Eu estava tenso, mais do que o normal. A cada passo que eu dava em direção à delegacia, algo me dizia que as coisas estavam tomando um rumo inesperado. A ligação que recebi na sorveteria sobre os assaltantes já era o suficiente para me deixar com a pulga atrás da orelha, mas quando a atendente me informou que eu precisava ir até lá para falar com Arthur, a sensação de que algo estava errado ficou ainda mais forte.
A delegacia tinha aquele cheiro característico de formalidade misturado com tensão, algo que sempre me fazia sentir desconfortável. Ao chegar, fui guiado até uma sala onde encontrei Arthur. Ele estava sentado, imóvel, em sua cadeira, com o celular preso às mãos, e seus olhos fixos na tela. Ele nem percebeu que eu entrei. O silêncio era denso, e eu podia ouvir o clique das teclas do celular à medida que ele digitava algo rapidamente. Não parecia ser nada de bom. Eu me aproximei e, com o olhar, tentei puxar sua atenção.
— Arthur — falei, um pouco impaciente, mas sem querer parecer desrespeitoso demais.
Ele levantou os olhos lentamente, como se me visse pela primeira vez, e deu um suspiro, largando o celular sobre a mesa com certa brusquidão. A raiva estava estampada no rosto dele, mas algo havia mudado. Algo não estava certo.
— Pedro — ele falou com um tom frio, sem aquele costumeiro sorriso irônico que sempre me fazia achar que ele estava no controle. — Antes de começar, você vai me chamar de "Delegado", entendeu? Eu subi de cargo, e agora eu exijo respeito.
Eu olhei para ele, sem acreditar nas palavras que saíam da boca dele. **Delegado?** Arthur, aquele cara que sempre foi tão casual, tão... Arthur, agora se achava o dono do lugar? Eu podia sentir um deboche formando na minha garganta, mas tentei controlar.
— Claro, "Delegado" — falei com um sorriso sarcástico, deixando claro que eu não estava levando a coisa tão a sério.
Ele não parecia se importar com a minha resposta. Apenas franziu a testa, claramente incomodado, e bateu a mão na mesa com um som surdo.
— Vou te mostrar quem são os assaltantes da sua sorveteria. Não vim aqui pra perder tempo com piadinhas.
Eu estiquei o pescoço, curioso. Ele se levantou e começou a caminhar em direção a uma porta ao fundo da sala. Eu o segui, sem saber o que esperar. Ele abriu a porta e acenei para ele me mostrar os criminosos, mas o que eu não esperava era o que ele diria em seguida.
— E já que você está aqui, tem mais uma coisa — ele falou, virando-se para mim com uma expressão grave. — Eu também vou te contar sobre Gabriel.
Eu franzi a testa. O nome dele era como um raio que cortou o ar. Gabriel, o amigo de infância de Arthur, aquele de quem ele nunca falava. Eu sabia que algo estava errado, e naquele momento, a revelação me acertou como um soco no estômago.
Arthur me levou até a cela onde os dois assaltantes estavam, mas minha mente estava longe dali, ainda tentando processar o que ele acabara de me dizer.
Arthur me fez um sinal para me aproximar dos assaltantes. Eles estavam sentados em uma das celas, com os rostos sujos e os corpos curvados, visivelmente abatidos. Quando me aproximei, percebi que os dois pareciam mais desesperados do que culpados. Eles estavam tremendo, provavelmente pensando que seriam castigados. Arthur olhou para eles com uma expressão implacável, sem nenhuma misericórdia.
— Eles são os responsáveis pelo assalto à sua sorveteria — ele disse, sem emoção, apenas constatando os fatos. — E também são os mesmos que roubaram o dinheiro, mas não pararam por aí. Eles estavam tramando algo bem maior.
Eu olhei para os rostos deles, tentando encontrar alguma pista que me levasse a entender melhor o que estava acontecendo. Não sabia o que me chocava mais: a verdade de que aqueles dois estavam ali porque tinham roubado da minha sorveteria ou o fato de que Arthur, o cara com quem eu tinha trocado algumas palavras casuais, agora parecia um completo estranho. Ele estava tão diferente... Eu não sabia como lidar com isso. Aquelas mudanças bruscas me deixavam confuso.
