Lairce caminhava pela calçada esburacada da escola como um espectro perdido entre os vivos. Seu vestido preto colava-se ao corpo curvilíneo, desenhando sua silhueta com precisão mortal. O sol poente jogava um brilho dourado sobre seus cabelos negros, fazendo-a parecer uma deusa caída, um anjo de mistérios insondáveis. Ela não notava os olhares lascivos dos homens nem os sussurros invejosos das mulheres. O mundo ao redor desaparecia quando seus olhos encontravam a figura magra e desengonçada de seu filho, Natan.
Ah, Natan… seu bem mais precioso, sua única razão de continuar. Alto, de rosto bonito, mas enterrado em livros e telas brilhantes, perdido em um universo onde ninguém parecia notá-lo. Ele passava pela vida como uma sombra, um detalhe embaçado no fundo da cena principal. Nenhum amigo, nenhuma namorada, nenhuma risada ecoando pelos corredores da escola. Apenas ele e seu silêncio solitário.
Isso preocupava Lairce. E essa preocupação a consumia como um fogo lento.
Na saída da escola, seus olhos captaram algo que fez seu coração disparar por um motivo que ela não queria admitir de imediato. Encostados no portão, em um grupo que parecia saído de um filme, estavam eles.
Reyam. Um colosso de ébano, músculos esculpidos como se tivessem sido talhados à mão pelos deuses. Os braços cruzados sobre o peito largo, os olhos semicerrados avaliando tudo e todos como se o mundo fosse uma arena e ele, o gladiador supremo. Um sorriso preguiçoso nos lábios carnudos, um predador em repouso.
Maicon. O loiro de olhos astutos, menor que Reyam, mas ainda assim com um físico respeitável. Seu charme estava mais na língua do que nos músculos – sempre com um comentário afiado, um sorriso de canto de boca, um brilho malicioso no olhar.
Eduardo. Gordo, mas confortável em sua pele. O tipo de cara que sabia fazer piadas das próprias falhas antes que os outros pudessem usá-las contra ele. Ele não era forte como Reyam nem magnético como Maicon, mas se beneficiava da amizade com ambos, nadando na maré da popularidade alheia.
Eles eram os mais populares da escola. O tipo de garotos que ditavam as regras sociais sem esforço. Se Natan andasse com eles, sua vida mudaria. Ele deixaria de ser invisível. Poderia até – quem sabe? – arrumar uma namorada. Ser feliz.
O pensamento pousou na mente de Lairce como um inseto venenoso. Ela lambeu os lábios sem perceber. A ideia era tentadora.
Mas então, algo estranho aconteceu.
Seus olhos encontraram os de Reyam.
E ele sorriu.
Foi um sorriso lento, preguiçoso, mas cheio de significado. Um frio percorreu a espinha de Lairce. Havia algo naquele olhar. Algo que fazia seu coração acelerar – e não era apenas pela óbvia beleza física do rapaz.
Era algo errado.
Maicon percebeu a interação e riu baixo, cutucando Eduardo, que também virou o rosto na direção dela. De repente, os três estavam olhando para ela.
Para Lairce.
Não para Natan. Não para qualquer outra mulher ao redor.
Apenas para ela.
E nesse instante, a rua pareceu mais escura. O ar, mais pesado.
Lairce engoliu em seco, mas não desviou o olhar. Algo dentro dela, algo primal e profundo, disse-lhe que nunca se deve desviar o olhar de um predador.
O que esses garotos tinham de tão perigoso?
E por que, diabos, ela sentia um arrepio de excitação misturado ao medo?
Os dias seguintes foram um desafio para Lairce. Ela tentava ignorar aqueles três, mas era como se os olhos deles queimassem em sua pele sempre que cruzavam seu caminho. Reyam, Maicon e Eduardo sabiam que ela os evitava, e aquilo parecia diverti-los.
Certa manhã, ao deixar Natan na escola, ela voltou para casa distraída, a mente vagando entre contas atrasadas e preocupações sobre o filho. Não percebeu a presença deles até ser tarde demais.
Eles estavam esperando.
— Bom dia, dona Lairce — Maicon disse com um sorriso de canto, o tom carregado de malícia.
