Fhelippe estava sentado em um banco da praça perto da universidade, observando as folhas caírem lentamente das árvores ao redor. O vento trazia uma brisa fria que parecia perfurar sua alma. Ao seu lado, Bruna ria de algo que havia dito, mas ele não conseguia acompanhar a conversa. O namoro com ela tinha começado há poucas semanas, e tudo parecia perfeito na superfície. Ela era gentil, engraçada e bonita. Mas, dentro de Fhelippe, uma tempestade silenciosa o atormentava.
Ele olhou para Bruna, que segurava sua mão de maneira terna, e sentiu uma pontada de culpa. Ele gostava dela, mas não da forma como ela merecia. Não como ele deveria. O problema era o vazio. Um vazio que parecia crescer mais a cada dia, uma ausência que nenhum sorriso de Bruna conseguia preencher.
— Você está tão distraído hoje, Fhelippe — disse Bruna, inclinando-se para encará-lo. — Está tudo bem?
— Sim, só estou cansado — mentiu ele, forçando um sorriso.
Mas a verdade era que, enquanto estava ali, seu pensamento vagava para Gustavo.
No mesmo instante, Gustavo estava no quarto de sua república, encarando o teto. O som das risadas de seus colegas no andar de baixo não conseguia abafar os pensamentos tumultuados que ocupavam sua mente. Ele pensava em Fhelippe, como sempre. No sorriso tímido dele, na forma como ele sempre parecia estar em conflito, como se carregasse o peso do mundo nos ombros.
Gustavo pegou o celular, hesitou por um momento e, finalmente, enviou uma mensagem:
> “Vamos sair amanhã? Só nós dois. Acho que precisamos conversar.”
Do outro lado da cidade, Fhelippe leu a mensagem e sentiu o estômago revirar. Gustavo tinha um jeito de o desarmar com a simplicidade de suas palavras. Ele sabia que aceitar seria perigoso, mas também sabia que não conseguia se afastar completamente.
> “Ok. Onde?”
No dia seguinte, Gustavo levou Fhelippe a um café tranquilo, longe da agitação da universidade. Eles se sentaram em uma mesa no canto, onde o som de música instrumental preenchia o ambiente de forma discreta.
— Então... como estão as coisas com Bruna? — perguntou Gustavo, com um tom casual, mas os olhos carregados de curiosidade.
Fhelippe mexeu no café sem olhar para ele.
— Estão bem.
— Só bem? — Gustavo pressionou, inclinando-se um pouco para a frente.
Fhelippe suspirou, finalmente encarando-o.
— Por que você quer saber, Gustavo?
— Porque eu me importo — respondeu Gustavo, sem hesitar. — E porque eu sei que você não está sendo honesto consigo mesmo.
O coração de Fhelippe acelerou, mas ele manteve a expressão impassível.
— Não sei do que você está falando.
— Sabe, sim — retrucou Gustavo, a voz agora mais firme. — Você acha que pode se esconder atrás desse namoro, mas eu vejo você, Fhelippe. Vejo a luta que você está travando.
As palavras de Gustavo foram como um soco no estômago de Fhelippe. Ele sabia que eram verdadeiras, mas ouvi-las em voz alta era diferente.
— E o que você quer que eu faça, Gustavo? Que eu jogue tudo para o alto? Que eu machuque Bruna? — Fhelippe rebateu, a voz carregada de frustração.
— Eu não quero que você machuque ninguém — disse Gustavo, a expressão suavizando. — Mas você não pode continuar vivendo essa mentira. Não vai funcionar, e você sabe disso.
Fhelippe desviou o olhar, os olhos ardendo. Ele sentia que estava à beira de um precipício, e Gustavo parecia determinado a empurrá-lo.
— Eu não posso... — Fhelippe começou, mas sua voz falhou. — Eu não sei como.
Gustavo estendeu a mão sobre a mesa, tocando levemente a de Fhelippe.
— Você não precisa fazer isso sozinho.
Enquanto Gustavo falava, uma onda de culpa o invadiu. Ele também estava lidando com seus próprios conflitos. A religião sempre havia sido uma parte central de sua vida, um guia para suas escolhas. Mas agora, parecia mais uma corrente que o prendia.
— Às vezes, eu me pergunto se o que sinto é errado — confessou Gustavo, inesperadamente.
Fhelippe olhou para ele, surpreso.
— Errado?
— Minha família, minha igreja... eles dizem que é pecado. Que eu preciso lutar contra isso. Mas... — Gustavo hesitou, procurando as palavras. — Como posso lutar contra algo que parece tão certo?
Fhelippe não respondeu imediatamente. Ele nunca tinha pensado em como Gustavo também poderia estar lutando, como ele também carregava suas próprias cicatrizes.
— Talvez a luta seja o problema — disse Fhelippe, finalmente. — Talvez a gente só precise... aceitar.
O momento entre eles ficou carregado de emoção. Gustavo segurou o olhar de Fhelippe, como se estivesse tentando decifrá-lo.
— Aceitar o quê? — Gustavo perguntou, quase em um sussurro.
— O que somos. O que sentimos — respondeu Fhelippe, também em voz baixa.
Os dois ficaram em silêncio, mas o ambiente parecia cheio de palavras não ditas. Gustavo queria se inclinar, queria romper a distância entre eles. Mas ele sabia que não era o momento.
Nos dias seguintes, Fhelippe começou a se afastar de Bruna. Ele sabia que continuar o relacionamento seria injusto, tanto com ela quanto consigo mesmo. Em uma tarde, enquanto caminhavam pelo campus, ele finalmente reuniu coragem para falar.
— Bruna, eu preciso te contar uma coisa — começou ele, nervoso.
Ela olhou para ele, preocupada.
— O que foi?
— Eu gosto de você, de verdade. Mas... não do jeito que você merece.
Bruna ficou em silêncio por um momento, assimilando as palavras.
— Você está terminando comigo?
— Sim. E me desculpe.
Bruna suspirou, mas havia compreensão em seus olhos.
— Eu sabia que algo estava errado. Espero que você encontre o que está procurando, Fhelippe.
Naquela noite, Fhelippe foi até o apartamento de Gustavo. Ele hesitou na porta, o coração disparado. Finalmente, bateu.
Gustavo abriu, surpreso ao vê-lo ali.
— Fhelippe?
— Podemos conversar? — perguntou Fhelippe, a voz carregada de emoção.
Gustavo deu espaço para ele entrar. Assim que a porta se fechou, Fhelippe virou-se para ele.
— Você estava certo. Eu não posso continuar fugindo.
Gustavo o encarou, tentando conter a onda de esperança que subia em seu peito.
— E o que isso significa?
Fhelippe deu um passo à frente, diminuindo a distância entre eles.
— Significa que eu quero tentar. Com você.
E, dessa vez, quando Gustavo se inclinou, Fhelippe não recuou. O beijo foi tímido no início, mas logo se tornou mais intenso, cheio de paixão reprimida.
O vazio que Fhelippe sentia não desapareceu completamente, mas agora parecia um pouco menos assustador. Ao lado de Gustavo, ele sentia que talvez pudesse encontrar uma maneira de preencher esse espaço, de construir algo verdadeiro.
E Gustavo, por sua vez, sentia que finalmente estava onde deveria estar.
Naquela noite, enquanto o vento soprava lá fora, os dois souberam que, apesar dos desafios que ainda viriam, estavam prontos para enfrentar tudo juntos.