Quando Anthea saiu abruptamente do quarto, não tive tempo para pensar no que ela iria dizer. Senti que ia desmaiar, tamanha a quantidade de energia que senti que estava saindo do meu corpo. Passei a suar frio, e minha visão escureceu.
- Roberto.
Eu ouvi essa voz como se fosse um eco distante, repetido.
- Roberto (ecoando).
Não era a voz de Anthea, parecia a de Alethea, mas com um tipo de entonação diferente.
- Hã?
- Você vai precisar ir ao Templo Profano.
- Quem está falando?
- Você sabe. Eu olhei nos seus olhos, vi dentro de você. Você é digno. E apenas um homem digno poderá abrir o portal que levará o Maligno para longe do meu Mundo.
- Adrasthea? Por que precisa de mim, se é uma Deusa?
- Foram homens do seu mundo que abriram os portais para o Terror do Abismo, de onde veio Khlûl-Hloo.
- Mas e o que eu posso fazer? Sou um ninguém, um homem comum.
- Foram homens comuns que fizeram o que fizeram.
- Mas o que você...a Senhora...quer de mim?
- Você deve ir ao Templo Profano com ela.
- Com Alethea? Mas ela está quase morrendo!
- Ela não vai morrer.
Minha visão escureceu novamente, e um ruído como de ruflar de muitas asas preencheu meus ouvidos. Fiquei paralisado, e subitamente senti como se estivesse flutuando. Eu estava a cerca de um metro e meio acima da cama. Olhei para baixo, e vi meu corpo ao lado do que parecia ser um casulo!
- Roberto.
Desta vez era uma voz bem clara. Olhei para o lado. Alethea, belíssima como sempre, estava flutuando bem perto de mim, seu rosto quase encostado ao meu. Creio que era o que alguns descrevem como “viagem astral”.
- Está tudo bem. Vou voltar para você.
Isto durou alguns segundos. Mas senti que eu havia tido uma experiência transcendental.
Abri os olhos, embora estivesse me sentindo muito fraco. Ao meu lado, agora havia um grande casulo, um pouco maior do que o corpo de Alethea.
- Minha Deusa!
Era Anthea, que havia retornado.
- O que foi?
Ela se ajoelhou , ergueu os braços para o alto, e iniciou uma oração:
“ Óh Adrasthea, Deusa das aflitas e desesperadas,
Eu , que sou a mais humilde de todas,
Aquela que foi salva por vós
Que me livrastes e ao meu consorte do suplício certo,
E que errou ao esquecer de a Vós recorrer
Na mais escura hora ,
A Vós suplico que não desampareis
O fruto de meu ventre,
Aos Vossos pés me prostro,
E se preciso for,
Levai-me para junto de Si,
Mas permita que Alethea retorne e cumpra seu destino!”
Será que eu havia ouvido direito?
Alethea é filha de Anthea!
- Anthea...
Ela não me ouviu, ficou por um bom tempo abraçada ao casulo. Depois olhou para mim, e falou, em tom de súplica:
- Por favor, Roberto...continue ao lado dela.
- Vou ficar aqui, embora não esteja compreendendo quase nada. Mas, pelo que entendi, você é a mãe dela! Como aconteceu isso? Como Arthur sobreviveu? E como você não foi sacrificada quando ela chegou na idade de ser educada pelas Sacerdotisas?
Anthea não respondeu, apenas me fitou com seus belos olhos marejados. Eu deveria ter percebido a semelhança entre as duas. Mas a expressão no seu olhar não deixava dúvidas.
- Ela não sabe, não é mesmo?
- N...não.
Você já me disse duas vezes: “É uma história muito longa, e você já ouviu demais.” Arthur não foi sacrificado, nem você, mas Alethea foi educada pelas Sacerdotisas e não por você. Isso me leva a pensar que houve alguma coisa diferente no Ritual após a noite de núpcias. O que houve? Khlûl-Hloo não apareceu? Arthur continuou vivo, e precisaram fazer um acordo para que vocês saíssem em segredo, para não questionar a “onipotência” da Entidade, mas com a condição que Alethea fosse educada pelas Sacerdotisas?