Ela hesitou. Queria ignorá-los, mas algo nela não permitia que passasse sem ao menos cumprimentá-los.
— Bom dia — respondeu baixinho e apressou o passo.
Foi quando ouviu um barulho seco.
Ela se virou e viu Eduardo caído no chão, gemendo de dor.
— Ai… droga, acho que me machuquei…
Lairce sentiu o instinto materno gritar dentro dela. Apesar do receio que sentia por aqueles garotos, não podia simplesmente ignorar alguém ferido. Voltou alguns passos e se ajoelhou ao lado de Eduardo.
— O que aconteceu?
— Acho que torci o tornozelo — ele disse, com um falso ar de sofrimento.
— Preciso te levar ao hospital.
— Não, não… é só um ralado. Mas tá doendo.
Ela hesitou, mordendo o lábio.
— Moro aqui perto. Posso fazer um curativo.
Eduardo sorriu e trocou um olhar cúmplice com Reyam e Maicon.
— Obrigado, dona Lairce.
Em Casa
O pequeno grupo seguiu até a casa dela. Lairce sentiu um desconforto estranho ao ver os três rapazes sentados no sofá da sua sala, parecendo donos do lugar. Ela trouxe uma caixa de primeiros socorros e tratou do ferimento de Eduardo, que não era nada além de um arranhão superficial.
O papo foi se desenrolando de forma natural. Eles pareciam diferentes ali, sem a pose de garotos populares da escola. Havia um certo charme em como falavam, como riam de maneira relaxada.
Em um momento, Lairce mencionou Natan.
— Ele precisa de amigos. É muito desengonçado…
Os garotos riram.
— Ele é meio anti-social — Maicon comentou.
— Pois é. Se eu pudesse, pagaria vocês para serem amigos dele — disse, em tom de brincadeira, rindo.
Os três riram também, mas então Reyam falou algo que fez o ambiente mudar.
— Quem sabe não podemos negociar?
Lairce franziu o cenho.
— Como assim?
Reyam a encarou com seus olhos profundos e intensos. Havia algo quase hipnótico em seu olhar.
— A senhora nos ensina algumas coisas da vida… e, em troca, a gente ensina seu filho a ser mais amigável.
O silêncio que se seguiu pareceu arrastar-se por uma eternidade.
Lairce sentiu o sangue gelar.
— Que coisas da vida? — sua voz saiu hesitante.
Maicon sorriu e respondeu antes de Reyam:
— Coisas que uma mulher faz com um homem.
Lairce arregalou os olhos.
— Como vocês podem falar isso para mim?
Eduardo riu baixo, mas Reyam permaneceu sério.
— Dona Lairce, tudo na vida tem um preço. Se fizer isso, podemos ajudar seu filho a ser muito mais popular do que a senhora imagina.
A sala ficou pequena, o ar pesado. Lairce sentia o próprio coração martelando no peito. A proposta era absurda… mas então, um pensamento traiçoeiro surgiu.
E se ela dissesse sim?
E se seu filho finalmente deixasse de ser um pária?
— Vou pensar… — murmurou, quase sem perceber.
Reyam se levantou, ajeitando a camisa sobre os músculos esculpidos.
— Amanhã voltamos para saber sua resposta.
Os três saíram, deixando Lairce sozinha com seus pensamentos.
E com um desejo que ela não queria admitir nem para si mesma.
No dia seguinte, Lairce acordou sentindo uma eletricidade no ar. Era um misto de nervosismo e excitação, uma sensação que não experimentava há muito tempo. Desde a morte do marido, sua vida tinha se resumido a contas, responsabilidades e, acima de tudo, criar Natan.
Mas agora... agora era diferente.
Ela passou o dia distraída, perdida em pensamentos sobre o que viria. Os três voltariam. Queriam uma resposta. E ela sabia que tinha o controle do jogo.
Quando o fim da tarde chegou, ela já tinha decidido como aquilo iria acontecer.
Às 18h em ponto, a campainha tocou.
Lairce abriu a porta com um sorriso tranquilo, vestida de forma casual, mas ainda assim impecável: um vestido de tecido leve, decote discreto, mas suficiente para deixar a imaginação trabalhar. Seus cabelos negros estavam soltos, caindo em ondas pelos ombros.
