Terça

Um conto erótico de Vaerloga
Categoria: Heterossexual
Contém 562 palavras
Data: 22/09/2024 03:38:13

A bruxa apagou o cigarro com um suspiro.

A lua sangrenta brilhava no céu noturno.

Os cascos dos cavalos podiam ser ouvidos sobre as nuvens carregadas. Chuva e trovão. Cães, elfos e deuses esquecidos.

— Tá entediado de novo? — ela perguntou ao ceifador — Cansou de brincar com garotinhos?

— Eles quebram rápido, esses deuses do novo mundo. E você? Ainda negociando com a Igreja?

— Consegui um bom estoque de água benta — a bruxa disse, retirando do bolso um cantil de prata — Tá servido?

— Isso vai te matar dia.

A bruxa tomou um longo gole, depois soltou fumaça pelas narinas.

— Aposto que você vai estar me esperando.

— Sei não. Quanto tá valendo a sua alma por esses dias?

— Isso depende. Os vagalumes não pagariam um tostão furado, mas dizem que o diabo subiria pra me buscar.

— Nem. Ele anda ocupado com sua pequena vendetta. Bem, ninguém me falou nada, se é o que quer saber.

— Você não veio me ver pelo azul dos meus olhos.

— Nem mesmo se eles fossem azuis.

— E então?

— Então o que?

— Tá, entendi. Você não vai me contar.

Como uma ave de mau agouro, o ceifador seguiu a bruxa. Não havia o que fazer. Ela sabia como lidar com demônios, mas condutores estavam fora da sua alçada.

Aquela era uma semana fraca, poucos exorcismos. Ela cobrou muito mais do que devia, é claro. Você precisa estar muito desesperado para recorrer a uma bruxa com tantos padres por perto, então não reclame por ela torcer a faca.

Então surgiu um trabalho que ela não fazia à muito tempo. Um velho moribundo queria que alguém devorasse os seus pecados. A bruxa não era muito fã de lágrimas, mas estava tentando largar seu vício em esperma e tinha pouco sangue de qualidade no mercado. Então ela topou. E sorriu ao descobrir quais pecados estavam no cardápio. Um dos raros pecados que ainda não deixaram de existir na modernidade líquida. Não houve negociação, o velho monstro entregou a ela toda riqueza que acumulara em troca dos tesouros do paraíso.

Outra, que não ela, acharia uma refeição um tanto indigesta, mas aquela bruxa já comeu coisa pior.

O selo foi ativado, o pactuário recebeu a sua parte. E a bruxa bebeu as lágrimas, a culpa e devorou todos os demônios que atormentavam a sua sombra.

— Seu preço acaba de subir no mercado — o ceifador disse, fazendo as contas e tentando pensar em um comprador. No entanto, os riscos ainda superavam as recompensas.

Por um extra, o ceifador despachou a alma do penitente para o além.

Ele deveria saber melhor. Bruxas não garantem o paraíso. Elas só te tiram do inferno.

A água benta desceu queimando. Todas aquelas crianças gritando em agonia.

— Precisa de ajuda para chegar em casa?

— Eu tô bem — a bruxa disse, zumbizando pela rua.

Uma gostosinha daquelas bêbada no meio da madrugada não tardou a chamar atenção. Mas o rancor em seu olhar lhes roubou a virilidade. Pelo menos a grinalda que lhe feria a coxa fez o seu trabalho.

“Uma pena” — a monstrinha dentro dela murmurou — “mesmo de má qualidade, um pouco de esperma viria bem a calhar. Um pouco de esperma e muitos litros de sangue”.

Ao chegar no santuário, a bruxa se deixou cair no sofá. Soltou um estalo de língua ao perceber o ceifador ainda por perto.

No céu tempestuoso, a caçada selvagem continuava.

Só mais uma terça-feira.

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 6 estrelas.
Incentive Giselle Kunrad a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.
Foto de perfil de Giselle KunradGiselle KunradContos: 12Seguidores: 70Seguindo: 0Mensagem Gosto de contar tanto histórias cotidianas quanto histórias fantásticas.

Comentários

Foto de perfil genérica

Simplesmente fabuloso esse texto!!! Como eu amo textos assim, onde o sombrio e o erótico se misturam!!! Isso é magia para mim e vc uma feiticeira que me faz querer mais e mais textos seus...

0 0