Olá meus leitores subversivos, hoje fiz uma coisa especial para vocês, deixei dois capítulos para que possam ler, esses capítulos iniciais levarão a um caminho sem retorno nessa história, a cada linha o universo desse conto vai piorando ainda mais
Boa Leitura Subversiva à Todos...
— Quem está falando? — perguntou, agora com um tom mais sério, a curiosidade misturada com desconfiança.
— Horácio Montenegro Vasques. O nome que você viu nos documentos e sim, sou o cientista por trás desse projeto — Horácio respondeu de maneira direta, sem rodeios. A revelação foi como um golpe frio. Rafael sentiu o estômago se revirar.
Ele ficou em silêncio por um momento, tentando absorver as palavras. Ele era o responsável por aquele projeto misterioso. Como isso poderia ter ficado oculto por tanto tempo?
— Eu… Eu achei que fosse um erro ou uma falha nos registros. — Rafael tentou manter a calma, mas sua mente estava em total turbilhão. Como Horácio sabia o que ele estava pesquisando?
— Não há erro algum. O Projeto Ataraxia tem um propósito muito claro. — Horácio continuou, com a voz tranquila e quase familiar, como se estivesse lidando com um velho amigo. — Mas algumas coisas devem ser mantidas no silêncio até que o momento certo chegue. E esse momento está mais próximo do que você imagina.
Rafael respirou fundo, agora ciente de que estava lidando com algo muito maior do que simplesmente uma pesquisa sobre o trabalho de seu pai. Horácio estava envolvido diretamente. Isso mudava tudo.
— Por que tudo isso está sendo mantido em segredo? — Rafael perguntou, a frustração começando a tomar conta de sua voz. Ele queria respostas, mas sabia que estava apenas arranhando a superfície de algo profundamente oculto.
— Porque, meu caro, nem tudo deve ser revelado quando se está apenas começando a entender a verdade. O Projeto Ataraxia não é o que você pensa. O que você encontrou nos documentos é apenas uma parte da história, e quando for o momento, você compreenderá completamente o que está em jogo.
A última frase de Horácio foi quase como um desafio. Rafael sentiu um peso crescente, como se estivesse sendo empurrado para algo inevitável, algo do qual não poderia escapar.
— Mas o que você realmente está escondendo? O que é o Ataraxia? — Rafael perguntou, agora sem conseguir disfarçar sua ansiedade. A ideia de que seu pai pudesse ter sido envolvido nisso, e de que ele próprio fosse um peão em algo muito maior, lhe parecia cada vez mais real.
— Isso, meu jovem, você descobrirá com o tempo. — Horácio respondeu de maneira evasiva, sua voz ainda séria. — O que posso dizer é que você está no caminho certo. Mas lembre-se de que nem todas as respostas podem ser dadas de uma vez. Às vezes, o segredo é uma bênção.
Antes que Rafael pudesse perguntar mais, Horácio desligou a linha abruptamente, deixando Rafael com um peso ainda maior sobre os ombros. Ele olhou para o telefone, sentindo a pressão aumentar. O que ele tinha acabado de ouvir era uma verdadeira declaração de guerra, e Rafael se viu preso em um jogo de forças maiores do que ele jamais imaginara.
A conversa com Horácio apenas aumentou suas suspeitas, mas agora, ele também sentia uma curiosidade quase palpável. Por mais que sua mente buscasse razões para descartar o que ouvira, algo dentro dele sabia que não poderia simplesmente ignorar o que estava acontecendo.
O que Rafael não sabia é que ele não é o único interessado em saber mais sobre esse cientista e seus segredos, nesse momento Mariane também se encontrava curiosa com tudo o que estava acontecendo.
Mariane estava em seu escritório, a luz suave da lâmpada sobre a mesa refletia sua expressão de cansaço e preocupação. A casa, agora sem Alberto, estava mais silenciosa e desolada, e ela não conseguia afastar a sensação de que algo estava profundamente errado. O vazio deixado pela morte do marido parecia ser preenchido por uma escuridão crescente, alimentada pela sensação de que algo muito maior do que uma simples perda estava em jogo.
Ela olhou para o telefone fixo na mesa e respirou fundo. Sabia que precisava de respostas. Não poderia mais ficar inerte. A investigação sobre Horácio Montenegro Vasques precisava começar agora, e para isso, ela teria que confiar em alguém de fora — alguém que soubesse trabalhar nas sombras, alguém que pudesse desvendar o que ela sentia ser um enigma perigoso. Fábio Lima era o detetive que ela procurava.
Com um movimento decidido, ela discou o número do escritório de Fábio, esperando que ele atendesse. O toque do telefone parecia ecoar na quietude do escritório, um lembrete sombrio de que o tempo não estava ao seu lado. Após alguns segundos, uma voz grave e calma respondeu.
— Detetive Fábio Lima, em que posso ajudá-la?
Mariane quase sentiu um alívio ao ouvir a voz dele, mas logo se lembrou da gravidade do que estava prestes a pedir. Com a postura mais firme que conseguiu, ela respondeu:
— Senhor Lima, meu nome é Mariane Macedo. Meu marido, Alberto Macedo, faleceu recentemente. E eu preciso da sua ajuda para investigar um homem… um médico, na verdade. Horácio Montenegro Vasques. Ele está… envolvido com a nossa família de uma maneira que não consigo explicar, mas sinto que há algo muito errado. Algo que não posso deixar passar.
Lima ouviu atentamente, sem interromper. Por um momento, o silêncio se instalou entre os dois, como se ele estivesse ponderando as palavras dela. Depois, com a mesma calma controlada, ele falou:
— Entendido, senhora Vieira. A investigação é um processo meticuloso, e estarei à disposição para ajudá-la. O que posso fazer para começar?
Mariane sentiu um pequeno alívio com as palavras dele. A confiança ainda estava distante, mas ele parecia ser o tipo de profissional que poderia cavar fundo e trazer à tona o que ela tanto temia. Era exatamente o que ela precisava.
— Eu já encontrei algumas informações superficiais sobre ele, mas nada conclusivo. Preciso que o senhor investigue a fundo a vida dele, sua história, suas conexões… Qualquer coisa que possa ligar esse homem a atividades suspeitas. Ele tem um nome que está sendo muito associado ao meu falecido marido, mas até agora, não consegui encontrar nada que explique o que ele realmente está fazendo com a nossa empresa. Quero saber o que ele realmente esconde.
Lima respirou fundo, como se já estivesse calculando o esforço que a investigação demandaria.
— Compreendo a urgência. Vou começar imediatamente. Você pode contar comigo, dona Vieira. Vou precisar de todos os dados que tenha sobre ele e qualquer outro detalhe que tenha encontrado. Vou garantir que a investigação seja feita com discrição e precisão. Quando houver algo relevante, entrarei em contato.
