O tão aguardado final de Mariana
“Destruída, mutilada, machucada e marcada pela violência que transformou sua sonhadora vida no momento que fora iludida, vendida e transformada numa descartável escrava sexual, com o único intuito de satisfazer os mais sujos desejos de pessoas inescrupulosas e que nela só enxergavam um pedaço de carne capaz de dar a elas um pouco de prazer, sua pobre vida se transformou em um inferno. E agora ali estava ela, distante de casa, jogada em uma caixa de lixo, misturada a lavagem dos porcos, descartada como mercadoria velha. Ela chorava, e seus olhos estavam distantes, perdidos no vazio de sua existência, quando um grande ruído de portas é ouvido ao longe, e ela pode redobrar sua consciência, voltando para sua dura realidade.”
Meus olhos estavam ardendo, meu corpo adormecido de tanta dor já estava enebriado de sofrimento e não sentia mais os castigos que tinham me dado recentemente, e eu só esperava uma oportunidade de morrer. Mas eu sabia que naquele momento e ali, nem isso me era permitido, e como uma boa escrava, eu não tinha direito a nada, nem mesmo sobre a minha própria oportunidade de tirar minha vida. Por isso, deixava de lado a ideia de me matar. Foi então que ouvi um dos homens que me levaram para aquele lugar chegar aonde eu estava e com olhar perplexo dizer com a voz embargada e em tom alto, com italiano bem coberto de sotaque, que tinham um imenso problema. E apontava o dedo para mim, mostrando meu corpo mutilado para seus amigos. Ele sabia quem tinha feito aquilo, e sabia também o que aquilo significava para eles. Mas para todos aqueles malditos, o que mais pesava é que com isso, eles teriam que me descartar, e para isso, teriam que me dar um fim.
Cogitaram e discutiram muito o que iriam fazer comigo. Fizeram isso na minha frente mesmo, sem a menor vontade de esconder e me preservar da conversa. Um deles queria me matar, me enterrando viva em algum lugar daquela fazenda, o que para ele seria um final bom para ver eu ter, principalmente se eles me obrigassem a cavar minha própria cova, e me cobrissem de terra podendo olhar meu desespero ao ser soterrada. Mas os outros não gostaram da ideia, e então decidiram que iriam me abandonar na beira de uma estrada, onde eu ficaria a própria sorte, e caso ela estivesse do meu lado, alguém poderia passar e me socorrer. Mas que isso não seria tão certo, pois eu seria deixada em uma estrada bem deserta, e longe dos olhos de quem passasse, e sem poder me mexer ou fazer barulho.
E assim fizeram, me levando no porta-malas do carro para uma estrada cheia de curvas, longe de casas, onde só via algumas vacas, e pastos. Fiquei ali, amordaçada, algemada, jogada no chão esperando por ajuda, até que peguei no sono, e já era noite quando acordei com barulhos de passos, e uma luz vermelha piscando. Eu tinha sido encontrada pela polícia, talvez algum morador local tenha me visto ali jogada, e me ajudou chamando a polícia, que me socorreu. Eles me levaram a um hospital, onde após meses de recuperação, pude conversar com investigadores, contei tudo que passei, todas as histórias que ainda lembrava, tudo que relatei aqui nesse conto, tentei descrever com detalhes os rostos e lugares por onde fui levada, e os pesadelos que fui forçada a vivenciar.
Da minha amiga Lays soube pela Polícia italiana que ela foi resgatada em um bordel na Turquia, grávida, e vai voltar comigo para casa, das minhas amigas de cativeiro, aquelas que convivi no tormento dos lugares que passei. Algumas pela descrição, a polícia pode identificar, e me deram notícias, pois já vinham procurando e investigando essa quadrilha de tráfico humano a muito tempo. Raíssa foi resgatada, mas muito machucada está com sérios problemas mentais, e não tem condições de voltar para seu país na África, Cecília foi vista pela última vez se prostituindo pelas ruas de Roma, as russas e as árabes ninguém tem notícias, Melissa já voltou para seu país, e infelizmente a nossa pequena samurai Matiko foi encontrada sem vida jogada em uma estrada na Sicília há alguns dias.
Pelas informações da polícia italiana, ficamos nas mãos daquelas pessoas infernais por mais de três longos anos, e é praticamente um milagre que tenhamos saído com vida dessa jornada de castigos e sofrimento. Portanto para eles, todas nós somos vencedoras. Mas dentro de nós, pelo menos se todas tiverem o mesmo sentimento que eu, estamos mortas a muito tempo. E nunca mais nada mudara isso. Nem mesmo a volta ao lar e as nossas famílias.
Essa volta inclusive que não foi nada fácil, pois todos me olham com julgamentos, o preconceito e a repulsa das pessoas me deixam marginalizada por onde eu passo, me tornando hoje uma mulher fria, com medo de conversar, de me aproximar, sem conseguir confiar em ninguém, sozinha, e principalmente sem confiança. Me afundei na bebida, vivo sozinha, e nem mesmo Lays conversa mais comigo, pois me culpa pelo que ela passou. E essa é a minha triste história como uma jovem sonhadora, que queria ser modelo, e acabou caindo na mais cruel e terrível trama de tráfico humano que uma jovem poderia entrar. Destruindo sua vida em um piscar de olhos.
***
Nesse momento uma forte tempestade se forma no horizonte, e Mariana acorda assustada, toda encharcada de suor, tremendo, olhando fixamente para o espelho na parede aos pés de sua cama, onde seu rosto reflete o medo estampado em seus olhos. Ela está desesperada, seu grito ecoa pelas paredes e todo o luxuoso hotel ouve tão estridente suplica de medo. Eis que surge Lays:
- Você novamente com seus pesadelos Mariana? Vai dormir, que daqui a pouco temos desfile, e você sabe que lançamento de coleção nova não podemos estar de olheiras!
- Lays, esse sonho me persegue, e dessa vez foi tão real, que eu achei que tinha sido verdade.
- Dorme Mariana, dorme que quem sabe um dia você não realiza ele!
- Eu não!
E assim, vocês descobrem que tudo fora um longo e bem detalhado sonho erótico macabro saído da fértil cabeça de Mariana, que tem em sua mente, no inconsciente o desejo reprimido de ser submissa por um dia, mas ainda não sabe disso. E reflete seu desejo nesses sonhos eróticos bem diferentes.
(Espero que tenham gostados. Desculpa se em algum momento exagerei)
Fim