Trancado numa gaiola de castidade pela ex - Parte 6

Da série A Chave
Um conto erótico de Domy
Categoria: Heterossexual
Contém 3662 palavras
Data: 09/12/2024 12:08:59
Última revisão: 09/12/2024 13:02:28

Penélope despertou lentamente do cochilo, seu corpo ainda aquecido pelo calor de Ricardo ao seu lado. A sensação era reconfortante, familiar, como se seus corpos tivessem sido feitos para se encaixarem daquela maneira. Instintivamente, olhou para o pulso para checar as horas, mas o relógio não estava lá. Riu de seu próprio reflexo condicionado, um som suave que quebrou o silêncio do quarto, e esticou o braço até o criado-mudo, onde o Guess prateado marcava 23:37.

"Está acordado?", ela sussurrou, cutucando levemente as costas de Ricardo. Seus dedos demoraram-se um pouco mais que o necessário, apreciando a textura da pele dele, o calor que emanava de seu corpo. Um "Sim" sonolento foi a resposta, a voz dele ainda rouca de sono e das atividades anteriores.

Levantou-se, seu corpo nu brilhando sob a luz prateada da lua enquanto caminhava até a cômoda, seus contornos criando sombras interessantes em sua pele bronzeada. O ar fresco da noite provocou arrepios em sua pele nua, fazendo seus mamilos endurecerem levemente. Voltou para a cama, sentando-se ao lado dele. Havia algo em seus olhos - uma mistura de nostalgia e ternura que fez o coração dele acelerar.

"Lembra do dia que nos conhecemos?", ela começou, sua voz carregando o peso doce das memórias queridas, cada palavra escolhida com cuidado, como se estivesse desembrulhando um presente precioso. "Eu tinha acabado de ser transferida pro escritório, e a primeira pessoa que conheci foi você, todo formal no seu terno - que depois descobri que era emprestado." Ela riu, o som enchendo o quarto, a lembrança ainda fresca em sua mente. "Eu estava passando pelo pior momento da minha vida. Tinha terminado um noivado de cinco anos, estava morando sozinha pela primeira vez, numa cidade estranha ainda por cima... Mas você... você apareceu com aquele seu jeito tranquilo, sempre disposto a ouvir, sempre com uma palavra gentil ou um café na hora certa."

"Por anos, fomos apenas amigos", ela continuou, seus dedos percorrendo os braço dele, cada toque uma pequena descarga elétrica em sua pele. "Você era aquele amigo incrível que toda mulher sonha em ter - atencioso, divertido, sempre presente. Lembra daquela vez que você apareceu bêbado na minha casa depois de uma briga com ela? Três da manhã e você chorando no meu sofá, dizendo que não sabia o que tinha feito de errado... Foi ali, vendo você tão vulnerável, tão humano, que algo começou a mudar dentro de mim. Como se um véu tivesse sido levantado, e eu pudesse ver você - realmente ver você - pela primeira vez."

Suas palavras pintavam um quadro vívido de sua história compartilhada - as tardes de café depois do expediente, onde o aroma do café se misturava com risadas e confidências; as longas conversas sobre nada e tudo, que começavam sobre trabalho e terminavam sobre sonhos e medos; as risadas compartilhadas durante os almoços, quando o mundo lá fora parecia desaparecer e existia apenas aquela bolha de cumplicidade entre eles. "E aquela última festa do escritório que fomos juntos? Você estava tão bonito naquele terno azul-marinho, que realçava seus olhos de uma maneira que me fez perder o fôlego... Amanda estava viajando, e pela primeira vez percebi que meu coração batia diferente quando você estava por perto. Foi como se todas as peças de um quebra-cabeça finalmente se encaixassem."

"Nosso primeiro beijo..." sua voz falhou um pouco ao lembrar, a emoção da memória ainda viva e pulsante. "Foi depois daquela reunião complicada com o cliente difícil. Você tinha acabado de terminar com ela, eu estava exausta... aconteceu tão naturalmente. Como se nossos lábios já se conhecessem de outras vidas, como se tivéssemos ensaiado aquele momento milhares de vezes em sonhos que não lembrávamos ao acordar. Foi ali que percebi que estava completamente apaixonada por você, que talvez sempre estivesse, apenas esperando o momento certo para admitir para mim mesma."