O tom profissional de Lima a tranquilizou, mas algo ainda a incomodava. Talvez fosse a rapidez com que ele aceitou o caso ou a maneira impessoal com que lidava com as informações. Mesmo assim, ela não hesitou.
— Agradeço, detetive. Por favor, seja discreto. Não podemos deixar que nada chegue aos ouvidos errados.
— Pode confiar, senhora Vieira. A discrição é parte fundamental do meu trabalho. Ficarei em contato.
Mariane desligou o telefone com a sensação de que havia tomado a decisão certa, mas ainda com um nó apertado no estômago. Ela não sabia ao certo o que estava acontecendo, mas seu instinto feminino, afiado pelo luto e pela necessidade de proteger sua família, indicava que a investigação de Lima era mais importante do que nunca. Ela precisaria de respostas, e logo.
Após a ligação, Mariane sentou-se em sua cadeira de couro, os dedos nervosamente tocando o canto da mesa. Sentia-se mais sozinha do que nunca, mas também sabia que não poderia continuar vivendo em um estado de dúvida. A busca por respostas começava agora.
Enquanto ela esperava por notícias do detetive, seu pensamento se voltava novamente para Horácio Montenegro Vasques. A lembrança daquele homem frio, com seu olhar enigmático e sua presença implacável no funeral de Alberto, lhe dava calafrios. Ele não era apenas um médico; ele era parte de algo mais obscuro. E Mariane sabia, no fundo de seu coração, que seu marido, Alberto, jamais teria deixado que um simples cientista estivesse tão envolvido com os assuntos da empresa sem um motivo muito maior.
A sensação de desconforto aumentava a cada pensamento. Ela sabia que não estava apenas lidando com a morte de Alberto; estava lidando com algo que estava sendo escondido, algo muito maior do que ela imaginava.
E agora, com o detetive Lima trabalhando nos bastidores, ela sentia que as peças do quebra-cabeça finalmente estavam começando a se mover. Porém, um medo crescente a consumia: e se estivesse cavando um buraco mais profundo do que imaginava? E se o que ela encontrasse fosse mais sombrio do que poderia suportar?
Fábio Lima estava em seu escritório, a luz suave da lâmpada de mesa refletindo nas pilhas de papéis espalhados à sua volta. O cheiro de café queimado pairava no ar, misturado com o aroma das páginas envelhecidas. Ele estava acostumado a investigar mistérios complexos, mas havia algo peculiar nesse caso. Algo que o deixava inquieto, mas ele não conseguia apontar exatamente o que era.
Ele ajustou os óculos sobre o nariz e virou a página do relatório mais recente, onde as palavras “Projeto Ataraxia” estavam sublinhadas repetidamente. Esse nome o atormentava de maneira incomum. Quando o telefone tocou, o som cortou a quietude do escritório como uma lâmina afiada. Fábio hesitou por um momento antes de atender.
— Lima — sua voz estava grave, focada.
Do outro lado, uma voz feminina respondeu com uma calma controlada.
— Detetive, é Mariane Vieira. Eu preciso de sua ajuda, de algo mais detalhado sobre o cientista Horácio Montenegro Vasques. Meu marido, um homem bem-sucedido, tinha algumas… conexões com ele. Preciso entender o que está acontecendo.
Mariane estava visivelmente preocupada, e Fábio sabia que ela estava em uma encruzilhada. Algo estava errado, mas o que exatamente, ele ainda não sabia. As pistas estavam escassas, e ele tinha a sensação de que as respostas estavam ali, mas estavam sendo cuidadosamente ocultadas.
— Vou me dedicar a isso, senhora Vieira. Vou investigar a fundo — ele respondeu de forma curta, mas direta, sua mente já começando a processar o que precisava fazer.
Ele desligou e ficou por um momento olhando para o telefone, refletindo sobre a solicitação. A investigação parecia simples à primeira vista, mas algo sobre o cientista não parecia certo. Horácio Montenegro Vasques era um nome bem conhecido, mas também era um nome que Fábio jamais conseguira associar a algo normal. A medicina não mentia, mas e os pacientes? O que mais esse homem poderia estar escondendo?
Ele abriu a pasta que havia recebido de Mariane e, ao folhear os documentos, seu olhar se fixou no que parecia ser o ponto central da investigação: o "Projeto Ataraxia". O nome era imponente, mas não lhe dizia nada. Não era o tipo de título de projeto que você encontraria em uma construção. Não se encaixava. Fábio sabia que se tratava de algo mais. Algo… humano. E talvez, algo ainda mais perigoso.
Fábio recostou-se na cadeira, sentindo a tensão apertar em seu peito. As letras da palavra “Ataraxia” pareciam brilhar de forma perturbadora. Ele sabia que, por mais que fosse um investigador de renome, esse caso estava prestes a levá-lo para um terreno mais escuro do que ele estava disposto a ir.
Por instinto, ele puxou seu laptop e começou a pesquisar o nome "Horácio Montenegro Vasques". Na tela, os resultados apareceram rapidamente, mas nenhum deles era definitivo. Era como se o próprio Vasques estivesse tentando apagar todas as evidências que o conectavam ao projeto, e, mais ainda, à família Vieira.
Mas Fábio era persistente. A pesquisa o levou a uma clínica especializada, uma referência médica bastante respeitada, mas sem maiores detalhes. Ele clicou em um link que parecia promissor, mas foi interrompido por uma tela de erro que surgiu repentinamente, como se alguém tivesse manipulado aquilo. A sensação de desconforto cresceu. Ele franziu o cenho e procurou por mais informações, mas o nome de Vasques parecia imune a qualquer investigação substancial.
A inquietação começou a crescer. Fábio sabia que existia uma rede de proteção em torno daquele nome, mas quem a estava gerenciando? Ele estava começando a sentir como se estivesse sendo puxado para uma teia de mentiras e manipulações, e ele não era do tipo que gostava de se sentir impotente. Fábio sabia que precisava ir mais fundo.
Ele se levantou da cadeira com uma velocidade que não era típica nele. Caminhou até a janela de seu escritório e olhou para a cidade iluminada. Havia algo na calada da noite, algo que o fazia querer mais. Algo que estava em jogo, e ele sentia que precisava ser a pessoa que fosse capaz de descobrir. A intensidade de sua convicção era palpável, como se um peso invisível estivesse empurrando-o para frente, para aquilo que ainda não entendia.
Voltou para a mesa e pegou o telefone. Sua primeira ligação seria para um antigo colega, um jornalista que costumava investigar questões médicas complicadas. Ele precisava de uma resposta, ou melhor, de uma pista. Sabia que os jornalistas, muitas vezes, sabiam mais do que qualquer investigador. Eles tinham fontes, contatos, e sabiam como fazer as perguntas certas.
Ele aguardou enquanto o telefone chamava, seu dedo tamborilando na mesa. Quando o amigo atendeu, Fábio foi direto ao ponto.
