritei aleluia, minha pastora! - falei rindo
- Você não me leva a sérioooo - reclamou balançando meu rosto
- Claro que levo, amor - e encostei nossas testas
- Você ficou brava com a mentirinha deles? - me perguntou
- Brava não é a palavra certa, eu só não acho que tinha necessidade... - falei meio pensativa
- Achei fofo e engraçado você brava - disse rindo
- Eu sabia que você estava doida para rir e aliviar para eles... - falei ainda pensativa
- Mas, amor, foi uma besteirinha e se o Kaká não brincasse você ia mandar um sermão, aposto - concluiu
- É que eu não gosto de mentiras... - justifiquei-me - vai que vira uma coisa normal, com coisas mais graves. Não quero que escondam as coisas da gente, tá muito cedo pra isso - lamentei
- Meu Deus, que dramática! - exclamou rindo de mim
- Não é drama, amor, é sério! - falei
- Você está proibida de brigar comigo, porque eu também vou fazer uma cirurgia - brincou e me beijou
- Estou feita com dois chantagistas... - e fui dando selinhos
- Amor, será que vai ser tranquilo? As coisas sempre parecem tão incertas... - me perguntou preocupada
- Mas até agora tudo deu certo, vamos continuar torcendo assim... - dei um beijinho em sua testa, ela se aninhou em mim e dormimos.
Os dias que precederam o transplante foram bem bagunçados, a nossa mesa de jantar ficou tomada de exames e documentos e enquanto os dois faziam atividades em um cantinho, Mih pegou a identidade de Kaká.
- Oliver - disse olhando as informações - o sobrenome da mamãe
- Isso, amor - confirmou Juh sem prestar atenção, eu também estava meio dispersa, separando a documentação que realmente usaríamos
- Eu não tenho Oliver - disse já entre lágrimas nos encarando e então nós passamos enxergar o que estava acontecendo
Ela saiu correndo para o quarto e enquanto íamos atrás, Kaká passou por nós desesperado subindo as escadas.
- Por favor, não fica assim - ouvimos ele dizer
- Não é porque você tem, tá? É porque eu queria ter... - disse com muita dificuldade
A porta estava aberta e eles estavam abraçados, batemos e entramos.
- Filha... Vem cá... - disse Juh sentando na cama e Mih foi até seu colo, ela não parava 1 segundo de chorar.
- Amor, se acalma um pouco - falei passando a mão em suas costas
- Vou pegar um pouco de água - disse Kaique preocupado e eu assenti
- Eu te amo tanto, tanto, tanto. Você sabe disso? - Perguntou Juh
E ela confirmou com a cabeça.
- Então, filha, mais importante que qualquer coisa é o amor, e isso você tem certeza que tem - falei tentando algo
Milena estava com a cabeça enfiada no pescoço de Júlia e virou para mim, seus olhos estavam super inchados e vermelhos.
- Mas eu queria - disse com a voz falhando e voltando a agarra-la
Juh me olhou com um certo desespero, eu também obviamente, não estava confortável com o que estava vendo. Claramente não era uma situação normal, não era para chamar atenção e era visível a dor daquela criança... Mas o que poderia ser feito?
- Ei, calma, vem aqui comigo um pouquinho... - o coração dela estava disparado e eu fiquei dando muitos beijinhos em seu pescoço até a água chegar
Milena deitou mais calma. mas as lágrimas insistiam em correr pelo seu rosto.
- Acho melhor eu dormir por aqui hoje - falei fazendo carinho em seu rosto
- Amor, vem cá rapidinho - disse Juh me levando para fora do quarto
- Dorme com o Kaká, porque ele tem medo, deixa que eu durmo com ela... Acho que ela precisa disso - disse-me e eu concordei, mas antes fui lá comunicar a ela e enchi de carinho
- Vamos precisar conversar sobre o que fazer depois, não acho que amanhã isso será esquecido por ela - disse Juh sussurrando no meu ouvido enquanto a gente despedia, eu estava em completo de acordo, não parecia algo temporário.