"E nossa primeira vez..." um rubor delicado tingiu suas bochechas ao lembrar, espalhando-se por seu pescoço como uma onda rosada. "Você foi tão gentil, tão atencioso... tão diferente dos outros homens que conheci. Cada toque era uma descoberta, cada beijo uma revelação. Foi a primeira vez que me senti verdadeiramente desejada, verdadeiramente apreciada. Como se cada centímetro do meu corpo fosse um território sagrado que você estava determinado a venerar."

Quando terminou sua narrativa, ambos tinham sorrisos largos nos rostos e olhos marejados, a emoção das memórias compartilhadas criando uma atmosfera quase mágica no quarto. O beijo que compartilharam foi profundo, carregado de história e promessa, transcendendo a mera atração física para algo muito mais significativo - um beijo que falava de passado, presente e futuro, de medos superados e esperanças realizadas.

"Quando vamos gravar o vídeo?", Ricardo perguntou, sua voz ainda embargada pela emoção, suas mãos acariciando suavemente as costas nuas dela.

O sorriso de Penélope era pura malícia quando respondeu: "Já gravamos." Levantou-se com a graça que a caracterizava e caminhou até a cômoda onde seu celular estava estrategicamente posicionado. Com dedos hábeis, editou o vídeo, mantendo apenas os momentos mais íntimos e significativos, cada corte preciso como uma cirurgiã do amor e da vingança.

Quando estava prestes a enviar, seu sorriso vingativo vacilou, uma sombra de dúvida cruzando seu rosto como uma nuvem passageira. "Devo?", perguntou, sua voz carregando uma súbita incerteza, o dedo pairando sobre o botão de enviar como uma bailarina prestes fazer o passo mais importante.

Ricardo assentiu silenciosamente, seus olhos transmitindo toda a confiança que ela precisava.

O som do envio ecoou no quarto como um tiro, o zumbido eletrônico parecendo mais alto no silêncio carregado de expectativa. A confirmação de visualização veio quase instantaneamente, o duplo check azul brilhando na tela como um pequeno farol de vingança realizada. Deitaram-se, seus corações batendo em uníssono acelerado, como tambores ancestrais anunciando uma mudança irreversível.

Minutos depois, Penélope checou seu celular - bloqueada por Amanda, a notificação aparecendo como um troféu de guerra em sua tela. Mal teve tempo de processar isso quando o celular de Ricardo tocou, a vibração contra o criado-mudo soando como um prenúncio de tempestade, fazendo ambos se entreolharem com apreensão. Uma, duas, três, quatro... Foram, ao total sete mensagens recebidas. Quando Ricardo finalmente apanhou celular, viu que as mensagens haviam sido apagadas.

O celular de Ricardo vibrou numa tarde de quinta-feira após dias de silêncio. Era Amanda, e seu coração gelou ao ver a notificação. A mensagem era surpreendentemente casual: "Que tal um cineminha no shopping no sábado? Eu, você, a Penélope e o Caio. Programa de casais!" O tom falsamente doce fez seu estômago revirar.

Minutos depois, outra mensagem chegou: "Ah, e diz pra sua namoradinha usar aquele vestido preto que ela tem. Não, pensando melhor... calça jeans e top branco. Salto alto, óbvio. E aquele relógio que ela tanto gosta. Cabelo solto, nada de rabo de cavalo. Quero ela bem bonita pro Caio." Amanda continuou: "E nada daquele perfume barato que ela usa. Quero algo mais... sofisticado."

Ricardo sentiu bile subindo em sua garganta. Penélope recebeu a notícia com uma mistura de raiva e resignação. "Ela não pode estar falando sério", disse, mas já estava mexendo em seu guarda-roupa, procurando a roupa exata que Amanda havia especificado. "É como se ela estivesse me vestindo como uma boneca." Suas mãos tremiam levemente enquanto segurava o top branco, o tecido fino parecendo zombar de sua situação.

No sábado, encontraram-se na praça de alimentação do shopping. Amanda estava deslumbrante num vestido vermelho que parecia pintado em seu corpo. Ao seu lado, Caio parecia saído de uma revista de fisiculturismo, cada músculo de seus braços ameaçando rasgar a camiseta propositalmente apertada.