— Preciso que você me ajude a encontrar algo sobre Horácio Montenegro Vasques. Algo que não está nos registros oficiais. Ele está envolvido em algo, e eu preciso saber o que é.
A voz do jornalista do outro lado estava carregada de ceticismo, mas a determinação de Fábio era clara.
— Vou tentar, mas isso é um território muito escuro, Fábio. Você tem certeza disso?
Fábio respirou fundo. Agora, ele sabia que estava entrando em algo que ultrapassava as linhas do habitual. Mas não havia como voltar atrás. E ele nunca foi do tipo que recuava diante de um mistério.
— Tenho certeza.
Desligou o telefone e voltou à sua pesquisa. Sabia que, quando uma resposta fosse encontrada, ela não seria fácil. E isso o assustava mais do que queria admitir.
Fábio Lima estava em um ponto de frustração. O trabalho não estava avançando. Já havia se passado uma semana desde que começara a investigar Horácio Montenegro Vasques, mas ele não estava conseguindo nada concreto. O nome de Horácio aparecia em diversas referências de pesquisas científicas, artigos antigos, e menções em clínicas de prestígio, mas nada que fosse realmente relevante para o que Fábio procurava. Não havia menção a algo como o misterioso “Projeto Ataraxia”.
Decidiu então tentar uma nova abordagem: buscar por alguém que tivesse trabalhado diretamente com Vasques. Carlos, o ex-funcionário, foi o nome que lhe veio à mente. Ele sabia que Carlos havia trabalhado na clínica de Horácio por anos, e talvez, na simplicidade da conversa, pudesse encontrar algum detalhe que ele havia deixado escapar. Se houvesse algo que poderia ser útil, talvez esse ex-funcionário soubesse.
Fábio foi até o café onde Carlos costumava frequentar. Ele já o conhecia, sabia onde encontrá-lo, e estava ansioso para ver se ele poderia revelar algo novo. Quando chegou, viu Carlos sentado em uma mesa perto da janela, absorto em seu livro. Ao avistar Fábio, o ex-funcionário levantou a cabeça com um sorriso.
— Fábio! — disse Carlos, com uma expressão amigável. — Quanto tempo, cara. Como você está?
— Bem, obrigado — respondeu Fábio, tentando não dar demasiada ênfase à sua preocupação. — Na verdade, estou em uma investigação. Tenho algumas perguntas sobre o Dr. Vasques. Você trabalhou com ele por um tempo, certo?
Carlos franziu a testa, parecendo curioso, mas logo acenou com a cabeça.
— Isso mesmo. Trabalhei com Horácio por anos. — Ele deu uma pausa e olhou para Fábio. — Ele é um bom homem, mas... ele é complicado, sabe? Sempre muito fechado sobre o trabalho dele. Nunca falava muito sobre o que estava acontecendo. Ele não dividia nada com a gente. A verdade é que, em termos de trabalho, ele era... um pouco distante.
Fábio percebeu a hesitação na voz de Carlos, como se ele estivesse evitando algum detalhe. Ele se inclinou para frente, atento, e perguntou com um tom mais direto.
— Então, você nunca ouviu falar de um projeto chamado Ataraxia? Um projeto de construção, talvez relacionado à clínica dele? O nome está aparecendo em alguns documentos.
Carlos ficou em silêncio por um momento. Seus olhos olharam fixamente para a xícara de café à sua frente, e ele engoliu em seco antes de responder.
— Nunca. Horácio nunca me falou sobre isso. Se ele tem algum projeto com esse nome, eu realmente não sabia. Mas, sabe, ele sempre foi muito cuidadoso com seus segredos. Muita coisa ele não contava nem para os mais próximos. Ele preferia que ninguém soubesse muito.
Fábio percebeu que, por mais que quisesse insistir, Carlos estava se fechando. O ex-funcionário parecia nervoso, mas não dava sinais de que estava mentindo. No entanto, algo na conversa não estava batendo. A sensação de que Carlos estava escondendo algo — e talvez estivesse, de algum modo, envolvido em um segredo mais profundo — estava ali, latente.
Carlos continuou, tentando parecer tranquilo.
— Olha, Fábio, meu conselho é o mesmo que sempre dei. Se ele está envolvido com algo grande, é melhor você não tentar ir atrás. Ele mantém tudo sob controle, e ninguém, nem mesmo eu, soube de qualquer projeto importante enquanto estava lá. Pode ser algo recente... ou algo que ele não quer que ninguém descubra.
Fábio se recostou na cadeira, ainda sentindo que havia algo mais ali, mas sem poder provar. Ele agradeceu a Carlos pela conversa e se levantou.
A conversa, para Fábio, parecia não ter levado a lugar algum. No entanto, ele não estava disposto a desistir. Havia algo errado, e ele estava mais certo do que nunca de que Horácio estava escondendo algo, algo muito maior do que ele imaginava. O Projeto Ataraxia, se existia, tinha que ser algo muito secreto. E se o ex-funcionário não estava disposto a falar, ele começaria a investigar outras fontes.
Fábio se afastou, deixando o café e indo para sua próxima etapa da investigação. Mas, por mais que estivesse determinado, uma sensação estranha o acompanhava — algo relacionado a Carlos não estava certo. Mas, por enquanto, ele não tinha provas. A peça do quebra-cabeça estava ainda faltando, e ele sabia que, mais cedo ou mais tarde, algo viria à tona. Ele só precisava ser paciente.
Após a conversa com Carlos, Fábio deixou o café com uma sensação crescente de frustração. Ele sabia que estava perdendo tempo. Nada parecia levar a lugar algum. Durante os dias seguintes, ele tentou seguir a investigação, vasculhando arquivos, fazendo mais contatos e tentando rastrear qualquer informação sobre Horácio e o tal projeto Ataraxia. Mas nada. O silêncio era ensurdecedor. Como se uma grande cortina tivesse sido puxada, isolando todos os segredos da vista de qualquer um que ousasse buscar.
Era óbvio que Horácio tinha muito poder e influência, muito mais do que ele havia imaginado. Cada vez mais, ele se sentia como um gato perseguindo uma sombra, sem nunca chegar perto o suficiente para capturá-la. O nome de Ataraxia continuava aparecendo em fragmentos dispersos, mas as conexões eram tênues demais, e os documentos, quando encontrados, estavam incompletos ou com informações vitais desaparecidas.
No final daquela semana, Fábio decidiu entrar em contato com Mariane. Ele sabia que ela estava esperando por uma resposta, e não queria mais prolongar a decepção.
Alguns dias depois...
Fábio pegou o telefone e, com uma leve sensação de impotência, discou o número de Mariane. A voz dela ao atender soou tão familiar, mas havia um toque de expectativa que ele sentiu quase como uma pressão em seus ombros.