No quarto, com Kaique, ele perguntou: - Mãe, por que Mih tá com ciúme?
- Acho que ela só queria ter o nome igual ao seu, lindo - falei
- Coloca, então! - falou com praticidade
- Acho que nem dá, filho, mas vamos conversar sobre isso amanhã, tá? Agora está tarde e nós precisamos dormir porque amanhã você tem aula - e dei um beijinho em sua testa
- Acho que ela quer ter o nome da mamãe e não o nome igual ao meu - falou ignorando meu conselho
- É, você tem razão... - concordei com ele
- Mãe, tenta dar o nome para ela - falou sentando na cama, aparentemente bravo comigo
- Filho, eu acho que nem tem como, acabei de te dizer isso! - disse sentando também
- Mas é injusto, nós somos irmãos! - exclamou mais alto ainda irritado
- Você acha que a culpa é minha? - Perguntei puxando-o para deitar novamente abraçando-o
- Não, desculpa... - respondeu arrependido
- Aaaaah, então você entende que não depende de mim, não é? Porque eu jamais deixaria meus filhos sofrerem tendo algo que eu pudesse fazer - falei fazendo carinho no seu cabelo
Kaká não estava mesmo a fim de dormir porque toda hora sentava novamente na cama.
- Seu cabelo tá crescendo - falei na milésima tentativa de mantê-lo deitado
- É, tá ficando lindão - falou sorridente
- Você sempre foi lindão! - falei enchendo de beijos, dessa vez ele se rendeu e me agarrou e finalmente dormiu.
Quando tive certeza de que ele travou no sono, levantei e fui ao quarto de Mih, as duas estavam dormindo abraçadas, fiquei observando um pouco e logo voltei para cama, mas não consegui pregar os olhos pensando no que fazer e também preocupada com a cirurgia dos meus amores. Acho que quando faltava uma hora, para o celular despertar, dormi um pouco, mas logo tive que levantar. Quando cheguei na sala Milena e Júlia já estavam prontas, o que era incomum, geralmente eu acordo e elas ainda permanecem dormindo.
Aparentemente estava tudo sob controle, mas ela estava quieta, bem abatida, recostada sobre Juh no sofá assistindo algum desenho.
- Acordaram cedo! - falei indo em direção a elas para encher de beijinhos
- Você roubou a mamãe de mim de novo essa noite - sempre brinco assim quando Juh dorme somente com ela, e geralmente isso a diverte. Nesse dia, surgiu apenas um sorriso sociável nos seus lábios.
- Mãe... Quero conversar com a psicóloga - pediu me abraçando
Olhei para Juh e visivelmente ela também não esperava isso.
- Tá bom, amor, nós vamos para a clínica e eu tento marcar um horário para você com sua terapeuta, pode ser?
Ela olhou para o uniforme, olhou para Juh e disse: - Quero ir com a mamãe para escola e esperar lá
Ia ser um pouco mais trabalhoso porque a clínica não fica tão próximo da escola e Juh não ia poder sair. Depois de sair mais cedo para os cursos preparatórios no processo de adoção e não concordar com a suspensão de Milena, a gestão do colégio não estava facilitando para ela. Resolvi deixar, para não a magoar ainda mais. Era nítido que com um pedido desse, ela não estava se sentindo bem.
Fui acordar Kaique com Mih e ele deu um longo abraço nela e disse apertando as bochechas: - Eu sonhei que você cortava meu cabelo, sua maluca
- Então vou realizar seu sonho! - respondeu ela brincando
Ele fingiu desespero se mexendo na cama e gritando: "Naaaaaaao!" e isso fez ela soltar o primeiro sorriso sincero do dia.
Enquanto meu filho tomava banho e Mih organizava a mochila fui falar com Juh direito.
- Não dormiu, não foi? - Perguntou passando os dedos nos meus olhos
- Estou tão acabada assim? - Perguntei e dei um beijinho
Ela esperava uma resposta e eu confirmei.
