Consegui o que eu queria trabalhando em uma área detestável para mim, finalmente troquei de carro e pude dar tchau aos meus queridos colegas. Apesar do pouco tempo de convívio, gostei bastante deles e mantive contato com alguns.
Fizemos vários exames nas crianças antes do recesso junino, que resultaram em Milena usando óculos para descanso e Kaique usando aparelho ortodôntico. Começou a zoação um com o outro, apelidando-se de "quatro olhos" e "boca de lata". De início, estava tudo no clima de humor, mas após alguns dias, começaram a se estranhar. Kaká não aguentou e começou a se chatear. Foi a viagem inteira para o interior no meu colo, enquanto, um pouco mais distante, Mih ia conversando e observando o mar com Júlia. Brad foi quietinho no caminho. No site em que procuramos informações, disseram que era obrigatório ter uma caixa de transporte e nós compramos, mas ele pôde ir somente com a focinheira.
— Por que vocês começam essas brincadeiras se vão ficar assim? — Perguntei, mas ele não respondeu, só me agarrou mais, fazendo um rostinho triste, ao passo que olhava a irmã tranquilinha.
Eu nem me preocupo, sei que é normal, que sabem e vão se resolver. Porém, é uma grande perda de tempo: dois trabalhos, se estressar e desestressar.
Um pouco antes de entrarmos na lancha, Milena só o abraçou e pronto, tudo já estava bem novamente.
— Finalmente, agora parem com isso definitivamente, por favor! — Aconselhou Juh.
— Agora posso beijar a mamãe de vocês em paz? — Perguntei ao abraçar minha muié por trás, fazendo-os rir, confirmando.
Não me recordo se já detalhei o percurso, mas ele é longo e cansativo de todas as formas. Geralmente, optamos pela maneira mais "rápida": ferry boat, blablacar ou carro próprio até o terminal hidroviário e, então, chegamos no atracadouro. Demora muito, contudo, vale a pena. É um lugar que me traz paz, nostalgia (da infância) e calma. Eu estava precisando.
Sentei com minha gatinha ao meu lado e ficamos de chamego, rindo das histórias que os meninos iam inventando sobre o que estava acontecendo no fundo do mar.
Quando chegamos em casa, estava um pouco suja, e Juh ficou limpando com Kaique e Milena. Fui fazer algumas compras. Geralmente, delego essa função para algum dos meus irmãos, mas eles só iam chegar dias depois, bem próximos dos dias festivos. Nós planejamos passar alguns dias lá e outros faríamos uma viagem para a região da Chapada Diamantina. Sarah e Victor também se juntariam a nós.
Do grupo inteiro, só Mih e eu já havíamos ido, e ela estava bem pequenininha. Então, ia ser bem legal, é um lugar lindo.
Quando retornei para casa, fui ajudá-los na missão "casa limpa", porém Juh preferiu que eu fosse organizar nossas roupas, e eu, obviamente, obedeci o meu amor, porque eu sou maluca, mas nem tanto. Preparei um almoço rápido e, após nos alimentarmos, partimos para a praia.
Mih e Kaká foram para o mar e Juh e eu ficamos deitadas na faixa de areia. Ela estava menstruada e não se juntou a eles. Eu já não curto tanto, então aproveitei para ficar por ali.
Recostei minha cabeça na lateral do seu quadril e começamos a relembrar de tudo: das nossas primeiras interações, de como nossas diferenças gritavam no início do relacionamento, os ciúmes, as brigas, nossas reconciliações e provocações que terminavam na cama. Estávamos levando a situação com humor. Olhamos para as crianças e... Era tudo tão simples... Eles só estavam sendo eles mesmos, se divertindo, correndo, um ficando em pé no ombro do outro e saltando o mais alto que conseguiam. Subiram em um barco que estava ancorado, pularam dele e ficaram repetindo. Eles exalavam felicidade.
Começamos a falar sobre como eles haviam crescido. Para a idade deles, eles eram baixinhos, sempre foram, mas haviam crescido. Mih estava ainda maior que Kaká. Foi impossível não comentar sobre a boa relação imediata da minha mulher com a nossa filha, e isso só cresceu com o tempo, o que as deixou com gostos bem semelhantes. Também falamos de Kaká, ele estava bem diferente fisicamente do modo de como chegou. Um verdadeiro rapazinho, só não é tão independente quanto Milena, por ser mais dengoso, porém tão confiante quanto.