— Mariane, aqui é o Fábio. — Sua voz estava firme, mas com um leve tom de desgosto. — Eu terminei minha investigação sobre o Dr. Vasques. Pesquisei tudo o que consegui. Fiz contatos, conversei com ex-funcionários, investiguei os arquivos... Não encontrei nada que sugerisse irregularidades.
Mariane permaneceu em silêncio por um momento, e Fábio imaginou que ela estava processando as palavras dele, provavelmente decepcionada, assim como ele estava consigo mesmo.
— Então, ele... não tem nada a esconder? — a voz de Mariane foi suave, mas Fábio podia sentir a preocupação nela.
Ele soltou um suspiro cansado e continuou.
— Não, nada que eu tenha encontrado. A ficha dele é limpa. Ele tem uma carreira sólida, sem nenhum registro de comportamento estranho, e todos os contatos que fiz falam bem dele. Aparentemente, é um homem bem respeitado na comunidade científica. Nada suspeito por aqui, Mariane. Eu... sinto muito.
Mariane, por outro lado, tentou esconder o desapontamento. Mas Fábio sentiu a tensão se dissipando na linha.
— Eu entendo, Fábio. Sei que você fez o possível. — Ela fez uma pausa, como se estivesse ponderando a situação. — Ainda assim, eu não consigo afastar essa sensação... como se houvesse algo mais. Mas, por enquanto, agradeço o que você fez. Talvez seja hora de encerrar essa parte da investigação.
Fábio hesitou, sentindo uma pontada de culpa. Ele queria acreditar que havia feito o suficiente, que ela ficaria aliviada com a resposta. Mas não era bem assim. Havia algo em seu peito que não o deixava confortável.
— Se você mudar de ideia ou quiser tentar outra abordagem, estarei por aqui. — Ele tentou oferecer uma palavra de conforto.
— Eu vou pensar nisso. Por enquanto, vou tentar seguir em frente com isso. Muito obrigada, Fábio.
A ligação terminou com um tom de despedida pesado. Fábio olhou para o telefone, uma sensação desconfortável apertando seu peito. Ele sabia que havia mais naquela história, mas também sabia que ele não era o único que estava envolvido naquela teia complexa. Ele só não sabia até que ponto isso o atingiria.
Ele largou o celular na mesa, sentindo-se impotente, e se permitiu por um momento pensar em como a investigação parecia ter chegado a um impasse.
No entanto, enquanto Fábio estava em um ciclo de frustração, algo estava acontecendo à sua volta.
No entanto, sem saber, ele estava sendo observado. O ex-funcionário Carlos o seguia à distância, silencioso, como uma sombra que se esgueirava nas ruas. E por trás de tudo isso, Horácio Montenegro Vasques assistia, com um sorriso discreto, à medida que o plano tomava forma. A estratégia de Carlos — que havia sido o primeiro a experimentar o soro — estava funcionando como ele esperava. Fábio estava cada vez mais afastado da verdade, e o jogo estava sendo jogado no palco das sombras.
Os dias seguintes se tornaram uma maratona de reuniões e decisões empresariais, algo que Rafael não estava totalmente preparado para enfrentar. A vida de herdeiro parecia um jogo de xadrez onde as peças estavam sempre em movimento, mas o tabuleiro era grande demais para ele ter total controle. Entre uma reunião e outra, ele se viu lidando com o peso de responsabilidades que antes, quando seu pai estava vivo, ele mal imaginava.
O telefone tocava incessantemente, mensagens se acumulavam em sua caixa de entrada, e cada ação parecia levar a uma decisão que afetaria não apenas sua família, mas a trajetória da empresa que seu pai construiu. Ele tentava manter a compostura, mas o cansaço estava começando a tomar conta.
Na manhã daquele dia, ele se encontrou em uma reunião importante com os executivos da construtora, revisando contratos e discutindo projetos que estavam em andamento. Seus olhos percorriam as páginas, mas sua mente não estava ali. Ele olhava para os documentos, assinava o que precisava ser assinado, fazia anotações de quando precisava tomar decisões, mas sua mente estava longe — muito longe, em um lugar mais nebuloso e sombrio.
"Ataraxia."
A palavra continuava ecoando em sua cabeça. E, o que mais o perturbava, era que ele não conseguia encontrar respostas. Ele já tinha passado horas tentando se lembrar de tudo o que sabia sobre seu pai e o envolvimento com esse projeto, mas a cada novo passo que dava, ele sentia que estava se afundando mais ainda em um mar de incertezas.
Enquanto os executivos discutiam detalhes do orçamento de uma nova obra, Rafael fingia acompanhar, mas a imagem do nome "Ataraxia" e o sorriso estranho de Horácio não saíam de sua cabeça. A suspeita de que o pai estivesse envolvido em algo mais sombrio, mais complexo, fazia seu estômago se revirar. Rafael não era um homem dado a mistérios, mas aquilo... aquilo não fazia sentido. Ele começava a imaginar que seu pai, de alguma forma, estava tentando proteger algo — ou alguém.
— Rafael, o que você acha sobre o prazo para essa entrega? — A pergunta de um dos executivos interrompeu seus pensamentos.
Ele piscou, voltando à realidade, tentando esconder o desconforto. Estava tão envolvido nos detalhes do que parecia ser uma simples questão corporativa, mas seu subconsciente se recusava a se concentrar nisso. O nome de Horácio, o mistério que o cercava, a sensação de estar sendo puxado para um labirinto sem fim — tudo isso pesava sobre ele.
— Acho que podemos cumprir o prazo, mas precisamos de uma revisão mais detalhada nos custos. — Ele respondeu, sem pensar muito, o que foi o suficiente para a reunião seguir seu curso.
As horas passaram, e com elas, a sensação de desconforto não se dissipava. Rafael mal percebeu que o dia já estava se esgotando quando, finalmente, ele se viu sozinho em seu escritório. Ele estava cansado, tanto fisicamente quanto mentalmente. A papelada se espalhava sobre sua mesa, mas ele nem ao menos se deu ao trabalho de organizá-la. Seu olhar se fixava em um ponto vazio da parede, e o pensamento sobre seu pai, o projeto, e Horácio voltava com mais intensidade.
Ele pegou o celular, revisando rapidamente as mensagens, e encontrou um relatório que já havia sido enviado na parte da manhã. Era uma atualização sobre os projetos da empresa, mas novamente sua mente se desviou, o nome "Ataraxia" piscando diante de seus olhos.
Rafael se levantou da cadeira e caminhou até a janela, observando o movimento lá fora. O contraste entre a correria do mundo exterior e a quietude de seu interior parecia abissal. A verdade que ele desconfiava estar enterrada no fundo de sua mente não o deixava em paz. Ele não queria admitir, mas seu pai talvez tivesse envolvimento em algo muito maior do que ele jamais imaginou. Algo que estava sendo mantido nas sombras, protegido por aqueles que ele mais confiava.
