Havia muito tempo que eu queria beijar aquele homem. Havia muito tempo que eu queria sentir-me dentro dos seus braços. Havia muito tempo que eu queria ser tocado por ele. Havia muito tempo que eu queria ser devorado por muito. Havia muito tempo. Quanto tempo? Muito tempo. Tempo o bastante para que eu sentisse que ele também passava pela mesma situação. Tempo o bastante para que tudo fosse elevado à milésima potência.
Eu estava na porta, e em fração de segundos já estava dentro do apartamento ouvindo o bater da porta, sem que meus lábios se desgrudassem do intenso movimento síncrono que se realizava junto aos dele. Era a continuação exata da última vez que nos beijamos, nos tocamos e nos sentimos. A parada súbita daquela ocasião servia de combustível para a intensidade dos nossos movimentos.
Ele me segurava com força, apertava a minha cintura e me conduzia para um estado de êxtase que há muito tempo eu não sentia. André estava literalmente pronto para sair, tão bem arrumado e engomadinho, que eu tinha medo de tocá-lo e desarrumá-lo. Ele percebeu minha hesitação e parou o beijo, uma de suas mãos segurou o meu pescoço - estávamos na parede ao lado da porta, ele tentava me guiar ao quarto.
- Qual foi, porra? Tá com pena de me pegar, é? - e aquele maldito sorrisinho de puto, que anos antes havia feito um enorme estrago no prédio de Humanas e Jurídicas da PUC.
Ele sabia do meu receio, também sabia que eu odiava ser desafiado; ou talvez não tivesse a noção do impacto que um desafio como aquele, no auge do meu tesão, pudesse me provocar. Seu sorrisinho mudou de figura quando segurei firmemente na gola - muitíssimo bem passada - do seu paletó e alterei a direção do seu corpo, o empurrando com força até o sofá. André era maior do que eu, e não seria somente um empurro firme que o conduziria até lá, mas ele sabia o que eu queria fazer, e a cada movimento das minhas mãos, seu corpo se movimentava para trás, até que finalmente ele caiu no grande sofá preto.
Permaneci em pé, a queda foi um tanto desajeitada, mas quando ele me viu firme, em sua frente, logo tratou de se reposicionar. Sentei-me devagar em seu colo, era uma manhã de verão e os relógios de rua já marcavam 30ºC, então eu vestia roupas simples, como um short preto e uma camisa de botão em tons mais claros, e apenas um chinelo. O short era curto e deixava minhas pernas à mostra, fazendo com que assim que eu me sentasse, minhas coxas ficassem plenamente visíveis, e acessíveis ao toque dele, que prontamente as apertou. Ele se aproximou para me beijar, mas eu rapidamente segurei levemente seu pescoço e o afastei.
Ele entendeu o recado e jogou sua cabeça para o lado, deixando seu pescoço livre; em que eu rapidamente me aproximei e passei minha língua do pescoço até sua orelha, onde dei uma mordida. O toque da língua quente, com a sua pele macia, fez com que ele reagisse segurando com ainda mais força as minhas pernas.
Eu sabia o que queria fazer, e sabia que ele estava disposto a me deixar assumir o controle, e antes de fazer qualquer coisa, procurei o seu rosto. Assim que nos encaramos, ele sorriu.
- Seu puto! - e me deu um tapa estalado na bunda, o que particularmente me deixou ainda mais excitado.
Segurei no paletó e comecei a empurrá-lo para trás, ao que ele prontamente deslocou o corpo para frente e me ajudou na missão, já que eu não saí de cima de seu colo. Sem o paletó, ele permaneceu com a camisa social branca e gravata, que a essa altura do campeonato já estava longe de aparentar ter sido passada. Ali, beijei novamente seus lábios e devagar, ainda durante o beijo, comecei a desabotoar sua camisa, deixando seu peito, de pelos aparados - logo baixos - visíveis. Com ela desabotoada, ele seguiu de camisa.
