1. Monique e Bruno
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É curioso como a vida pode mudar tão profundamente em tão pouco tempo.
Monique e Bruno já estavam juntos há bastante tempo, mas apenas dividindo o mesmo espaço. As boas lembranças do início do casamento foram se dissipando, desgastadas por inúmeras discussões, pelo antigo emprego de Bruno, que o mantinha distante, e pela constante interferência da família de Monique, o que tornava tudo ainda mais complicado. Além disso, havia o vício de Bruno em apostas, que agravava a situação.
Quando a primeira filha, Victória, nasceu, o casal decidiu se mudar para outra cidade, tentando recomeçar longe da família de Monique. Bruno já tinha uma nova proposta de emprego, que lhe permitiria estar mais presente no lar.
De fato, as coisas melhoraram muito na nova cidade. Não havia mais brigas, estavam bem financeiramente, mas a frieza de antes só deu lugar a uma morna indiferença. Tesão, mesmo, era coisa que não existia mais, e essa era a marca do casal: eram bonitos e jovens, mas cada vez mais insossos e distantes.
Se concentravam apenas na filha, enchendo-a de carinho, e assim a vida seguia. Porém, por trás dessa estabilidade aparente, algo se deteriorava. Com o tédio tomando conta, Bruno voltou às apostas - em um estabelecimento ilegal -, e então, numa batida da polícia, foi acusado de ser um dos organizadores, o que não era verdade. No fim, acabou preso por dois anos.
A briga entre o casal foi terrível, e a decepção de Monique, imensa; ela terminou tudo antes do julgamento, angustiada com o fato de que a filha, agora uma pré-adolescente, teria que carregar o peso de ter um pai preso. E ali morreu o que restava daquele casal.
Dois anos se passaram e Bruno estava fora da cadeia. Os portões se abriram e um carro o aguardava lá fora. Era Monique, linda como nunca. Ela o abraça ali mesmo e eles até choram emocionados. Bruno não esperava por isso, tinha certeza que agora teria de fazer um esforço colossal se quisesse ver a filha, e acreditava também que talvez Monique estivesse em outro estado ou até país. Mas tudo aconteceu de outra forma, e ele estava muito feliz.
O casal não conversa muito no carro, porque é como se tivessem perdido toda a intimidade, mas havia um clima bom. Depois de quase três horas de viagem, chegam em casa.
- Onde está ela? - pergunta Bruno por sua filha, Victória.
- Vick! Venha ver seu pai! - chama Monique.
Victória desce as escadas, a garota mais linda que Bruno já tinha visto, e como tinha crescido!, e sorridente dá um abraço no pai.
- Filha, como eu senti sua falta…
- Eu também, pai!!! - e eles se emocionam.
Você, leitor, pode imaginar como foram esses primeiros dois dias: colocando as conversas em dia e aproveitando todos aqueles pequenos prazeres que só um lar proporciona. Bruno estava encantado com a personalidade da filha e com sua beleza, que parecia uma versão mais jovem da mãe. A relação entre pai e filha floresceu rapidamente, e logo já estavam bem próximos. Era visível a felicidade de Vick em ter o pai de volta em casa.
A nossa história começa aqui, quando depois de três semanas o casal conversa na cama, na hora de dormir. Conversa vai e conversa vem…
- E… você não tem ideia de como me senti sozinha, sabe?
- Eu sei, amor, posso imaginar. Se serve de consolo, uma cela de cadeia também é algo que não é fácil.
- Sim... Eu estava tão confusa… Eu… Eu preciso te contar uma coisa, até porque… Eu sei que mais cedo ou mais tarde você ficará sabendo...
- Pode me contar, amor. O que houve? Você teve algum relacionamento enquanto estive preso? Isso não seria nada errado, afinal, você tinha terminado comigo.
- Amor… É mais esquisito que isso.
- Hum.
- A Victória não te contou nada?
- Não, contou o quê?
- … Você tem falado com sua irmã?
- A Karen? Bem, eu conversei só um pouco com ela pelo Whatsapp. Ela está no Peru com umas amigas e volta semana que vem, aí ela vai passar aqui para me ver. Mas o que ela tem a ver com isso?
