Paula fez o pedido do jantar pelo aplicativo, a previsão de entrega era de 20 minutos, enquanto esperavam iniciaram a conversa.
LUIZ: Nós nos conhecemos desde a faculdade, fizemos estágio juntos e logo que nos formamos nos tornamos sócios. Eu nunca advoguei contra você. Hoje vai ser a primeira vez!
PAULA: Declaro aberta audiência! (risos) . Com a palavra o advogado da acusação ( risos). Qual a sua tese Dr. Luiz?
LUIZ: (risos) Eu estou rindo do seu jeito! Mas o assunto é serio! Minha tese é que o Claudio é um golpista que contratou duas criminosas para se fazerem passar por Celeste e Aletheia, alegando que elas estão vivas e são alienígenas. Tudo isso com o claro intento de nos enganar e obter indevida vantagem financeira, crime de estelionato!
PAULA: E para arquitetar esse golpe, você acha que Scharlenne foi convidada?
LUIZ: Eu acho que ele pensou em fazer isso, mas não chegou a convidá-la. É uma suposição. O Claudio tem contratado prostitutas com frequencia. A algum tempo atrás ele chegou a contratar Scharlenne para um programa, não há dúvidas que ela é parecida com Celeste.
PAULA: E por que não foi convidada?
LUIZ: Bom, pelo que ouvi, Claudio comentou com Scharlenne que tinha uma amiga muito parecida com ela que se chamava Celeste. Scharlenne respondeu que tinha um cliente que a chamava de Celeste.
PAULA: E o Claudio conseguiu adivinhar que o cliente era você?
LUIZ: Sim, qual outro cliente além de mim iria querer chamar Scharlenne de Celeste?
PAULA: E dessa forma seria inútil contratá-la para te enganar, visto que você já a conhecia.
LUIZ: Exato!
PAULA: Mas o Claudio ficou 30 meses internado no CMP, sem apoio de familiares ou amigos, como ele conseguiu sair de lá e se estruturar para aplicar golpes? Se é que os está aplicando. Você mesmo disse que ele parece que está muito bem financeiramente.
Toca o interfone, era o jantar que havia chegado. Enquanto Paula vai receber Luiz aproveita para ficar pensando no assunto.
Como Luiz já é de casa, decidem comer na mesa da cozinha mesmo. Enquanto jantam Luiz retoma a conversa.
LUIZ: Bom, quando alguém como Claudio fica no sistema carcerário ele pode ser facilmente aliciado por membros de organizações criminosas. Eu acho que foi isso que aconteceu com o Claudio. Ao sair de lá ele começou a trabalhar para alguma organização que deu um suporte para ele.
PAULA: Mas então ele deveria estar trabalhando para essa organização e não dando golpes.
LUIZ: Já faz 5 anos que saiu do CMP, ele pode ter abandonado a organização criminosa, ou pode estar nela ainda e aplicando golpes também. Ou quem sabe a família o desculpou e o aceitou de volta.
PAULA: Mas nós vimos a condição que Claudio estava na audiência, era um lunático. Como pode estar tão bem? Precisa de muita inteligência e vivacidade para aplicar golpes.
LUIZ: Ele ficou 30 meses em tratamento no CMP, talvez conseguiram curá-lo.
Nem mesmo Luiz acreditava nessa possibilidade de alguém ser curado no CMP.
PAULA: Mas o laudo do perito no processo diz que o dano cerebral é irreversível!
LUIZ: Bom , as vezes esses peritos fazem o laudo de qualquer jeito, pode estar errado ...
PAULA: Você não pode simplesmente alegar que o laudo está errado! Fácil demais! Para você dizer que o laudo está errado, só provando. Caso contrário é um fato que a lesão cerebral do Claudio é irreversível!
LUIZ: Tem razão! Não sou médico, mas tem lesões de diversas magnitudes, algumas são mais graves, outras não. Algumas lesões podem causar somente sintomas leves: dor de cabeça ou tontura. As vezes a lesão é irreversível mas é passível de ser controlada, com remédios por exemplo, e ele vive uma vida normal.
PAULA: Tá, essa eu vou ter de olhar de novo o laudo no processo. Mas agora, se isso for mesmo um plano do Claudio, é bem louco, né?
LUIZ: Eu já vi coisa pior, é cada golpe que tem por aí. Se passar por alienígenas para tentar dar o golpe é muito mais comum do que você imagina.
PAULA: A Aletheia esteve aqui hoje, se era uma golpista como poderia ter exatamente a mesma tatuagem? Eu só comentei com você e com Celeste sobre essa tatuagem.
Fazia tempo que Luiz não ia no apartamento de Paula, mas nota que os porta retratos com fotos dela junto com Aletheia ainda estavam lá, tinha um no quarto, um na sala e até mesmo um em cima de um balcão na cozinha próximo onde eles estavam comendo. Luiz tem que ter muita cautela ao falar sobre Aletheia.
