A semana passou e nem vi, tenho trabalhado muito com os garotos tanto que consegui por o Pietro e o Júnior no time principal, estou muito entusiasmado, só é uma pena que meus amigos não vão poder ir no meu primeiro jogo, Raylan parece ter se desentendido com a mãe de vez, como ela passa os fins de semana em casa ele nem esporou foi de mala e cuia passar o fim de semana na casa do namorado e o Guilherme mora longe de onde vai ser o jogo.
Eu sei que na real Guilherme não curte futsal e menos ainda de mim, por partes entendo que Raylan queria agradá-lo e dessa vez vou deixar passar, já que ele já está bem estressado com a história dos pais dele, o Dan não está falando comigo, Raylan até fez um grupo, mas Dan não se pronuncia no grupo a não ser que seja muito preciso, fora que ele não respondeu nenhuma das minhas mensagens, estou dando espaço e tempo para ele agora, por isso nem espero que ele apareça e por fim Bia me pediu mil perdões mas ela precisou viajar com os pais, algo relacionado aos avós dela.
Pelo menos Téo garantiu que vai aparecer — mas ele está trabalhando hoje e só vai poder quando terminar o que foi fazer na faculdade — antes do final do jogo, Tales estão uma pilha pois a escola que vamos enfrentar é muito boa, está entre as três melhores da cidade, temos que nos esforçamos bastantes hoje, mas estou esperançoso nos garotos.
Pego minhas coisas e chamo o carro de aplicativo, afinal não posso me atrasar hoje, sou o assistente do treinador — ainda sinto um frio na barriga toda vez que penso nisso — e não vai ficar bem pra mim não chegar na hora, sigo para escola, vamos de ônibus todos juntos para escola rival onde será a partida, é muita pressão afinal os caras estão jogando em casa, conhecem bem a quadra deles, mas não tem erro, nosso time está afiado.
— Bom dia Ricardo — Tales está com uma cara de quem não dormiu.
— Bom dia professor e os carinhas já começaram a chegar?
— Nada, esses adolescentes só chegam em cima da hora, querem me deixar maluco, esse jogo é muito importante, não podemos vacilar — ele está estranhamente preocupado, mas não me admira, afinal ele pediu até uma grana a mais para me contratar, a escola está depositando muita confiança nele.
— Tem algo que posso fazer professor?
— Pode verificar se os equipamentos que vamos levar já estão todos no ônibus e verificar se não está tudo em ordem.
— Sim senhor — vou fazer o que ele me pediu alegremente, estou muito empolgado com esse jogo, parece até que vou jogar também.
Assim como o professor falou os moleques chegaram em cima da hora, diferente da gente muitos estão tranquilos, nem parece dia de jogo — essa juventude é diferenciada mesmo, antes de partirmos verificar rapidamente na ficha se todos os alunos estão no ônibus e de cara percebo que Junior não chegou, para piorar estamos em cima da hora, se não sairmos agora iremos nos atrasar, o professor já está pirando, quando mostro a frequência para ele só falta espumar pela boca, ele pega seu celular e liga direto para os pais do Junior.
— Claro, sem problema, desde que ele chegue — Tales fecha a cara no momento em que desliga o telefone — pais separados, o garoto foi dormir na casa do pai.
— Mas ele vem? — Agora estou preocupado também, nossas jogadas foram muito bem ensaiadas com ele, precisamos desse moleque pelas engrenagens do time girarem.
— A mãe dele disse que o pai vai levar ele direto, porque não vai dar mais tempo dele chegar aqui, mas juro que se ele não aparecer ele não entra mais em quadra enquanto eu for o técnico.
Tales está puto e nem posso tirar a razão dele, é um jogo importante e os moleques tem que demonstrar responsabilidade também, até porque todos os moleques do time ganham desconto nas mensalidades por serem atletas da escola e fiquei sabendo ontem que o Junior é um dos que tem o maior desconto, porque a mãe dele é dona do restaurante que dá desconto para os funcionários da escola, parece que tem um acordo entre eles, ela fornece esse desconto em troca de um desconto para o filho, ou seja ele estuda nessa escola quase que de graça. Chegamos na escola rival que também é uma dessas tradicionais e caras escolas particulares da cidade, a quadra é enorme e perfeitamente arrumada, até a pintura no chão parece nova, eles têm um zelo pela estrutura que impressiona.
