Parte 5.
Voltei para o hotel novamente dirigindo como um zumbi. Minha cabeça estava um caos. Tudo o que eu havia deduzido antes de ir até minha casa, se delineou com aquela conversa com Maraísa. Eu tivera todos os sinais desde o início, e como havia pensado, estupidamente, cegamente, ignorei ou negligenciei. O que me revoltava mais é que eu tinha que reconhecer que também tinha a minha parcela de culpa. Eu não fui capaz de dar um basta naquilo.
Quando cheguei no hotelzinho de beira de estrada, tratei de me despir, e entrar num banho demorado. Primeiro liguei a água quente e fiquei ali o tempo que suportei aquela ducha soltando fumaça. Depois, mudei para a água fria e tomei um choque térmico que fez a circulação do meu corpo se dinamizar, mexendo fortemente com meu estado geral. Me senti melhor, mais recuperado fisicamente, embora o emocional estivesse destroçado.
Eu sempre tive certo controle emocional, algo que já veio comigo desde a infância, nunca fui um garoto angustiado ou ansioso, sempre me conduzindo por um padrão de comportamento bem lógico, e sem me deixar envolver por dificuldades momentâneas. Era o rapaz bonzinho, Cu-de-Ferro da turma. Mas, ao mesmo tempo, devido à minha origem humilde, e toda a dificuldade que eu tive para alcançar um nível razoável de qualidade de vida, de estabilidade profissional e social, eu acabei me tornando um ser cuidadoso, programado, evitava improvisos, seguia a cartilha do bom rapaz, bom marido, bom profissional e bom colega. Era muito querido por todos no escritório e tinha alcançado um posto mais elevado na estrutura, graças ao afinco com que eu me dedicava à carreira. Estudava criteriosamente as causas, pesquisava a legislação, buscava casos semelhantes, analisava as chances de alcançar êxito nas demandas, me aconselhava com mais experientes, e com isso tinha sucesso e era respeitado. Mas eu sentia que, como marido, eu realmente tinha deixado a desejar, não como companheiro, ou como fiel cuidador e provedor da minha esposa, mas como parceiro dela nas necessidades dela.
Ela tinha, de fato, dado vários sinais de estar em crise e carente. E eu nesse aspecto tinha deixado a desejar.
Ali, debaixo do chuveiro, eu refletia que de fato, Maraísa tinha razão ao me cobrar a falta de atenção para com as suas necessidades afetivas, emocionais, e até físicas e sexuais. Não bastava eu não deixar faltar nada em casa, não bastava eu ajudar nas tarefas domésticas, não bastava eu ir sempre às compras de supermercado com ela, e ter aquele comportamento religioso de ir da casa para o trabalho, e do trabalho para casa. Eu não estava sendo um parceiro sexual, um macho à altura daquela mulher linda, vibrante, dedicada e sensual. Eu reconhecia minha culpa. Passei a fugir em vez de enfrentar a dificuldade que, gradualmente, surgia na nossa relação, especialmente no tocante à satisfação sexual dela. E para piorar, eu não gostava de ir à festas, sair, passear com ela, pois tentava, proteger minha querida esposa, do risco de ser assediada ou atraída por outros. E eu via como ela era cada vez mais admirada, mais desejada, mais cobiçada. No fundo aquilo me deixava inseguro, e como eu sabia que por mais que eu tentasse, eu não conseguia ser aquele macho potente e viril que ela sonhava ter, eu evitava expor minha mulher e meu casamento ao perigo. Passara a restringir o uso de roupas mais sensuais e chamativas, a censurar atitudes mais liberais. Estava me tornando um inseguro muito grande, machista, cheio de julgamento das atitudes frívolas dos outros, e isso chegou ao ponto de me intimidar na relação com ela. O que não acontecia no início da nossa relação, passou a ser mais evidente.
Quando consegui formar aquela visão mais clara da nossa situação, e entender o quadro que favoreceu que aquilo tivesse acontecido, eu comecei a entender melhor todos os acontecimentos daqueles dias. Mas, ainda estava tão magoado com o que me acontecera, que travei aquelas reflexões, e tratei de me arrumar para ir ao escritório. Eu já não fora trabalhar na véspera, e naquele dia só iria na parte da tarde.
