Relação sexual... “ato que se refere a uma ampla variedade de comportamentos entre indivíduos voltados para a obtenção de prazer erótico de pelo menos um dos membros envolvidos independentemente de haver penetração, orgasmo e fins reprodutivos. Para isso é feita a estimulação de uma ou mais zonas erógenas como seios, vagina e pênis.”
Me lembrei da definição fria sobre relação sexual que aprendi na escola e me peguei pensando, dentro dos limites de meu mundo monogâmico e do que vivi até hoje. Desde quando esse ato prazeroso se transformou de complemento para uma vida saudável e feliz em fonte primordial de vida para alguns. Pensei que como tudo que gera prazer pode viciar, gerando uma necessidade cada vez maior de relações, de variedades e de intensidade. O sexo na sua forma mais animal, poderia também transformar pessoas. Pensei também que o habitat, criação, ambiente familiar, amizades, entre outras coisas, influenciavam a forma com que as pessoas viam e viviam o sexo. Existem lados certos e errados? Claro que não! Apenas um somatório de fatores vividos e experimentados por cada um, que nos moldavam. Todos esses pensamentos só comprovavam que eu não fazia a menor ideia do que fazer e do que pensar. Eu tinha uma bola de gude e queria ganhar uma partida de boliche.
Mas não era essa a minha vida, minha história. Eu nunca dei qualquer deixa para que ela pudesse imaginar que aceitaria algo do gênero. E nem ela, em nenhum momento, me fez desconfiar sobre essa sua vontade. Isso me levou a lembrar que seu comportamento mudou da água para o vinho após sua doença. Isso me fez ter a certeza de que ela fora manipulada ou algo parecido, por alguém de muita confiança. Essa pessoa a instigou, tentando mostrar que era algo natural. Que fazia parte da natureza humana.
Eu sabia quem era, e sabia que era natural para ela. Mas com que objetivo alguém manipula uma mulher frágil e psicologicamente ainda instável, (afinal o psicológico não se cura ao mesmo tempo que o físico), a ser como ela, a pensar como ela, a agir como ela? Eu precisava obter essas respostas, e sendo assim, tinha que agir com calma, com estratégia. A pressa nos faz tropeçar e perder vantagens. O tsunami já tinha passado, agora era deixar a água baixar e ver o que sobrou. Reconstruir é sempre pior do que construir.
Cheguei em casa triste, mas determinado a seguir o que já tinha planejado. Aproveitando que, o dia seguinte seria sábado e que minha filha estaria na casa dos avós durante o fim de semana. Entrei em casa o comecei a relacionar meus próximos passos no bloco de notas de meu celular.
Peguei o que tinha de essencial para passar alguns dias, coloquei em uma mala e levei para o carro. Peguei algumas roupas de cama e arrumei a cama no quarto de hospedes. Me tranquei na suíte do casal e fui dormir. Era evidente que não iria conseguir dormir no mesmo quarto que ela.
Poderia ter saído naquela mesma noite, mas preferi olhar dentro dos olhos dela no dia seguinte e ver se perceberia algum sinal de remorso ou culpa.
Dormi pesado e tive um sonho, ou melhor, um pesadelo com ela e o Pinguim.
No sonho, eles chegavam no quarto do hotel e não perdiam tempo com assuntos frívolos ou conversas banais de sedução e conquista. Eles tinham um único objetivo. Sexo puro e sem comprometimentos. Partiram para um beijo apresado e cheio de tesão e expectativas. Sem desgrudarem suas bocas, as roupas iam caindo, sendo tiradas por mãos impacientes. Peças por peças iam sendo depositadas no chão e corpos nus iam aparecendo na mesma proporção. Seios estavam sendo sugados, pescoços e orelhas beijados, mãos se aprofundando em locais inéditos para os dois. Bocas buscando prazer em áreas sensíveis e genitálias se fundindo em uma seção de gemidos e sussurros.
Acordei enojado suando frio e com ânsia de vomito no meio da noite. A raiva me consumiu e amaldiçoei meu subconsciente por ter me dado essa visão dos infernos que eu julgava não ser merecedor. Eu não estava pronto para entender e muito menos para aceitar tudo o que passei nestes dias, e de acordo com minha reação a este sonho, dificilmente estaria um dia.