— O Ricardo o Júnior chegou com o pai dele, vai lá na portaria buscar ele, não sei se o pai dele vai ficar para ver o jogo, melhor você ir logo pois estamos sem muito tempo também.
— Sim senhor — faço o que o professor manda e me dirijo rapidamente para a entrada.
Tales disse que não são todos os pais que vêm ver os jogos, mas sempre tem uma turminha que marca presença, mas o pai do Junior não é uma desse grupo então por isso ele me mandou vir buscar o Junior, acho que o pai dele nem deve ter descido do carro, enfim estou pensando em mil coisas ao mesmo tempo quando avisto meu jogador entrando na escola as presas junto com um homem que deve ser seu pai.
— Puta merda.
O pai do Junior é simplesmente o homem mais bonito do mundo, sua pele é morena, tem uma tatuagem de tribal no antebraço esquerdo, o cara é grande — ele tem quase a minha altura — e bem constituído, bem sou forte por trabalhar na roça, já ele tem cara de que treina ou no mínimo pratica algum esporte, para me matar mais ainda de tesão — coisa rara, pois não sou de ficar assim por homem, tipo eu fico quando acho o cara interessante, mas com esse cara meu interesse é puramente carnal — ele tem um cabelo curto num corte degrade e uma barba completa e com um inicio de transição para o grisalho.
Ele está usando um tênis branco e uma bermuda preta com uma blusa também preta, o cara é perfeito, esqueço até de respirar por meio segundo olhando para ele, mas consigo voltar ao meu normal — ou quase pelo menos — para chamar o Junior.
— Bora moleque está atrasado — o time já está acostumado comigo chamando eles de moleques, é uma mania minha desde novo chamar meus amigos assim, mas só depois de falar na frente do pai dele é que me toco que isso pode ter pegado mau.
— Foi mau professor, acordamos tarde, foi culpa minha — até a voz do pai parece de outro planeta, ele tem um voz firme, meio rouca, estou em alerta, pois tudo nesse cara chama minha atenção.
— Sem problema, chegou bem na hora, o senhor vai ficar para ver o jogo?
— Não vou poder, Junior lembra de avisar sua mãe quando estiver voltando para ela ir te buscar, entendeu?
— Entendi pai, valeu.
Junior apenas vai andando na frente sem nem se despedir do pai dele, divorcio nunca é facil, não sei se é recente ou não, mas dá para perceber que Junior não está feliz com essa dinâmica, mas seu pai não parece ser do tipo passivo, sei disso pela forma como seu pai o está encarando agora, incrédulo com a falta de educação do filho.
— Oh Mauro Júnior! — Junior para na mesma hora e volta, conheço bem esse sentimento, bastava ouvir a voz do meu pai para saber o que me aguardava quando era menor.
— Desculpa pai.
— Ah sim, já estava me perguntando que rebeldia é essa.
Dessa vez Júnior se despediu do pai de uma forma mais respeitosa, essa cena me trouxe algumas lembranças não muito boas, mas algo no pai dele me diz que ele não é agressivo como o meu era, porém reconheço o temor do jovem, agora estou muito confuso, porém tenho um jogo para me preocupar, me despeço educadamente também e levo o atrasadinho pro vestiário, só depois de vê-lo em quadra é que Tales volta a respirar, claro que seu bom humor não dura muito, pois o juiz acabou de apitar o início do jogo.
O jogo não começa nada bem para gente, logo no início o time adversário marcou um gol, no meio do segundo tempo eles marcam o segundo, pronto a essa altura a moral do time está baixíssima e Tales está soltando fogo pela boca, mas não podemos desistir ainda, peço pro Tales me deixar tentar algo e ele autoriza, assim que Pietro pega o posse de bola pro nosso time peço uma parada técnica.
— Olha não vou brigar com ninguém agora, ao invés disso vamos focar no que interessa, vou dizer exatamente o que eu quero que façam, entenderam?
— Sim professor! — Eles respondem em uníssono.
Lhes dou as instruções e aponto as brechas do time rival, não demora para meu plano começar a funcionar, Pietro fez um ótimo passe e Junior marca nosso primeiro gol, antes que o primeiro tempo se encerre Luka nosso pivô empata a partida, agora de cabeça fria Tales entendeu o que estou fazendo e me deu uma ideia ainda melhor, como resultado no segundo tempo viramos o jogo com uma boa vantagem, quando o técnico deles percebe já é tarde o juiz encerra o jogo com uma virada extraordinária, vencemos de quatro a dois.
