— Mãe, bom dia! — Acordei mais feliz do que o normal. O aroma de café fresco e pão caseiro feito na hora encheu o ar e abriu meu apetite. Desci correndo para a cozinha.
Pelo jeito, apenas minha mãe tinha acordado. Eu precisava me preparar para a escola, mas, graças a Deus, era o último ano. Depois, faria uma entrevista de emprego em um café ali perto. Estava torcendo para conseguir o trabalho — seria ótimo ajudar em casa. Apesar disso, Márcia já tinha me avisado que o patrão do lugar era grosseiro e mal-educado.
Ainda assim, se o salário fosse bom, não me importava.
— Bom dia, meu filho. — Ela veio até mim, deu um beijo no meu rosto e sorriu.
— Bença, mãe. — Peguei sua mão e a beijei com carinho.
— Deus te abençoe. — Ela voltou ao fogão, mexendo nas panelas enquanto o cheiro de café se espalhava.
— Acordou animado hoje, hein? — Ela me lançou um olhar rápido e um sorriso.
— Hoje começo no café.
Ela abriu um sorriso ainda mais sincero.
— Tenho tanto orgulho de você. Tão jovem e já tão responsável.
— Mãe, precisamos sair daqui. Quero dar uma vida mais confortável pra senhora e pros meus irmãos.
Nasci naquela vila, mas sonhava em sair dali. Apesar de ter memórias boas, não era um lugar seguro, e os crimes estavam cada vez mais frequentes.
— Sim, meu filho, se Deus quiser, vamos sair. — Ela começou a tossir e fiquei preocupado.
— Mãe, tá tudo bem? — Me aproximei, pronto para ajudá-la.
— Tô bem, é só essa mudança de tempo que me deixa assim. Não se preocupa, viu? — Ela sorriu, mesmo com os olhos marejados pela tosse.
— A senhora precisa ir ao médico.
— Ir ao médico pra quê? Pra ele dizer que é virose e me passar um analgésico? Logo fico boa. — Ela colocou uma xícara de café e um pedaço de pão com manteiga na minha frente.
— Cadê o pai? — Perguntei, mordendo um pedaço do pão quentinho.
— Está dormindo. Trabalhou a madrugada toda.
Ela falou sem detalhes, mas eu sabia. Aos 18 anos, já entendia que meu pai não estava trabalhando. Era difícil ignorar as garrafas vazias que minha mãe jogava no lixo toda semana.
— Ele precisa de ajuda, mãe. E a senhora sabe disso.
— Sei, meu anjo. Mas ele disse que vai parar. — Sua voz tinha esperança. — Ele bebe por causa da dor na coluna. É difícil pra ele.
Minha mãe sempre tinha uma justificativa para tudo, até para as bagunças minhas e dos meus irmãos.
— Bom, eu não aguentaria viver assim.
Ela soltou uma risada.
— Ai, meu filho, você é tão jovem. Ainda não viveu um amor. Espero que, quando acontecer, seja algo bom e não complicado. Mas isso é mais difícil do que parece.
— Negativo! Nunca vou me apaixonar e nem me envolver com ninguém.
Eu me sentia invencível, como qualquer jovem com 18 anos.
— Ah, não? Sabia que o Jonas não para de passar aqui na frente? Ontem mesmo chamei ele e disse pra parar, porque já tava ficando feio.
Meu rosto esquentou na hora, e meu coração disparou. Engasguei com o café.
— Filho, você tá bem? — Ela me olhou preocupada. Quando viu que eu estava, soltou uma risada.
— Mãe! — Reclamei, tentando esconder minha vergonha.
— Olha, meu filho, não me importo que você seja gay. Muito pelo contrário: só quero que você seja feliz e saiba que eu e seu pai te aceitamos do jeitinho que você é.
Ela ficou séria.
— Mas não vou aceitar que você se envolva com bandido. O Jonas é um bom menino, conheço a família dele, mas ouvi dizer que ele anda com uma turma barra pesada. A gente já ajudou aquela família quando precisaram, mas ninguém precisa roubar ou fazer coisa errada pra sustentar uma casa.
Eu sabia exatamente do que ela estava falando. Já tinha ouvido boatos sobre ele, mas nunca imaginei que fossem verdade. A Márcia me contou que ele tinha dito a uma amiga que me achava bonito, mas sempre o vi como o "machão" do bairro.
— Mãe, não viaja. Não tem nada entre mim e o Jonas. E, além disso, não vou me envolver com gente assim. Agora preciso ir.
Dei um beijo no rosto dela e, antes de sair, fui surpreendido por dois pequenos furacões que pularam em mim.