Nós amamos vê-los e lembrar dos nossos momentos. Passamos por tantas coisas, mas a maior certeza que temos é que tudo serviu para nos fortalecer, solidificar nosso vínculo, potencializar nosso amor, abastecer nossa fé e consolidar nosso afeto. Nós cuidamos uma da outra, zelamos pela nossa família e somos um porto seguro para nossos filhos e para nós mesmas.
A risada dos dois era contagiante, e ficamos um bom tempo em silêncio contemplando, até Juh romper ao dizer, com um bobo sorriso no rosto: — Consegue imaginar mais um ali com eles?
— Facilmente... — Respondi encarando-a e fazendo carinho em sua mão.
— Aceita entrar nessa vida de vara da infância comigo novamente, amor? — Ela perguntou, levando a mão até o meu rosto, com um rostinho fofo, bem animado.
— Com você, todas as vezes possíveis, gatinha! — Falei e fui enchê-la de beijos.
— Acho que agora, que já conhecemos o processo, será mais tranquilo, não vamos pirar tanto. — Ela concluiu e eu concordei.
— É a única vara que eu deixo você entrar! — Disse-lhe, rindo, e antes que Juh reagisse, beijei sua boca com força. Aos poucos o beijo foi sendo correspondido e ficando cada vez mais gostoso, antes que a gente se empolgasse demais, fomos diminuindo o ritmo até finalizar com alguns selinhos.
Me joguei ao seu lado e foquei nas crianças novamente. Agora, vinham correndo até nós.
— Eu te amo, Lore! Vai ser lindo ter mais um filho e encher mais um coraçãozinho com nosso amor! — Disse-me, ao passar o braço sobre o meu tronco.
— Eu também te amo, Juh! E com certeza será incrível criar, educar e fazer mais um ser humaninho transbordar de amor.
Mih e Kaká se jogaram por cima de mim e, depois de tomarem água de coco, fomos para casa. Eles pediram para brincar um pouco do lado de fora com a mangueira e outras crianças, e nós fomos tomar banho.
No momento em que enxaguava o meu cabelo, notei que, embora também estivesse fazendo a mesma coisa que eu, Júlia me fitava. Não era um olhar sexual, era mais como se planejasse algo, como se tivesse acabado de ter uma boa ideia, mas ela estava viajando legal. Só reparou que eu a observava quando comecei a rir, dando pequenos estalos com o dedo, bem próximos do seu rosto.
— Posso saber no que minha gatinha está pensando, assim, que até saiu de órbita? — Perguntei, dando alguns beijinhos em seu pescoço.
— Amor, por que você não coloca piercing no peito? — Perguntou, segurando-os.
Comecei a rir, acho que esperava por qualquer coisa, menos por esse "pedido".
— Você acha que ia ficar legal? Tem vontade de fazer em você? — Perguntei, ainda em meio ao riso.
— Não, em mim, não. Nem pensar! Morro de medo só de pensar, mas em você... Tenho convicção de que ficaria perfeito. — Me respondeu.
— Já tive vontade de fazer, porém falam tanto da cicatrização que é ruim que acabei desistindo. — Falei.
— Ah, então deixa para lá, vai que inflama e fica doendo... Melhor não. — Juh concluiu.
Eu tenho alguns piercings nas orelhas e todos eles foram feitos da maneira mais caótica possível: menor de idade, escondido dos meus pais, com uns gorós na mente e sem instrução verdadeiramente profissional. E, por um grande milagre divino (eu nem conhecia a Santa Whisper para pedir a intercessão dela), todos são perfeitamente cicatrizados, tanto que não uso o tempo todo e nunca fecharam ou infeccionaram.
Fiquei com a ideia na cabeça, mas não comentei nada, por não ter certeza se realmente faria. Quando meus irmãos chegaram, comentei com Loren e ela me chamou para ir a um estúdio de body piercing, já que ela ia aproveitar para trocar suas joias.
Chegamos no estúdio e eu comecei a tirar as minhas dúvidas sobre cicatrização, e o mais importante para mim: a sensibilidade. No meio da semana, eu tinha visto alguns vídeos e uma moça disse que perdeu completamente, e isso eu não queria de jeito nenhum. A mulher me explicou que, na maioria das pessoas, até aumenta a sensibilidade, que, se essa fosse a minha preocupação, eu teria uma surpresa boa.
Esperei minha irmã fazer as trocas, também fiz as minhas enquanto pensava se valia a pena... Bom, foi um desejo da minha gatinha, se ela queria e achava que ia ficar legal, não era uma decisão tão difícil de tomar. Pelo menos não para mim.
Doeu para um caralho, foram as minhas únicas perfurações doloridas. Se o espelho não fosse colocado imediatamente na minha frente e eu não visse como ficaram LINDOS, eu com certeza me arrependeria amargamente da minha, até então, fácil escolha.