Os meninos estão em uma animação só, no meio da comemoração os pais entram na quadra para cumprimentarem seus filhos e nisso sou surpreendido pelo Ciço que parece até que faz parte do time, o moleque tá empolgadaço, procuro pelo Dan, mas ao que me parece Ciço veio sozinho o que me deixa ainda mais surpreso, Raylan disse que eles são que nem unha e carne, fazem tudo juntos, não esperava que o Ciço fosse aparecer ainda mais sozinho.
— Caralho menor, você é um gênio, eu fiquei maluco quando me toquei na jogada que tu armou.
— O professor é quem é o gênio, só usei o que ele treinou com os moleques.
— Você teve seus méritos, cara sabia que ia ser jogão, só pelo que tu me contou naquele dia.
— Foi loucura, mas sabia que eles se davam conta, só precisavam de uma nova abordagem — estudei tanto as jogadas do professor que foi graças a isso que montei uma estratégia tão rápido — e também a estratégia do segundo tempo foi pro professor.
— Vocês formam uma boa dupla então, já estou doido pelo próximo jogo — estou olhando para um espelho, se ele fosse preto podia jurar que somos irmãos.
— Não tanto quando eu, foi bom para burro — ele ri da minha forma de falar, minha mãe não gosta de palavão então sempre que consigo evito.
— E ai onde vai ser a comemoração? — Ciço perguntou todo animado.
— Não vai ter, só vamos levar os alunos para escola e vou voltar para casa depois.
— Nem pensar, vamos comemorar, uma vitória dessa é até pecado deixar passar assim — Raylan me disse que o Ciço é um meninão e estou começando a entender o que ele quis dizer.
— Tá pode ser — comemorar não vai me matar e assim quem sabe o Raylan não convence seu namorado a ir também e vejo se meu amigo está de boas.
— Pois te encontro na escola.
— Posso pegar um carro de aplicativo só para dizer o lugar.
— Nada velho eu te busco, estou de moto vai dar certo — ele diz isso saindo dando o caso por encerrado.
Téo não conseguiu chegar a tempo, mas já está me parabenizando por mensagem, Ciço joga no grupo a proposta de comemoração, mas Dan recusa quase que no mesmo minuto, ele diz que tem que estudar, mas tipo sei que ele só não quer me ver, afinal todo mundo é da mesma sala, se fosse um trabalho ou uma prova todos teriam que estudar e tipo ele é um nerd, mas enfim Bia também lamenta que não vai poder, Raylan diz que está tentando convencer o Guilherme, se eles não forem acho que só vai me restar voltar pro meu plano inicial de ir para casa.
Dentro do ônibus está os moleques estão numa empolgação só, alguns já foram embora com seus pais, mas isso não diminui em nada a baderna que estão fazendo no caminho de volta para casa, vejo no celular se já tem atualização no grupo e tem uma mensagem do Raylan falando que vão ter que ficar em casa com o sogro, mas me parabenizam pela vitória, pelo visto o voltei ao meu plano inicial de ir para casa.
Na escola ajudei a descarregar o caminhão, depois despeço de todos e vou me encaminhando para a parada de ônibus que tem em frente a escola do outro lado da rua, mas sou surpreendido pelo Ciço em sua moto parado me esperando, está com o celular na mão, vai ver só agora viu que o pessoal não vai, de qualquer forma vou me aproximo para me despedir, quando me ver ele guarda o celular e me entrega um capacete.
— “Vamo bora!” — Sua animação parece ser inabalável.
— Eu posso ir de ônibus mesmo, de boas.
— Oxe se a gente vai pro mesmo lugar, os as ideias — ele está rindo e nem entendi ainda o que está acontecendo.
— O pessoal não vai poder — acho que ele não deve ter visto mesmo o grupo.
— Tô ligado acabei de ver aqui, mas nós estamos aqui e nós vamos comemorar essa vitória de estreia meu amigo, afinal esse foi seu primeiro jogo no time — ele tem razão, pego o capacete e sigo com ele para comemorarmos minha primeira de muitas vitórias que viriam.
Ciço me trouxe para uma churrascaria, o lugar é bacana e tem cara de ser meio caro, mas estou tranquilo, não é como se eu fosse gastar muito, o jogo foi pela manhã, já era de almoço acho que por isso ele me trouxe aqui e também deve vir muito aqui, já que todos os garçons parecem conhecê-lo.
— Você vem muito aqui? — Pergunto.
— Sim, é do meu pai, então todo dia praticamente passo por aqui.