Ele não sabia se tinha coragem de seguir esse caminho, mas ao mesmo tempo, sabia que não poderia simplesmente ignorar o que havia descoberto. Ou o que ele acreditava ter descoberto.
"Será que meu pai sabia do que estava acontecendo com Horácio?", ele pensou. "Será que ele também se sentia tão preso quanto eu estou agora?"
Aquela pergunta martelava em sua cabeça enquanto ele dava alguns passos de volta para sua mesa. Ele olhou para os arquivos novamente, um impulso irresistível o levando a vasculhá-los. Talvez houvesse algo que ele tivesse deixado passar. Ou talvez... talvez fosse hora de tomar uma atitude mais drástica.
Mas a sensação de estar se afundando em algo perigoso, algo que poderia destruir tudo o que ele acreditava, o deixava paralisado. Ele não sabia por onde começar, nem se deveria continuar.
Antes que pudesse se decidir, o celular tocou novamente, interrompendo seus pensamentos. Era Fernando, o assistente de sua empresa.
— Rafael, só para confirmar, o senhor queria que eu revisasse os documentos sobre o Projeto Ataraxia novamente? — perguntou Fernando, sua voz nervosa ao telefone.
Rafael pensou por um momento, quase relutante em continuar sua investigação. Mas não podia mais ignorar a voz de seu próprio instinto.
— Sim, Fernando. Faça isso. — Ele disse, a voz mais firme do que se sentia por dentro. — Continue pesquisando. Eu preciso de mais informações. Quero saber de tudo, cada detalhe.
Ele desligou o telefone, a tensão se acumulando em seus ombros. O que ele estava fazendo? Ele se sentia como um homem à beira de descobrir algo que poderia mudar sua vida para sempre — ou destruí-la completamente. Mas, por agora, a dúvida e o medo eram mais fortes do que qualquer outra coisa. Ele não sabia qual caminho seguir, mas também não sabia mais como voltar atrás.
Rafael estava em sua mesa, em um dos muitos dias cheios de reuniões e papéis espalhados pelo escritório da construtora. Ele passava os olhos por mais uma pilha de documentos, tentando se convencer de que estava mais perto de uma resposta. Mas, mesmo enquanto absorvia os relatórios financeiros e os detalhes do cronograma das obras, sua mente vagava. O nome Ataraxia ainda ressoava, ecoando como uma palavra estranha em sua cabeça. Cada vez que ele tentava se concentrar no trabalho, a ideia de investigar mais a fundo o projeto o consumia mais.
A luz fria do escritório o envolvia, e a chuva lá fora tamborilava contra as janelas, mas a pressão que ele sentia dentro do prédio parecia ainda mais forte. Ele queria descobrir mais, mas algo lhe dizia que a verdade poderia ser mais devastadora do que ele poderia imaginar. Seus dedos passearam pela tela do celular, sem saber se deveria procurar mais informações ou simplesmente deixar o passado onde estava.
De repente, o som de uma ligação interrompeu seus pensamentos. A tela do celular iluminou o escritório com o número de um número desconhecido.
Ele hesitou por um momento, mas atendeu.
— Rafael Macedo? — a voz do outro lado era grave, abafada e com um tom de alerta que o fez arrepiar. — Eu sugiro que pare agora. Não continue com essa investigação, ou vai se arrepender.
O tom autoritário e a ameaça velada na voz do homem fizeram a pulsação de Rafael aumentar. O instinto lhe disse que aquilo não era uma brincadeira.
— Quem é você? — perguntou Rafael, tentando esconder o nervosismo que começava a se espalhar por seu corpo. Ele sabia que era perigoso se meter mais ainda nesse jogo, mas o desafio lhe era atraente. Ele queria respostas.
— Isso não importa agora. O que importa é que você está mexendo com algo que não entende. E eu sou o aviso. Pare agora, ou não será apenas você quem pagará as consequências — a voz do homem parecia cada vez mais ameaçadora, quase como se estivesse olhando diretamente para ele, a cada palavra que proferia.
Rafael ficou em silêncio, a mente trabalhando rápido. Ele nunca foi de se intimidar facilmente, mas o que o homem disse parecia sincero e calculado, e isso fez com que ele se sentisse vulnerável, ainda que, em seu orgulho, tentasse se manter firme.
— E o que você sugere que eu faça? — disse ele, mais desafiador do que realmente se sentia.
O homem deu uma breve risada, sem humor, e continuou:
— Você não tem ideia do que está fazendo, Rafael. Ataraxia não é o que você pensa. Se você insistir, não será só sua carreira que estará em jogo. Vai muito além disso. Siga por esse caminho, e não restará nada de você, nem no mundo corporativo, nem na sua vida pessoal. Eu sou um aviso. Faça o que quiser com isso. Mas pare enquanto ainda há tempo.
A ligação foi desligada abruptamente.
Rafael ficou com o celular na mão, olhando para a tela por alguns segundos, em silêncio. A sensação de ter sido ameaçado e, ao mesmo tempo, desafiado, o deixou inquieto. Ele jogou o celular sobre a mesa e, por um instante, olhou para os papéis à sua frente. Algo havia mudado. Agora ele sabia que estava mexendo em algo muito maior do que imaginava.
Os detalhes do projeto Ataraxia começaram a ficar ainda mais misteriosos. O aviso parecia só aumentar sua curiosidade. Mas, ao mesmo tempo, ele sabia que se algo estava tão protegido, deveria haver algo de muito grave ali.
Rafael respirou fundo e, ao olhar para o relógio, percebeu que as horas passavam enquanto ele ainda se questionava: seria ele realmente capaz de parar agora? Ou seria ele o próximo a se tornar uma peça nesse tabuleiro, sem saber onde realmente estava pisando?
Ele não sabia a resposta, mas uma coisa estava clara: não poderia parar agora.
Dias se passaram, ele foi descobrindo mais e mais coisas a respeito desse projeto e quanto mais a verdade vinha à tona, mais ele se sentia perturbado com tudo aquilo, não estava acreditando em todas as coisas que ganharam luz com essa investigação, o que o pai estava fazendo era terrível demais e ele estava custando acreditar nisso
Rafael estava inquieto. O peso do que descobrira esmagava sua mente como um torno apertando lentamente. Ele caminhava de um lado para o outro em sua sala, respirando fundo, tentando racionalizar aquilo. Soro de manipulação mental. Vício. Dominação. As palavras giravam como um vendaval furioso em sua cabeça.
“Isso é uma loucura... Meu pai passou dos limites...”
Ele queria acreditar nisso, queria que houvesse alguma explicação razoável para tudo. Mas não havia. O que Horácio Montenegro Vasques estava fazendo era criminoso.
Ele se jogou na cadeira de couro, esfregando o rosto com força. Deveria denunciar Horácio. Entregá-lo às autoridades, expor o que estava acontecendo. Mas... como? Como provar?