Ao chegar no escritório, procurei o chefe do nosso setor, para me explicar, e justificar minha ausência. Eu realmente estava psicologicamente detonado, e tive que explicar a ele que tive um problema pessoal grave, e por isso não me sentia em condições normais para trabalhar. Poderia comprometer algumas das nossas causas. Ele teve a capacidade de entender, sem especular do que se tratava, e se ofereceu se eu quisesse conversar com ele e me aconselhar. Me disse que se eu pudesse falar do que se tratava, talvez pudesse ajudar. Eu agradeci, e respondi que teria que perguntar para minha esposa, se ele estava de acordo que eu conversasse com ele, e se ela aceitasse, então o procuraria.
Ele, por ser um homem maduro e experiente, entendeu que era algo da minha vida familiar, e apenas me autorizou que eu tirasse dez dias de férias, que ele iria remanejar os casos que estavam na minha alçada, para outro colega da casa. E me pediu que fizesse uma reunião com ele naquela tarde, para dar um relatório do pé em que cada processo estava. Passei o resto da tarde, até perto das 18h00 conversando com o colega, sobre os processos, os estágios, andamento, ideias de encaminhamento, e providências em curso. Pode ser que quem não sabe o que é o cotidiano de um advogado de escritório famoso, não faz ideia do que eu esteja falando. Mas o nosso sistema jurídico é complicado, burocrático, cheio de recorrências, providências, medidas a serem tomadas, pagamentos de taxas e emolumentos, de muitos casos, e alguns com prazos meio urgentes para serem encaminhados. Temos assistentes e estagiários, mas cada advogado tem sua carteira de processos e fica responsável pelo andamento. Quando passa a outro suas “pastas”, precisa explicar tudo detalhadamente, e temos ainda o cuidado de gravar essa conversa, para o caso se se recorrer a algum detalhe mais tarde. Bem, quando terminei, estava exausto, pois não tinha dormido quase nada naquela noite. Peguei minha Strada e fui a uma pizzaria no centro da cidade, onde comi e ainda comprei algumas coisas para levar. E fui para o hotelzinho fuleiro onde estava hospedado, na saída da cidade. Quando estacionei no pátio do hotel e desci da picape, vi um taxi estacionar na frente do hotel. Não dei muita atenção, peguei as coisas que havia comprado, basicamente uma garrafa de água mineral, um cacho de bananas, duas maçãs, e um copinho de iogurte, Comprei na cidade pois eram mais em conta do que pedir no hotel. Quando já me dirigia para entrar, vejo o Geni parado me esperando. Levei um susto, fiquei muito contrariado, mas ele disse:
— Vim na paz. Por favor, quero conversar.
— Não tenho nada do que falar com você. – respondi meio irritado. Estava mesmo exausto.
— Como me achou aqui?
— Segui você quando saiu do escritório, Esperei, e segui de novo.
Soltei um suspiro de cansaço:
— Pode ir, não tenho vontade de falar nunca mais com você.
— Pela última vez, – disse Geni — podemos, depois, se você quiser, não falar nunca mais. Mas hoje, preciso passar a régua neste assunto.
Eu estava cansado, mas pensei que poderia me livrar de uma vez.
— Vou deixar, estas coisas no quarto, tirar o terno, e desço. Espere aqui.
Ele concordou e eu entrei no hotel e fiz o que disse. Guardei as compras, troquei o terno por uma calça Jeans e uma camiseta, calcei um tênis, e saí. Entramos na Strada e segui para um bar-restaurante que havia na orla da praia, que eu sabia que ficava aberto até mais tarde. Durante o trajeto, eu não disse quase nada, apenas quando o Geni falou:
— Eu devo explicações a você. Não acho correto, sair sem deixar você saber tudo o que desejar.
— Vamos parar ali num bar mais sossegado e podemos conversar. Seja discreto.
Depois disso não falamos mais nada até que estivéssemos sentados numa mesa da parte de fora do bar, numa área onde não havia mais nenhum cliente próximo e podíamos conversar sem ter que falar muito baixo. O Geni pediu uma cerveja preta e uma porção de filé frito e acebolado com pão cortado em fatias. Eu não queria pedir nada, mas acabei pedindo uma cerveja preta também. Logo que o garçom se afastou o Geni começou a falar:
— Soube que você foi falar com a Maraísa, hoje. E está decidido a se separar. Eu juro que não queria ser causador disso, mas sei que tenho muita culpa de tudo que aconteceu, e queria esclarecer algumas coisas. Apenas para você saber todos os lados dessa história.
Naquele momento, eu até me senti meio arrependido de ter aceitado a conversa. Não ia resolver, não ia fazer as coisas ocorridas voltarem atrás, e seria mais uma faca sendo enterrada na ferida que eles haviam causado. Tentei abreviar tudo:
— Geni, eu não quero mais saber de coisa alguma. Vamos passar a régua. Estou destroçado, e você, depois da “Ma”, era a última pessoa que eu imaginava que me fizesse o que fez.