Ele é um cara tão legal e humilde que às vezes esqueço que ele tem uma boa condição, bem pelo menos não vamos comer só nós dois, já que outros amigos dele está chegando também, ele me apresenta e já vai falando sobre o jogo e em pouco tempo já fico feliz por ter topado, pois falar de futsal com outros amantes do esporte é muito melhor do que ficar em casa sozinho.
É bom poder me gabar um pouco, afinal eu venci meu primeiro jogo como auxiliar do técnico, para mim foi uma grande conquista, os amigos do Ciço são tão gente boa também que até já me convidaram para uma pelada que vai ter no fim da tarde, pelo que entendi eles se juntam quase todos os sábados para jogar bola, já estava sentindo falta disso uma turma da pelada, adoro o Raylan, mas ele mudou um bocado depois desses anos.
— Vamos ver se tu só tem conversa ou se tu joga mesmo — um dos amigos do Ciço me provoca.
— Beleza, mas você me promete que não vai chorar depois de perder para mim? — A galera começa a zoar o cara, mas pelo menos ele leva na brincadeira, estou achando que essa turma é do bem mesmo.
Passamos um tempão conversando depois do almoço e ainda estava passando um jogo da champions na tv, daí não teve como passei a tarde inteira com a galera, o pessoa conhece o Dan, mas meu amigo não é nem um pouco sociável, os caras até aproveitam para reclamar com Ciço que ele anda sumido.
— Que isso, chamei vocês para almoçar hoje seus safados.
— No restaurante do pai dele, esse salafrário só quer nosso dinheiro — um dos caras diz rindo.
— Ei, o meu pai está perguntando se vai rolar mesmo hoje porque ele quer ir também — Romeu, um dos caras da turma, fala todo animado.
— Pode confirmar, quando o tio Cláudio ele leva uns amigos e no fim do jogo a gente bebe de graça com eles — um dos caras se diz mais animado ainda.
— Relaxa Rick a turma do tio Cláudio é de boas também, normalmente ele leva uns dois ou três amigos só.
— Os coroa tudo perna de pau — Romeu já começa a cantar vitória.
— Nem todos, você esqueceu daquele maluco lá — Ciço lembra o amigo.
— O policial?
— Sim, o maluco é rapido e tem uma força da porra — Ciço parece gostar de desafios pelo jeito, nesse ponto somos bem parecidos.
— Qual era o nome dele mesmo? — Um dos caras perguntou para o Romeu.
— É o Mauro, ele trabalha com meu pai.
Só o nome me faz lembrar do pai do Junior, eles têm o mesmo nome, coincidência, mas enfim aquele cara é de longe o homem mais bonito que já conheci na vida, o cara é todo posturado e tem uma cara séria, tudo nele me atrai, nunca tinha encontrado alguém que mexesse tanto comigo só de ver, pior é que agora estou pensando que se o paizão lá fosse policial que nem o cara estão falando, porra se esse homem me chega fardado para deixar o filho dele no treino vou ser preso certeza.
— Vou ter que ir em casa buscar minhas coisas para ir jogar com vocês, o society é aqui perto? — Só fiquei sabendo do jogo depois então não tenho nem roupa aqui para usar e sou muito alto, não tem tanta gente assim do meu tamanho para me emprestar uma roupa ou uma chuteira.
— Eu te levo lá — Ciço como sempre muito prestativo.
— Valeu macho, mas precisa não, vou de ônibus qualquer coisa se eu ver que não vai dar tempo eu peço um carro.
— Eu te levo cara, não precisa se preocupar — Ciço insiste.
— Oxe isso tudo é medo de eu não ir é — digo rindo — eu vou gente, só me passar o endereço direitinho, estou indo em casa rapidão encontro com vocês lá, vai dar certo.
Os caras me adicionam no grupo antes de eu ir em casa, agora que já sei onde é tá de boas de chegar, fica um pouco longe, mas tem ônibus para lá então isso é tudo que importa, o pessoal jogava no Montese, mas descobriram esse no bairro de Fátima e gostaram mais, bem só vou ter tempo de chegar em casa banhar e sair, mas até que gosto, quando mais ocupo a mente melhor fico, dou noticias pro pessoal lá de casa, incluindo a ótima noticia da minha vitória, a essa hora meus pais estão na igreja e lá tem sinal de celular então aproveito para conversar com eles um pouquinho, estou muito feliz e ainda vou jogar bola, não tem como esse dia melhorar.