Um amor que não pôde ser vivido

Um conto erótico de Davi
Categoria: Heterossexual
Contém 2183 palavras
Data: 19/09/2024 00:58:26

Olá, talvez seja o único conto que irei escrever. Não tenho com quem desabafar, mas precisava colocar isso para fora. Antes de mais nada, tudo aqui é real. Precisarei mudar alguns nomes para preservar nossa identidade e espero que vocês sintam exatamente tudo que pudemos sentir nesse tempo... Sentem-se e venham comigo.

Junho de 2018, São Paulo.

Olá novamente! Meu nome é Davi. Nesse ano eu tinha 21 anos, trabalhava em uma grande empresa e que hora ou outra aparecia um funcionário novo aqui e ali. Acabara de voltar de férias quando percebi que havia um garoto novo na minha equipe, Willian. Ele era alto, moreno, magro, cabelos pretos bem escuros, sempre curtos e ajeitados, próximo de o que eu poderia chamar de “corte militar”. Ah sim, já esquecendo: Sou branquelo, cabelo castanho bem claro, liso para ondulado, olhos castanhos bem claros, quase mel e também alto. Assim que o vi, me chamou a atenção que ele se vestia de uma forma muito parecida com a minha: Camiseta larga, tênis baixo e calças justas, nada apertada. Meus olhos acompanharam-no enquanto ia para minha mesa. Ele olhou para cima, mas logo desviou a visão para o seu computador. O dia seguiu normalmente, comigo perguntando para outros colegas quando é que esse garoto entrou em nossa equipe.

Algumas semanas após, já éramos colegas próximos. Ele era inteligente e logo começou a fazer parte da minha equipe e eu sendo o responsável por treinar ele. Nosso pequeno grupo de amigos do trabalho adotou ele (digamos assim, pois ele acabara de completar 18 anos). As semanas iam passando e cada vez mais nos encontrávamos mais próximos do outro. Ir para o trabalho já não era tão maçante como antes: Eu ficava feliz em saber que ele estaria lá.

[Aqui faremos um adendo para melhor entendimento: Sempre me relacionei - ou ao menos tentei – com mulheres, mas eu sentia algo “estranho” que nunca soube decifrar quando tinha uma amizade mais próxima com outro cara, o que havia ocorrido uma única vez, com meus 9 anos. Até então, me considerei hétero, mas tinha medo desses sentimentos...]

Julho de 2018,

Não demorou muito para sermos inseparáveis: Íamos almoçar juntos, se eu saísse do setor para ir tomar café, ele vinha atrás, mesmo sem eu tê-lo chamado. Se eu saísse mais tarde do trabalho, ele me esperava para irmos juntos até o ponto de ônibus. Nossa amizade aumentava cada dia mais: Fazíamos piadas e brincadeiras que só nós dois entendíamos e muitas vezes até adivinhávamos o que o outro iria dizer. Poucos meses após viajamos juntos para o Hopi Hari. Foi um dia incrível, cada segundo. Tiramos muitas fotos, as quais guardo até hoje.

Agosto de 2018,

Desse momento em diante é onde tudo começou a se aprofundar mais... Uma oportunidade de viagem para MG, de imediato todos do nosso pequeno grupo topou. Confesso que de início eu não estava tão animado para ir, mas ele chegou em mim e disse: “Eu só vou se você ir também” E sem pensar duas vezes, aceitei. Como a viagem era à noite, fomos dormindo no ônibus, até chegar lá, com ele na poltrona do lado, algumas vezes encostando a cabeça no meu ombro e eu cuidando para que ele conseguisse descansar, pois eu já estava acostumado a dormir pouco.

Desembarcamos e corremos para encontrar um lugar para acampar. Nesse momento aqui surgiu um “pequeno problema”, como não tínhamos costume de acampar sempre, não havíamos levado barraca, apenas as meninas, um total de 4 barracas para 6 pessoas. Duas delas toparam dormir juntas, outras duas pegaram uma cada uma e sobrou apenas uma... mas eu e ele éramos dois. Olhei desapontado para o chão, mas já tive a ideia de perguntar se ele queria dividir ela comigo, assim como as meninas fizeram. Ele topou de imediato, eufórico para montarmos logo ela. Guardamos todas as coisas e nos trocamos para ir nas cachoeiras e lagos. O dia todo nada mudou: Ele não saía do meu lado, nas fotos que tiramos, sempre me abraçando ou com a mão nas minhas costas e eu o mesmo com ele. Tínhamos uma conexão muito forte e diria que até inexplicável só o fato dele me olhar, já sabia o que queria me dizer.