— Lore, você é a maior escravoceta que eu conheço, gada demais... Nunca vi igual... — Zoou, minha irmã.
— Sou e com orgulho, minha mulé quer, minha mulé tem! — brinquei, e fomos rindo para casa.
São meias verdades. Eu sempre vou fazer de tudo por Júlia, para agradá-la. Das coisas mais simples às coisas mais complexas. É o meu jeito de mostrar que me importo com os pequenos detalhes e com tudo que se refere ao meu grande amor.
Por eu ser uma pessoa assumidamente safada e sem vergonha, muitas vezes minhas atitudes, principalmente em questões estéticas e de expressões sentimentais, são levadas apenas para o lado sexual, como se eu quisesse sempre levar vantagem ou algum proveito, com segundas intenções. Por um tempo, mais na adolescência, na minha fase de descobertas, isso me incomodava muito, porque as proporções eram diferentes, completamente exageradas. Quando conheci Juh, se algo se excedesse, eu conseguia reverter e, hoje em dia, levo no humor e até acho graça na fama que criaram para mim, mas é algo feito de maneira mais saudável, graças às restrições impostas por mim.
A única pessoa que sempre me enxergou como eu sou, sem aviso prévio da minha, como ela mesma gosta de chamar, lábia e da minha afetividade, se chama Júlia Oliver. Ela sabe exatamente quando eu estou exercitando uma vertente ou outra, e é muito gratificante ter alguém ao meu lado que me conhece dessa forma, onde eu não preciso dizer uma palavra a respeito.
~ Peraê, atrás desse tesão de dez Anittas e cinco Luizas Sonzas existe um coraçãozinho carinhoso e sentimental, (kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk), mas bora voltar para história, caso contrário, eu me derreto inteira de amor.
Entrei em nosso quarto, tirei a blusa e me joguei na cama para aguardar Juh, que estava no banho. Assim que ela saiu e os olhos dela pousaram sobre meus seios, a sua face se transformou. Pude ver vários divertidamente trabalhando ao mesmo tempo em sua reação.
— Não acredito, amooor! Você é maluca!!! — Exclamou, chegando mais perto.
— Por você eu sou mesmo, viu?! — Falei.
Juh me deu um beijo e tinha um sorrisinho satisfeito nos lábios, a coisa mais linda.
— Posso tocar? Tá doendo muito? Doeu para colocar? Tem alguma restrição? — Ela me enchia de perguntas, totalmente empolgada.
— Toca com cuidado, doeu e ainda tá incomodando, mas gostei do resultado, valeu super a pena... Ainda mais com essa sua reação... — Disse-lhe e ganhei mais um beijinho. — Tem essas restrições aqui e... Infelizmente, cê só vai poder experimentar depois de quinze dias... — Falei, entregando o papelzinho com as orientações de cuidado, que eu nem havia lido, mas ela fez questão de ler cada palavra.
— Ficou perfeito, sabia que ia ficar lindo, amor!!! — Juh exclamou animada e deu um beijo na fenda entre os meus seios, segurei seu rosto e a beijei.
Enquanto ela se vestia, fiquei olhando no espelho. Apesar do inchaço, ainda estava bem bonito, acredito que deu até uma elevada na minha autoestima.
De repente, sem mais nem menos, Júlia vira para mim e pergunta séria: — Outra pessoa te viu sem blusa?
Comecei a rir, não sei se por achar engraçado ou de desespero.
— Outra pessoa te tocou sem blusa, Lore? — Juh insistiu.
— Amor, a ideia foi sua... — Já fui me defendendo.
— Foi homem ou mulher? — Me perguntou.
— Não faz diferença, foi um profissional... — Falei.
— Foi mulher, não foi? — Continuou insistindo.
— Amor, você está sendo injusta comigo... Gostei de fazer, mas a iniciativa só foi tomada por você demonstrar interesse... — me justifiquei.
— Huuuuuuuum, tô brincando... Mas sempre me impressiono com sua capacidade de me responder sob pressão. — Ela finalizou com um risinho.
— Sou bem treinada, muié... — brinquei, abraçando-a, um pouco sem jeito, estava doendo mesmo. — Se tá tudo bem mesmo, me dá um beijinho! — Pedi e recebi um beijão, mas logo ela voltou para terminar de se vestir.
A noite, nós nos preparávamos para curtir o primeiro dia de festa. Mih estava com os avós paternos e Kaká ia com a gente. A gente só não contava que íamos esbarrar com uma antiga conhecida que já nos causou um pequeno mal-estar.