Do outro lado, Reyam, Maicon e Eduardo esperavam como caçadores diante de uma presa. Mas o que eles não sabiam era que Lairce não era presa alguma.
— Boa noite, garotos. — Sua voz soou calma, convidativa.
— Boa noite, dona Lairce — respondeu Reyam, o líder silencioso do grupo. Seus olhos percorreram-na como se tentassem decifrá-la.
Eles entraram e se acomodaram no sofá. O ar estava carregado de expectativa.
— Então, pensou na nossa proposta? — perguntou Maicon, inclinando-se para frente com um sorriso travesso.
Lairce cruzou os braços e caminhou pela sala, os saltos batendo suavemente no piso.
— Sim, pensei muito. E cheguei a uma conclusão... Vamos negociar.
Ela fez uma pausa, deixando as palavras suspensas no ar. Os três trocaram olhares.
— Negociar? — Eduardo perguntou, franzindo a testa.
Lairce sorriu de forma divertida e continuou:
— Sim, achei que começar com uma aula sobre a arte do sexo oral seria o suficiente para um primeiro acordo. Eu ensino, vocês ajudam meu filho.
Maicon soltou uma risada curta.
— Só isso? Achei que teríamos algo mais... abrangente.
— Ah, querido, vocês não acham que podem levar tudo assim, de graça, né? Homens precisam aprender o valor de uma boa negociação.
Reyam, que observava em silêncio até então, inclinou a cabeça, avaliando-a com interesse renovado.
— Hmm... justo. Mas acha que isso é suficiente para que a gente transforme Natan no cara mais popular da escola?
Lairce deu um passo à frente e colocou as mãos na cintura.
— Por enquanto, é o que estou disposta a oferecer. Negociações futuras dependem de desempenho, entende?
Eduardo soltou um assobio.
— Isso parece uma entrevista de emprego.
Lairce riu, jogando a cabeça para trás.
— Pensem assim: vocês querem algo de mim, eu quero algo de vocês. Se me mostrarem que são realmente bons em transformar meu filho, quem sabe não podemos ampliar o contrato?
O olhar de Reyam brilhou com algo que não era apenas desejo — era desafio.
— Amanhã, então?
— Amanhã.
Ele se levantou primeiro, e os outros dois o seguiram. Mas quando estavam prestes a sair, Reyam parou e se virou.
— Espera. Queremos ver uma amostra grátis.
Lairce arqueou uma sobrancelha, fingindo confusão.
— Como assim? O trato começa amanhã.
— Nada prático. Só... mostre um pouco do que tem a oferecer.
Os outros dois riram, concordando.
Ela suspirou teatralmente e deu um sorriso de lado.
— Vocês são impacientes.
— Apenas curiosos — retrucou Maicon.
Ela hesitou por um momento, criando um suspense proposital. Sabia que estava no comando.
Então, sem dizer nada, deslizou as mãos pelos lados do corpo, descendo até as coxas. Sob o vestido, suas mãos puxaram a lingerie para baixo com um movimento controlado.
Os três prenderam a respiração.
Quando terminou, ela simplesmente levantou um pouco o vestido e o segurou por alguns segundos. Não o suficiente para ser explícito. Apenas um vislumbre fugaz.
Maicon soltou um riso nervoso.
— Isso não vale, dona Lairce.
Ela abaixou o vestido e cruzou os braços.
— Ah, não?
Eduardo abanou o rosto como se precisasse de ar.
— Isso foi sacanagem.
Lairce riu.
— Tudo bem. Já que vocês foram bons meninos hoje…
Ela deslizou as alças do vestido pelos ombros lentamente e o deixou cair no chão. Estava nua.
Silêncio absoluto.
Ela girou suavemente sobre os calcanhares, dando uma volta completa. Sabia o que estava fazendo.
Quando voltou a encará-los, os três pareciam hipnotizados.
Lentamente, pegou o vestido e o vestiu novamente, fechando-o como se nada tivesse acontecido.
— Pronto. Agora podem ir.
Eles pareciam em transe. Maicon e Eduardo riram de nervoso, enquanto Reyam, sempre mais contido, apenas assentiu.