- Você é um homem inteligente. Mas não estou em condições...de falar agora. Só peço que continue com ela.
- Vou continuar, eu já decidi. Mas ainda não entendo o que a Deusa quer comigo e com Alethea. Ela me disse que nós dois deveríamos ir ao Templo Profano.
- Adrasthea falou novamente com você?
- Foi a impressão que tive.
- Então ela vai viver! Graças à Deusa!
- Mas o que vai acontecer agora? Isso parece uma crisálida!
- Agora é aguardar o tempo que for necessário.
- E que pode demorar muito.
- Não pense nisso. Fique deitado e imagine sua energia fluindo para ela, e recebendo parte da energia dela dentro de você. Essa energia retornará purificada para Alethea.
- Eu já disse antes que quero dar toda a minha energia para ela, mesmo que...
- A Deusa já se manifestou. Você deverá ir ao Templo Profano, isto significa que você vai viver e ter forças para empreender essa tarefa.
Não havia o que contestar. Deitei e procurei relaxar meu corpo, mentalizando a transferência de minha energia para ela. Então, apaguei. Foi como um sono profundo, em que tive sonhos estranhíssimos, que envolviam o mundo de Alethea e uma criatura gigantesca, com tentáculos que se assemelhavam aos de um polvo, mas muito mais terrível.
Não sei quanto tempo passou, mas me pareceu uma eternidade. Quando abri os olhos, tive uma sensação indescritível, um mal-estar generalizado, eu estava suando muito, com uma ereção dolorida. Quando olhei para meu corpo, gritei:
- Arthur! Anthea!
Anthea veio rapidamente e ficou em pé, ao meu lado.
- Não se assuste...
- Como não vou me assustar? Olhe só!
Eu estava irreconhecível. Os pelos de meu corpo haviam crescido enormemente, eu parecia um urso ! Minha barba estava enorme, as unhas das mãos e pés com quase trinta centímetros !
- O que foi isso? Fiquei quantos anos inconsciente, para acordar assim?
- Você lembra do que falei antes? Os humanos precisam cortar os cabelos, fazer a barba, aparar os pelos do corpo, cortar as unhas...
- Você não disse quanto tempo...
- Vinte e quatro horas.
- Não acredito, Anthea! Impossível!
- Mas é verdade. Seu metabolismo acelerou durante a transferência de energia.
- Então, eu envelheci alguns anos em algumas horas, para isso ter acontecido.
- Melhor do que morrer.
Nisso, Arthur chegou, vindo do Hospital.
- Hum, vamos ter algum trabalho para aparar tudo isso.
- É típico de médico. Não se impressionou nem um pouco.
- Na Medicina, meu amigo, é necessário um grande autocontrole. Imagine se o médico ficar apavorado com cada situação preocupante que ocorrer.
- Desculpe. E Alethea? Como ela está?
- Veja você mesmo.
Preocupado com minha aparência, eu não havia ainda olhado para ela. Agora havia um casulo que emitia uma luz dourada, brilhante, que pulsava com se fossem as batidas de um coração.
- O que isso significa?
- Significa que agora você precisa cortar as unhas, o cabelo, aparar os pelos e depois descansar, porque logo você terá que ir a Adrasthea, em um Templo Secreto onde a crisálida irá abrir.
- Ela vai criar asas, como uma borboleta?
- Não. Mas vai parecer rejuvenescida.
- Quanto ? vai voltar a ser...
- Não, claro que não. Via ter a mesma idade. Mas digo rejuvenescida porque seus órgãos estarão renovados, sua saúde estará perfeita. Graças à Deusa, que nos criou e ao nosso mundo.
Os dois me ajudaram a cortar as unhas, afinal em nem conseguia me mover direito. Depois, Anthea trouxe uma máquina de cortar cabelos, aparou os pelos de meu corpo, depois, com uma tesoura, deixou meus cabelos mais apresentáveis. Ela trouxe um espelho, e agradeci, eu estava novamente “normal”. Só havia um inconveniente:
- E isto aqui?
