(Karol)
Após aquela primeira noite em que Mauro teve sua noite de vingança, esperei ansiosamente por uma ligação dele, ou ao menos uma resposta às mensagens que eu enviei. Cada toque do celular que não era dele parecia ecoar pelo quarto, aumentando minha inquietação.
Com o passar dos dias, eu me sentia cada vez pior. Era como se estivesse caindo em um buraco sem fim, escuro e sufocante. Já não conseguia acompanhar as aulas na faculdade; os cadernos e livros permaneciam intocados sobre a mesa, empoeirando junto com a minha vontade de seguir em frente. Não falava com ninguém, evitando principalmente Vagner, e a cada refeição perdia o apetite, mal tocando na comida que minha mãe insistia em preparar.
Logo meus pais perceberam a mudança. As olheiras profundas que marcavam meu rosto pálido, a apatia e os sorrisos forçados foram suficientes para que, após alguns dias, eu fosse questionada. Não tive alternativa e expliquei que Mauro e eu havíamos nos separado. Meu pai, protetor como sempre, enrijeceu a expressão e, cruzando os braços como se sustentasse toda a raiva que sentia por mim, declarou que iria conversar com Mauro para saber o que ele havia feito comigo.
Imediatamente implorei que ele não o fizesse. Com lágrimas nos olhos e um nó na garganta, tive que contar o que aconteceu. Mesmo tremendo e com a voz falhando, revelei apenas o necessário: contei que havia bebido demais numa festa e que tinha beijado um rapaz da faculdade. Tentei omitir qualquer detalhe que pudesse envergonhá-lo ainda mais, mas, no fundo, me perguntava se ele ainda teria coragem de ir até Mauro depois disso.
Mais tarde, naquela mesma noite, minha irmã e meu cunhado, Bruninho, apareceram em casa logo após o jantar. Eles surgiram com um olhar preocupado, mas logo a expressão dura de Bruninho contrastou com o consolo frio que ele me oferecia. Sem que eu soubesse, ele e meu pai decidiram ir até a casa de Mauro. Fiquei no meu quarto, inquieta, sentada na beira da cama com minha irmã ao lado, enquanto eles saíam sem dar explicações.
Para minha surpresa, ao retornarem, me informaram que Mauro não estava em casa. O silêncio do local os fez hesitar, mas, em um movimento rápido, meu pai conseguiu convencer o vigilante noturno, com sua lábia habitual, a revelar que Mauro havia viajado. Aquilo foi mais um golpe no meu coração, como se o buraco no qual eu caía ganhasse ainda mais profundidade.
Quando eles voltaram para casa, eu estava trancada no quarto com minha irmã. Ela, que sempre teve um tom autoritário e direto, atendeu a ligação de Bruninho no viva-voz, expondo-o à humilhação com a mesma frieza que sempre usava. Ele, sem outra opção, ouviu as palavras duras e, no final, ela o ordenou com um tom cortante: “Descubra onde Mauro está. Só volte para casa quando tiver informações.”
……..
(Mauro)
Após o jantar com Paola, um misto de vergonha e arrependimento tomou conta de mim. Lembrava-me do jeito impulsivo com que tinha agido, algo que nunca fizera antes. Desde que deixei Karol na entrada do condomínio, parecia que minhas emoções estavam ditando minhas ações. O reflexo no espelho do carro, com o rosto cansado e os olhos semicerrados de preocupação, mostrava alguém que eu mal reconhecia.
Eu estava me dirigindo a um caminho perigoso, uma armadilha que eu mesmo parecia estar construindo. Esses pensamentos confusos foram suficientes para que eu recusasse o convite de Paola para dormir em sua casa naquela noite. Com o coração acelerado e a mente em guerra, voltei para casa. Estacionei o carro e, ao sair, o ar frio da noite me atingiu, ajudando a clarear um pouco os pensamentos.
Eu precisava urgentemente recuperar o controle sobre minhas emoções. Sabia que, se não o fizesse, cairia na armadilha que tantas pessoas traídas enfrentam: perdoar submissamente o que nunca deveria ter sido perdoado. Entrei em casa, largando as chaves sobre a mesa e sentindo o peso de um silêncio esmagador. A cada passo, ecoava a ideia do paradoxo que me assolava – a dor de um amor ferido, que ainda me mantinha vulnerável.