Na noite desse dia...

Estávamos todos exaustos. Corri para tomar banho e já entrei na barraca para dormir. O Will (como eu o chamava) veio logo atrás, também de banho tomado. Eu sempre durmo sem camisa e as vezes de cueca, mas como estava com outra pessoa na barraca, me limitei a ficar sem camisa e somente de bermuda - Sempre tive um físico atlético e modéstia a parte, chamava uma certa atenção... Ele entrou e deitou-se, fechando o zíper da barraca. Já era um pouco tarde, por volta das 01:00 e ventava bastante, deixando a barraca mais fria. [O que eu vou narrar desse momento em diante é a cena que jamais esquecerei, e que hora ou outra vem à tona na minha memória e me castiga... dói muito pensar, mas ao mesmo tempo, me trás um dos melhores sentimentos que tive em minha vida]

Em um determinado momento dessa noite eu já estava pegando no sono, quando ele se virou para o mesmo lado, ficando com o seu rosto próximo do meu. Eu percebo um ar mais quente golpeando meu rosto – Era a sua respiração que se encontrava com a minha e abafava o pequeno espaço que havia entre o meu rosto e o dele – Nós dois sabíamos que estávamos acordados e ele se aproximou mais. Inclinei meu rosto mais próximo dele, que também respondeu. 5 centímetros separavam minha boca da sua. Nesse ponto ele já podia sentir o calor do meu corpo emanando por debaixo daquele cobertor fino que nos envolvia. Como grande parte do nosso diálogo era através de gestos, aqui não foi diferente. Ficamos uns longos 30 minutos assim: Nossos corpos pedindo a aproximação do outro, como um modo desesperado de sentir, nem que fosse por segundos, a presença do outro. E... ao mesmo tempo... o medo, a insegurança, principalmente o medo... medo de perder o que nós tínhamos, medo de alguém nos ver, medo de corresponder a esse impulso que sempre nos permeou, mas recusávamos a nos entregar. Adormecemos dessa forma, sentindo o calor do corpo do outro, uma barreira invisível de medo dividia-nos, impedindo que nossos lábios se tocassem... o cheiro do seu cabelo, do seu perfume, e o cheiro que ele tinha por si só, que me fazia sentir em paz.

Na manhã seguinte...

Acordo ainda cansado, havia me esquecido que tínhamos que acordar cedo para ver o nascer do sol na montanha que estava a alguns metros dali. Assim que abro os olhos, ele está sentado na barraca, me olhando fixamente. Nosso olhar se cruza e ficamos inertes, hipnotizados. Eles diziam o que as palavras não podiam dizer, ficavam presas, escondidas em nossos medos. Permanecemos nos olhando, enquanto ouvíamos de longe as meninas nos chamando para tomar café. Eu entendia tudo o que estava acontecendo ali, em meio a angustia de não poder falar e a sensação desse momento pertencer a nós dois, sua mão se estende e toca o meu rosto. Nossos olhares aguentando cada segundo desse momento já em tom de despedida. Ele respira fundo e já começa a arrumar suas coisas. Eu aceno com a cabeça entendendo o que sua tristeza correspondia: Ele, cristão, seus pais extremamente rígidos com a religião e nossos colegas de trabalho dormindo a 30 centímetros de nós. Nunca entramos em conversas mais diretas sobre sexualidade, mas entendíamos um ao outro quando tentávamos entender o que o outro sentia ou queria...

Chega a hora de ir embora, voltamos cansados novamente, dessa vez já não me importava quem estava perto, o Will veio o caminho todo apoiado com a cabeça em meu ombro e eu com os braços envoltos no pescoço dele. As vezes sentia o cheiro do seu cabelo e me vinha uma vontade imensa de beijar ele ali, no meio de todos, mas infelizmente o nosso medo ainda era maior. Sua perna caia levemente sobre a minha e eu acariciava sua nuca. Descemos do ônibus e nos despedimos, abraçando forte um ao outro. Ao afastar o rosto, ele me deu um beijo de leve na bochecha, o mais rápido que pôde, antes que nos vissem. Novamente nos olhamos profundamente e o seu olhar já era de “Desculpa” eu sinto o mesmo que você, mas não posso viver isso, não nessa vida... Meus olhos se encheram de lágrimas e ele começou a se segurar para não chorar também, se afastando de mim quando as meninas chegaram e perguntaram o que tinha ocorrido conosco após termos ficado tão tristes de um segundo para o outro. E eu respondi: “Foi o melhor dia da minha vida... e dele também...” Elas riram e disseram que parecíamos irmãos nessa viagem e que outros na viagem estavam perguntando se éramos realmente irmãos.