Beijei novamente seu pescoço, e devagar comecei a deslizar para seu peito; sua respiração mudou, ficando mais pesada e ofegante, a cada vez que meus lábios deslizavam pelo seu torso. Saí do seu colo e fiquei de joelhos, na sua frente. Ele me olhava fixamente, um olhar que misturava admiração com tesão. Uma coisa linda e excitante ao mesmo tempo. Antes de chegar ao seu umbigo, minha mão já estava segurando firmemente o volume da sua calça, ele ainda não gemia, mas respirava cada vez mais ofegante.
Antes que eu conseguisse tocar em seu cinto, ele já estava o soltando. O caminho estava livre. Olhando fixamente em seus olhos, vendo cada vez mais ele esmorecer, comecei a abrir sua calça. Abaixei-a o suficiente para que ele permanecesse de cueca; ainda queria que houvesse algum tipo de distância entre o que queríamos e o que ia ocorrer. Ele usava uma cueca boxer branca, o volume era facilmente destacável. Eu conseguia ver claramente o contorno do seu pau e da sua glande, que marcava com a umidade do pré-gozo a cueca. Com a língua, circundei o contorno da cabeça.
Ele respirou fundo, já segurando com força as laterais do sofá. Refiz o movimento, queria vê-lo gemer, mas ele mais uma vez conteve o gemido.
- Por favor. Para de me torturar. - ele pediu suplicando, com a voz manhosa, quase gemendo.
Não houve terceira tentativa, abaixei a cueca, fazendo o seu pau saltar, brilhando, moreno e com a cabeça rosa em riste. Seu cheiro delicioso me inundou. Aquilo era além. Não me contive. Sem nada mais impedindo, coloquei seu pau na minha boca, comecei devagar, apenas pela cabeça rosada.
André gemeu. Finalmente. Ele gemeu. Um gemido arrastado, alto e firme. Seu corpo se enrijeceu, suas mãos seguraram com ainda mais força o sofá. Aquilo era música. Era arte. Era o meu show. André era gostoso, sua energia era de gostoso, seu corpo era gostoso, seu gosto era gostoso. Eu podia continuar ali por horas, poderia continuar ouvindo-o gemer durante horas, mas ele não podia, quando sentiu que ia gozar, ele me puxou para cima e me beijou.
- Ainda não, gatinho. - ele sussurrou entre o beijo.
Enquanto nos beijávamos o ajudei a retirar suas suas últimas peças de roupa. Livre para se movimentar, ele levantou do sofá, comigo em seu colo. Não fiz questão de abrir meus olhos e entender para onde estávamos indo, eu confiava nele. Quando minhas costas suavemente encostaram no colchão macio, eu entendi que estávamos em seu quarto. Finalmente abri meus olhos. André estava por cima de mim, suas mãos seguravam firmemente minha cintura, a luz do sol entrava pelo quarto e iluminava ainda mais o seu rosto e o seu corpo, já levemente suados.
- Você é lindo. - disse enquanto alisava o seu rosto.
Ele sorriu e me beijou mais uma vez. As coisas seguiram da maneira como tinha de ser. André não conhecia o meu corpo, fez um voo cego, descobriu aos poucos onde eu precisava tocar, e como precisava ser a intensidade desse toque. Aos poucos, as minhas peças de roupa foram saindo, em antítese aos meus gemidos que cada vez mais apareciam. O toque da sua língua macia e quente, nas partes mais certas do meu corpo, quase me conduziu ao êxtase.
Ele estava atrasado para o trabalho, do quarto eu conseguia ouvir o celular tocar com as notificações, mas não importava. Nada importava naquele momento. Somente nós.
André me levava a loucura, me molhava, me excitava, me desbalanceava. Eu estava preparado para tudo, exceto para ele. Eu já estava em cima dele, suas mãos seguravam com força a minha cintura, eu me movimentava para cima e para baixo, ele gemia alto, eu mais ainda. Seu sexo tinha gosto de mais. Mais é sempre melhor.