— Mano, bom dia! — Gael me encheu de beijos enquanto Julia abraçava minha perna, sem querer soltar.
— Bom dia, maninhos. — Sorri com a cena.
Logo eles me soltaram para abraçar minha mãe. Em seguida, desceram Gus e Yasmin, os pré-adolescentes de caras amarradas.
— Oi, mano. — Gus me deu um abraço rápido e beijou minha mãe.
Yasmin, ainda sonolenta, praticamente dormiu no meu ombro até que eu a acordei.
Antes de sair, olhei para todos eles sentados à mesa. Cada um com sua personalidade, e eu os amava mais do que tudo. Queria congelar aquela cena, guardá-la para sempre. Mas uma sensação ruim me invadiu, como se soubesse que aquele momento nunca mais fosse acontecer assim.
Respirei fundo, espantei o pensamento e saí de casa.
****
Do lado de fora, as palavras da minha mãe se confirmaram: Jonas realmente estava lá. Ele morava a umas duas casas da minha, do outro lado da rua, mas eu não conseguia entender por que estava na rua tão cedo.
Ao passar por ele, Jonas me lançou um sorriso. Um sorriso lindo, que fez meu coração disparar. Envergonhado, baixei o olhar e segurei firme as alças da minha bolsa. Meu gesto pareceu encorajá-lo, pois ele se levantou de onde estava e correu na minha direção.
— Oi. — Ele falou, também meio tímido.
— Oi. — Respondi, incapaz de olhar diretamente nos olhos dele.
— Suas aulas vão até quando? — Ele tentou puxar assunto.
— Essa semana é a última. — Falei, lançando um olhar rápido para ele antes de voltar a encarar o chão.
— Hum... E depois? O que você pretende fazer? — Ele parecia bem mais à vontade do que eu.
— Hoje começo a trabalhar no café do Antônio. Também vou fazer o vestibular na semana que vem, pra ver se entro em alguma faculdade. — Dei um sorriso amarelo, meio sem jeito, e ele retribuiu.
— Sempre achei que você teria um futuro brilhante. Na escola, eu meio que tinha raiva de você.
— Raiva de mim? Por quê? — Perguntei, surpreso e um pouco incomodado.
— Você era tão focado na escola que nunca percebeu como eu te olhava. Na verdade, acho que ainda não percebe.
Fiquei sem reação. Aquilo me pegou de surpresa. É claro que eu tinha notado os olhares dele antes. No começo, pensei que ele não gostasse de mim, talvez até tivesse algum preconceito. Ele era o típico "machão" da escola, afinal. Com o tempo, no entanto, percebi que aqueles olhares eram diferentes, mas isso só me deixava desconfortável, então preferi ignorar.
— Não entendi... — Eu realmente era muito lerdo.
Ele levantou os olhos para o céu, como se pedisse paciência, depois olhou de volta para mim e abriu um sorriso.
-Você ainda não percebeu que eu gosto de você né? -Ele foi direto, isso era um ponto bem forte dele, não fazia rodeio para falar o que queria.
Não sei como ficou minha cor, se foi de vermelha para branca, só sei que ele me olhou preocupado.
-Ei, você está bem? -Minha vergonha estava completa agora.
-To... eu acho. -Falei baixinho. -Mas tenho que ir para aula, estou atrasado. -Eu saí quase que correndo, deixando ele para trás me olhando confuso com minha reação.
Chegando na escola ofegante fui logo atrás da Márcia. Ela estava com um grupo de amiga e quando viu minha situação correu até mim e me levou para um banco distante.
Falei logo o que aconteceu e eu deu um grito, todos que estava perto olhou para gente.
-Ei se controla.
-Eu não acredito nisso. Ele realmente falou isso? E você saiu correndo? Ai amigo, não tem como te defender seu idiota. -Ela falou decepcionada mas não tirava o sorriso do rosto.
Fiquei pensativo, nunca ninguém tinha falado que gostava de mim, eu meio que afastava tudo mundo. As meninas por eu ser gay e os garotos por ter medo de falar com eles.
-Você é muito lerdo, Virgem, ingênuo... -Ela começou a me metralhar com um monte de "elogio" que tive que mandar ela calar a boca.
-Escuta bem, depois da aula, você vai na casa dele e vai falar que o ama e quer dar para ele. -Ela falou tão sério que até me convenci por um minuto em fazer essa loucura.
-Não viaja, nunca mais vou falar com ele. -eu realmente nunca mais queria passar por essa vergonha de novo.
-Vai sim, e vai ser hoje, nem que eu te puxe pelo saco e te leve até ele. Amigo você tem 18 anos e nunca se quer beijou alguém. Qual seu problema?
Me sentir um pouco humilhado. Mas rebati.