Ele contestou:
— Primo, eu tentei abrir o seu olho. Mostrar o que estava acontecendo.
Cortei:
— Não, você tentou preparar o terreno para o que ia fazer.
Nisso, o Geni negando com a cabeça, explicou:
— Você é advogado, um cara inteligente. Tenta se retirar da história, e veja de fora. Repare que tudo levava ao que aconteceu, envolvendo, você, sua mulher, e eu, como agente catalisador da tempestade que já estava armada. Porra, primo, deixe a mágoa de lado, e use a sua mente com frieza. Analise os fatos. Só para entender melhor o que houve.
Mesmo com preguiça de continuar, e bem revoltado ainda, fui mais uma vez levado a explicar:
— Me senti manipulado, enganado, e traído, por pessoas que eu sempre tive grande apreço. Muito mais do que isso, eu amava a minha esposa, adorava o meu primo, e não consigo admitir que vocês tenham feito o que fizeram. Mas está feito. Foi revoltante.
Geni parou para beber um gole da cerveja, e esperar o garçom que viera servir se afastar. Então disse:
— Você ama sua mulher e ela ama você. Ainda. Mas isso não impediu de vocês dois criarem a situação que já estava pronta quando eu cheguei. Se não fosse eu iria acontecer com outro. Eu vi que estava para dar merda, e resolvi ser honesto com os dois.
Porra, eu estava cansado, e queria encerrar.
— Tá bom. Foi honesto, mas jogou sujo. Fim de papo. Já está feita a merda e você ajudou a cagar no pau, ou acelerar. Vamos parar por aqui?
Geni concordou com a cabeça, mas disse:
— Está bem, mas quero encerrar dizendo umas coisas para você pensar. Primeiro, a atitude de não querer ver o que está errado de fato, só vai prejudicar os dois, você e a sua esposa. Separação é complicada, dolorida, principalmente porque os dois se amam, traz despesas, e não conserta o que pode e deve ser consertado. Pense bem. O que estava errado? O modo como vocês conduziam a relação, sem diálogo e fugindo de enfrentar ou de enxergar o problema. Estava assim já, sem eu existir na história. Eu apareci e vi que ia dar merda, e pensei em ajudar, de verdade...
— Ah... Geni, para com isso! Ajudar! – interrompi, meio impaciente.
— Bem, veja como quiser. Eu quis ajudar, porque eu sou da família, gosto de vocês, poderia levar as coisas na surdina, como foi feito, e ninguém ficar sabendo. Mas o que eu desejava era mexer nessa situação caótica do seu casamento que apodreceu sem minha participação.
— Agora tira a sua responsabilidade? – cortei novamente.
Sem perceber, eu havia entrado novamente na conversa, em vez de fechar, e dei munição para que ele continuasse.
— Não tiro, está enganado, primo. Tentei fazer de um jeito que mostrasse a vocês como mudar tudo. Então, como você quer encerrar logo, eu vou fechar o papo de uma vez, dizendo o que eu acho. Vamos lá. Você sempre foi ruim de cama, nunca foi um bom amante para atender as necessidades de sua esposa, e ficou sempre com medo que ela descobrisse que havia coisa melhor do lado de fora. Por isso escondeu a Maraísa do mundo. Até o emprego você não a ajudou a conseguir, pois era cômoda a situação de ter a esposa em casa esperando.
