Por um instante, tudo ao meu redor desaparece e me perco na sensação dos lábios dele nos meus, e da língua dele tocando a minha, mas é apenas um breve momento de fraqueza. Faz tanto tempo que não experimento esse tipo de contato que estou perdendo o controle. Volto à realidade e o empurro, limpando a garganta. Sinto meu rosto esquentar enquanto, de forma vaga, percebo a vista ao fundo e o calor do corpo dele se transferindo para o meu. Deve ter sido isso que me desconcertou e quase, QUASE, me fez pensar que o beijo valeu a pena. O encaro, tentando manter a expressão de desdém e indiferença.
— Da próxima vez que for me beijar, avisa antes, tá? Quase me matou de susto! — ele ri e me encara.
— Como preferir, André! Você é insuportável, sabia?
***
Chegamos ao hotel por volta das sete da noite, porque Eduardo insistiu em irmos ao shopping. Eu até tentei recusar, mas ele praticamente me arrastou para lá, então não tive escolha. Fomos ao medíocre shopping Bella Vista, e eu odiei, achei sem graça e sem vida, uma total perda de tempo! Decidimos voltar de metrô, e, para isso, tivemos que atravessar a passarela até a estação. Como tenho um pavor enorme de altura, sem perceber, segurei com força a mão de Eduardo enquanto caminhava ao seu lado, e ele a segurou de volta.
— Que vergonha, meu Deus! — disse uma senhora que passava, nos encarando e balançando a cabeça com reprovação. Sinto Eduardo tensionar a mandíbula, apertando minha mão com mais força, seus olhos disparando contra a mulher.
— Fala mais alguma coisa, senhora, para ver se eu não a empurro dessa passarela. — a mulher vira o rosto e sai rapidamente. Agora é a minha vez de ficar perplexo enquanto o olho, incrédulo.
— Você é louco?
— O quê? Você não achou ousadia da parte daquela velha? — ele responde enquanto chegamos do outro lado da passarela, e eu solto sua mão, balançando a cabeça em incredulidade. — Você é muito fresco!
— E você é um idiota!
***
Suspiro ao acordar sentindo meu corpo despertar lentamente. Abro os olhos e sinto a respiração quente de Eduardo no meu pescoço, me arrepiando. Me levanto e vou ao banheiro, me sentindo cansado; preciso de um banho urgente. Não ligamos o ar-condicionado e agora estou pagando o preço. O quarto está insuportavelmente quente, e ainda tem o Eduardo, que parece ter fogo nas veias e não desgruda de mim de jeito nenhum. Tento afastá-lo, mas ele sempre volta a me agarrar durante a noite. Me pergunto por que ele se acostumou a dormir assim, se aparentemente nunca namorou ninguém antes... Mas ele parece gostar de dormir abraçado comigo... Que saco!
Quando saio do banheiro, quase dou um grito ao ver Eduardo parado no meio do quarto, completamente nu, com aquele... troço balançando e me dizendo um "oi". Desvio os olhos rapidamente, sentindo meu rosto queimar... Fala sério! Engulo em seco e vou até ele com a melhor expressão de "exasperação", tentando não olhar para aquele corpo maldito, cheio de músculos e braços torneados.
— Será que dá para vestir uma cueca...?
— Não gosta do que vê? — ele sorri e balança o troço na minha direção. O olho irritado e, sem pensar, dou-lhe um tapa com força. — Aii!
— Vai logo tomar um banho. Quero ir ao Bonfim, e se demorar muito, vou sem você! — ele sorri de forma sarcástica e corre para o banheiro. Ele está ficando muito ousado para o meu gosto.
***
Já prontos, partimos para o Bonfim. Subo as escadas exausto — acho que estou mesmo sedentário —, mas no final, vale a pena. Estou distraído olhando aquele muro de fitas, quando ouço risadinhas. Olho para trás e vejo uma garota jovem, de cerca de dezenove anos, cabelos castanhos e pele bronzeada, praticamente se esfregando em Eduardo, que conversa alegremente com ela. Me aproximo curioso e a encaro com a melhor expressão de "o que está acontecendo aqui?"
— Com licença, querida, mas infelizmente ele ainda está casado comigo, então não vai poder satisfazer seus desejos. — a garota me encara assustada e Eduardo com raiva. — Ah, mas se você me passar seu número, talvez, quando nos separarmos, vocês possam se encontrar. — sorrio docemente, mas ela parece em choque e ele ainda mais irritado.
— Espera, você é gay? — ela vira para Eduardo, que me fuzila com os olhos.
— Não! — ela responde, mas continua olhando para mim.
— Então, por que está casado com ele? — Eduardo faz uma pausa antes de responder.
— É complicado! — e eu continuo o que estava dizendo.