Segundos depois estava rindo. Imaginando quanto tempo o Pinguim aguentaria minha leoa. Mas percebi que este sorriso era pura farsa para esconder minha derrota, minha angustia, meu sofrimento. Comecei a imaginar a cena dela abraçada a outro, caminhando como dois namorados. E lembrei da sensação que senti quando ela entrou no hotel. Um sentimento de impotência de fragilidade, que me congelou e me deixou atônito, a ponto de bloquear qualquer reação, me impossibilitando também de pensar em formas de tirar minha esposa, e porque não, meu casamento, daquela situação.
Dormi novamente e só acordei com as batidas na porta, seguidas de pedidos para que fosse aberta. Do outro lado da porta uma voz cansada, aparentemente embebedada e melosa, dizia para deixá-la entra pois precisava dormir. Eram 7 hs da manhã. Me fiz de surdo mudo. Ela desistiu e foi para o quarto de hospedes. Ouvi o chuveiro daquele quarto sendo ligado e imaginei ela nua, cansada e possivelmente satisfeita, tentando tirar as digitais, o cheiro e o gosto do outro homem de seu corpo. O cansaço e o desanimo me abateram e voltei a dormir.
Acordei definitivamente as 11h. Fiz minha higiene, Sentia a boca seca e amarga, o estomago roncando de fome. Mesmo com tudo isso só pensava uma coisa: “Era a hora da verdade”. Abri a porta e dei de cara com minha esposa me esperando na saída do nosso quarto com cara de poucos amigos, mas com uma certa aflição no olhar. Não sei quanto tempo ela estava parada ali, mas isso pouco me importava. Eu olhei bem nos olhos dela e notei certa condescendência, mas nenhum sinal de arrependimento. Quando eu comecei a pensar como iniciaria aquela conversa ela se antecipou:
-- Precisamos conversar... continuar a nossa vida. Você é o homem da minha vida, a pessoa que não pode faltar em todos os meus dias. O que preciso fazer para que me entenda, supere e me perdoe?
Tudo o que eu queria ouvir dela era o porquê e não uma tentativa de simplesmente minimizar o problema. Tudo o que eu planejei, tudo que eu ensaiei para nossa conversa caiu por terra. Eu olhei bem dentro dos olhos dela e de forma firme e com uma voz assustadoramente calma com um leve sotaque de deboche, falei:
-- Você tem tomado decisões sozinhas ultimamente, faz o seguinte, continua a fazer assim. Não vai precisar de minha presença ou opinião agora, vai? Tenho plena convicção de que possas resolver tudo isso sozinha. Só não garanto estar aqui para ouvir.
Peguei a chave do carro, abri a porta da sala, deixando minha esposa para trás, estática e agora com os olhos marejados. Sai em direção a garagem, entrei no carro, desliguei meu celular e fui em direção a um apart hotel bem distante de minha casa. Cheguei após duas horas de viagem. Me estabeleci, e comecei a pensar nos passos já completados. Ainda faltavam muitos e eu tinha pressa nenhuma para conclui-los.
Após algumas horas percebi que meu telefone desligado poderia causar preocupações em pessoas que não mereciam, como filha e sogros, já que eu os considerava como pais. Liguei o telefone e na hora recebi uma enxurrada de mensagens e avisos de ligações perdidas. Minha filha estava preocupada e meus sogros também. Mas a grande maioria eram de minha esposa. Respondi minha filha e sogros com uma mensagem única de que estava bem e em breve lhes daria explicações sobre o que estava acontecendo. Mas as mensagens e ligações da esposa, simplesmente desconsiderei. Bloqueei seu número. As imagens do sonho e dela abraçada ao homem ainda me torturavam e não ajudavam em minha recuperação.
O sábado ficou para trás e o domingo já ia se esgotando. Sabia que precisava retornar pra minha casa. Para minha filha, para o meu trabalho. Assim o fiz. Peguei a estrada de volta. Quando entrei em casa, minha esposa deu um sorriso desconfiado e veio em minha direção para me abraçar. A rejeitei e seu sorriso foi substituído por olhos tristes, prestes a chorar.
Sem perder tempo falei enfaticamente:
-- Você tem uma semana para deixar esta casa. Enquanto isso ficará no quarto de hospedes. Não vou conseguir dormir na mesma cama que você e sua presença não nos ajudará em nada. Não precisa se preocupar comigo nem com nossa filha, eu me viro com comida e roupas limpas.
Ela de forma revoltosa e com alguma mágoa na voz, gritou:
-- Eu não vou deixar esta casa...!!!!!! Você não vai se livrar de mim...!!! Nós não vamos nos separar... nunca...!!!!!
