Filho da Pauta

Um conto erótico de Lauro Costa
Categoria: Gay
Contém 759 palavras
Data: 06/04/2025 23:51:33
Assuntos: Gay

O domingo amanheceu abafado, com aquele céu cinza de São Paulo que sempre parece guardar ressentimentos. Leônidas estava largado no sofá, vestindo pijama de seda e com uma expressão de príncipe entediado em crise existencial. O celular na mão tremia com as notificações: a bomba havia explodido. O nome de Aldebaran estampava todos os portais de fofoca, e Leônidas era citado como “jovem assessor íntimo”, “figura misteriosa” e “acompanhante habitual”.

Ele suspirou e deslizou o dedo pela tela como quem passa a mão por uma ferida.

Márcia ligou.

— Leozinho, tá respirando ainda?

— Por enquanto.

— Olha, antes que você comece a cavar sua própria cova nesse domingo de merda: consegui ingressos pro camarote do show da Luísa Sonza, hoje no Burle Marx. E adivinha quem tá patrocinando o evento? Johnnie Walker, meu bem. Aquela campanha com gente quebrada que virou herói. Tudo a ver com o Aldebaran. Você devia ir. Falar com alguém de lá. Mostrar a cara dele pra outro público.

— Cê acha mesmo que eu tô com cabeça pra ver a Luísa cantar sobre chifre e empoderamento, com gente pulando bêbada em volta?

— Justamente por isso. Porque você só pensa com a cabeça errada. Vai com uma proposta pronta, fala com a equipe da marca. Se der certo, você mata dois coelhos: melhora a imagem do Aldo e se livra do rótulo de “amante misterioso”. E outra: camarote, Leônidas. Gente importante. Gente influente. Nada de subcelebridade com moletom falso.

Ele abriu um sorriso torto.

— Você sabe me vender bem, Márcia.

— Eu devia ser tua empresária. Ou tua madrasta má.

O toque na porta interrompeu a ligação. Um estalo seco. Outro. E depois a maçaneta girando com força. Leônidas se ergueu num pulo, olhos apertados.

Aldebaran Rocha entrou como um touro ferido.

Estava suado, descomposto e com os olhos injetados. Seu corpo ainda tinha aquele volume de lutador, agora meio decadente, como um templo em ruínas. Leônidas recuou um passo, mas não parecia assustado — apenas irritado.

— Você pirou?

— Liguei pra você. Vinte vezes. Não respondeu. Tive que falar com teu pai. Ele me deu o endereço.

— Marcelo adora trair gente da família — Leônidas disse, indo pegar o celular que tinha largado no sofá. — Agora você virou meu stalker.

Aldo caminhava em círculos como um animal preso.

— Você viu? Aquela merda que saiu? “Campeão em queda se agarra a assessor loiro”? Cês tão de sacanagem comigo?

— Se acalma. A matéria já saiu. Não tem como desmorrer notícia. Mas dá pra virar o jogo.

— Não tem jogo nenhum. Eu tenho filhos. Não quero eles vendo isso.

— E como eles viram? No TikTok ou no Instagram? Me diz o nome deles.

Aldo o encarou, desconfiado.

— Por que você quer saber?

— Porque se você quer limpar sua imagem, eu preciso entender o que sujou. Me dá os nomes.

Aldo cedeu. Leônidas mexeu no celular, achou os perfis. Stories com músicas da Luísa Sonza, dancinhas em looping, vídeos com frases tipo “cansada de macho escroto”.

Ele levantou os olhos com um sorriso quase perverso.

— Você vai comigo no show hoje.

— Que show?

— Da Luísa Sonza. Burle Marx. Camarote com fotógrafo. A Johnnie Walker tá patrocinando. Se a gente montar uma narrativa boa — pai redimido, lutador que se reconecta com os filhos — eu consigo te meter numa campanha.

— Eu não vou me prestar a esse papelão.

— Então continua apanhando. Porque essa é a única chance de mostrar que você é um pai presente, e não um troglodita de Twitter. Seus filhos te amam, Aldo. Só estão esperando você aparecer por eles. Se você não for hoje, a próxima matéria vai ser sobre pensão alimentícia e abandono afetivo. E você sabe que o Rico Matias adora essas pautas.

Aldo o encarava com ódio, mas já hesitava.

Leônidas se aproximou, lento, como quem encurrala uma fera.

— Olha pro meu rosto e diz que não é uma boa ideia.

— Eu odeio quando você faz isso.

— O quê?

— Me faz parecer burro só porque você fala como se tivesse escrito um roteiro.

— Não é roteiro. É só que eu já vi esse filme. E sei como ele pode acabar.

A tensão entre eles era quase física. Cheia de silêncios carregados, proximidades milimétricas e o tipo de raiva que se parece demais com desejo.

— Vai botar uma roupa decente. Hoje você é pai de adolescente. Não um zumbi bêbado saído de um treino mal pago.

Aldo respirou fundo. Como quem se rende a algo que odeia... mas precisa.

— Se isso der merda, é tudo culpa tua.

— Já tô acostumado a levar porrada. Mas hoje, a gente vai sorrir pra câmera.

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