LUIZ: Faz 5 anos que a Aletheia faleceu, pela nossa experiência constatamos que a memória vai ficando cada vez mais imprecisa com o passar do tempo. Depois desse tempo todo você pode não ter uma lembrança 100% fiel de como realmente era a tatuagem.
PAULA: Quando a Aletheia fez a tatuagem eu tirei uma foto, e tenho alguns nudes que ela me mandou, posso te garantir que a tatuagem é exatamente a mesma.
LUIZ: Talvez Aletheia comentou com as colegas do Hospital sobre a tatuagem.
PAULA: A Aletheia me falou que também não comentou. Mas ainda que tivesse comentado com alguém, como a pessoa poderia saber com exatidão como era a tatuagem? Para isso somente se olhasse, e daí ela teria de estar nua.
LUIZ: Tem algumas possibilidades, numa consulta médica por exemplo, com uma ginecologista. Outro exemplo, lá no hospital tem um vestiário para as funcionárias, ela pode ter trocado de roupa lá, e alguém visto. Outro exemplo, lembra aquele dia que marcaram um jogo de futebol só para mulheres, a Aletheia e a Celeste participaram. No final do jogo eu lembro que todas as jogadoras foram para o vestiário e tomaram banho lá.
PAULA: Mas em todos esses casos o Claudio não teria acesso.
LUIZ: Alguma das mulheres poderia ter visto e contado para ele.
PAULA: Mas contar exatamente como era a tatuagem, uma descrição tão detalhada que permitisse reproduzi-la?
LUIZ: É possível sim reproduzir uma tatuagem somente com base na descrição. Alguém pode ter batido uma foto escondido, sem que ela percebesse. Se você tem nudes da Aletheia no seu computador, alguém pode ter invadido e ter tido acesso a essas fotos.
Luiz estava acostumado a defender teses, era sua profissão. Para ser bom advogado tem que acreditar 100% no que fala, e passar essa convicção para quem está ouvindo. E Luiz tem grande poder de convencimento. Embora fosse uma conversa informal com Paula, Luiz tentava ser o mais persuasivo possível, mas no seu íntimo já via que precisava de uma argumentação mais consistente, se estivesse mesmo em um julgamento precisaria apresentar provas. Ele estava ansioso por encontrar Fabião, para que ele pudesse lhe trazer essas provas.
PAULA: Mas porque alguém bateria uma foto da tatuagem da Aletheia escondido, prevendo que anos depois seria usada em um golpe? Sobre alguém ter invadido meu computador, guardo vários documentos importantes lá, os profissionais de TI que contratamos para nos proteger de hackers nunca reportaram nenhuma invasão.
LUIZ: São ideias que tenho sobre o que aconteceu, de fato vou ter que buscar evidências.
PAULA: E a moça que esteve em sua casa, você mesmo disse que ela sumiu em questão de segundos.
LUIZ: Sim, é verdade. Mas pelo que eu cronometrei, ela poderia ter se levantado do sofá assim que virei as costas e corrido para a parte dos fundos da casa e pulado o muro. Naquela região não tem câmeras.
PAULA: Se levantado com essa agilidade? Corrido nessa velocidade e pulado aquele muro, sendo ela pequena e franzina como você falou? Ainda mais estando ferida?
LUIZ: Eu pretendo que o Fabião vá lá em casa. Ele pode me dizer se de fato era possível uma fuga tão rápida sem que ninguém percebesse. Esses criminosos são muito ágeis em fugas, subir muros , etc. E também eu não sei se de fato ela estava mesmo ferida.
PAULA: É verdade, ela podia estar fingindo que estava ferida, seria uma maneira que ela encontrou de entrar na sua casa.
( Paula boceja e se espreguiça).
Em seguida Luiz pega um talher, bate na mesa com ele, fingindo que era um martelo desses usados por juízes;
LUIZ: (risos) Tendo em vista o adiantado da hora declaro suspensa a presente audiência. (risos).
PAULA: Mas mesmo que nos convencessem de primeira, se fossem mesmo golpistas bastaria fazermos algumas perguntas íntimas, que as golpistas não saberiam responder e seriam desmascaradas (Paula boceja de novo)
LUIZ: Eu tenho resposta para isso também. Mas nós dois estamos cansados. Muito obrigado pelo jantar e pela conversa , mas agora vou para casa!
PAULA: Luiz, eu gostaria que você dormisse aqui hoje, não estou me sentindo bem para ficar aqui sozinha, depois de tudo que aconteceu.
Luiz nunca gostou de dormir fora de casa. E é muito metódico, gosta de se planejar antecipadamente, Paula estava pedindo em cima da hora para ele dormir ali. Luiz nem tinha trazido roupas adequadas e itens pessoais de higiene. Já estava com problemas de insônia para dormir na própria casa, para dormir ali seria pior ainda.