Karol havia puxado muito o jeito da mãe e da irmã. Sempre soube do que meu amigo de infância, Bruno, sofria nas mãos da irmã dela. No começo, ele se deixou levar pela atração e pelo desejo, mas já fazia anos que sua futura esposa havia ultrapassado todos os limites. Essa lembrança me fez respirar fundo e me lembrar do motivo pelo qual eu tinha que manter minha cabeça no lugar, para não acabar me tornando uma cópia de Bruno.
Fiquei tentado a apagar as fotos que tinha mandado. Sabia que minha cunhada, que sempre lia entrelinhas com precisão cirúrgica, veria nelas um reflexo da minha vulnerabilidade. Isso a daria munição para manipular a situação a seu favor.
Mas apagar as fotos seria o mesmo que admitir meu erro, o que só me deixaria mais exposto. Com esses pensamentos ainda turbulentos, resolvi conversar com um amigo de infância, que me deu uma ideia. Ele sugeriu o que talvez eu devesse ter feito desde o início: sumir sem dar notícias. E, ao voltar, agir com a maior indiferença possível com Karol. Sabíamos o impacto que isso teria, especialmente depois de uma briga ou término.
Com essa decisão em mente, entrei em contato com o diretor de logística da empresa onde trabalho, solicitando uma folga de duas semanas. Sabia que nesses dias nada urgente aconteceria, e eu poderia resolver qualquer questão de forma remota. Embora hesitasse, acabei explicando a ele o que estava acontecendo, mostrando uma vulnerabilidade que ele, um homem ambicioso e implacável, não deixaria de notar.
…….
(Karol)
Já passavam das duas horas da manhã, e ainda nada de Bruno retornar. Eu estava deitada, com a cabeça recostada no peito de minha irmã, sentindo o calor e o conforto da sua presença. Ela, sem dizer uma palavra, fazia cafuné nos meus cabelos, os dedos deslizando suavemente pelas mechas soltas, tentando apaziguar a angústia que apertava meu peito. Mas, por mais que aquele carinho fosse acolhedor, parecia insuficiente diante da dor que me consumia.
Minha mente se perdia em pensamentos torturantes. Tudo que eu conseguia pensar era em Mauro, o único homem que tinha significado tudo para mim, alguém que parecia agora escorregar por entre meus dedos devido a um erro impulsivo. Um erro idiota, um desejo de experimentar algo passageiro, que agora ameaçava destruir o que tínhamos.
Nunca houve ninguém como Mauro. Ele me conhecia em profundidade, sabia o que falar, como tocar, onde conduzir cada sensação. Cada detalhe da nossa conexão era único. E agora, eu o estava perdendo... Mas por quê? Para quem? Um garoto imaturo, um moleque que nem chegava perto do que Mauro era para mim.
A raiva crescia dentro de mim, não pelos outros, mas por mim mesma. Eu era a culpada. Fora eu que tinha permitido que amigas me incitassem a fazer algo que normalmente nunca faria. Mas que diversão havia nisso, afinal? Sem Mauro ao meu lado, qualquer coisa parecia vazia.
Quando já estava quase perdendo as esperanças, o celular da minha irmã começou a tocar. O som me trouxe de volta, e ela sorriu com um ar de confiança, segurando o aparelho.
- Viu? Eu disse que ele traria notícias. Você precisa saber estimular seus homens - falou ela, soltando uma risada rápida antes de atender no viva-voz.
- Meu amor, minha rainha. Desculpe ligar tão tarde - a voz de Bruno soou do outro lado, séria, quase preocupada.
- Você sabe que desculpas não bastam. Pode ser injusto, mas essa é sua realidade. Se quiser, pode se separar... respondeu Beth, com um tom irônico, mas mantendo uma voz firme, simulando estar irritada.
Bruno começou a gaguejar, balbuciando uma explicação confusa, mas minha irmã o interrompeu rapidamente.
- Espero que tenha informações úteis. Caso contrário, as coisas vão piorar para você.
Ela disse isso com uma voz intimidadora, embora logo depois tenha levado a mão à boca, tentando conter o riso.
- Minha rainha, eu liguei para um amigo comum e ele ficou preocupado, então ligou para os pais de Mauro. Mauro viajou sozinho para Floripa.