Eu a cortei e confirmai:
-- Vai sim, ela é minha casa, eu herdei de meus pais e em uma separação você não terá direitos sobre ela. Você fez uma escolha onde eu não fui permitido opinar. Nada neste mundo vai me fazer entender como alguém joga fora anos de relacionamento feliz por uma simples “curiosidade”. Nada vai reparar o que estou sentindo por dentro. O que me garante que essa “curiosidade” não vai se manifestar outra vez? Não consigo olhar para você sem te imaginar transando com outro. Isso me enoja, me enfurece e só me faz quere me afastar cada vez mais.
Quando ouviu a palavra separação, ela emudeceu, ficou pálida, se jogou no sofá e com as mãos no rosto começou a chorar de forma intensa.
Diante da raiva que ainda sentia, não me solidarizei imediatamente com seu pranto. Apenas sai e fui para meu quarto, me tranquei lá. Agora poderia chorar também.
Após meia hora de um choro doido, me deitei, e de tão cansado que estava, simplesmente apaguei. Quando acordei, era madrugada de domingo para segunda. O silencio imperava. Observei várias chamadas no meu celular. Eram de minha filha, de meus sogros e até da nefasta amiga Monique. “O que será que esta puta queria comigo?” Pensei. Sabia que precisava encarar a realidade e dar uma resposta a todos, menos, claro, a descomungada da amiga.
Enfim segunda. Me arrumei em silencio, e, mesmo sendo muito cedo, fui para o trabalho. Precisava evitar confronto por enquanto. Nada de bom sai quando se está com a cabeça quente. Eu precisava de um lugar em que ficasse em paz e sozinho para decidir com clareza, o que fazer em seguida... O meu trabalho me permitia isso.
Passei o dia todo recebendo mensagens e ligações. Liguei para minha filha. Precisava dar uma satisfação para ela.
Atendeu uma voz aflita e chorosa:
-- Pai!!!!! Onde você está??? Você está bem??? O que está acontecendo??? Mamãe está estranha demais e não fala coisa com coisa. Me fala, toda a hora, que acha que fez besteira, e que está muito preocupada com você.
Com uma voz calma e tranquilizadora respondi:
-- Calma filha, estou bem. Estou no trabalho. Fique com sua mãe, ela precisa de seu apoio. Só posso te antecipar que ela fez escolhas que me deixaram triste. Não se preocupe. Independentemente do que acontecer daqui pra frente, saiba que nós te amamos mais do que tudo e que você será sempre nossa prioridade. A noite papai vai sentar com calma e te deixar a par de tudo. Mas no momento se tranquilize e procure deixar sua mãe amparada.
Preocupada ela reiterou:
-- Tem certeza que está tudo bem?
-- Sim, garanto a você. Um beijo e até mais tarde. Te amo. Respondi e desliguei.
O dia de trabalho estava chegando ao fim, mas deu tempo para eu entrar em contato com um amigo que trabalhava no jurídico da empresa e pedir uma indicação para um bom advogado de divórcios. Ainda não tinha me decidido a nada, mas precisava de orientações em um campo que era totalmente novo para mim. Ele de forma profissional, não me perguntou o porquê e me enviou pelo WhatsApp o contato, afirmando que era o melhor que ele conhecia. Agradeci e desliguei. Liguei para o contato e em poucas palavras agendei uma consulta para quarta-feira próxima. Pela primeira vez na minha vida lamentei o fim do expediente. Ainda não tinha estrutura para encarar minha esposa com a calma que o assunto exigia. A todo momento que pensava em tentar um diálogo, vinha, mais uma vez em minha mente o sonho que tive com ela se entregando a outro homem e as imagens dela abraçada ao Pinguim rumando para o abatedouro. Nada fazia aquelas imagens desaparecerem. Isso me torturava e destruía toda a vontade de tentar entender suas razões.
Me direcionei para casa, com o intento de primeiro tomar um banho e depois sentar e conversar com minha filha. Ela merecia e precisava disso. Deixei o carro na garagem e me direcionei para a porta. Assim que girei a maçaneta da porta, ouvi um falatório que denunciava a presença de algumas pessoas dentro da casa. Na hora, devido ao grande falatório, não reconheci nenhuma das vozes. Minha vontade era de dar meia volta, mas seria uma atitude covarde e não adiantaria eu ficar me escondendo do inevitável. Quem estaria em casa? O que me esperava? Pensei e entrei.
Continua....