Mas por outro lado ele entendia perfeitamente o que Paula estava sentindo, afinal ela tinha recebido a visita de uma golpista ou então de sua noiva que achou que havia falecido. Ele entendia a insegurança de Paula e o seu pedido por companhia.
LUIZ: Claro Paula, eu posso dormir aqui hoje. Eu tenho uma muda de roupa no carro.
PAULA: Obrigada Luiz, eu também tenho umas roupas que servem para você. São para quando meu irmão vem dormir aqui, estão limpas e são do seu tamanho. Tenho escova de dentes nova, na embalagem. Você pode ficar nesse quarto aqui mais próximo da cozinha, que é suíte, tem banheiro próprio.
Luiz foi se instalar no quarto, deixou seus objetos pessoais em cima de uma mesinha dentro do quarto. Chaves, celular, carteira e as 3 balas que Scharlenne lhe deu.
PAULA: Que balas diferentes!
LUIZ: É um produto natural, para combater a insônia. Uma amiga minha me deu (Luiz ficou com vergonha de dizer que ganhou da prostituta Scharlenne)
PAULA: Posso pegar uma pra mim?
LUIZ: Claro, pode sim. Está com insônia?
PAULA: Hoje não. Hoje eu estou com sono e sinto que vou dormir logo Vou deixar para chupar essa bala algum outro dia que eu estiver com insônia.
Luiz tinha pensado inicialmente em jogar as balas fora, mas agora mudou de opinião e resolveu guarda-las.
LUIZ: Certo. Paula, quero te pedir um favor, preciso de um caderninho ou um bloco de anotação e uma caneta.
PAULA: Claro Luiz, para que você precisa?
LUIZ: Bom, é recomendação do meu psicólogo. Ele trabalha numa linha em que analisa os sonhos dos pacientes. Ele me pediu para anotar o que lembro dos meus sonhos assim que eu acordar.
O psicólogo pediu isso ao Luiz, pois segundo ele após acordar, passados mais de 5 minutos é muito provável que esqueça boa parte do sonho. Por isso é importante anotar o que lembra assim que acorda.
Paula atendeu ao pedido de Luiz, trouxe o caderninho e a caneta, logo em seguida foi para o quarto dela e logo dormiu.
Luiz ainda ficou acordado mais tempo. Aproveitou para checar o apartamento, as portas e janelas, buscando sinais de arrombamento e verificando possíveis caminhos por onde a golpista poderia ter entrado ou fugido.
Ainda assistiu uma serie na TV, queria descansar a cabeça. Mas por coincidência na série o marido de uma das personagens havia morrido, mas ela tinha indícios de que na verdade ele estava vivo. Em um momento da serie a personagem pede que o marido falecido se comunique, nem que seja através de um sonho.
Após terminar de assistir foi para o quarto dormir. Colocou o despertador do celular para as 9:30h da manhã.
Ficou um tempo acordado, conseguiu dormir por volta de 01:30h da manhã.
As 6:30h, Luiz acordou com um forte barulho de metal vindo da cozinha, se levantou e foi até lá verificar o que era.
Quando estava chegando perto da porta da cozinha começou a ouvir alguns barulhos.
“Tem alguém na cozinha! Só pode ser a Paula, mas que engraçado, a luz tá apagada” pensou.
LUIZ: Paula! Paula! É você que está aí na cozinha?
Foi só o Luiz ter feito a pergunta que o barulho parou, mas ninguém respondeu.
Decidiu entrar na cozinha.
Entrou, acendeu a luz mas não viu ninguém, e agora estava um completo silêncio.
“ Devo ter me enganado, não tem ninguém aqui”
Saiu da cozinha e estava indo em direção ao seu quarto, mas logo que saiu ele ouviu um barulho de vidro se quebrando.
Voltou rapidamente para a cozinha, e não havia ninguém. No chão estava caído o porta retratos com a foto de Aletheia e Paula, o vidro do porta retratos estava quebrado, o que explicava o barulho.
Luiz estranhou, ele estava bem no meio do balcão. Impossível ter caído sozinho, e não havia vento ou nada que justificasse a queda. Na cozinha não havia ninguém. E se tivesse, para que alguém saísse da cozinha, teria obrigatoriamente de ter passado por ele.
Rapidamente vai até o quarto de Paula e bate na porta.
Paula abre a porta assustada.
PAULA: Aconteceu alguma coisa Luiz?
Luiz conta tudo que aconteceu na cozinha. Paula põe a mão na cabeça:
PAULA: Me desculpe Luiz! É tudo minha culpa, tem algo que eu esqueci de lhe contar!
LUIZ: Pelo amor de Deus Paula! O que você não me contou!?
Continua ...