- Amor, senta firme. Por favor, não para. - ele disse enquanto gemia. Aquele cabelo disfarçado e a cara de quem não valia nada, tinham-me por completo.
Não parei. Cada vez mais forte. Cada vez mais forte. Cada vez mais. Até que chegamos ao ápice juntos. Não foi planejado, mas a energia era indescritível, não havia como ser diferente.
*
Estávamos deitados e exaustos na cama, olhando para o teto, enquanto as respirações tentavam voltar ao ritmo normal. Não estávamos abraçados porque eu detesto abraçar alguém suado, mas estava acarinhando sua cabeça. Eu não sabia onde estava meu celular e naquele quarto não havia qualquer tipo de relógio, mas eu definitivamente sabia que ele estava atrasado pra o trabalho.
- Quando eu cheguei, pra onde você ia? - ele permanecia ofegante e olhando para o teto.
- Eu ia tomar café na starbucks da Cinelândia e depois ia pra o escritório. Hoje é um dia mais burocrático, eu tenho alguns casos pra revisar, alguns relatórios pra atualizar e coisas assim.
- Eu te atrasei muito? Foi um impulso que me deu e eu vim.
- Não atrasou. Vamos dizer que meu café da manhã só mudou. - rimos os dois dessa palhaçada.
- Eu tinha que resolver muitas coisas agora de manhã, mas não me arrependo de ter vindo.
- Fez bem… mas tu não quer me contar o que mudou pra tu ter aparecido na porta da minha casa às 07:30 de uma quarta-feira?
- Uma longa história. Que que você acha da gente preparar um café da manhã enquanto te conto tudo o que aconteceu?
Ele assentiu com a cabeça. Foi uma longa história e um longo café da manhã. Apesar dele dizer que não, naquele dia ele chegou muitíssimo atrasado ao trabalho, mas ficou a par de tudo que havia ocorrido.
*
Nos dias subsequentes continuamos tomando café da manhã juntos, e transando antes do café, ocasionalmente, após. Não tínhamos uma relação puramente sexual, mas também não tinha um nome, e nem havia como ter; eu havia acabado de me separar. Passei anos dando pitacos na vida dos outros e afirmando que quando se encerra uma relação era necessário dar um respiro até a outra. Conhecer-se, descobrir-se e desfrutar da sua própria companhia. Eu ainda acreditava nisso, não há dúvidas quanto a isso, mas eu simplesmente não conseguia me afastar da figura do André.
Era saudável, eu o via quando dava e quando queríamos, mas ocorre que dava todos os dias e eu queria vê-lo todos os dias. Eu não podia ser mais um desses que mergulha de um relacionamento para o outro, era preciso viver o luto pelo fim do último relacionamento, ainda que não houvesse pelo que sofrer. Meu casamento havia acabado muito antes da tentativa de reconciliação, só me faltava entender e aceitar esse fato.
Que caos. A minha cabeça estava num caos. E no meio desse caos, o filme do qual participei da direção entrou em sua fase de edição. A ilha de edição era tão ou mais caótica que a minha cabeça, e era lá que eu encontrava algum tipo de paz. Entre cortes, adições, filtros e efeitos, ajustes de imagem e de áudio eu encontrava o desequilíbrio necessário para dissociar.
Ainda havia muito a ser feito, e numa dessas, meu celular apitou no meio de um dia já cansativo.
- gatinho, que que tu vai fazer hoje? - não contive um sorrisinho quando vi que a mensagem era dele.
- acho que nada… tô exausto. mas quero relaxar depois que sair daqui
- que horas tu sai? umas 18:00
- perfeito, então eu passo aí e te pego. a gente vai naquele bar que tu curte, lá em copa, e depois tu vai lá pra casa. pode ser?
- pode. te espero aqui. preciso ir. beijo!