"Nada de beijos entre vocês dois", Amanda anunciou assim que se sentaram, seu sorriso doce contrastando com a crueldade em seus olhos. "Não quero ninguém desconfortável aqui." Seu olhar se demorou em Penélope, avaliando cada detalhe de sua produção como uma professora rigorosa. "Ótimo, você seguiu minhas instruções direitinho. O Caio adorou, não é amor?" Ela cutucou o namorado, que apenas grunhiu em resposta, seus olhos percorrendo o corpo de Penélope de uma maneira que fez Ricardo querer socar algo.

No cinema, escolheram um filme de ação qualquer - a escolha não importava realmente, já que Amanda e Caio passaram a maior parte do tempo em uma sessão de amassos que parecia calculada para provocar o máximo de desconforto em Ricardo e Penélope. Os sons dos beijos e sussurros eram perfeitamente audíveis na sala meio vazia. Ocasionalmente, Amanda soltava gemidos mais altos que o necessário, fazendo outras pessoas na sala se mexerem desconfortavelmente em suas cadeiras.

Ricardo mantinha os olhos fixos na tela, mas sua mente estava em turbilhão. Ao seu lado, podia sentir a tensão emanando de Penélope em ondas quase palpáveis. Suas mãos se encontraram no escuro, dedos se entrelaçando num aperto desesperado por conforto, mas Amanda notou o gesto e pigarreou alto. "Já disse, nada disso pra vocês."

"Que tal terminarmos a noite com chave de ouro?", ela sugeriu depois do filme, seus dedos brincando com a corrente em seu pescoço - onde, Ricardo sabia, a chave de sua liberdade estava pendurada. "Conheço um motel ótimo aqui perto... Podíamos fazer uma festinha particular, os quatro." Seu olhar encontrou o de Penélope, um sorriso predatório brincando em seus lábios pintados de vermelho. "Tenho certeza que o Caio adoraria conhecer você melhor, Pê. Posso te chamar de Pê, não é?"

O silêncio que se seguiu foi ensurdecedor, preenchido apenas pelo som distante da música ambiente do shopping e o tilintar suave do relógio de Penélope quando ela inconscientemente ajustou a pulseira, um gesto nervoso que não passou despercebido por Amanda, cujo sorriso apenas se alargou, como um gato que acabou de encontrar um novo brinquedo para torturar. Caio sorriu também, seus olhos percorrendo o corpo de Penélope mais uma vez, demorando-se em suas curvas de uma maneira que fez Ricardo sentir náusea.

"E então?", Amanda pressionou, sua voz agora mais baixa, mais íntima, como se estivesse compartilhando um segredo delicioso. "O que me dizem? Poderia ser... interessante. E quem sabe..." ela puxou a corrente em seu pescoço, fazendo a chave cintilar sob as luzes do shopping, "eu posso ser convencida a ser generosa hoje."

O quarto de motel parecia menor do que realmente era, as paredes espelhadas refletindo a tensão que pairava no ar como eletricidade estática antes de uma tempestade. Amanda estava radiante, quase febril, uma energia nervosa emanando dela em ondas quase palpáveis. Seu vestido vermelho refletia nas superfícies espelhadas como pequenos flashes de perigo. Havia algo diferente nela esta noite - uma urgência mal contida, uma vulnerabilidade que ela tentava mascarar com sorrisos largos demais e risadas um pouco altas demais.

"Sentem ali", ela ordenou, indicando a cama king size com seus lençóis de cetim preto. Sua voz tinha aquele tom autoritário do qual Ricardo já era íntimo, embora agora houvesse uma nota quase imperceptível de súplica por baixo do comando. Caio murmurou algo sobre tomar um banho e desapareceu no banheiro.

Assim que Ricardo e Penélope se sentaram, Amanda se aproximou com a graciosidade de uma pantera, seus saltos altos marcando cada passo como uma contagem regressiva. Sentou-se no colo de Ricardo num movimento fluido, seu corpo se moldando ao dele com uma familiaridade que fez algo dentro dele se contorcer - desejo, culpa, saudade, repulsa, tudo misturado num amargo coquetel confuso. Ao lado deles, Penélope sentiu cada músculo de seu corpo se retesando.

Os olhos de Amanda - aquele azul profundo que sempre fora a perdição de Ricardo - encontraram os dele com uma intensidade quase hipnótica. Eram os mesmos olhos que o fizeram se apaixonar anos atrás, que o faziam perdoar cada briga, cada manipulação, cada momento de toxicidade em seu relacionamento. Olhos que podiam passar do gelo ao fogo em questão de segundos, que sabiam exatamente como implorar ou comandar, seduzir ou destruir. O perfume dela evocava memórias de noites apaixonadas e manhãs de reconciliação após brigas explosivas.