— Amanhã — ele disse, a voz ligeiramente rouca.
Ela sorriu.
— Amanhã.
Os três saíram, e quando a porta se fechou, Lairce se permitiu soltar um riso baixo.
Ela estava gostando do jogo.
Na manhã seguinte, Reyam, Maicon e Eduardo estavam na escola, sentados no canto mais afastado do pátio. Havia um ar de conspiração entre eles.
— O garoto é um bloco de gelo — resmungou Maicon, jogando um pedaço de pão na mesa. — Tentamos puxar assunto com ele, mas ele mal responde.
Eduardo suspirou.
— Como a gente vai fazer ele andar com a gente se nem olha na nossa cara?
Reyam, sempre calado e observador, esfregou o queixo.
— A gente precisa criar uma situação onde ele tenha que confiar na gente.
Os outros dois olharam para ele, intrigados.
— Como assim? — perguntou Maicon.
— O medo aproxima as pessoas. Se ele sentir que está em perigo e que nós somos a proteção, vai começar a andar com a gente naturalmente.
Eduardo arqueou as sobrancelhas.
— E como a gente faz isso?
Reyam olhou para um canto do pátio, onde um grupo de garotos trombadinhas se reunia. Entre eles, estava Beto, um rapaz magrelo, sempre metido em confusão. Ele não era popular, mas todos sabiam que gostava de intimidar os mais fracos.
— Deixa comigo.
Reyam se levantou e foi até Beto. Os dois trocaram algumas palavras rápidas, e no final, Reyam passou discretamente uma nota de dinheiro para ele.
Quando voltou para a mesa, Maicon sorriu de lado.
— Subornando trombadinhas agora?
— Apenas criando a situação perfeita.
Eles aguardaram o intervalo, e quando finalmente tocou o sinal, o plano começou.
Natan caminhava sozinho pelo corredor vazio, segurando seus livros contra o peito, quando sentiu um empurrão forte.
Ele cambaleou para trás e olhou assustado.
Beto.
— O que foi, nerdinho? Achou que podia passar por aqui sem pagar pedágio?
Natan gaguejou.
— O quê?
O primeiro soco veio rápido, acertando-o no ombro. Não era forte o suficiente para derrubá-lo, mas doeu muito.
— Ei! — gritou, recuando.
Beto avançou para dar outro golpe, mas uma mão firme agarrou seu punho no ar.
Era Reyam.
— O que tá acontecendo aqui?
Beto olhou para ele e hesitou.
— Só brincando com o garoto, mano…
— Brincadeira acabou. Some.
Beto bufou, mas sabia que não valia a pena brigar com Reyam.
— Tanto faz. Esse nerd nem vale meu tempo, na saída a gente se acerta.
Ele se afastou, e Natan olhou para Reyam, ainda respirando pesado.
— O-obrigado…
Reyam deu um sorriso tranquilo, como se aquilo não fosse nada.
— Relaxa. Tem muito cara babaca por aí. Melhor você andar comigo na saída. Ele pode querer te pegar de novo.
Natan hesitou, mas acabou concordando.
— Certo… valeu, cara.
Maicon e Eduardo, que assistiam tudo de longe, trocaram um olhar cúmplice.
O plano tinha dado certo.
Na saída da escola, Lairce estava esperando, como sempre fazia. Mas dessa vez, algo diferente chamou sua atenção.
Natan não estava sozinho.
Ele caminhava ao lado de Reyam, e Maicon e Eduardo logo atrás. Seu filho, sempre tão solitário, estava finalmente acompanhado.
O coração de Lairce bateu mais rápido.
— Natan…
Ele sorriu.
— Mãe, esse é Reyam. Ele me ajudou hoje.
Lairce olhou para Reyam e viu aquele mesmo brilho enigmático nos olhos dele.
— Que bom. Obrigada por ajudar meu filho.
Reyam sorriu de leve.
— Sem problemas, dona Lairce.
Os outros dois acenaram de longe, e Lairce apenas os cumprimentou timidamente antes de ir embora com Natan.
Eles tinham cumprido a parte deles. Agora era a vez dela.
CONTINUA...