Fiquei ali, parado, analisando os assaltantes, mas a cabeça girava. Eu precisava saber mais. Precisava entender de onde vinha toda essa raiva de Arthur, por que ele estava tão obcecado em pegar os responsáveis. O assassinato de Gabriel... Ele estava tentando de alguma forma redimir algo? Ou estava apenas tentando se vingar?
Arthur, que antes parecia tão seguro de si, agora estava visivelmente abalado. Ele estava olhando para os assaltantes, mas seus olhos pareciam perdidos, como se ele estivesse em outro lugar. Isso me fez perceber que tudo o que ele dizia sobre Gabriel estava profundamente ligado à dor que ele estava sentindo. A perda de Gabriel parecia ter mexido com ele de um jeito que eu não podia compreender.
Então, ele se virou para mim, com um olhar carregado de um sentimento que eu ainda não havia visto nele. Ele estava, na verdade, tentando se segurar. Tentando não transbordar.
— Eu sei que... eu sei que parece estranho pra você, Pedro — ele começou, a voz falhando um pouco. — Mas Gabriel era mais que um amigo. Ele era meu irmão. Nós crescemos juntos, compartilhamos tudo, e eu... não consegui protegê-lo- ele passou as mãos pelo rosto, visivelmente incomodado. Eu vi a dor em seus olhos e, por um segundo, me senti um pouco desconfortável. Eu não sabia o que dizer. Ele estava me contando algo muito pessoal, algo que eu nunca imaginei ver daquele jeito.
— Os dois assaltantes — ele continuou, olhando para os criminosos com uma raiva que eu nunca tinha visto nele —, eles têm algo a ver com a morte do Gabriel. E eu vou fazer de tudo, Pedro, tudo, para descobrir a verdade. Eles não podem sair impunes. Ninguém bagunça a minha cidade e saí ileso. Essa cidade é pacata e eu não vou deixar que alguém transforme isso num circo!
Eu engoli em seco. O peso das palavras dele era algo tão intenso, tão esmagador, que me senti preso naquela sala com ele, com as respostas que ainda não tinham chegado.
Eu olhei para os assaltantes e depois para Arthur, tentando entender o que ele estava realmente dizendo. O foco dele não era mais a delegacia ou a polícia. O foco dele era Gabriel, a dor dele, e agora ele estava disposto a cruzar qualquer linha para que isso não fosse esquecido.
Agora eu sabia de algo ainda mais importante: eu estava sendo puxado para o centro de um turbilhão de ódio e vingança. Arthur não era mais o menino que eu conheci na adolescência, e eu tinha que tomar todo o cuidado possível, pra me vingar dele!
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Acordei naquela manhã de sobressalto. O sol já começava a brilhar, e eu senti uma estranha mistura de ansiedade e cansaço, olhei o horário e fiquei chocado com o horário, teria que adiar a corrida de hoje! Era mais um dia de trabalho na sorveteria, mas meu corpo ainda estava tentando se acostumar com a rotina, principalmente depois de tudo o que aconteceu nos últimos dias. A conversa com Arthur e a descoberta sobre Gabriel ainda estavam frescas na minha mente, mas eu não podia ficar me afligindo o tempo todo. Eu precisava de uma distração, e a melhor maneira de fazer isso era focando no trabalho.
Cheguei na sorveteria e comecei a abrir . A luz suave que entrava pela janela dava à loja uma sensação aconchegante. Eu ainda estava em um estado meio grogue, mas logo me vi tomando o lugar de sempre atrás do balcão, começando a arrumar as coisas enquanto esperava a chegada dos outros.
Não demorou muito até Mateus e Wellington chegarem. Eu estava organizando os potes de sorvete na geladeira, quando ouvi a porta se abrir e os dois entrarem. Os dois estavam conversando animados, como sempre, mas hoje parecia que havia algo de diferente. Mateus estava sorrindo mais do que o normal, com um brilho nos olhos, e Wellington estava rindo de alguma piada interna que só eles conheciam.
Eles se aproximaram de mim, e, como sempre, trocamos algumas palavras rápidas antes que eles começassem a fazer seus próprios preparativos. Mateus se dirigiu para a área de preparo, enquanto Wellington se encostou na bancada ao meu lado, começando a organizar os ingredientes que ele usaria mais tarde.
