CAP 1 - PT 1
Henrique trabalhava em um escritório. Coisa bem chata, assistente administrativo. Não pagava bem, mas também não pagava mal. Dava pro gasto.
Ele passava o dia numa mesa no décimo andar, o último do prédio. Ia pra lá de elevador porque não tinha saco pra ficar subindo escadas. Não pagavam bem pra isso.
Só que naquele dia os elevadores estavam cheios e com fila até. Tinha gente de outras filiais vindo para uma série de reuniões importantes Então lá se foi Henrique, subir dez andares de escada.
Enquanto subia, ele ia bebendo água e pensando na merda que fez com a própria vida. Ele queria ser artista. Quando era adolescente desenhava muito e hoje em dia ele se aventurava na pintura quando não estava morto de cansaço na cama. Henrique não era bom como aqueles caras que ele via no Instagram, mas não era ruim.
Mas arte não dava dinheiro, não a dele, ele já tinha tentado. Era difícil viver disso. Então Henrique trabalhava num emprego de merda em uma empresa que pouco importava.
Quando ele tava lá no décimo andar, suado, cansado e puto com as suas escolhas de vida, ele ouviu um barulho estranho. Era um barulho de respiração estranho e meio abafado. Tinha alguém chorando nas escadas?
O barulho vinha de cima. Talvez a pessoa estivesse na cobertura do prédio. Ninguém ia lá, ela poderia chorar sem ser vista.
Henrique olhou no relógio: 08h15. Ele já estava atrasado (culpa do trânsito e das escadas). Ele estava complicado com os horários e a chefe dele ia comer o cu dele de tanto xingar se tivesse mais um atraso.
Mas não dava, o dia em que ele deixasse alguém chorando sozinho para ir trabalhar seria o dia em que esse capitalismo desgraçado teria vencido. E esse dia não era hoje.
Ele subiu a escada com passos leves para não assustar quem tava lá em cima. Subiu um lance de escadas e ia fazer a curva e subir o outro quando percebeu...
Ali de perto ele conseguia ouvir melhor o barulho. Choro nada, eram gemidos. Tinha uma mulher (dava pra perceber pela voz abafada), gemendo bem baixinho e ofegando como uma corredora na escada.
Henrique olhou com cuidado pelos espaços vazios no corrimão de ferro e viu isso mesmo. Uma mulher apoiada contra a porta da cobertura. Dava pra ver direitinho com as luzes dali: Ela estava com as calças abaixadas um pouco, só o bastante para ela conseguir colocar uma mão dentro da calcinha e ficar se tocando. Enquanto isso a outra mão tampava a boca, abafando mais ou menos os gemidos.
E não era qualquer mulher. Era uma loira com um corpão cheio e as unhas pintadas. Usava o cabelo solto e vestia um uniforme personalizado da empresa. Henrique reconheceu ela na hora, claro. Era a sua chefe!