Assim que ouvi o que Bruno nos revelou, endireitei-me na cama e peguei o celular da mão de Beth, sentindo um nó de ansiedade se apertar ainda mais.
- Tem certeza disso? - perguntei, aflita, quase sem fôlego.
- Sim... sim, é a informação mais confiável que consegui. O pai dele mandou um áudio. Posso repassar se quiser.
Eu fiquei incrédula, absorvendo aquela informação. Permaneci em silêncio, e Bruno também se calou do outro lado da linha.
Minha irmã retomou o celular das minhas mãos e, com uma frieza que sempre me impressionava, disse:
- Isso é perfeito. Vou te apresentar o Carlão, um dos meus melhores 'comedores'. Até o Bruninho viciou nele, não é, amorzinho?
Diante desse comentário, Bruno não respondeu. Ela poderia tê-lo torturado mais com palavras, mas apenas desligou sem se despedir. Logo depois, enviou-lhe um áudio com uma voz dura:
"Não me ligue mais! Vou dormir na casa dos meus pais hoje. Durma no carro. O Claudinho ainda está em casa. Amanhã, faça café para ele e pague seu Uber. Se fizer tudo direitinho, talvez você escape de uma punição."
Minha irmã, então, me explicou seu plano. Parecia lógico: eu teria alguém para suprir minha carência e, ao mesmo tempo, poderia causar ciúmes em Mauro.
Eu estava confusa e perdida, mas acabei aceitando. Confesso que as diversas fotos de Carlão que ela me mostrou influenciaram minha decisão. Ele parecia irresistível, e talvez isso ajudasse a mascarar a dor.
Agora, eu estava realmente pronta para jogar o jogo. Sabia que isso traria consequências – e muitas.
…….
(Mauro)
Ao chegar em Floripa, já de madrugada, fui recepcionado no prédio onde ficaria hospedado por duas garotas, filhas do dono do apartamento que aluguei. A noite estava silenciosa, e a iluminação suave do saguão realçava as silhuetas das duas, que conversavam animadamente enquanto eu me aproximava.
A mais velha, que se apresentou como Vanderleia, mas preferia ser chamada de Léia, tinha um sorriso caloroso e era uma mulher de presença marcante. Morena de pele brilhante, sua beleza lembrava aquelas musas de Carnaval que só se vê na TV durante os desfiles das escolas de samba. Os cabelos negros e ondulados desciam sobre os ombros, destacando o olhar intenso e confiante. Com 25 anos e casada, carregava consigo uma sensualidade natural, porém contida, quase como quem guarda um segredo.
Já Sandra, a mais nova, exalava um charme diferente. Sua pele ainda mantinha um tom bronzeado suave, contrastando com os olhos castanhos claros que reluziam sob a luz do hall. Ela era mais baixa que a irmã, com um corpo mais delicado, quase frágil, mas que trazia uma atratividade singular. Aos 21 anos, e se dizendo solteira, tinha um jeito despretensioso e uma voz doce, mas com um toque de audácia. Os cabelos claros caíam soltos, e o sorriso que ela me deu enquanto falávamos era cúmplice e acolhedor.
As duas foram incrivelmente simpáticas e acolhedoras, e logo puxaram conversa para entender o que me trazia a Floripa, ainda mais viajando sozinho. A curiosidade delas era afiada, e quando mencionei brevemente meu problema de relacionamento com Karol, notei uma mistura de empatia e intriga nos olhares delas. Mas, claro, contei apenas o essencial, mantendo o foco na ideia de que precisava de um tempo para mim.
Sandra, após um tempo, mencionou que tinha um jipe e se ofereceu para me levar a alguns dos lugares mais bonitos da cidade. “Meu preço? Só sua companhia,” disse ela, com um sorriso que trazia uma malícia leve, quase inocente, mas que eu sabia que escondia outras intenções. Seu olhar era direto, e seu tom de voz sugeria que ela não se incomodava em lançar palavras com um duplo sentido.
Eu não era ingênuo e logo captei o jogo. Era claro que Sandra estava me testando, sondando até onde eu iria. E, dessa vez, eu decidi aceitar. Me permiti entrar naquele jogo, com a mesma intensidade com que ela sugeria cada possibilidade.
Acabei entrando de vez no jogo. Dessa vez parecia estar batendo um bolão.
Continua….