Entrei em casa arrastando os pés. Cada músculo do meu corpo implorava por descanso. Nem acendi todas as luzes. Só joguei as chaves na mesa e fui direto para o quarto, chutando os sapatos no caminho. Meu corpo afundou no colchão, e o sono veio como uma correnteza forte, me puxando para a inconsciência em segundos.
Mas algo me acordou pouco tempo depois!
Primeiro, o cheiro.
Pesado, sufocante, enjoativo.
Depois, o calor. Crescente. Opressor.
Tossi, tentando entender o que estava acontecendo. Meus olhos se abriram devagar, e o que vi me deixou paralisado. Sombras estranhas dançavam pelas paredes. Um brilho alaranjado tremulava pelo quarto.
Meu estômago se revirou.
Então ouvi.
O estalo seco da madeira queimando.
O ar quente raspava minha garganta como lixa. O cheiro de fumaça era tão forte que meus pulmões pareciam encolher. Meu coração disparou, e um pensamento cortou minha mente como um raio:
**A casa está pegando fogo.**
O choque me prendeu por um segundo, mas o medo me lançou para frente. Pulei da cama, tonto, os pés descalços tropeçando no chão quente. Corri até a porta e puxei a maçaneta—mas assim que encostei nela, o calor fez minha pele queimar. Soltei um grito, recuando.
O corredor estava em chamas.
O desespero me agarrou pela garganta. Minhas pernas tremiam. O fogo estava se espalhando rápido demais. O teto rangia alto, ameaçando desabar.
Precisei forçar o cérebro a funcionar. **A janela. Eu preciso sair pela janela!**
Corri até ela, mas a porcaria estava emperrada. Meus dedos escorregaram no suor e na fuligem. Minhas mãos tremiam. O ar ficava mais pesado a cada segundo, me sufocando. Meu peito doía.
**Eu vou morrer aqui.**
Esse pensamento me atingiu como uma faca.
Não. Não podia acabar assim.
Peguei uma cadeira e, gritando, arremessei contra o vidro com toda a força que tinha. O estrondo do vidro estilhaçando me deu um lampejo de esperança. O vento fresco invadiu o quarto, mas o calor das chamas já lambia as paredes.
Com um último impulso, me joguei para fora.
Caí no chão com um impacto brutal, o braço rasgando no vidro quebrado. A dor explodiu, mas era o menor dos meus problemas. Rolei na grama, engolindo o ar da noite com desespero, tossindo tanto que achei que meus pulmões fossem sair pela boca.
**Estou vivo.**
A constatação me atingiu com força. Mas antes que eu pudesse sentir qualquer alívio, senti que estava sendo observado.
Levantei a cabeça, ainda ofegante.
Flávio.
Ele estava ali, parado, a poucos metros. A luz do incêndio iluminava seu rosto, e seus olhos estavam fixos em mim.
Sem reação.
Sem emoção.
Sem fazer nada.
Apenas me encarando.
Um arrepio subiu pela minha espinha, mais forte que o calor do fogo. Meu coração, que já estava acelerado, pareceu querer rasgar meu peito.
— Flávio… — minha voz saiu rouca, quase irreconhecível.
Ele não respondeu. Nem piscou.
Apenas continuou ali.
Me observando.
E foi nesse momento que percebi: o fogo dentro da casa não era a única ameaça.
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