Estar com ele era uma forma de relaxar, ainda que sair em público sempre envolvesse alguma tensão. Nós não tínhamos nada, então não conversei com o Caetano sobre isso. André não era mais um funcionário do seu escritório, havia recebido uma proposta de outra firma, e foi. Seu nome agora estava em um daqueles “& associados”, mas ainda que não houvesse mais um conflito profissional, havia um pessoal. André e Caetano dividiram grupos de amigos, de futebol, cerveja, churrasco e faculdade, além de todo o situacional envolvendo a morte do Alberto. Era complexo e sair como amigo da onça era inevitável. Mas em que medida o julgamento alheio deveria interferir no que queríamos e sentíamos? Concluí que em nada.
Às 18:00 em ponto ele me ligou, avisando que já estava na porta da produtora. Alguns minutos ali, e eu já estava beijando-o dentro do seu carro. A sede da produtora era em Botafogo mesmo, pertíssimo de casa. Em 30 minutos já estávamos em Copa - poderia ser 15, mas o trânsito havia sido cruel. Nos sentamos a mesa e falamos sobre nossos respectivos dias. Eu amava ouvir André falar, ele não era o primeiro advogado com o qual eu me relacionava, e as histórias e situações narradas por ele estavam longe de serem novas para mim, mas havia um quê de originalidade absurdo na forma como ele levava a vida. Uma leveza e confiança que me deixavam completamente admirados. André poderia narrar a história dos 3 porquinhos para mim e eu ainda iria me surpreender com cada pedaço da história… não por ela, mas pela forma com a qual ele iria me contar.
Entre cervejas puro malte, risadas e porções de aipim com carne de sol, regadas a brisa do mar - o bar era literalmente na Avenida Atlântica -, as horas deslizavam por nós. Era fácil demais estar com ele e ceder. Era leve demais sorrir ao fazê-lo gargalhar de alguma piadinha boba que eu havia feito. Entretanto, tempo é rei, e de repente já passava das 22h.
Durante as horas que passamos ali, fomos muitíssimo bem atendidos por um garçom, chamado Mariano, conhecido antigo meu e do André. Assim que sinalizamos que iríamos fechar a conta, ele veio, sorridente, com a comanda e a maquininha de cartão. Iniciou-se uma pequena discussão: eu queria dividir os custos, enquanto André queria pagar tudo sozinho, alegando que o convite havia sido feito por ele. Por fim, eu venci e dividimos a conta.
Atento a tudo, antes de sairmos, Mariano questionou ao André:
- Vocês tão namorando há quanto tempo?
- A gente não tá namorando, amigo. Somos amigos - ele sorriu sem graça.
- Mas você já descobriu que tá apaixonado? Que tá amando mesmo. Coisa séria.
- Do que que tu tá falando? - ele sorriu amarelo, Mariano me olhava sorrindo e depois para ele.
- Talvez tu ainda não tenha se dado conta, mas eu reparei que voltou nesse teu olhar de ursinho um brilhinho diferente. Um brilho de amor… não é da minha conta, mas, porra, isso é lindo demais de testemunhar.
Da mesma forma que iniciou aquela conversa, ele se despediu e deu as costas, nos deixando com aquele elefante branco na sala. Nada daquilo me assustou, pelo contrário.
- Cê tá me amando, mesmo? - o encarei.
- Lindo, eu… - pela primeira vez ele estava tímido, desviando o olhar.
- André! - ele me encarou. Eu esperava uma resposta.
- Pra caralho. Tu sabe… - ele sorriu
- Sei. Achava que sabia, agora eu tenho certeza.
- E você?
- Tô completamente fudido.
Ele sorriu pra mim, fazendo aqueles olhos de ursinho brilharem ainda mais. Naquele dia, não deu pra esperar até em casa, transamos dentro do carro, em uma rua mais deserta do Humaitá. Tudo era urgente. Tudo era intenso. Éramos nós. Até o fim.