O projeto Ataraxia não existia oficialmente. Nenhum documento concreto. Nenhuma testemunha que ousaria se voltar contra um homem tão meticuloso. Tudo estava fragmentado, escondido sob camadas e mais camadas de segredos.
E mesmo que conseguisse algo... quem acreditaria nele? Quem poderia garantir que Horácio não sumiria com todas as provas e faria Rafael parecer um lunático?
Rafael apertou os punhos. Precisava de alguém para ajudá-lo.
Foi quando um nome surgiu em sua mente. Fernando.
O jovem atendente da recepção. Leal, discreto. E, mais importante: ele já sabia que Rafael estava investigando Ataraxia.
Era um risco. Um risco enorme. Mas Rafael sentia que não tinha outra opção. Se tentasse fazer isso sozinho, acabaria soterrado pelo peso daquele segredo.
Ele pegou o celular e encarou a tela por alguns segundos. Sabia que estava prestes a envolver Fernando em algo muito maior do que ele imaginava. Mas se não fizesse isso... estaria perdido.
Respirou fundo, abriu a lista de contatos e encontrou o nome de Fernando. Seu dedo pairou sobre o botão de chamada. Então, sem mais hesitar, pressionou. O telefone tocou. E com isso, Rafael cruzava um ponto sem retorno.
O telefone tocou duas vezes antes de Fernando atender.
— Senhor Macedo? — A voz do jovem parecia surpresa. Não era comum Rafael ligar para ele diretamente.
Rafael não perdeu tempo. Sua mente estava fervilhando, e ele precisava agir antes que a dúvida o paralisasse de novo.
— Fernando, preciso da sua ajuda. — Sua voz saiu mais grave do que o normal.
Do outro lado da linha, Fernando hesitou.
— Aconteceu alguma coisa?
Rafael respirou fundo, apoiando o cotovelo na mesa e apertando o nariz entre os dedos.
— Eu quero que me ajude a investigar tudo sobre o que meu pai e Horácio Montenegro Vasques estão fazendo com o Projeto Ataraxia.
O silêncio do outro lado da linha foi quase sufocante. Fernando prendeu a respiração por um segundo, e Rafael pôde imaginar a expressão confusa no rosto dele.
— O senhor tem certeza? — Fernando perguntou, quase em um sussurro.
— Mais do que nunca. — Rafael se levantou da cadeira e começou a andar pela sala. — Tem algo muito errado nisso. Meu pai nunca deixaria um projeto tão fragmentado, e o que eu descobri até agora... Fernando, isso não é só um projeto de pesquisa qualquer.
— E o que seria então? — A hesitação na voz de Fernando indicava que ele já desconfiava da resposta, mas precisava ouvi-la de Rafael.
Rafael parou em frente à janela, olhando a cidade iluminada à noite. Parecia tão normal lá fora... Mas dentro daquela empresa, dentro daquele segredo, algo obscuro estava crescendo.
— Algo grande. Algo perigoso. — Ele apertou os punhos. — E eu não posso fazer isso sozinho.
Do outro lado, Fernando exalou lentamente.
— Se o senhor acha que isso é necessário... eu estou dentro. Mas, senhor Vieira, se o que estamos mexendo for realmente perigoso... precisamos ser muito cuidadosos.
Rafael fechou os olhos por um momento e assentiu para si mesmo.
— Sim. A partir de agora, cada passo precisa ser calculado.
Ele sabia que estavam prestes a entrar em um jogo que poderia engoli-los completamente. Mas era tarde demais para voltar atrás
Rafael e Fernando continuavam vasculhando os arquivos, imersos na investigação. As informações sobre o Projeto Ataraxia estavam se tornando mais nítidas, mas, ao mesmo tempo, mais perturbadoras. O que antes parecia apenas um experimento controverso agora começava a tomar contornos de algo muito maior e mais calculado.
No meio dos arquivos digitais, Fernando encontrou uma pasta com documentos antigos. Ele analisou com atenção um relatório que detalhava os efeitos do soro em cobaias humanas. A linguagem técnica mascarava o que estava implícito: o soro não apenas alterava o comportamento, mas criava uma dependência psicológica e emocional.
— Isso aqui é insano... — Fernando murmurou, lendo um trecho que falava sobre submissão e reforço da obediência. Ele olhou para Rafael, seus olhos brilhando com um misto de fascínio e desconforto. — Você consegue imaginar o que isso significa? O nível de controle que isso pode proporcionar?
Rafael sentiu um arrepio percorrer sua espinha. O tom de Fernando não era de repulsa completa, mas de uma curiosidade que beirava a admiração. Algo nele queria repreendê-lo, dizer que aquilo era errado. Mas, ao invés disso, ficou em silêncio. Por um momento, ele próprio sentiu um peso no peito – um impulso que não deveria estar ali.
— Não é só controle — Rafael disse, sua voz mais firme do que se sentia por dentro. — É escravidão. Uma prisão mental. Meu pai... Horácio... eles sabiam exatamente o que estavam fazendo.
Fernando passou os dedos pelos papéis, pensativo. Ele então ergueu o olhar para Rafael, um sorriso leve nos lábios.
— Mas, se é tão poderoso assim, por que eles ainda estão escondendo? Se isso realmente funciona... — ele hesitou, escolhendo bem as palavras — por que eles mesmos ainda não tomaram?
Rafael prendeu a respiração. A pergunta ficou ecoando em sua mente. Ele não sabia responder. Pior, percebeu que não queria responder. A ideia de que alguém poderia se submeter de forma voluntária ao soro o incomodava... e, ao mesmo tempo, instigava.
Fernando não percebeu a perturbação de Rafael e continuou falando:
— Imagina só... um mundo onde ninguém resiste. Onde todas as vontades se alinham. — Ele riu, balançando a cabeça. — Parece algo saído de um livro distópico.
Rafael apertou os punhos. Algo estava errado. Ele sentia que precisava parar essa investigação antes que fosse tarde demais – mas tarde demais para quê? Ele não sabia dizer se estava com medo de descobrir mais ou com medo de algo que já crescia dentro dele. Algo que, no fundo, ele não queria nomear.
— Vamos focar em encontrar mais provas, Fernando — disse, em um tom mais duro do que pretendia. — Isso aqui precisa acabar antes que vá longe demais.
Fernando assentiu, mas seu olhar ainda carregava aquela centelha de curiosidade. Rafael sabia que essa centelha não se apagaria tão fácil... e temia que a sua própria estivesse começando a brilhar da mesma forma.
Depois de uma hora vasculhando documentos, registros e qualquer pista que pudessem encontrar, Rafael e Fernando se viram diante de um impasse. Nenhum novo dado surgia. O que tinham até agora não levava a lugar nenhum, apenas fragmentos que não revelavam a verdadeira natureza do Projeto Ataraxia.
