Pelos comentários fica claro que os leitores ficaram, em menor ou maior grau, indignados com a traição de Cacau. Não podia ser diferente, como já escrevi ela optou por reservar o prazer extraconjugal apenas para si, excluindo o marido da equação.
Por outro lado os leitores estão batendo cabeças ao tentarem conceituar amor, sexo, paixão, relacionamento liberal, casamento aberto, sentimentos, etc.
Muitos acham besteira esse esforço dos leitores - e dos autores - , na busca por explicitar o real significado de cada conceito, não é o meu caso, gosto de separar alhos de bugalhos e vejo com bons olhos tal esforço.
Talvez seja fruto da minha prática profissional, afinal ao fazer uma anamnese ou registrar um prontuário eu tenho que ter em mente que outros médicos podem precisar das informações que eu registrei, elas precisam ser claras, sem margem para interpretações equivocadas.
O que percebo nos comentários ao conto é a total falta de consenso sobre os significados dos conceitos.
Para sairmos desse impasse alguns hábitos adquiridos devem ser abandonados. Os famosos "eu acho" e "é a minha opinião" devem ser deletados em prol de uma maior precisão conceitual, precisamos falar a mesma língua.
Volto a anamnese. Considero o melhor protocolo iniciar com o histórico familiar. O paciente relaxa ao ser questionando sobre questões que não tratam diretamente das suas mazelas mas das dos seus parentes e antepassados. Muitos não percebem que tais dados são fundamentais para entender o quadro geral, afinal nossa vida começa com a interação da carga genética de dois indivíduos.
Na natureza nada é por acaso, todos os seres vivos obedecem a dois princípios básicos: manter a vida e a espécie. Não importa se você se sente especial por ser racional, como o canguru ou a samambaia você tem sua vida norteada pela sobrevivência e pela reprodução.
Em outras palavras o sexo nada mais é que um dos mecanismo criado pela natureza para manutenção da espécie. O prazer sexual, como o perfume das flores, tem como função facilitar tal objetivo. O perfume atrai insetos que realizam a polinização e o orgasmo torna a mecânica da reprodução humana agradável para os sentidos. Ou seja, antes de mais nada é importante ter claro que o desejo sexual é um instinto e que o prazer sexual a recompensa por satisfazer tal instinto. O maior afrodisíaco, o que atraia o macho pela fêmea e vice versa, era o cheiro. Ainda não está claro como os famosos feromônios agem no cérebro humano, mas estudos em outros mamíferos deixam claro sua influência na escolha de com quem copular. Quando a compatibilidade química é muito grande o casal exclui outros(as) parceiros (as), o corpo passa a produzir estimulantes químicos que só funcionam entre eles, o prazer sexual é ampliado. Mas, como tudo que é bom, tem prazo de validade. Não dura muito e os indivíduos passam a procurar o prazer turbinado copulando com outros(as).
Esse período onde o(a) outro(a) é a grande fonte de prazer nós chamamos de paixão.
Sim meus amigos, sexo é instinto e nós apaixonamos quando encontramos alguém que amplia o prazer do sexo. Apesar do verniz cultural desenvolvido por séculos de vida em sociedade o sexo e a paixão fazem parte do mundo natural.
Já o amor é outra parada. Vem do conforto de conviver com alguém que tenha objetivos semelhantes, que seja amigo(a), que cuide e de carinho. Claro que o amor pode vir depois de uma paixão avassaladora, mas não é o sexo que faz alguém amar, talvez a memória da paixão seja um ingrediente importante no amor, mas também pode ser sua ruína.
Casais que viveram um momento de paixão e passaram a se amar, sempre, mesmo inconscientemente, vão se perguntar onde foi parar o fogo do início do relacionamento.
A maior parte das traições acontecem quando um dos cônjuges se vê apaixonado por um terceiro elemento. Como a maioria não diferencia "amor" de "paixão sexual", muitas vezes acredita estar amando sua nova paixão. O ciclo se completa, divórcio, novo relacionamento, morte da paixão, nova paixão, divórcio e vai por aí.
Mas nós somos racionais, não somos? Podemos tentar viver o melhor dos dois mundos. Basta ter claro que amor é alho e sexo é bugalho...
Com a revolução sexual nos anos 1960 muitos casais "abriram o relacionamento", não que isso não existisse antes, mas se tornou mais comum. Em síntese a alma do casamento aberto é manter o amor que une o casal sem se importar com a busca por prazer sexual fora do casamento. As regras são poucas, normalmente para preservar a imagem do casal (e da família), em um mundo monogâmico. Muitas vezes um dos cônjuges se apaixona, mas não tem problema, é só sexo no seu ápice, tem data para acabar. Já o amor que une o casal é eterno, transcende o ato físico. As palavras chaves do relacionamento aberto é liberdade e confiança. Não é para todo mundo...
Por outro lado, nos anos 1980 surgiu o conceito de casal liberal. Pode parecer a mesma coisa, mas não é. Nos casais liberais a liberdade é limitada por um número enorme de regras, o cônjuge permite relações fora do casamento sem abrir mão do controle. Foi nesse meio que surge a ideia do sexo sem sentimentos, como se isso fosse possível. Regras como não repetir o(a) mesmo(a) parceiro(a) passou a ser considerada fundamental para evitar a "catastrófica" paixão.
Muito sofrimento vem daí, as pessoas não entendem que toda interação humana provoca sentimentos, ainda mais algo tão íntimo.
A troca de casais sempre foi a prática preferida dos liberais, mas está crescendo o fetiche do corno e da esposa putinha. No meu entender nada explícita melhor tal visão. O corno se excita vendo a mulher ser devorada por outro e, inebriado pela sensação de poder, afinal foi ele que permitiu, goza sem desejar outro corpo. Dá mesma maneira a mulher goza ao se sentir poderosa por seu prazer com corpo ser o suficiente para satisfazer seu marido.
No meu modo de ver o relacionamento aberto é o mais honesto, o que permite o casal ter experiências mais significativas, afinal são livres. Pode "dar ruim"? Claro! Mas mesmo relacionamentos monogâmicos conservadores existe está chance. Olha a taxa de divórcios!
Cacau errou ao não ser honesta com Gabi, no meu entender ela deveria ter deixado claro que gostaria de novas experiências mas que não se sentia confortável em ser um apêndice do fetiche do marido. Se Gabi concordasse o casal seguia juntos, cada um buscando experiências paralelas, se não concordasse ela teria que avaliar se o amor que sente pelo marido compensa reprimir sua sexualidade. Monogamia ou divórcio.
No mais, PUTA CONTO!! Parabéns.