Foi quando Wellington, com um sorriso nos lábios, me soltou a bomba.
— Sabia que o Mateus e eu estamos morando juntos agora? — Ele disse isso de forma tão casual, como se fosse a coisa mais normal do mundo.
Eu parei de mexer nos potes de sorvete e olhei para ele, confuso, tentando processar o que acabara de ouvir. **Morando juntos?** Mas… o que isso queria dizer? Eu não sabia o que pensar. Até outro dia, parecia que Mateus estava dando em cima de mim, ou pelo menos que havia algo mais acontecendo entre a gente. Talvez eu tivesse me enganado.
— Vocês… estão namorando então? — Perguntei, ainda tentando entender a situação. Não queria parecer tão perdido, mas estava claro que eu não sabia de nada. Eles pareciam tão à vontade, e agora me sentia meio deslocado.
Wellington deu uma risada baixa e assentiu, um sorriso doce se formando no rosto dele. Ele olhou para Mateus com carinho, que estava preparando algo na cozinha, sem perceber a nossa conversa.
— Isso, Pedro. Estamos juntos já faz um tempo. E agora que estamos morando juntos, as coisas estão ficando mais sérias. — Ele me olhou, como se estivesse tentando ver minha reação. — Sei que o Mateus pode ser meio... reservado às vezes, mas vocês dois têm algo em comum, né? Eu só não sabia o quanto ele era fechado sobre a vida pessoal dele, até você aparecer aqui.
Isso me deixou ainda mais confuso. Mateus... sempre foi meio enigmático. Eu achava que havia algo ali, alguma conexão. Mas agora, com Wellington falando sobre morar juntos, tudo fazia mais sentido. Ou talvez fosse só minha cabeça criando expectativas. Eu tinha me iludido? Não conseguia entender, não conseguia separar o que era real e o que eram apenas as minhas suposições.
Mateus olhou para nós com um sorriso tímido ao ouvir a conversa. Ele caminhou até o balcão e se inclinou para pegar um pote de creme, mas me olhou por um segundo, como se estivesse prestes a dizer algo, antes de se afastar de novo. Eu não queria forçar a barra. Se ele quisesse falar sobre isso, falaria. Só me restava aceitar a realidade que estava se desenrolando diante dos meus olhos.
Mas tudo isso foi interrompido rapidamente por uma visita inesperada.
A porta da sorveteria se abriu com um som familiar, e Flávio entrou apressado. Ele estava com um sorriso grande no rosto, como sempre, mas algo estava diferente nele hoje. Ele segurava algo grande, embrulhado, e parecia um pouco fora de lugar por ali.
— Oi, pessoal — ele disse, se aproximando de mim enquanto olhava para o que estava carregando. — E aí gatinho, tudo bem? - Ele beijou minha testa! E por um instante eu me senti um anãozinho, era impressionante como Flávio era alto!
Eu olhei para ele, confuso, mas não consegui esconder o sorriso ao vê-lo ali.
— E aí, Flávio. O que você trouxe? — Perguntei, tentando entender o que ele estava fazendo ali, tão apressado.
Flávio deu uma risada baixa e mostrou o que estava carregando. Quando ele abriu o pacote, meu coração quase saltou da garganta. Ele segurava um pôster gigante da Adele. Era uma imagem dela em preto e branco, de um show, com uma expressão intensa no rosto, como se tivesse acabado de cantar sua música mais emocionante.
— Eu sabia que você ia adorar — Flávio disse, com um brilho nos olhos, e eu fiquei completamente sem palavras.
Eu olhei para ele, completamente surpreso. Como ele sabia que eu gostava tanto de Adele?
— Como você sabia que eu gostava dela? — Eu perguntei, sem conseguir disfarçar a surpresa.
Flávio se inclinou para frente, com um sorriso travesso, e deu um pequeno riso.
— Eu vi a foto da tela de bloqueio do seu celular, e também reparei que você sempre sussurra as músicas dela enquanto trabalha. — Ele deu uma piscadela, como se tivesse acabado de descobrir o maior segredo da minha vida.
Fiquei sem palavras. Eu nunca imaginei que ele estivesse prestando tanta atenção assim em mim. Mas, de alguma forma, aquilo me fez sentir especial. Como se ele tivesse notado algo que eu nem sabia que era tão visível.
