O céu estava nublado, e o vento frio cortava minha pele, mas dentro de mim, algo queimava. Era esperança. Era força. Era aquele sentimento de que, mesmo com tudo desmoronando, eu ainda podia vencer. Caminhei até a faculdade como fazia todos os dias: mochila nas costas, cabeça erguida, passos firmes, mesmo quando o mundo parecia querer me dobrar.
Na mochila, além dos cadernos velhos e da caneta que vivia falhando, havia algo que me fazia suar frio. Três pacotinhos embalados em plástico, escondidos no fundo do bolso interno. Eu sabia o que aquilo significava. Sabia o risco. Mas também sabia o que era passar fome. Sabia o que era dormir no chão gelado da rua com o estômago roncando e o medo como travesseiro.
Aquela grana não era pra luxo. Era pra comer. Era pra pagar o aluguel do quartinho fedorento onde eu dormia. Era pra comprar xerox, livro usado, uma marmita no final da semana. Era a diferença entre continuar estudando ou voltar pro nada.
Quando cheguei na portaria da faculdade, tentei parecer normal. Sorri pro segurança, como sempre fazia. Mas percebi o olhar dele demorando um segundo a mais. Meu coração disparou. Tentei passar direto, fingindo tranquilidade.
Foi então que os dois caras apareceram.
— Pietro Andrade? — um deles disse, mostrando uma carteira de identificação. — Polícia civil. Você está preso por tráfico de drogas.
Por um momento, não consegui ouvir mais nada. O tempo parou. As palavras me atravessaram como facas. Tentei abrir a boca, dizer que não era bem assim, que eu só queria estudar, que a vida me empurrou pra isso. Mas as algemas já estavam nos meus pulsos.
As pessoas começaram a se aglomerar. Alguns colegas de turma. Gente que até ontem dividia a mesma sala comigo, que me chamava de guerreiro, que dizia se inspirar na minha história. Agora, cochichavam, apontavam, filmavam com os celulares.
Me deu vontade de gritar. De correr. De sumir.
Mas eu apenas baixei a cabeça e deixei que me levassem.
Dentro do camburão, com o gosto de sangue e vergonha na boca, encarei meu reflexo na parede de metal. Vi um garoto cansado, machucado, sujo… e ainda assim, com os olhos acesos. Porque mesmo ali, no fundo do poço, eu me recusei a apagar os meus sonhos.
E foi naquele momento, enquanto o carro se afastava da faculdade, que entendi: minha vida tinha acabado de mudar. E eu ainda nem fazia ideia do inferno que me esperava.