— Eu até permitiria que vocês ficassem, mas íamos acabar com problemas, entende?! Ele realmente não pode!
— Como você oferece seu marido desse jeito?! — a garota nos olha como se fôssemos dois malucos.
— Como eu posso dizer...? Huum, digamos que eu não gosto dele!
— Então, por que se casaram? — ela pergunta desconfiada e é minha vez de hesitar.
— É complicado!
***
Paramos em uma sorveteria, e quando finalmente me sento, tentando apreciar a paisagem e o clima, percebo que Eduardo não parou de me olhar de forma atravessada desde o encontro com a garota estranha que se insinuou para ele. O encaro de volta, vendo-o me olhar como se quisesse me matar. Ele nem tocou no próprio sorvete, e para Eduardo não comer o que está na frente dele, é porque algo muito errado aconteceu. Não aguentando mais o jeito que ele me olha, decido quebrar o silêncio que se formou.
— O que foi? Será que dá para parar de me olhar assim?
— Eu te odeio! É sério!
— E posso saber o motivo de tanto ódio?
— "Por quê"? Você praticamente me entregou de bandeja para aquela mulher.
— E daí? Não era você quem estava todo animado conversando com ela? Tenho certeza que, se tivesse a chance, teria ido com ela para algum motel barato, então me poupe. — ele me encara sério e, pela primeira vez, não vejo o idiota que ele é. E aquilo, junto com a luz dourada do pôr do sol iluminando seu rosto, seus olhos e cabelos, o tornando ainda mais bonito, faz meu estômago revirar. Engulo em seco.
— Eu realmente odeio quando você faz esse tipo de coisa! — ele faz uma pausa, olhando para o horizonte e estreitando os olhos. — Na verdade, eu pensei que, se você me visse conversando com ela, ficaria com um pouco de ciúmes... Sei lá!
— Até parece! — não consigo segurar o riso, não estou ouvindo isso, estou?! — Porque você achou que eu ficaria com ciúmes de você?
— Talvez porque eu sou seu marido?!
— Acho que quando você se afogou, a água entrou pelo seu ouvido e foi parar no cérebro, só pode!
— Então você não tem ciúmes de mim? Nem um pouquinho?
— Por que eu teria ciúmes de você, Eduardo? — ele parece cada vez mais irritado.
— Sei lá, cara! Quer dizer, eu sei que a gente não tem esse tipo de relação, mas os gays não gostam de... pica? E não é querendo me gabar, mas tenho orgulho da minha! — ele me encara e fala a coisa mais sem sentido que já ouvi ele dizer. — E eu pensei que... Sei lá, depois de todo esse tempo, você acabaria se apaixonando por mim?! — fico parado, sem palavras. — Quer dizer, olha só o jeito que você age... Antes você vivia reclamando que eu dormia só de cueca, agora nem reclama mais e ainda fica com essa bunda colada no meu pau... — tento controlar o nível de raiva que está prestes a transbordar.
— Ótimo, você tinha que estragar o clima que estava ótimo, né, babaca?! Sinceramente, você enlouqueceu! — sem querer aumento meu tom de voz. — Deixa eu te explicar uma coisa... EU NÃO GOSTO DE VOCÊ! Entendeu?! E não é porque eu sou gay que vou me atirar em "qualquer um", ainda mais em um como você!
— Ah, para, André! Vai mesmo me dizer que você não quer transar comigo?!
— No momento, o que eu mais quero é me livrar de você e desse casamento ridículo, só isso!
— Vou fingir que acredito nisso!
— Olha, vamos pagar essa conta e ir embora. Não estou afim de brigar com você na frente de tantas pessoas! Na verdade, não quero me estressar com você! Nem agora, nem depois... eu só vou acabar com rugas.
— Por falar nisso, para onde vamos agora? Ainda é de tarde! — ele deve ser bipolar, só pode.
— Estava pensando no Pelourinho.
— Pode ser...! E a noite? Quer jantar em algum restaurante?
— Restaurante? É sério?
— Algum problema?
— Além de ter que ir com você? Isso é praticamente uma sentença de vergonha.
— Você não acha que é exagero demais?
— Abro a boca para responder, mas nesse momento meu celular toca. Pego o aparelho e vejo a tela, automaticamente um sorriso se forma no meu rosto.
— Oi, pai!
— E aí, aproveitando a viagem?
— É, acho que sim... Pelo menos estou tentando, né?! Talvez se eu estivesse sozinho, aproveitaria de verdade, mas... — suspiro novamente, deixando claro meu descontentamento. — Além do mais, parece que o Eduardo pirou de vez.
— Como assim?
— Não é nada demais, esquece pai... Só estou um pouco estressado!
— Hum... Problemas, né?
— Sim, mas não se preocupe. Já chegaram em casa ou ainda estão viajando?