— Eu... não sei o que dizer — murmurei, tocando levemente a face, ainda surpreso com a surpresa. — Isso é… inacreditável.
Flávio deu de ombros, como se fosse a coisa mais natural do mundo. Ele me entregou o pôster e olhou para a parede da sorveteria.
— Bom, agora a gente precisa colar isso em algum lugar bem visível. Esse pôster não vai ficar só na gaveta. Vamos arranjar uma cola e deixar ela exposta para todos verem. — Ele deu uma olhada em volta, já imaginando onde colocar a peça na parede.
Eu fiquei um momento parado, admirando o pôster. Ele parecia tão... perfeito. Eu mal podia esperar para vê-lo pendurado na parede da sorveteria. Adele era, sem dúvida, uma das minhas maiores inspirações, e aquilo estava se tornando ainda mais real agora.
— Claro! Vou arranjar cola — disse, ainda sem acreditar no que estava acontecendo.
Fui até a prateleira onde eu guardava alguns itens de papelaria, peguei a cola e voltei rapidamente para onde Flávio estava. Ajeitei a escada que ele pegou para alcançar o lugar perfeito na parede e, enquanto ele começava a colar, não pude deixar de perceber o quanto estava me divertindo com aquele momento. Mesmo com tudo que estava acontecendo na minha vida, aquele momento simples, com Flávio ali, parecia uma válvula de escape do caos.
A cola foi aplicada, o pôster foi esticado e, finalmente, ficou firme na parede. O rosto de Adele agora brilhava ali, em toda sua glória, na parede da sorveteria. Eu olhei para ele com um sorriso satisfeito.
— Ficou incrível — disse, olhando para Flávio com um sorriso sincero.
Ele sorriu de volta e deu um tapinha nas minhas costas.
— Eu sabia que ia ficar ótimo. E, só para você saber, Pedro... fiquei sabendo que você tem bom gosto.
Eu ri, sentindo algo estranho. Era como se, de repente, o dia tivesse dado uma virada inesperada, mas boa. Flávio e eu estávamos lá, lado a lado, colocando um pedaço de mim na parede da minha própria sorveteria.
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O dia já estava avançado, e a correria da manhã passou mais rápido do que eu esperava. A sorveteria estava um pouco mais tranquila, então aproveitei para organizar as coisas e dar uma respirada. Enquanto mexia nos potes, meu celular vibrou na bancada. Era uma mensagem de Flávio.
**Flávio:** "Oi, Pedro! Bora almoçar mais tarde? Tenho uma surpresa pra você! 😁"
Sorri ao ler a mensagem. Flávio sempre tinha algo novo em mente, e a ideia de almoçar com ele parecia boa. Eu realmente estava precisando de uma pausa, e quem melhor para fazer isso do que ele?
**Pedro:** "Claro! Onde? E que surpresa é essa?"
**Flávio:** "Vou te contar só quando chegar lá 😜. Meio-dia, naquele restaurante da beira da estrada, te espero."
"Beleza", respondi, colocando o celular de volta na bancada. A expectativa sobre o que Flávio estava planejando começou a crescer, mas eu sabia que seria algo divertido, como sempre. Ele tinha essa capacidade de transformar momentos simples em algo especial, e eu estava curioso para ver o que ele tinha reservado para o almoço.
Quando chegou meio-dia saí apressado. Fui para o lugar onde Flávio havia me indicado — um pequeno restaurante que tinha um pequeno lago do lado .
Cheguei no restaurante e encontrei Flávio já sentado em uma mesa. Ele estava com aquele sorriso de sempre, me observando como se soubesse algo que eu ainda não sabia. Era um pouco irritante, mas ao mesmo tempo cativante.
— Oi, Pedro! — Flávio disse assim que me viu. Ele se levantou e deu um abraço rápido. — Estava te esperando. Sente-se, vou pedir o que você gosta.
Eu me sentei e, antes que eu pudesse perguntar sobre a tal surpresa, Flávio já estava se inclinando para a mesa com seu celular na mão.
— Então, o que me trouxe aqui? — Perguntei, tentando parecer calmo, mas a curiosidade me consumia.