- Bom, querido, sua irmã é muito legal… você sabe, ela é do tipo de pessoa que gosta de ajudar, e tal…
- Sim, mas e daí?
- Mas ela… ao mesmo tempo acaba desestabilizando as coisas.
- Amor, fala logo o que houve, vocês discutiram? Quando vocês se viram?
- Lembra quando você me contou aquelas coisas… da sua adolescência com ela…?
- Ah, para com isso, Monique. Você vai mesmo trazer esse assunto? Eu já expliquei, eu e ela não tínhamos nada na cabeça... Meus pais ficavam fora o dia inteiro... Enfim. Só pra você ter ideia, quando descobriram o que estava acontecendo entre eu a Karen, eles só deram uma bronca na gente… e só! Uma bronca bem leve, se quer saber. E fingiram que estava tudo resolvido.
- ...Mas depois de adultos vocês fizeram algumas vezes, você já me disse isso.
- Antes de eu estar casado com você, Monique, que fique bem claro! E mesmo assim, foram poucas vezes. Não se esqueça que depois a Karen foi morar em outro estado e a gente mal se via. Mas amor, por que você está trazendo esse assunto à tona???
- É que... Quando você foi preso eu fiquei péssima. Sua irmã ficou alguns dias aqui comigo, para me ajudar…
- Certo…
- Eu estava muito confusa…
- Sim, e…?
- Tipo... Ela foi ficando, ficando… Acho que ficou uns quatro meses aqui.
- Tá, mas, e daí? - Bruno ficar confusoMonique silencia e olha para baixo
- Peraí... Não, não…. Deixa eu ver se estou entendendo... Vocês foram pra cama??? Você era Karen!?
Monique desaba de uma vez:
- Eu estava tão confusa, amor! Por favor, não me julgue! Eu estava na situação de ter que criar uma filha sozinha, com meu marido preso! Você sabe a bagunça que estava na minha cabeça? E ainda tinha minha mãe me ligando, me infernizando, me dizendo que tinha me avisado que você não prestava...
- Amor… eu já entendi, não estou te julgando. Não há motivos para esse drama, ok? Eu acho legal você ter me contado, mas se fez isso só por medo de a Karen me contar, não acho que ia acontecer, ela pode ter mil defeitos, mas ela não contaria.
- Não é sobre ela a minha preocupação, Bruno.
- Não?
- … Bom, é que sua filha ficou sabendo.
- Ai, caralho… Puta que pariu…
- E como ela soube? - pergunta Bruno já com a mão na testa.
- Bom, basicamente ela tinha ido para uma aula de dança… E eu e sua irmã... Começamos a… fazer… na sala.
- No chão?
- No sofá, isso não importa, amor! Eu não quero entrar em detalhes!
- Eu preciso entender o cenário, mas ok, prossiga.
- A Vick não tinha ido, cancelaram a aula em cima da hora e ela entrou de volta e… viu... Tudo.
- Eita porra… Ai, caralho - diz Bruno com a mão sobre a cabeça - E como ela reagiu?
- Ela foi super educada, disse apenas: “Eita, gente, desculpa, eu não sabia.”
- Putz…
- Depois disso, me isolei no quarto, de vergonha, até que ela bateu na porta Eu não sabia onde enfiar a cara, mas ela disse que eu não precisava ficar daquele jeito, e que ela já sabia de tudo bem antes desse episódio. Ela disse que tinha visto eu beijar a tia dela na cozinha alguns dias antes, então quando ela nos viu no sofá, já sabia o que estava acontecendo.
- Eita porra... Certo, então o seu medo era a sua filha me contar?
- Não, porque acho que eu conseguiria convencê-la a não contar
- Então, qual era seu medo?
- É que você sabe como a Karen é com a filha dela, né? Eu duvido que a Karen não tenha comentado com a Leona.
- Porra, essa história só piora??? Kkk
- Amor, estou falando sério, por favor! Pensa bem: sua filha, sua irmã e sua sobrinha. É muita gente, uma hora você ficaria sabendo. Por isso meu medo.