— Acho que por hoje é só… — Fernando suspirou, fechando o último arquivo que analisava. — Talvez seja melhor deixar para outro dia. Quem sabe a gente consiga mais alguma coisa com a cabeça mais fresca.
Rafael concordou com um aceno lento.
— Sim, acho que estamos forçando sem resultado. Amanhã podemos tentar outro caminho.
Eles se despediram, e cada um seguiu seu rumo. Rafael caminhou pelos corredores da empresa, ainda imerso em pensamentos. A lembrança de Fernando fascinado com o que descobriram o incomodava mais do que queria admitir. Aquele brilho nos olhos do rapaz... aquela inquietação, aquela admiração disfarçada. Era como se ele estivesse... atraído pela ideia.
Isso o preocupava.
Seguiu pelo saguão e avistou sua secretária organizando a mesa para ir embora. Já era fim de expediente.
— Boa noite, senhor Macedo— ela disse, empilhando algumas pastas.
— Boa noite, Patrícia.
— Amanhã, às nove, temos a reunião com o conselho. E… Ah, quase esqueci! Um jovem chamado Talles virá para a empresa para saber sobre a oportunidade de estágio.
Rafael assentiu.
— Certo. Diga a ele que estarei disponível.
Ela sorriu e se despediu, deixando Rafael mais uma vez sozinho com seus próprios pensamentos.
Ao sair do prédio, deu de cara com Jonatan e Helena, que conversavam perto da calçada. Sua mãe percebeu sua presença primeiro e abriu um sorriso caloroso.
— Rafael!
Jonatan se virou também, cumprimentando-o com um aceno.
— Está parecendo mais leve ultimamente — Helena comentou, observando-o atentamente.
Rafael arqueou a sobrancelha.
— Isso é bom ou ruim?
Ela riu suavemente e segurou a mão do filho.
— É bom. Estou feliz que você esteja lidando melhor com o luto e com tudo o que seu pai deixou para você. Me desculpe por ter exagerado naquele dia... Eu só me preocupo.
Ele segurou a mão da mãe e balançou a cabeça.
— Não precisa se desculpar. Você estava certa em se preocupar. Mas estou me esforçando para manter as coisas no caminho certo.
Ela sorriu, parecendo mais aliviada. Conversaram mais alguns minutos sobre Paulo, seu filho, e sobre como a rotina da família estava seguindo depois da morte de seu pai. Mesmo naquele breve momento de normalidade, Rafael sentia um peso diferente. Como se estivesse em um equilíbrio frágil, entre o mundo que conhecia e aquele novo, cheio de sombras e perguntas sem resposta.
Pouco depois, ele se despediu e seguiu para o elevador. Quando as portas se fecharam, um suspiro escapou de seus lábios. Fernando estava certo.
Quando falava sobre sua família, sobre coisas normais, parecia esquecer aquele universo obscuro que seu pai criou. O medo, a tensão, a incerteza... tudo ficava para trás por alguns instantes.
Mas algo dentro dele ainda pulsava.
O misto de curiosidade e perigo. Ele precisava manter distância. Não podia continuar. E, ainda assim... o pensamento não ia embora.
Rafael dirigiu para casa em silêncio, os dedos batendo no volante em um ritmo lento e pensativo. Curiosidade e perigo. O eco dessas palavras martelava sua mente. Ele queria afastá-las, mas era como se algo o puxasse de volta. Quando chegou à sua residência, estacionou o carro na garagem e respirou fundo antes de entrar. O cheiro de comida caseira preencheu o ambiente, e ele encontrou sua esposa, Clara, terminando de pôr a mesa enquanto Paulo, seu filho de dezoito anos, mexia no celular sentado no canto da sala de jantar.
— Papai! — Paulo sorriu, largando o celular ao vê-lo.
Rafael esboçou um sorriso e bagunçou o cabelo do filho antes de se sentar. — Como foi o dia? — perguntou, enquanto Clara servia os pratos.
— Ah, normal. Faculdade, treino… aquele mesmo ritmo de sempre — o garoto respondeu, pegando os talheres.
— O professor de história falou hoje sobre ditaduras no século XX. Foi bem interessante — Paulo continuou, cortando um pedaço de carne.
A palavra "ditaduras" atingiu Rafael como um choque, e por um instante sua mente se desviou para as pesquisas sobre o soro, o poder que ele poderia proporcionar. O mundo sombrio que seu pai construiu.
— História sempre foi seu forte — Clara comentou, olhando para o filho com orgulho.
— E você, Rafael? Como foi o dia? — ela perguntou, voltando-se para o marido.
Ele hesitou por um momento, tomando um gole de suco antes de responder. — Foi... cansativo. A empresa exige muito ultimamente.
Clara assentiu, observando-o com aquele olhar atento que apenas uma esposa sabe ter. — Parece preocupado.
Preocupado. Essa palavra mal começava a cobrir o que ele sentia. Ele sabia que deveria dividir um pouco do que passava por sua mente, mas como explicar algo tão absurdo? Como dizer que estava investigando o próprio pai e um projeto secreto que envolvia controle mental e submissão? Ele apenas sorriu de leve, tentando aliviar a tensão no rosto.
— Apenas trabalho, nada demais.
O jantar continuou, e Rafael tentava se concentrar na conversa, mas sua mente divagava. Cada palavra dita, cada risada trocada parecia um lembrete de como sua vida antes era mais simples. Mas agora, cada segundo fora daquele mundo sombrio parecia uma pausa temporária. Ele precisava parar. Mas será que queria?
A pergunta o pegou desprevenido. O perigo ainda o assustava, mas a curiosidade... essa o corroía por dentro.
Rafael continuou jantando, forçando-se a prestar atenção na conversa. Clara falava sobre um projeto novo no trabalho, enquanto Paulo comentava sobre uma possível viagem com os amigos da faculdade no final do semestre. Ele ouvia, acenava com a cabeça, mas sua mente ainda estava longe dali.
— O que você acha, pai? — Paulo perguntou de repente, o olhar curioso voltado para ele.
Rafael piscou algumas vezes, trazendo-se de volta à mesa. — Sobre o quê?
O filho riu. — Sobre a viagem. Estava pensando em ir com o pessoal para Florianópolis, passar uns dias na praia.
Clara ergueu a sobrancelha. — E desde quando você gosta de praia?
— Não é a praia em si, mãe, é a experiência — ele respondeu, dando de ombros. — Todo mundo vai, menos eu. Quero aproveitar também.
Rafael refletiu por um instante, buscando manter a postura racional de sempre. — Se suas notas estiverem boas e você se organizar, não vejo problema.
Paulo sorriu. — Pode deixar.
Clara soltou um suspiro discreto. — Seu pai é muito mais fácil de convencer do que eu, hein.