- Espero que fique tudo bem... Eu nunca achei que isso fosse acontecer... Principalmente por causa de um nome! - disse baixinho
- Eu imaginei um ciuminho envolvendo você, mas jamais algo assim, que a machucasse tanto, confesso que estou preocupada... - falei pensativa
- Vamos ver como vai ser depois da terapia... - falou e eu confirmei com a cabeça.
Fizemos o que combinamos, ela foi para a escola e eu expliquei o que aconteceu para a psi que entendeu e agendou minha filha para às 9h.
Fui informando Júlia de tudo e recebi uma foto delas duas grudadas, achei que ela ficaria na aula, mas minha mulher relatou que Mimi estava morrendo de dor de cabeça, provavelmente por ter chorado muito e estar com o emocional abalado.
No caminho, um silêncio incomum pairava no carro e eu fui tentando conversar.
- Quer falar algo sobre o assunto? - Perguntei e ela negou com a cabeça
- Só depois da terapia - disse e eu assenti
Coloquei o cantorzinho dela preferido para cantar, nesse tempo ele só tinha uma música e foi tocando o percurso inteiro, quando acabava ela pedia para repetir e assim eu fazia.
Comprei um lanche para ela e esperei terminarem, a sessão durou 2h11min, foi longa e Mimi saiu com os olhos novamente marcados, obviamente tinha chorado mais um pouco.
- A próxima consulta vocês podem estar presente? Seria bom se fosse ainda essa semana - perguntou a psicóloga
Eu confirmei e pedi que fosse a noite por conta dos nossos horários, e ficou certo assim.
Milena pediu para dormir e eu a levei para casa, 14h eu tinha que sair para o hospital e não teria como adiar isso, então pedi para meu irmão ficar com ela até Juh chegar. Conversamos bem por cima e ele ficou surpreendido.
- Achei que o cenário seria ao contrário, Kaká com ciúme
- Eu imaginei que viria dela, mas não que fosse tão sério... falei para ele – E principalmente, não imaginei que esse seria o motivo, uma coisa tão...
- Fútil? – Completou para mim
- Não gosto de tratar assim, se dói tanto... Não é fútil – falei
- Sou eu quem estou aqui, para de dar uma de médica. Tá suave, se expresse como quiser – disse meu irmão
- Lorenzo, eu sei que você acabou de dizer isso nas melhores das intenções, mas você não imagina o quanto eu gostaria de estar dando uma de médica agora! – falei com rispidez
- Foi mal... Quer abraço? – Perguntou abrindo os braços e um sorriso
Fui até ele e já o ouvi dizendo: - Igualzinho como me ensinou a minha irmã médica, acolhendo sentimentos – falou rindo
- Vai se fuder! – ri também
- Vai se fuder, você! – e me deu um beijinho na testa
- Se acontecer qualquer coisa fora do comum, me liga – falei preocupada
- Escutar, validar, ser empático, não julgar, dar suporte e acolher; eu fui muito bem treinado. Vai em paz! - disse quase me expulsando
A tarde e a noite inteira, a minha cabeça não parava de pensar. Loren me enviou foto lá em casa, com Juh, Mih, Kaká, Victor, Sarah e Lorenzo. Estavam fazendo uma sessão de cinema. Ao que tudo indicava, tinham a distraído. Apesar de me sentir bem leiga quando as crises acontecem com pessoas que eu amo, tinha plena certeza que seria um processo difícil e a longo prazo, só não imaginava que duraria mais de 7 anos.
Não vou entrar muito em detalhes sobre o que tratamos com a psi, mas uma frase foi marcante. Milena disse se sentir menos filha de Juh por não ter o Oliver. Nesse momento as duas choravam. Mih não culpava ninguém, não tinha raiva do Kaká, porém ela queria porque queria o sobrenome. Embora a gente demonstrasse todo amor e argumentasse tudo que sabíamos, nada adiantava e ela foi indicada para Terapia Cognitivo-Comportamental.
A noite Kaká e ela conversaram.