- Sim, entendo. Pior que Leona e Vick têm a mesma idade, não sei se atualmente são amigas, mas…
- São, sim, vivem conversando pelo Whatsapp
- Ih, caralho, já devem estar falando sobre tudo isso faz tempo, então
- Mas isso passou, só isso que quero te dizer - diz Monique aliviada - Eu precisava te contar.
- Eu ainda preciso processar essas coisas. Eu nem sei como devo entender isso. Tipo... isso faz de mim um corno???
- Claro que não, né? Para! Assim como não me sinto lésbica por ter feito essas coisas.
- Bissexual, talvez?
- Não, não me acho.
- Caralho, Monique, você transou com minha irmã, como isso não é ser bissexual?
- Eu sei lá, não me sinto assim, foi só… algo momentâneo, eu nunca gostei de mulher na minha vida toda, ôxi.
- E o que eu devo dizer à nossa filha?
- Nada, deixa esse assunto pra lá. Se ela um dia comentar com você, diga que já sabia. Mas preciso saber se você está chateado comigo, Bruno. Eu fui infiel... - ela abaixa a cabeça, melancólica
- Amor… Sei que me contar essas coisas deve ter sido bem difícil pra você… Mas... eu sou homem, essa coisa toda dificilmente chatearia tanto assim um homem, se é que me entende.
- Aff, eu estou falando sério e você com palhaçada! Poxa, Bruno, leva à sério!
- Ei, eu não estou com palhaçada! Não tô querendo tirar casquinha da situação, não é isso! Só estou dizendo que… Poxa, minha esposa e minha irmã transaram na minha cama! Você quer que eu não ache nada? Cara, que situação mais louca…
- … Ah, é? E se em vez da Karen, fosse com um irmão seu?
- Eu não tenho irmão, Monique, então a pergunta não se aplica.
- Mas E SE você tivesse?
- Bem... realmente seria péssimo. Eu me sentiria um lixo, com certeza. Seria o fim para nós.
- E pelo fato de ser com uma mulher você aceita de boa?
- Meu, não é aceitar de boa! É que… Nada aconteceu de verdade, entende?
- Ah, nada aconteceu!? Só porque um pinto não entrou em mim, nada aconteceu!?
- Caralho, meu, você quer que eu fique chateado, então? Não estou te entendendo! ...Além do mais, acho que o ponto não é o fato de ela ser mulher. O ponto é que… sei lá, por eu também já ter feito sexo com ela, no passado… Eu não sei, é como se eu não pudesse me queixar tanto, já que eu também cometi meus deslizes com ela... Entende?
- … Entendo - Monique experimenta alívio pela reação tranquila do marido
- E vocês estão bem ou brigaram? Ela vem pra cá semana que vem, mas se estiverem brigadas eu posso me encontrar com ela em outro lugar.
- Estamos bem, não brigamos, não. Depois daquele evento ela ainda ficou umas três semanas com a gente. Depois decidimos que era hora de continuarmos cada uma com sua vida. Mas eu agradeço muito a ajuda que ela me deu.
- E que ajuda, hein? rs
- Tsc, para com isso, rs.
O dia seguinte chega e na porta se escutava o TOC-TOC. O casal vai à porta e recebe Karen, que trazia uma pequena mala.
- Maninho, que saudade de você!!! - ela o abraça com força e demoradamente, um abraço de irmãos mesmo.
- Seja bem vinda, Karen! rs - diz Monique, um pouco sem jeito
Karen termina o abraço com o irmão e volta-se para Monique.
- Cunhada, sua linda!! rs - e se abraçam como amigas.
Eles entram e logo chegava Vick.
- Tiaaaaa! - e se abraçam.
Bruno percebe que o abraço de Vick em sua tia era muito genuíno, e que isso mostrava que aqueles meses em que Karen morou lá, tinham criado um vínculo muito forte entre elas.
- Por que não trouxe a Leona, tia??? - Vick pergunta
- Ah, ela está com a avó… (que morava em outro estado)
- Tia, você vai ficar aqui com a gente de novo, né??? - pergunta Victória, toda empolgada.