— Vamos para casa amanhã! — Eduardo paga a conta enquanto converso com meu pai.
— É para irem me visitar na terça à tarde, viu?
— Está certo, filho, vai ser bom, quero ter uma conversa séria com você!
— Meu Deus! Algum problema?
— Conversamos na terça!
— Sério que vai me deixar na curiosidade?
— Até terça, André! Tenho que ir agora, tchau. — ele desliga, me deixando ansioso.
***
Já tem meia hora que estamos no Pelourinho e, confesso, estou encantado com tudo aqui. Das casas aos ambulantes tentando ganhar a vida.
— Isso é incrível! — digo, entregando a câmera para Eduardo. — Essa vai pro Instagram, certeza! — faço pose e ele tira a foto de má vontade.
— Argh, esse lugar é insuportável! — ele reclama pela milésima vez.
— Nem comece! — pego a câmera. — Esse lugar é espetacular!
— Só vejo ladeiras! O que tem de tão bom nisso? — reviro os olhos.
— Se você quiser, pode voltar pro hotel, mas eu vou continuar aqui!
Digo, já me afastando dele. Começo a andar e me deparo com um museu, fico deslumbrado olhando por uns trinta segundos, mas antes de sequer pensar em tirar uma foto, a câmera é puxada da minha mão com agilidade. Dou um pulo com o coração disparado, enquanto o maldito ladrão ainda tem a audácia de sair rindo e me dando o dedo enquanto corre. Eduardo se aproxima emburrado.
— Podemos sair daqui agora? — o olho, irritado.
— Quase todas as fotos da viagem estavam naquela câmera... Só restaram algumas no meu celular agora! Que droga!
— Talvez se você não fosse tão distraído...
— Nem termina, Eduardo, não quero me estressar, já falei.
— Você não acha que é muito estressadinho, não?! — ele ri, bagunçando meu cabelo.
— Com licença... — olho para quem falou e meu queixo cai fascinado com o homem maravilhoso vendendo água. Empurro a mão de Eduardo que está nos meus cabelos e me afasto dele, mantendo distância. Então, encaro o homem e sorrio.
— Água mineral?
— Não só a água! — digo sem pensar e mordo o lábio... O que eu falei, meu Deus! — T-também gostaria de um sorvete — tento disfarçar e ele sorri de volta, me deixando sem fôlego. O que é esse sorriso, meu pai?!
---
— Você reside aqui? — ele segue, e eu aproveito, claro. Só porque não posso permanecer, não quer dizer que não posso flertar, né?!
— Quem me dera, sou de São Paulo!
— Que pena mesmo, hein! Se morasse aqui, eu te mostraria o lado bom da vida!
— Acho melhor você procurar outra pessoa pra mostrar, parceiro! — já tinha esquecido que o imbecil do Eduardo estava aqui também e o encaro com raiva, enquanto ele me encara de volta com a mesma expressão.
— Se ele quiser, eu mostro! — o homem
— Seria maravilhoso... mas infelizmente não posso! — digo, sentindo a frustração me dominar, acompanhada de um desejo inesperado. Então, uma ideia surge na minha mente. Tá bom, devo ter enlouquecido, mas e daí?! — Podemos conversar pelo WhatsApp, o que acha? Quem sabe em breve... Afinal, o futuro é incerto!
— Perfeito! Então me adiciona aí. — pego meu celular e digito o número dele. — Vai ser um prazer ser seu... "amigo". — falo enquanto pago pela água e o sorvete, demorando-me para tirar o dinheiro só para pegar a mão dele e, então, me despeço daquele pedaço de tentação. Antes de ir, recebo uma palmada nas minhas nádegas.
— Que merda...? — Eduardo surge do nada e empurra o cara, que perde o equilíbrio e cai no chão. — Seu desgraçado pervertido!
— O que você fez isso, seu imbecil? — vou até o homem que já se levanta.
— Por que? Porque você é um idiota fácil que se joga no primeiro cara que aparece, como se fosse qualquer coisa, é isso! Ou você se esqueceu que está CASADO comigo e eu estou bem aqui? — o cara encara Eduardo com desdém, balançando a cabeça como se dissesse que não vale a pena discutir com ele, o que é verdade.
— Eu só não vou reagir porque estou trabalhando, mas você é ridículo!
— Ridículo é você!
— Estou ficando sem paciência com esse seu temperamento de merda! — falo, olhando-o com mais raiva do que jamais senti.
— Cansado estou eu das suas bobagens! Fica aí dizendo que não superou o tal do Luigi e ainda se joga no primeiro que aparece! Sua bichinha inútil! — ele grita, irritado, enquanto se afasta rapidamente em direção ao elevador Lacerda. Eu o observo, pensando em mil maneiras de acabar com ele, e me divirto com cada uma dessas ideias.
Continua...