A minha ereção não diminuía, e estava dolorida. E o fato de ter ficado pelado esse tempo todo perto daquela belíssima mulher só aumentava o “problema”.
Anthea falou:
- Você pode fazer algo muito útil com isso. O orgasmo libera uma energia sexual muito intensa. Vamos deixá-lo a sós e você pode se aliviar. Mas precisa manter uma imagem mental , projetando sua intenção na saúde dela.
- Quer dizer que, se eu projetar uma intenção durante o orgasmo, isso vai acontecer?
- Se você tiver força de vontade suficiente, sim.
Admito que me passou pela cabeça a possibilidade de que ela me ajudasse nessa tarefa, mas lembrei que, se isso viesse a acontecer, minha possibilidade de ficar com Alethea, caso ela se recuperasse, iria por água abaixo.
A saída foi me masturbar, pensando nos momentos que passei com aquela moça nua nos túneis subterrâneos. Quando estava prestes a atingir o clímax, procurei criar uma imagem mental dela, lindíssima, nua, ao meu lado, em nossa futura casa, que seria perto das linhas de energia.
Foi um orgasmo prolongado e com uma ejaculação farta, que atingiu o casulo, cuja luminosidade pulsava mais rapidamente. De maneira curiosa, agora emitia uma espécie de vibração, que produzia um som como: “Hmmmmmmm”.
Levantei-me e fui tomar um banho prolongado. Meu corpo formigava após o orgasmo, mas era uma sensação boa, como se eu estivesse com mais energia.
Levei um susto quando vi Anthea na porta do banheiro.
- O que houve? Algum problema?
- Você precisa se aprontar para a viagem, está na hora.
- Como assim?
- O casulo só pode se abrir em nosso mundo. E essa vibração significa que a hora está chegando. Se abrir aqui, ela pode não resistir às condições desta região intermediária.
- Tudo bem, vou me apressar.
Procurei me vestir rapidamente.
Arthur e Anthea já haviam deixado minha mochila pronta. Com ela nas costas, me aproximei do casulo. Ao tentar erguê-lo, fiquei surpreso:
- Mas é muito leve! Parece mais leve do que quando eu a carreguei no colo até aqui!
- Não se preocupe, é assim mesmo. E vai ser mais fácil para você levá-la ao Templo Secreto.
- E onde fica esse Templo?
- Vamos acompanhá-lo a um túnel que tem uma entrada que irá deixá-lo bem próximo do Templo.
Com o casulo de Alethea no colo, fui com Arthur e Anthea até um túnel que eu ainda não conhecia, pois estava fechado com uma porta de pedra que abria com um dispositivo eletrônico, com um código, como da vez em que Anthea havia me livrado do sacrifício.
- Instalamos estes dispositivos para evitar que alguém descubra a existência do Templo Secreto da Deusa.
- Mas ninguém sabe disso do outro lado?
- Apenas as sacerdotisas fiéis a Adrasthea conhecem o lugar, está bem escondido em uma caverna , em uma região desabitada.
Anthea me passou a rota, eu precisava memorizar, porque caso fosse escrita e desenhada, poderia cair nas mãos dos adeptos de Khlûl-Hloo, caso algo desse errado. E também me disse tudo o que deveria ser feito quando lá chegasse.
- E o que poderia dar errado?
Arthur riu.
- Isso é o que sempre dizem antes de algo dar errado nos filmes. Mas espero que você se saia bem.
- Eu preciso que você faça tudo certo, Roberto – disse Anthea.
- Além disso, a Deusa espera que eu a ajude, embora eu não me considere ninguém especial.
Como das vezes anteriores, após o portal ter sido aberto, tirei as roupas, passei a mochila e o casulo para o outro lado, sob o olhar atento do casal.
- Que a Deusa te acompanhe por todo o caminho, Roberto!
Fiquei sentado ao lado do casulo brilhante, embora a luminosidade estivesse bem mais fraca, da mesma forma que minha lanterna não iluminava o túnel. Eu teria que esperar clarear para então me aventurar até o Templo Sagrado.
CONTINUA