Setembro de 2018,

Os dias seguintes permaneceram os mesmos, sempre muito próximos, cumprimentos com abraços longos e o cheiro profundo que ambos dávamos ao nos abraçar. Os meses foram se passando... Anos... Nosso supervisor já tinha o apelidado de Robin e eu de Batman. As pessoas comentavam que não nos largávamos, sempre juntos para tudo, até brincadeiras que éramos um casal, o que nos deixava confuso e com medo: Será que eles estão falando isso brincando ou estão realmente questionando?

Janeiro de 2020,

Recebo a primeira notícia que me partiu o coração e no segundo seguinte, novamente, meus olhos encheram de lágrimas, me relutando para que não caíssem, ali, no meio de todos, assim que recebi a notícia: “Ei, Davi... Estou me mudando para outra empresa... Recebi uma proposta de estágio, mas não queria te falar, não queria que acabasse (ele nem precisou explicar o que seria o acabasse, eu entendi... sim... nós dois entendíamos) nossa voz embriagada, evitando falar cada palavra para não cair os dois em prantos... Eu disse:

“Eu sei... eu nunca quis que esse momento chegasse, me desculpa por...” e antes que eu terminasse de falar, ele falou:

“Não, não completa, não termina de falar isso” sua lágrima escorreu. E eu abracei ele e eu já estava chorando como uma criança. Todos que estavam nas mesas lá do fundo viram, alguns sem entender também choraram ao ver sua despedida.

Enquanto o abraçava, falei: “Eu sinto o mesmo que você, sempre senti”. Ele me abraçou bem forte e secou as lágrimas, acenando com a cabeça e me olhando com os olhos vermelhos e a boca trêmula, disse: “Eu também Davi... Me desculpa”. Eu o vi indo em direção ao seu armário, meus olhos acompanhando-o, como foi no início: Aquele garoto alto, magrelo, de coração tão puro pelo qual me apaixonei, indo embora, da mesma forma que o vi chegar em minha vida...

Dezembro de 2021,

Ainda que meus pensamentos já estivessem ocupados demais com outros assuntos da vida: Faculdade, trabalho e academia, pequenos flashes de memórias que tive com ele vinham como um “fantasma camarada” para me dar oi... Deixei a empresa poucos meses após a saída do Will e no fim desse ano, no mês de Dezembro, recebo uma mensagem que me fez sentir aquela mesma sensação de felicidade e euforia, mas também o segundo golpe que meu coração levou e que até hoje ainda não me recuperei: A mensagem no Whatsapp, dele... sim o Willian, e que dizia: “Oi Davi, quanto tempo, eu sinto muitas saudades de você, das nossas viagens, nossas conversas... Nós devíamos ter feito muito mais... Eu estou noivo, iremos nos casar em janeiro e já estamos morando juntos... ela também é da igreja”. Assim que terminei de ler, fui clicar em sua foto, estava ele com sua namorada, digo, futura noiva, ambos abraçados e relativamente felizes, ou parecia... Eu precisei de alguns dias para conseguir responder aquela mensagem. Eu estava confuso, mas não sei se foi por pressão da família por conta da religião, se ele encontrou alguém que pudesse se sentir em paz em transmitir tudo que sente e confesso que até hoje, não sei... Assim que pude responder, enviei: “Eu também sinto muito a sua falta... Eu nunca mais tive uma amizade assim como nós dois tivemos... Desejo toda a felicidade do mundo para vocês”

A sua última mensagem foi: “Eu também Davi... nunca mais terei...”

E esse aqui é o fim desse drama que vivi. Talvez não fosse o momento certo, nem a vida certa? Quantos amores proibidos nós já não tivemos? Eu não pude levar isso, nós não pudemos... Por mais que doa e que muitos de vocês não entenderão, seria esmagador o sentimento do mal que poderiam ter feito a ele. Algum tempo depois eu comecei a entender mais a condição que a família dele convive, a forma de abominar o amor entre o mesmo sexo... Bom, o que não cabe a mim julgar...

Talvez, em uma outra história, nos veremos de novo, Will, e nós iremos nos reconhecer novamente, assim como ocorreu conosco, mas esse amor não poderia ser vivido se isso te custasse a paz...

Com amor,

Davi.

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