"Sabe", ela começou, sua voz agora mais suave, quase um ronronar, seus lábios tão próximos da orelha dele que ele podia sentir o calor de sua respiração, "isso tudo pode acabar agora mesmo." Seus dedos brincavam com a corrente em seu pescoço, onde a chave balançava como um pêndulo hipnótico, cada movimento calculado para torturá-lo. "É só dizer que ainda me ama... que nunca deixou de me amar... pedir perdão pela forma como me tratou… e eu tiro essa gaiola aqui, agora mesmo." Para enfatizar, puxou a chave, fazendo-a cintilar sob a luz difusa do quarto. O pênis de Ricardo pareceu responder ao chamado de sua libertadora, pulsando dolorosamente contra sua prisão.

Ricardo desviou o olhar, seu coração trovejando no peito com tanta força que tinha certeza que todos no quarto podiam ouvir. Ao seu lado, Penélope discretamente encontrou sua mão, seus dedos se entrelaçando num aperto que carregava mais significado que mil palavras. A lembrança de sua amiga Débora, que passou anos presa num relacionamento abusivo, sempre voltando após cada "última vez", passou por sua mente como um aviso silencioso.

"Podemos voltar a namorar", Amanda continuou, sua voz agora carregando uma nota de urgência mal disfarçada, quase desesperada. "Fingir que esses seis meses nunca aconteceram. Voltar ao que éramos..." Suas mãos encontraram o rosto dele, dedos com unhas perfeitamente feitas forçando-o a olhar para ela, o relógio dourado em seu pulso refletindo a luz como pequenas estrelas de aviso. "Ou podemos recomeçar... construir um novo relacionamento..." Havia algo em sua voz agora, uma vulnerabilidade que ele raramente via nela, que fazia todo seu corpo querer responder, querer acreditar.

A mente de Ricardo girava como um caleidoscópio emocional. Seria verdade? Aquela súplica mal disfarçada em sua voz, aquela vulnerabilidade em seus olhos... eram reais? Ou apenas mais um dos jogos mentais dela, mais uma manipulação em seu extenso repertório? Anos de relacionamento passaram por sua mente em segundos - momentos de felicidade genuína misturados com os mais perversos sentimentos, declarações de amor eterno seguidas por acusações cruéis, promessas de mudança que nunca duravam mais que algumas semanas. "E o Caio?", ele perguntou, tentando ganhar tempo, sua voz saindo mais rouca que pretendia, traindo sua própria confusão.

Amanda deu de ombros, um movimento estudadamente casual que não conseguia esconder completamente a tensão em seus ombros. "Mando ele embora." Um sorriso malicioso brincou em seus lábios pintados de vermelho, mas havia algo forçado nele agora. "Ou... posso deixar ele pra Penélope. Tenho certeza que ela vai gostar... não é, Pê?" Seu olhar encontrou o de Penélope, provocador e cruel, mas havia um tremor quase imperceptível em sua voz.

Ricardo balançou a cabeça negativamente, o movimento pequeno mas definitivo, carregando o peso de uma decisão que não era apenas sobre aquela noite, mas sobre todas as noites futuras. Ao seu lado, Penélope soltou a respiração que nem percebera que estava segurando, seus dedos apertando os dele com força renovada.

Amanda se levantou num movimento fluido, aparentemente imperturbável - embora algo em seus olhos, um brilho que poderia ser raiva ou dor, traísse sua compostura perfeita. Por um momento, sua máscara de controle vacilou, e Ricardo vislumbrou algo em seu rosto - mágoa, talvez, ou a realização de que algumas pontes, uma vez queimadas, não podem ser reconstruídas. Inclinou-se e depositou um beijo rápido nos lábios de Ricardo, o gesto surpreendentemente casto considerando a situação, carregando um gosto de despedida que nenhum dos dois esperava.

"Bem", ela disse com um sorriso que não alcançava seus olhos, sua voz tentando manter o tom leve mas falhando sutilmente, "parece que só eu vou transar hoje à noite então." O som do chuveiro cessou, enfatizando suas palavras, deixando o quarto em um silêncio pesado que parecia zumbir com todas as palavras não ditas, todas as possibilidades que acabavam de morrer ali, naquela cama de motel com lençóis de cetim preto.