- Você tá triste por minha causa? – Perguntou chateado
- Não é por sua causa, eu só queria o nome da mamãe também... – disse tentando tranquilizar ele
Kaique tirou um desenho do bolso, e entregou para ela sorrindo. Era uma identidade, com o nome completo dela + o Oliver, Mimi o abraçou tão forte que caíram e mais uma vez, ele a fez rir.
Ela passou a semana inteira extremamente grudada com Júlia, não tinha nenhuma aversão ao irmão, na verdade eu que sobrei, os três passaram a semana inteira colados. Para ter atenção, eu tinha que pedir (ô vida sofrida, mds). Fingi vários draminhas para eles rirem, mas eu realmente senti falta.
Comecei a procurar mais informações sobre o assunto e não há nada que impeça, porém não é fácil de conseguir. É preciso passar por um processo judicial e os pais biológicos devem estar em comum acordo. O pai dela JAMAIS aceitaria.
Quando ela voltou ao assunto, citei o nosso casamento. Nós nos preocupamos muito mais com a celebração do amor do que com a troca de sobrenomes. Assinar papeis não foi a nossa prioridade e sim o que realmente importava, o nosso sentimento. Mas a criança não tirava a ideia da cabeça...
Chegamos na semana do transplante e eu já não suportava mais aquele assunto de nome (mal sabia eu que duraria até...), estava pronta para explicar o que eu tinha pesquisado, mesmo Juh não querendo e Milena disse: - Mãe, vamos deixar isso para lá, POR ENQUANTO, e focar na mamãe e no meu irmão.
- Ainda dói? – Perguntei
- Dói, – afirmou com os olhos cheios de lágrimas que não deixou escapar – mas vamos fazer assim, pode ser?
- A gente já conversou sobre ignorar nossos sentimentos. Eu sei que eu posso estar agindo sem paciência esses dias mas, se a gente não se expressa, vira uma grande bola de neve e fica mais difícil ainda de lidar... – falei extremamente arrependida da minha irritação anterior por saturação do assunto
- Converso na terapia, não vou ignorar – me respondeu como se soubesse o que eu argumentaria
- Você não quer mais conversar com sua mãe? – Perguntei abrindo os braços e ela veio me abraçar rindo
- Sobre outras coisas a gente conversa! – me respondeu
Enxerguei tanta maturidade nela nesse momento.
Foi uma semana tranquila, como se tudo estivesse normal. Óbvio que existia certa tensão pela cirurgia e a possibilidade de rejeição, porém preferimos confiar nos resultados animadores que tivemos nos exames de compatibilidade.
Sobre a insegurança de Milena, até hoje lidamos com isso.
Léo é advogado e, embora não seja a área dele, foi assim que Mih ficou sabendo que era possível colocar o sobrenome de Juh. Lembro-me como se fosse hoje, ela arrastando-o pela camisa animada com a possibilidade. Simplesmente fez um interrogatório e sem saber de toda a crise, foi soltando informações. Quis falar com o pai que evidentemente achou que era ideia minha. Ela ficou bem mal quando ele não deixou, eles brigaram. Chegamos até a conversar pessoalmente após alguns anos, quando vimos a situação se perdurar. Mas ele foi irredutível, disse que o único jeito de um filho dele ter o sobrenome de Juh é se eles fizerem um, e é claro que antes de sair rindo, levou um belo tapa no meio da cara.
Vivemos normalmente, mas a insegurança não foi superada, Milena me envia toda e qualquer noticia que envolva algum menor de idade que conseguiu esse feito. Se eu perguntar agora qual o maior sonho dela, a resposta será: “Fazer 18 anos e colocar o nome da mamãe”.
A interesse de curiosidade (e porque eu acho fofo) o sonho do Kaká é fazer 19 porque aí ele terá 10 anos com a gente e somente 9 sem.
OBS: Ficou enorme porque não quero ficar voltando no assunto, acredito que ficaria chato mas devo ter que contar alguns episódios específicos dentro de outros contos.