-Pelo menos não sou a vadia do bairro que dar até para os postes da rua. -Falei sabendo que ela não ia levar a mal a brincadeira, mas que no fundo também era verdade.
-Ai sua audaciosa, por que não é assim em cima da pica do Jonas? -Ela falou um pouco alta e as pessoas voltaram a olhar para gente e eu queria enfiar minha cabeça em um buraco. Então decidi ir para sala de aula logo antes que piorasse.
Claro que não prestei atenção na aula e só fiquei sonhando com a boca do Jonas, aquele corpo sarado e musculosos. Nunca gostei de futebol mas eu e a Márcia fazia questão de ir ver os meninos jogando na quadra do bairro, e adorávamos ver o time que ficava sem camisa. E a maioria das vezes era o Jonas. Meu Deus que Deus grego.
A professora me chamou atenção e mandou eu prestar atenção da aula, tentei me focar e quando o sinal bateu meu estômago deu um giro de novo de nervosismo, tive até vontade de ir no banheiro vomitar.
Márcia me esperou na porta da minha sala e já me puxou pelo braço correndo para fora da escola apesar dos meus protestos.
-Hoje você não escapa. -Ela gritava na frente ainda me puxando.
-Eu juro se você abri a boca na frente dele eu te mato e é de verdade.
-Se você não falar com ele, você me abriga a me intrometer.
-Nem sonha, vadia.
Chegando perto de casa, ja podia avistar ele na frente da sua casa, estava sentando. Mas o que chamou nossa atenção foi outra coisa, fazendo eu e a Márcia parar.
Ele estava conversando com um dos chefão do bairro. Eu tinha arrepio só de ouvi o nome dele.
Márcia ficou de boca aberta, e ficou do meu lado.
-Amigo... -Ela tentou falar algo, mas sabía o que ela ia dizer.
-Acho que deixamos para outro dia. -Ela também morria de medo do cara.
-Sim...
-Eu vou indo, minha mãe disse para eu chegar cedo. -Ela meio que nem se despediu direito e já correu para sua casa.
Eu respirei fundo e continuei meu caminho, no meio do percurso sentir uma decepção enorme, podia não ser nada, mas também podia ser algo muito sério. E acabou que tive razão.
Algum tempo depois...
-Mãeeee! Passei! -Gritei do meu quarto e logo corri até a cozinha.
Minha mãe me olhou assustava, estava bem mais magra e pálida. Eu diariamente insistia para ela ir no médico, mas como sempre ela se negava.
-Passou em que menino? Que gritaria é essa?
-Na faculdade mãe, eu passei em direito, vou ser advogado. -Eu gritava e fez tudo mundo até meu pai ir para cozinha.
-O que esta acontecendo? -Meu pai chegou com uma cara enorme de ressaca, a frequência de porre dele estava só aumentando.
-Pai! Passei na faculdade federal, eu vou fazer direito. -Eu falei bem empolgado, os meus irmãos todos vieram pulando e gritando me abraçar, e minha mãe não parava de sorrir.
Até meu pai deu um sorriso e me abraçou me dando parabéns.
Mas tarde, conversando com meus pais. Eu revelei que queria ir embora, mora mas perto da faculdade e do café que trabalhava, como o curso era de noite eu podia trabalhar o dia todo e alugar um apartamento, já tinha conseguindo junta um dinheirinho para comprar meus móveis.
Apesar do protesto do meu pai, minha mãe acabou convencendo ele e aceitaram. Até disseram que ia ajudar com um pouco de dinheiro.
Eu estava hipnotizado de felicidade, a Márcia ficou feliz e no mesmo tempo triste em saber que iria morar longe de mim. Mas podíamos nos visitar final de semana. E ela meio que estava se afastando de mim devido que engatou um namoro com o Julius o homem mais alto e forte do bairro.
Poucos dias de me mudar, já tinha arrumado um kitnet bem pequeno perto da faculdade mais com um aluguel até que barato, os móveis os vizinhos acabaram dando alguns usados e já estava mobiliado a minha futura casa. Eu estava tão feliz, só faltava uma coisa.
-Oi. -Falei quando bati na porta da sua casa e ele me atendeu supresso.
-Oi. —Ele realmente não estava entendendo nada.
-Ta sozinho? -Ele morava com a sua vó.
-Sim, a vó foi no mercado.
-Ótimo. -Eu falei e nem esperei ele dizer nada e o empurrei para dentro da casa dele e dei um beijo de supressa na sua boca. Ele não mexeu os lábios e isso me deu insegurança e vergonha daquela atitudes inusitada.
Me afastei rápido e ele segurou meus braços.
Me olhou confuso e depois sorriu.
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