Ele deu uma parada para respirar e viu que eu não queria dizer nada. Eu fiquei meio chocado com o que ele disse. Bebeu um gole da cerveja e prosseguiu:
— Mas, em vez de evitar, essa sua atitude de isolar a esposa, despertou ainda mais, nela, a necessidade de buscar satisfação. Eu estava na hora certa, e no lugar certo, como qualquer comedor oportunista. Aconteceu. Não vim para isso e descobri tudo aqui. Só que não era minha intenção. Percebi que ia dar merda se eu fizesse como ela queria. E tentei mexer o doce, para você entender o que estava acontecendo. E você “sacou”, mas não teve coragem de assumir, e encarar, ficou se fingindo de besta. Eu dei todas as pistas, agi de forma muito visível, notável, na sua frente, fácil de você me chamar e questionar o que estava rolando. Era para a gente ter uma conversa aberta e franca. Mas você sabia que o papo ia chegar neste ponto, onde ela ia dizer o que estava acontecendo com vocês, e eu ia ter que lhe mostrar que, no fundo, você sempre teve um comportamento de cockold, você se excitava em me ver provocar a sua esposa, e ela me provocar e se excitar com isso. Ficou explícito. Não pode negar. Aí, eu chamei você para um papo sincero, quase abri o jogo, e você desconversou, achou que ia ficar por isso mesmo. Aí, eu resolvi dar o pontapé inicial. Aconteceu. Confesso que a nossa brincadeira de provocar escapou do nosso controle. Aliás, escapou do meu controle, porque a sua esposa estava desesperada para ser bem fodida e queria muito. Vamos falar a verdade, ela me disse, nunca teve tanto prazer e satisfação em uma foda como a que tivemos na sala da sua casa. Ela precisava disso. E você também precisava. Desculpe. Falo sério. No fundo, você reagia com ciúme, mas também morria de tesão de ver eu e a sua esposa nos provocando. Você tem medo até de assumir o seu fetiche de corno. Medo de ter que liberar a sua esposa que é um avião, e precisa voar urgentemente. Inseguro e babaca. E não foi capaz de entender que eu fiz isso tudo, para ajudar a vocês se resolverem. Não quero tomar a sua mulher. Fica certo disso. Quero que vocês sejam felizes. Mas ela precisava ter uma aula de foda bem dada.
Eu ouvia aquilo como se fossem bofetadas. Mesmo sabendo que ele estava certo, a raiva e a revolta me dominavam e exclamei:
— Filho da puta. Isso sim!
Ele aceitou:
— Tá! Sou filho da puta. Mas você vai se foder de verde e amarelo se continuar com esse orgulho machista babaca. Agora, talvez, se você deixar o orgulho e o medo de assumir de lado, vai lá e aprende a dar o que ela precisa. Fim de papo. Não tenho mais nada para dizer, porque fui sempre muito verdadeiro, e transparente.
Ele parou de falar e me olhava de frente. Eu tinha vontade de pegar a garrafa de cerveja e enfiar na fuça daquele desgraçado. Mas, no fundo, sabia que ele estava falando a verdade. Apenas disse:
— Mas me enganou, fez escondido.
Geni abanou a cabeça negando:
— Eu dei todas as pistas, mas você fingiu que não sabia, ou pior, não teve coragem para encarar e deixou rolar. Sua mulher também deu todas as pistas. Fodeu com você toda gozada depois de foder comigo. Lamento muito que você esteja assim agora, que não entenda que respeito e gosto muito dos dois. Se eu quisesse ficar com a Maraísa, eu ficava, comia mais vezes, na surdina, ela não contava, e você ia fingir que não sabia. Mas ela não me ama, ela ama você. Eu tenho um monte de mulher para comer, sempre tive, não quero ter vida de casal. Ela entendeu que eu podia mesmo ajudar, unir o útil ao agradável, e satisfazer uma vontade que ela tinha. Agora está feito. Você pode seguir o seu caminho, faça como acha que deve ser. Sabe o que acho que vai acontecer? Você deixa a sua esposa, ela acaba encontrando um que dá a ela o que ela precisa, ela é gostosa, bonita, sensual, inteligente, vai crescer, progredir, ter sucesso, vai brilhar, ou vai ser uma deliciosa de uma safada que vai passar o rodo geral, descontar o tempo de cativeiro, e você vai mesmo perder de vez, pois não tem a coragem de sair desse armário onde se esconde e assumir que nessa parada, é ela que dá as cartas! Você é casado, separa, vende a casa, ou dá a metade da grana para ela, os dois vão se ferrar, e você, nunca vai achar outra mulher como ela. Pronto. Desculpe a sinceridade, falei. Peço perdão, primo, não quero ofender, mas está fazendo a maior cagada da sua vida. Eu saio de cena. Eu gosto muito de você e quero o bem de vocês. Não voltarei a aparecer a menos que um dos dois me chame. Mas o que eu poderia fazer, já fiz. Pode ser que para você seja a merda, mas eu acho que foi melhor sendo comigo do que com outro desconhecido. É isso... desculpe se ofendi. Tinha que falar o papo reto.
Eu não sabia o que fazer. Uma parte de mim pedia que eu desse uma porrada na fuça daquele safado, mas outra parte, sentia que ele estava sendo muito verdadeiro. Fiquei parado, olhando para ele. Vi o Geni se levantar, deixar uma nota de cinquenta sobre a mesa e sair para a rua. Quando me levantei ele já ia longe. Chamei o garçom e pedi a conta. Paguei e saí com a picape. Não queria mais falar com ele, estava muito tenso, irritado, e fui novamente dirigindo como um autômato para o hotel. Não eram ainda 21:00.
Continua...
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