Flávio fez uma careta dramática e, com um sorriso travesso, me respondeu:
— Olha, pensei em algo bem simples... Almoço, bate-papo... e uma ajuda. Como a sorveteria está bombando, sei que você deve estar pensando em contratar mais alguém, não? Eu conheço uma amiga nossa que seria perfeita pra isso. Ela tem experiência e já trabalhou em lugar semelhante.
Eu fiquei pensando um momento. Era verdade, eu já tinha notado que, com o aumento das vendas, estava ficando complicado dar conta de tudo sozinho. Um novo funcionário faria sentido.
— Eu estava mesmo pensando nisso. — Respondi, enquanto olhava Flávio com um ar de dúvida. — Quem é ela?
Flávio sorriu, satisfeito por eu ter aceitado a sugestão tão facilmente.
— O nome dela é Camila. Ela é ótima e tem uma energia incrível. Eu posso avisá-la para ir amanhã para a entrevista.
— Beleza! Manda ela aparecer amanhã. — Falei, finalmente aceitando a ideia. — Ela pode vir no período da tarde?
Flávio assentiu com entusiasmo, já mexendo no celular para mandar a mensagem. Eu observei, ainda achando graça do quanto ele parecia animado com coisas simples como essa.
A comida chegou, e logo estávamos nos concentrando no almoço. Era uma refeição simples, mas saborosa, como sempre. No meio da conversa, falamos sobre tudo um pouco: a sorveteria, o pessoal da cidade, e até sobre como a vida tinha mudado depois que eu voltei para cá.
- E então? Qual era a surpresa afinal ? - Franzi as sombrancelhas!
- A surpresa é a minha presença! - Eu ri - Só falei aquilo pra você vim !
- Você não tem jeito né ?!
Quando terminei meu prato, Flávio, de repente, pegou um pedaço de carne do meu prato com o garfo e, com um sorriso brincalhão, colocou o pedaço na minha boca. A princípio, fiquei um pouco surpreso e até sem reação, mas quando percebi o que ele estava fazendo, não pude evitar de sorrir.
— E isso, Flávio? — Falei, rindo, um pouco sem jeito, mas com o coração batendo mais rápido.
— Ah, você precisa de ajuda para comer direito, Pedro. Vai dizer que não ficou bom? — Ele perguntou, com uma expressão de quem sabia exatamente o que estava fazendo.
Fiquei todo bobo, de um jeito que eu não sabia como reagir. Senti uma mistura de vergonha e carinho. Ele tinha esse jeito especial de fazer qualquer coisa parecer divertida e, ao mesmo tempo, um pouco intimidadora. Não consegui evitar de rir, e ele me olhou de forma carinhosa.
— Você é um desastre, Pedro. — Ele disse, ainda sorrindo, enquanto pegava outro pedaço de comida do meu prato.
— Tá, tá. Eu sei. — Respondi, rindo mais, e acabei engolindo o pedaço com um pouco mais de dificuldade do que o normal.
Flávio parecia se divertir com isso, e, de alguma forma, a situação foi se tornando mais íntima, mais descontraída. Eu me peguei pensando que, de certa forma, ele era um dos poucos que realmente sabia me fazer rir e relaxar, mesmo quando tudo ao meu redor estava complicado.
O almoço seguiu tranquilo, e a conversa fluiu sem pressa. Depois de um tempo, Flávio terminou de comer e, antes de eu levantar, ele me deu um sorriso quase tímido, mas com um toque de afeto.
— Eu sabia que você ia adorar o almoço. E espero que tenha gostado da "ajuda" que eu te dei. — Ele disse, enquanto pagava a conta. — Ah, e por último, quando você precisar de mais "ajuda", é só chamar. Eu estou por aqui, sempre.
Eu ri, mais relaxado, e assenti.
— Pode deixar, Flávio. Eu sei que posso contar com você.
Saímos juntos do restaurante, e enquanto nos afastávamos, eu não pude deixar de pensar no quanto aquela tarde havia sido agradável. Mesmo com todos os problemas que ainda estavam na minha cabeça, como o mistério sobre Gabriel e os desafios da sorveteria, Flávio parecia ser a minha válvula de escape. E, talvez, ele fosse mais importante do que eu mesmo imaginava.
Continua..