Quando finalmente a vegetação começou a se abrir e a vila surgiu à frente deles, um pequeno suspiro escapou dos lábios de Flávia. Era uma visão impressionante, completamente diferente do que ela havia imaginado. As cabanas, construídas com madeira e palha, formavam um círculo em torno de uma grande clareira. No centro, havia uma fogueira apagada, ao redor da qual várias figuras se movimentavam, aparentemente ocupadas com suas atividades diárias. O lugar tinha uma aura antiga, como se estivesse preso no tempo. Havia uma vibração na atmosfera, algo que Flávia não conseguia identificar, mas que a deixava inquieta.
Reyam, sempre à frente, virou-se para o grupo, o olhar sério e impenetrável. — Chegamos — disse ele, sua voz ressoando com uma solenidade que Flávia não havia ouvido antes. — Esta é a nossa casa.
Luís apertou levemente a mão de Flávia, um gesto que tentava passar segurança, mas que revelava seu próprio nervosismo. Eles haviam passado semanas na selva, enfrentado desejos e provações inimagináveis, mas, agora que estavam diante do destino final, tudo parecia incerto.
Ao entrarem na clareira, Flávia percebeu que todos os olhos estavam sobre eles. Os aldeões os observavam com curiosidade, mas sem hostilidade. Eles os estudavam, como se estivessem avaliando cada detalhe. As mulheres, com seus corpos fortes e rostos marcados pelo sol, moviam-se graciosamente entre as cabanas, enquanto os homens, altos e musculosos, mantinham-se próximos ao centro da vila, em conversas silenciosas que, de tempos em tempos, se interrompiam para olhar na direção do grupo recém-chegado.
Nala, que havia estado em silêncio durante boa parte da caminhada final, aproximou-se de Luís e Flávia. — Vocês foram esperados por muito tempo — disse ela, sua voz carregada de uma sabedoria antiga. — O líder da vila deseja vê-los. É hora de vocês conhecerem o verdadeiro propósito de sua vinda até aqui.
As palavras dela fizeram um arrepio subir pela espinha de Flávia. Havia algo solene na maneira como Nala falava, algo que indicava que o que estava por vir era muito mais do que uma simples reunião. Luís assentiu em silêncio, apertando novamente a mão de Flávia antes de seguir Nala em direção à cabana central, que parecia maior e mais elaborada que as outras.
Ao entrarem na cabana, foram recebidos por uma figura imponente. O líder da vila, um homem alto e robusto, estava sentado em uma cadeira feita de madeira entalhada, adornada com símbolos que Flávia não conseguia decifrar. Seus olhos, escuros e profundos, observavam cada movimento deles com uma intensidade quase sobrenatural. Havia uma aura de poder ao redor dele, algo que deixava o ar pesado e carregado de expectativa.
— Bem-vindos à nossa casa — disse o líder, sua voz grave ecoando pelo espaço. — Vocês chegaram em um momento crucial. Há muito tempo, os espíritos nos disseram que um casal viria até nós, trazendo consigo uma nova fase para nossa comunidade. E agora, vocês estão aqui.
Luís e Flávia trocaram um olhar rápido, confusos com as palavras do homem. — Nova fase? O que isso significa? — perguntou Luís, tentando manter a calma na voz.
O líder os observou por mais alguns segundos antes de se levantar. — Aqui, na nossa vila, seguimos os caminhos antigos. Os espíritos guiam nossas decisões e nossos rituais. E há um ritual que deve ser cumprido... um ritual que envolve vocês dois.
Flávia sentiu o coração acelerar. Algo dentro dela já sabia que o que viria a seguir não seria simples ou fácil. O ar na cabana parecia mais denso, mais carregado, e ela sabia que aquele momento era decisivo.
— O ritual é antigo — continuou o líder, caminhando lentamente ao redor de Flávia e Luís. — E, para nós, é sagrado. Ele marca a passagem de um novo ciclo, a renovação das forças espirituais da nossa vila. E vocês, como os escolhidos, desempenharão um papel central nisso.
Nala, que estava ao lado de Reyam, olhou para eles com seriedade. — Vocês terão que participar... tanto Flávia quanto Luís. O ritual envolve vocês se unirem aos nossos guerreiros e aos líderes espirituais da vila. É uma honra, mas também uma prova.
Luís franziu o cenho, confuso. — Como assim? O que vocês esperam que façamos viemos para pregar a palavra?
Reyam, que até então havia permanecido em silêncio, deu um passo à frente. — Flávia — ele começou, sua voz firme e direta —, você será oferecida aos dez guerreiros mais fortes da vila. Cada um deles... a possuirá, como parte do ritual de renovação das energias. Isso faz parte do ciclo de fertilidade e poder que seguimos há gerações.
Flávia arregalou os olhos, sentindo o choque percorrer seu corpo. A ideia de ser possuída por dez homens, consecutivamente, era algo que ela jamais havia imaginado. Seu coração batia rápido, o medo e o desejo se misturando de maneira confusa em sua mente.
— E eu? — perguntou Luís, sua voz tensa.
— Você — respondeu Nala, seus olhos brilhando com uma intensidade quase feroz —, será oferecido à filha do líder da vila e à filha do pastor local, um gesto de união entre as forças espirituais da vila e a nova liderança que vocês representam. Elas irão possuir você, como parte do ritual de transição.
O silêncio que seguiu as palavras de Nala parecia pesar mais do que o próprio ar ao redor. Flávia e Luís se entreolharam, tentando processar o que acabavam de ouvir. Havia uma mistura de medo, choque e, estranhamente, excitação. A selvageria daquele lugar, as regras antigas e os rituais primitivos, tudo parecia distante da realidade de onde haviam vindo. Mas ali, naquele momento, a única opção era aceitar ou recusar o chamado da selva e seus habitantes.
— Vocês podem recusar — disse o líder, finalmente. — Mas saibam que isso significaria a rejeição dos espíritos que nos guiam. E a rejeição pode trazer consequências sérias.
Flávia sentiu o peso da escolha sobre seus ombros. De um lado, o desejo de resistir, de se agarrar aos resquícios de sua vida anterior, da moralidade e dos costumes com os quais havia crescido. De outro, a sensação de que aquilo era parte de uma jornada maior, de uma transformação que já havia começado há muito tempo, e que agora alcançava seu clímax. Ela olhou para Luís, procurando apoio.
Ele a olhou de volta, e em seus olhos, ela viu o mesmo conflito. Mas também viu algo mais. Uma aceitação silenciosa de que, de alguma forma, aquilo fazia parte do que eles haviam se tornado. Sem palavras, Luís assentiu levemente, e Flávia soube que ele estava disposto a seguir com o ritual.
— Nós aceitamos — disse Flávia, sua voz baixa, mas decidida.
O líder sorriu, satisfeito, e Reyam deu um passo para o lado, sinalizando que eles poderiam descansar antes do ritual. A partir daquele momento, sabiam que suas vidas jamais seriam as mesmas. O destino final os aguardava naquela vila, e o que estava por vir selaria a transformação completa de suas almas, corpos e desejos.
Flávia sabia que a noite seguinte seria a mais intensa de sua vida.