"Estou cansado", Ricardo suspirou, passando a mão pelos cabelos num gesto nervoso que Penélope conhecia bem.

"Você sabe o que precisa fazer pra conseguir a chave..." Amanda sibilou, seus olhos brilhando com malícia. "Posso até ser boazinha e deixar a Penélope assistir... ou participar, se ela quiser." O sorriso em seus lábios era pura provocação.

"Nós dois sabemos que mesmo se chupar um pau, você não vai me dar a chave", Ricardo respondeu, a voz carregando anos de frustração acumulada. "Vai arranjar algum motivo, alguma ofensa mínima... qualquer coisa pra aumentar o preço. Você sempre foi boa nisso."

Penélope segurou a mão de Ricardo. Sabia que essa era uma batalha que ele precisava lutar sozinho, mas isso não a impedia de sofrer junto.

"Eu te amava!" Amanda contra-atacou, sua voz tremendo levemente. "Você não tinha o direito de terminar comigo daquele jeito!"

O riso de Ricardo foi seco, desprovido de qualquer humor. "Você não sabe o que é amor, Amanda. Você acha que é posse, controle." Ele fez uma pausa, memórias amargas dançando em seus olhos. "E, eu admito, terminar por mensagem foi algo escroto a se fazer... Mas, quantas vezes eu tentei terminar pessoalmente? E você sempre com as mesmas ameaças... aparecer no escritório, dar chilique..." Ele engoliu em seco antes de continuar, a lembrança ainda dolorosa. "Se machucar... como daquela vez com os remédios... ou quando você tentou cortar os pulsos..."

Amanda baixou a cabeça, toda sua postura mudando. A máscara de crueldade caiu, revelando algo mais vulnerável, mais real. Seus dedos inconscientemente tocaram as cicatrizes no pulso esquerdo, parcialmente escondidas pelo relógio. "Eu procurei ajuda..." sua voz era quase um sussurro, embargada de uma tristeza genuína que fez algo dentro de Ricardo se contorcer. "Não faço mais esse tipo de coisa.", ela disse, baixinho, o olhar cheio de vergonha.

Ricardo sentiu uma onda de compaixão atravessá-lo. Por um momento, viu além da Amanda cruel e manipuladora - viu a jovem assustada que conhecera anos atrás, que tinha tanto medo de ser abandonada que preferia machucar a si mesma a perder alguém.

"Estou cansado", Ricardo repetiu após um momento, levantando-se. "Vamos, Pê?"

Penélope se levantou em silêncio, pegando sua bolsa. Enquanto caminhavam para fora do quarto, deixando Amanda e Caio para trás, o som de seus saltos no piso ecoava como um pequeno ato de rebelião, mas também como um lembrete melancólico de que algumas feridas, mesmo quando cicatrizam, nunca desaparecem completamente.

De volta ao apartamento de Penélope, a meia-luz da sala criava sombras suaves que dançavam nas paredes. O vinho tinto em suas taças refletia a luz difusa como pequenos lagos de rubi. Penélope observava Ricardo com atenção - a barba por fazer sombreando seu rosto exausto, as olheiras profundas marcando seus olhos como manchas de tinta violeta, testemunhas silenciosas de noites mal dormidas. O cabelo levemente desgrenhado caía sobre a testa em mechas rebeldes, e a camisa social, aberta até o segundo botão, estava amarrotada como se tivesse sido usada por dias seguidos. Seus ombros, normalmente eretos e firmes, agora curvavam-se ligeiramente para frente, como se carregassem um peso invisível. Ele parecia uma cama desfeita após uma sequência interminável de noites agitadas.

Seus movimentos eram lentos, quase letárgicos, como se cada gesto exigisse um esforço monumental. Até mesmo o ato de levar a taça aos lábios parecia consumir uma quantidade desproporcional de energia. Suas pálpebras ocasionalmente fechavam-se por alguns segundos mais que o normal, como se seu corpo implorasse por descanso, mesmo que momentâneo.

"Será que eu não sou o vilão dessa história?", Ricardo perguntou de repente, sua voz rouca e quebrada, carregando o peso de todas as provações do úlimo mês. As palavras saíram arrastadas, como se até mesmo falar exigisse um esforço sobre-humano.