Paulo riu e voltou a mexer no celular, enquanto Rafael desviava o olhar para o próprio prato. Ele não sabia explicar, mas sentia-se desconectado de tudo aquilo. A casa, a família, o jantar... Era como se estivesse assistindo de fora, vendo-se agir mecanicamente.
— Rafael? — Clara chamou sua atenção novamente.
— Hm?
Ela o encarava com um olhar de quem conhecia cada mínimo detalhe de sua expressão. — Você tá estranho.
Ele soltou um leve sorriso, tentando não demonstrar a inquietação. — Só cansado. Foi um dia longo. Ela não pareceu convencida, mas também não insistiu.
O jantar seguiu por mais alguns minutos, com trocas ocasionais de palavras, mas Rafael continuava com aquela sensação incômoda. Eu deveria parar. O pensamento voltava como um aviso. Ele deveria encerrar essa investigação, esquecer o que descobriu, seguir com sua vida normal. Mas ao mesmo tempo, algo nele o empurrava para frente. A curiosidade, o perigo, o fascínio. O que Fernando disse mais cedo continuava martelando em sua cabeça.
Ele olhou para a esposa e o filho e tentou se concentrar neles, na normalidade daquela cena. Mas, no fundo, sabia que não importava quantos jantares tranquilos tivesse, algo dentro dele já havia sido despertado—e não seria fácil ignorar.
Depois do jantar, Rafael seguiu para o quarto, sentindo o peso do dia sobre os ombros. Ele soltou um suspiro pesado enquanto retirava a camisa e jogava no cesto de roupas. Precisava de um banho quente para limpar a mente, afastar aqueles pensamentos.
O som da água caindo contra o piso do box ecoava no banheiro quando ele entrou sob o chuveiro, deixando que o calor aliviasse a tensão acumulada em seus músculos. Fechou os olhos por um instante, respirando fundo, tentando esvaziar a mente. Mas, como um eco persistente, as palavras de Fernando voltavam. O brilho fascinado nos olhos dele. O peso do que tinham descoberto.
Isso não pode me afetar. Ele se forçou a pensar, abrindo os olhos novamente. Eu sou maior do que isso.
Então, como se o universo decidisse zombar de sua tentativa de controle, o som de uma notificação ecoou pelo banheiro. Rafael franziu o cenho, desviando o olhar para o celular sobre o balcão da pia. Não deveria ser nada importante a essa hora. Mas quando enxergou o nome na tela, sentiu uma onda de raiva subir por seu corpo.
Horácio.
A notificação brilhava, exibindo a mensagem curta, direta, como se o maldito estivesse dentro da sua cabeça:
"Não está conseguindo pensar direito, não é?"
Os olhos de Rafael se estreitaram, o sangue ferveu. Ele desligou o chuveiro abruptamente, saindo do box com passos pesados, pingando água pelo chão. Pegou o celular com força, os dedos apertando o aparelho como se quisessem esmagá-lo.
Ele queria responder. Queria dizer a Horácio que ele não sabia de nada, que não estava caindo nesse jogo. Mas algo dentro dele hesitou. Se eu responder, estou admitindo que ele tem razão.
Com um movimento brusco, ele jogou o celular sobre o balcão, o impacto ressoando pelo banheiro. Ficou parado por um momento, as mãos apoiadas na pia, encarando o próprio reflexo no espelho. Os olhos estavam carregados de fúria, mas por trás dela havia outra coisa. Algo que ele se recusava a nomear.
Não, eu não vou cair nisso. Ele pensou, cerrando os punhos. Mas, no fundo, sabia que Horácio já tinha fincado suas garras na sua mente.
Rafael estava parado na frente do espelho do banheiro, o reflexo refletindo mais do que seu corpo. Sua mente estava nebulosa, os pensamentos entrecortados pela sonolência que o calmante ainda deixava em seus nervos. Mas o som do relógio despertador o trouxe de volta à realidade e, com um suspiro cansado, ele se arrumou rapidamente, trocando a camisa de dormir por uma camisa jeans cinza escura. Ajeitou os bolsos com gestos automáticos enquanto sua mente ainda vagava entre os fatos que descobrira, e o que mais estava por vir.
Ele se olhou uma última vez no espelho. Seu rosto estava marcado pela fadiga, mas havia algo mais ali — uma inquietação que o fazia sentir-se como se estivesse à beira de um abismo, sem saber qual caminho tomar. Rafael esticou os ombros, tentando se convencer de que estava tudo bem. A rotina o aguardava, e ele precisava manter a compostura.
Ao sair para o trabalho, o que ele não esperava era que, ao chegar à empresa, Talles estivesse já ali, esperando para ser recebido. O jovem, com sua natural inocência, estava tão simples e ao mesmo tempo tão imponente naquele momento. Ele vestia uma camisa verde oliva militar, com dois bolsos nas alturas do peito e aqueles pequenos detalhes típicos de camisas militares, como os ombros reforçados.
Rafael não pôde evitar, mesmo que tentasse disfarçar, um frio estranho percorrer-lhe a espinha. Talles não parecia nada mais do que um jovem simples, mas havia algo ali, algo que ele não conseguia identificar. Aquele visual, aquele olhar curioso e ao mesmo tempo descomplicado, mexeu com ele de uma maneira que ele não conseguia entender. A sensação era confusa e até mesmo perturbadora.
Quando Talles sorriu ao ver Rafael, o olhar do jovem parecia ter uma luz de curiosidade genuína. Seus olhos brilhavam com algo inocente, mas que, de alguma forma, cortava através de Rafael de uma maneira que ele não queria admitir. Rafael desviou o olhar rapidamente, tentando não ser pego por aquela sensação que não sabia de onde vinha. Mas o coração de Rafael não parecia obedecer aos seus próprios pensamentos.
— Oi, senhor Rafael. Eu sou Talles. — disse o jovem com um sorriso amigável.
Rafael deu um sorriso forçado, tentando manter a compostura.
— Oi, Talles. Prazer em conhecê-lo. Vamos ao meu escritório. — Ele disse, a voz mais rígida do que gostaria, tentando se afastar daquelas sensações.
Mas, por dentro, algo dentro dele se agitou. Rafael não podia negar que, pela primeira vez, sentiu uma atração por outro homem. Algo que jamais tinha experimentado antes. Aquele sorriso, aquele olhar doce e descontraído, e a maneira como Talles parecia ser tão natural, sem pressa e sem medo... fez algo dentro de Rafael se mover, algo que ele não estava preparado para enfrentar.
Os dois seguiram até o escritório, com Rafael tentando desviar os pensamentos. Mas o calor que subiu ao seu rosto e as pequenas falhas no controle de seus pensamentos não passou despercebidos. Rafael se obrigou a focar no trabalho, mas sua mente, cada vez mais tomada por aquela sensação desconcertante, não conseguia mais focar totalmente.
Ele não sabia até onde aquilo o levaria, mas já sentia o abismo começando a engoli-lo.