Penélope, no meio de um gole de vinho, não respondeu imediatamente. Algo em sua intuição dizia que ele precisava desabafar, colocar para fora tudo que estava entalado em sua garganta. Observou como seus dedos tremiam levemente ao segurar a taça.

"Você só conhece o meu lado da história", ele continuou, girando a taça entre os dedos nervosamente. Uma gota de vinho escorreu pela lateral do copo, mas ele parecia cansado demais até mesmo para notar. "Vai ver só te contei o que me interessava. Me coloquei como vítima." Sua voz foi diminuindo gradualmente, como uma bateria perdendo carga.

Penélope pousou sua taça na mesa de centro e levou a mão ao rosto dele, virando-o gentilmente para si. Sua pele estava quente ao toque, febril quase, como se seu corpo estivesse lutando uma batalha invisível. "Não, você não é o vilão", ela disse com firmeza. "Eu vi vocês dois juntos, lembra? Durante o namoro. Vi como ela te tratava, como te manipulava... como você mudava perto dela, ficava menor, mais quieto, como se tentasse ocupar menos espaço no mundo."

Ricardo fechou os olhos e suspirou profundamente, o som carregando anos de exaustão emocional. Quando os reabriu, estavam marejados e vermelhos, as veias capilares formando pequenas teias de cansaço. As lágrimas não derramadas brilhavam sob a luz suave da sala como pequenos diamantes de tristeza.

"Estou cansado", ele murmurou, sua voz quase um sussurro, como se até mesmo admitir seu esgotamento exigisse mais energia do que possuía. "Tão, tão cansado..." Suas últimas palavras foram quase inaudíveis, dissolvendo-se no ar como fumaça.

Não demorou muito para que adormecesse ali mesmo, na cadeira, o copo de vinho ainda pela metade em sua mão relaxada, ameaçando cair a qualquer momento. Seu corpo finalmente cedendo à exaustão que vinha combatendo há tanto tempo. Sua respiração, antes irregular e tensa, agora encontrava um ritmo mais tranquilo, embora ocasionalmente perturbado por pequenos espasmos.

Penélope o observou por alguns momentos, seu coração apertando ao ver como ele parecia vulnerável no sono, todas suas defesas baixadas. As linhas de preocupação em sua testa, tão presentes quando acordado, agora suavizavam-se ligeiramente, embora não desaparecessem por completo - como se até mesmo em sonhos ele não encontrasse paz total.

Com movimentos deliberados, Penélope pegou o celular dele. Seus dedos dançaram sobre a tela com determinação enquanto digitava a mensagem para Amanda: "Precisamos conversar. Agora."

Enquanto esperava a resposta, seus olhos voltaram para a figura adormecida de Ricardo. A exaustão estava gravada em cada linha de seu rosto, cada músculo relaxado, cada respiração profunda. 'Isso acaba hoje', pensou, uma determinação férrea crescendo em seu peito. 'De uma forma ou de outra, essa história termina essa noite.'

Siga a Casa dos Contos no Instagram!

Este conto recebeu 18 estrelas.
Incentive Beladona a escrever mais dando estrelas.
Cadastre-se gratuitamente ou faça login para prestigiar e incentivar o autor dando estrelas.

Comentários

Foto de perfil genérica

A tensão e carga emocional é surpreendente...estou adorando

3 estrelas

1 0
Foto de perfil genérica

caramba, maravilhoso. a Penélope vai agir, espero que ela não faça nenhuma besteira.

3 estrelas

1 0
Foto de perfil de Beladona

Kiquinho, você comentou em quase todas as partes do conto, mas não o fez na última parte! Quero saber o que achou do final.

0 0
Foto de perfil genérica

Oi, fiquei surpreso por ela ceder na minha opinião tão facilmente à conversa com a Penélope. Mas talvez isso mostre que ela não é o monstro que se estava desenhando mas simplesmente uma mulher ferida no seu orgulho que estava agindo pura e simplesmente na emoção de uma vingança que levou muito sofrimento para quem ela realmente ama.

Depois disso tudo realmente acredito no amor dela por ele e quando entendeu o que estava fazendo, simplesmente deixou ele seguir em paz, espero que ela também encontre a paz dela.

3 estrelas com certeza e fico muito grato com a sua atenção.

0 0